Coleção Elétrica

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Coleção Elétrica
As histórias e os personagens do mundo das instalações elétricas
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Volume 2
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10
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Mauro Júnior, Sergio Bogomoltz e Thais Mirotti
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Capa
Kanji Design
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Hilton Moreno
Apoio
Evolução dos fios e cabos elétricos, hoje aparatos
biografia
É de Eurico de Freitas Marques a primeira tabela de
honorários para os engenheiros. Profissional, aos 81 anos,
continua contribuindo para as engenharias civil e elétrica.
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dentro da lei
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conformidade
As normas técnicas são obrigatórias ou voluntárias?
O cumprimento das normas é verificado por mecanismos de
avaliação de conformidade. Conheça os métodos utilizados
no Brasil e saiba como isso tudo começou.
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formação profissional
Depois da universidade, cursos de menor duração surgiram
para atender a uma demanda interna: a origem dos
ensinos técnico e tecnólogo e sua contribuição para o
Distribuição
ACF Alfonso Bovero
Boa leitura e abraços!
história
comunicação.
Impressão
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ABNT NBR 5410 – eficaz também contra incêndios?
indispensáveis à transmissão de infra-estrutura, tecnologia e
Coordenador técnico
Hilton Moreno
Primeiro, agradeço a todos aqueles que se manifestaram em relação ao
conteúdo e ao formato da primeira edição da Coleção Elétrica.
O nível de satisfação e de compreensão da filosofia que marca este projeto
excedeu nossas expectativas e confirmou que estamos no caminho certo ao
oferecer aos profissionais um conjunto de informações históricas, técnicas,
normativas, educacionais, biográficas e de exercício profissional, entre outras,
focadas no setor de instalações elétricas.
Foi particularmente tocante a reação de todos à reportagem que
homenageou nosso inesquecível professor Cotrim. Como era esperado, ao ler
o texto publicado na Coleção Elétrica, cada um, imediatamente, lembrou-se
de pelo menos uma história vivida pessoalmente com nosso querido mestre
ou contada por outra pessoa. Com isso, atingimos plenamente nosso objetivo,
que não era outro, senão, fazer as pessoas lembrarem e homenagearem esta
figura tão querida.
Estimulados pelas avaliações positivas do primeiro número e buscando
sempre melhorar o que ainda pode ser melhorado, preparamos para esta
segunda edição algumas matérias que vão ao encontro do objetivo do
projeto, na medida em que abordarão questões relativas à segurança contra
incêndio abordadas ou não na ABNT NBR 5410, a história da evolução
dos fios e cabos elétricos, a obrigatoriedade das normas técnicas brasileiras,
o processo de avaliação da conformidade e os rumos que tomaram o ensino
da eletricidade no País. Findamos este número com um diagrama composto
por termos de eletricidade para o leitor se divertir.
Mesmo considerando todos os assuntos de relevante importância, destaco
a seção “Biografia”, na qual prestamos um tributo ao engenheiro e eterno
professor Eurico de Freitas Marques, uma pessoa e um profissional muito
especial. Com esta homenagem, reafirmamos nossa admiração por alguém
que, ao longo de décadas, vem trabalhando arduamente para que a profissão
e os profissionais do setor sejam devidamente valorizados. Simultaneamente
a esta luta, Marques elaborou importantes projetos de instalações elétricas,
que são referências no mercado até hoje.
Espero que você, amigo leitor, aprecie este segundo volume da Coleção
Elétrica e aguardamos, com todo interesse, seus comentários.
grandes questões
índice
expediente
carta ao leitor
Gerência de planejamento
Sergio Bogomoltz
sergio@atitudeeditorial.com.br
Administração
Paulo Martins Oliveira Sobrinho
adm@atitudeeditorial.com.br
Hilton Moreno, engenheiro eletricista, consultor
e presidente da Associação Nacional de
Fabricantes de Produtos Elétricos - Nema Brasil
Caro amigo (a) do setor de instalações elétricas,
06-07
Diretores
Adolfo Vaiser
José Guilherme Leibel Aranha
desenvolvimento industrial.
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descontração
Um diagrama com termos de eletricidade para o leitor
pensar e se divertir.
Divulgação/Nexans
por Thais Mirotti
grandes questões
Instalações precárias:
um incêndio difícil de apagar
08-09
Fogo, muito fogo. Essa foi a imagem que marcou, há dez anos, milhares de pessoas no País, quando um grave incêndio
atingiu o Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Na madrugada do dia 13 de fevereiro de 1998, cerca de 70% dos
35 mil metros quadrados do prédio de cinco andares foram atingidos pelas chamas. O fogo, que só foi controlado dez horas
depois, chegou a atingir quase 700 metros de altura e destruiu o terminal de passageiros. O prejuízo na época foi calculado
em R$ 40 milhões. A provável causa dessa tragédia teria sido um curto-circuito nas instalações elétricas.
Outro acidente sério, que também apontou como principal culpada a precariedade das instalações elétricas, foi o
incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo. O prédio, localizado no Vale do Anhangabaú, teve 14 de seus 25 andares
completamente destruídos pelo fogo. Seis pavimentos de garagem queimaram por inteiro e a estatística final dessa
tragédia revelou mais de 170 mortos e cerca de 300 feridos.
Exemplos de tristes episódios como estes apontam como são perigosas e, muitas vezes, fatais, instalações elétricas
ruins, irresponsáveis e mal projetadas. Mas, será que incêndios causados por falhas como essas não têm normas e
cuidados a seguir? A resposta é simples: existem sim regras e precauções que deveriam ser cumpridas, mas isso nem
sempre acontece e não há fiscalização e inspeção que verifique se a regra é cumprida.
A 66 anos, foi criada uma das mais importantes normas do setor elétrico, a antiga NB-3, depois transformada
em NBR 5410. Ela estabelece “as condições a que devem satisfazer as instalações elétricas de baixa tensão, a fim de
garantir a segurança de pessoas e animais, o funcionamento adequado da instalação e a conservação dos bens. Aplicase principalmente às instalações elétricas de edificações, qualquer que seja seu uso (residencial, comercial, público,
industrial, de serviços, agropecuário, hortigranjeiro, etc.), incluindo as pré-fabricadas”.
Desde que foi publicada em 1980, a NBR 5410 – Instalações elétricas de baixa tensão –, considerada a normamãe do setor, passou por quatro revisões, sofrendo algumas modificações e adaptações em cada uma delas. Embora
a sua última atualização de 2004 tenha sido considerada positiva por alguns especialistas, ainda existem detalhes
a melhorar. E são esses pontos que muitas vezes fazem a diferença para evitar a ocorrência de grandes transtornos
quando o assunto é segurança nas instalações elétricas de baixa tensão.
A norma por si só aponta uma série de importantes prescrições, mas somente ela não garante a proteção e a
segurança adequada. O processo de elaboração e de revisão das normas técnicas é aberto à participação de qualquer
indivíduo. Entretanto, o que se tem observado, não só na última edição, mas como em todas as outras atualizações da
NBR 5410, é somente a participação de pessoas gabaritadas do setor elétrico, em sua maioria, engenheiros eletricistas.
No entanto, será que exclusivamente esses profissionais são suficientes para estabelecer todas as normas de
segurança exigidas e cabíveis para instalações elétricas seguras?Algumas estatísticas apontam que não.
Segundo um levantamento do Corpo de Bombeiros de São Paulo, a segunda maior causa de incêndios no
Estado deve-se a instalações elétricas de baixa tensão precárias e inadequadas.
Em 2006, foram 10.223 ocorrências de incêndios em todo o Estado. Desse
total, 3.677 foram causados por problemas elétricos. Só na Capital foram
943 ocorrências por esse motivo.
Se existe uma norma considerada moderna e atual para assegurar a
qualidade e a segurança nas instalações elétricas, por que os números ainda
são tão alarmantes?
Na opinião do Capitão do Corpo de Bombeiros, Adilson Silva, seria
muito importante que pessoas que entendem de segurança participassem da
elaboração da norma. “São profissionais que regulamentam, por exemplo, as
características de segurança que as construções deveriam ter. A norma está bem
escrita, porém ficaria mais rica com a participação dessas pessoas”, analisa.
Por ser uma norma importante e ao mesmo tempo muito complexa,
é preciso dispor de tempo para participar de sua elaboração. O que ocorre
muitas vezes é que os profissionais que não estão ligados diretamente ao
setor elétrico, como é o caso dos engenheiros de segurança, acabam não
tendo tempo necessário e disponível para contribuir com a atualização da
norma. E quando o assunto é segurança, a norma, em alguns pontos, não é
tão clara como deveria.
Para o engenheiro eletricista e presidente da Associação Nacional de
Fabricantes de Produtos Elétricos NEMA Brasil, Hilton Moreno, a NBR
5410 é eficaz quando prescreve sobre aspectos elétricos. Entretanto, ela não
é clara, por exemplo, quanto à classificação dos locais de instalação. “Não se
trata de uma falha da norma, mas um ponto importante a melhorar. Todas
as recomendações relativas a incêndio implicam que antes se classifique os
locais adequados de instalação, mas a definição dessas classificações está em
aberto na norma”, aponta.
O problema é que, genericamente, a norma diz que autoridades
deveriam classificar esses locais, mas não especifica qual profissional é mais
indicado para esse trabalho.
De acordo com a NBR 5410, “os códigos locais de segurança contra
incêndio podem conter parâmetros mais estritos”, ou seja, esses códigos locais
especificados não possuem exigências mais severas. Isso obriga o profissional
a buscar outras informações e orientações de diferentes documentos e
autoridades, isto é, a norma não oferece toda a informação necessária para a
construção da instalação. “Ela deveria ser mais clara nesse ponto, fornecendo
diretrizes sobre como fazer a classificação dos locais contra incêndios. Isso é
algo que deve ser melhorado”, avalia Moreno.
Normalmente, o profissional que classifica os locais mais ou menos
seguros é o projetista. Ficam em suas mãos as decisões quanto à segurança
contra incêndios e a classificação dos locais que demandam segurança
adequada contra fogo. “O que se percebe é que a norma explicita uma
preocupação, mas não é muito clara quanto à sua aplicação”, completa.
É válido lembrar, porém, que a NBR 5410 é uma norma que cobre as
prescrições elétricas e que seria mais eficaz se fosse efetivamente atendida e as
instalações inspecionadas, mas este é outro grande problema.
A norma técnica é, a princípio, um documento voluntário e se fosse
cuidadosamente obedecida, certamente o número de incêndios causados
por problemas nas instalações elétricas seria consideravelmente menor.
Para Moreno, existem três elementos importantes que fazem parte da
verificação: inspeção visual, ensaios e averiguação da documentação de acordo
com o que a norma propõe. “É muito difícil no Brasil reunirmos essas três
verificações, mas fazer a inspeção visual já seria um grande passo para as obras
onde geralmente não se faz nada. É o que a norma prevê”, alerta.
Na opinião do engenheiro de segurança, João Barrico, manter as
características da instalação é manter também as condições de projeto e atender
Apoio
às exigências normativas. Entretanto, para ele, a NBR 5410 cumpre bem seu
papel na medida em que traz recomendações e orientações para o planejamento
e execução de um bom projeto elétrico: seguro e com qualidade.
A observação visual deve ser realizada por um especialista, o qual, como
profissional qualificado, é capaz de perceber precisamente eventuais desvios
nas instalações.
O mito da madeira
Madeira em instalações elétricas não é uma boa combinação. Quem
nunca ouviu essa frase ou algo parecido? Mas esta afirmação realmente tem
fundamento? Segundo a NBR 5410, a combinação é permitida. Vejamos.
A norma diz que “a instalação elétrica deve ser concebida e construída
de maneira a excluir qualquer risco de incêndio de materiais inflamáveis,
devido a temperaturas elevadas ou arcos elétricos”.
A madeira é sim um material que pega fogo, mas se colocarmos um
componente elétrico com ela poderemos causar um incêndio? Estamos indo
contra as normas de segurança? Para quem acha que o sim seja a resposta
mais óbvia, está enganado.
A madeira é um material sólido e tem resistência à ignição muito alta. Logo,
seria necessária uma temperatura elevada demais para causar um incêndio. Para
se ter idéia, seu ponto de fulgor é 150º C, ao passo que um material considerado
inflamável possui ponto de fulgor menor ou igual a 70ºC.
Um componente elétrico bem projetado não será aquecido a tal
ponto de queimar a madeira, já que sua combustão ocorre quando o calor
atinge 300ºC. Essa situação é difícil de acontecer, pois os circuitos são
interrompidos em questão de segundos em temperaturas menores que
essas, anulando dessa maneira a fonte de calor para incendiar a madeira.
É importante lembrar também que a madeira não é um bom condutor de
calor, com baixa condutividade térmica.
O que se pode observar, depois de anos após seu uso com algum
componente elétrico, é que a madeira fica com uma coloração preta. A
temperatura vai carbonizando a madeira, porém, se rasparmos o local
afetado, o que se perde da madeira é mínimo.
Bom senso e qualidade
É possível bom senso e qualidade andarem juntos em uma instalação
elétrica? Sim, mas, para que isso ocorra, é necessário e prudente adotar quatro
pontos básicos: atender às normas de produtos, estar em conformidade
com a norma de instalação, utilizar materiais de qualidade e inspecionar a
instalação antes de ser colocada em serviço.
Essas ações já são rotineiras em diversos países, como Estados Unidos,
Japão e quase toda a Europa, mas aqui no Brasil a realidade é diferente.
A maioria dos bons profissionais segue as três primeiras recomendações
e uma das mais importantes e que garante efetivamente a segurança não é
levada em conta: a verificação da instalação antes de seu uso. “Não adianta
nada você ter um excelente produto, seguir as normas de instalação e não
se importar em verificar o serviço antes de colocá-lo em prática. É como
fabricar um carro e não testar sua qualidade antes de vendê-lo. O resultado
pode ser um defeito, por vezes grave, no seu produto”, avalia Moreno.
Se a inspeção e a manutenção adequada existissem, não teríamos hoje
cerca de três mil ocorrências ao ano, só no Estado de São Paulo, advindas de
instalações elétricas precárias. Seguramente nos lembraríamos de grandes e
tristes incêndios, cuja causa foi a eletricidade apenas como fatos isolados e
não como possibilidades ainda reais.
Por Bruno Moreira
história
Divulgação/Nexans
Primeiros fios e cabos elétricos
eram recobertos com fios de
juta, fibra têxtil vegetal.
Instalação de cabos próxima ao Opera
de Lyon, na França, em 1906.
Pelo céu, pela
terra ou pelo mar
A história dos fios e cabos, produtos que acompanharam o sucesso e o declínio dos
telégrafos e evoluíram para atender à necessidade do mercado de energia elétrica
10-11
Normalmente, eles passam despercebidos pelos nossos olhos já acostumados com sua presença.
Quando avistados, porém, não são muito queridos, acusados que são de causadores da poluição visual.
Enterrá-los tem sido a solução. Estamos falando dos fios e cabos elétricos, cuja baixa popularidade
no quesito estética é completamente anulada por sua incomensurável utilidade. Sob o asfalto, ligados
entre postes, escondidos dentro de paredes em residências, estabelecimentos comerciais e indústrias,
foi e ainda é inegável a importância de tais componentes para o progresso econômico mundial, porque,
afinal de contas, sem fios e cabos, para que fosse conduzida a eletricidade, como haveriam de funcionar
as grandes cidades do mundo, como São Paulo, Nova Iorque, Tokio e outras?
Na atualidade, os condutores apresentam alta tecnologia. São comuns os cabos mistos formados
por condutores elétricos e fibras óticas que transmitem dados e sinais, atividade perfeitamente
compatível com o mundo da era digital. Entretanto, nem sempre foi assim. Quando surgiram, no
início do século XVIII, restringiam-se à realização de funções
hoje quase esquecidas, tais como: transmitir mensagens de
telégrafos eletrostáticos, equipamentos que precederam o telégrafo
eletrodinâmico, cuja lembrança é menos remota que o outro,
considerando uma sociedade que se comunica, quase que em sua
totalidade, por e-mails.
Neste período, pode-se destacar algumas experiências que foram
realizadas e obtiveram êxito no intuito de desenvolver a tecnologia
telegráfica. Em 1747, por exemplo, o inglês Sir William Watson
construiu uma linha de 3.200 metros confeccionada com fios de
juta, fibra têxtil vegetal. O objetivo era transmitir informações de
uma margem a outra do rio Tâmisa, em Londres. Para demonstrar
a eficiência do circuito, Watson colocou, em uma das extremidades
da linha, um assistente, que prendia em uma mão a ponta de um fio
e com a outra segurava uma haste metálica mergulhada no Tâmisa.
Sabe-se que a inusitada experiência foi muito bem-sucedida (e o
assistente não morreu eletrocutado!).
Anos mais tarde, em 1795, o espanhol Dom Francisco Salva
realizou as primeiras experiências usando papel como isolante de
condutores metálicos para transmitir sinais telegráficos. Contudo,
o emprego do primeiro condutor isolado da história é colocado na
conta do engenheiro russo Barão Von Schilling entre 1812 e 1815.
Apoio
Como estratégia durante as guerras napoleônicas, foi desenvolvido
um cabo submarino para detonar minas cruzando o rio Sena. O
condutor era formado por fios de cobre isolados com uma solução
de borracha da Índia, seca e envernizada.
Finda a guerra, o engenheiro russo continuou dedicando-se
à telegrafia e, em 1836, conseguiu que o imperador Nicolau, da
Rússia, ordenasse a construção de uma linha telegráfica a título
de experimento entre as cidades de São Petesburgo e Peterhoff. A
linha era feita com cabos aéreos nus e cabos subterrâneos, isolados
individualmente por seda envernizada, reunidos e amarrados por
juta e impregnados por asfalto.
O experimento russo obteve sucesso, o que estimulou os
inventores da época a pesquisarem novos produtos para isolação
de cabos para telegrafia. Chegou-se, então, à planta gutta percha
da Ásia, ótimo isolante que foi utilizado pelos engenheiros alemães
Carl William Siemens e Johann Georg Halske, em 1848, na
implantação de uma linha subterrânea telegráfica, com um cabo
isolado de cinco mil metros, interligando as cidades alemãs de
Berlim e Gross Berem.
Apenas dois anos depois da linha subterrânea de Siemens
e Halske, em 1850, uma obra de proporções gigantescas foi
anunciada: a primeira grande linha telegráfica de cabo submarino
Divulgação/Nexans
Divulgação/Nexans
Divulgação/Nexans
Máquina trançadeira de cabos para elevadores em Clichy, na França (1962).
Implantação de cabo de alta tensão no leito do lago Zurich (1957).
Manuseio de cabo de 50 kV para eletrificação da linha de bondes de Lyon,
na França, em 1906.
que ligaria França e Inglaterra pelo Canal da Mancha. O cabo,
isolado com gutta pecha, teve sua instalação finalizada na noite
de 28 de agosto, mas a transmissão não foi muito bem-sucedida
e algumas horas depois não havia mais sinal. Dias se passaram até
que se descobriu o que havia acontecido: um pescador francês
havia cortado um pedaço do cabo acreditando ter pescado um tipo
desconhecido de alga marinha. Apenas no ano seguinte o cabo
entre os dois países foi refeito, dessa vez, para que não houvesse
outro pescador francês, isolaram-no com duas camadas de gutta
percha, várias camadas de juta e uma armação em fios e de aço
galvanizado, pesando 5.000 Kg/Km.
elétrica. Os primeiros cabos utilizados por Edison, em 1882, para
a alimentação das lâmpadas, eram dois grossos segmentos de
cobre separados por espaçadores de papel amarrados por juta que
ficavam dentro de um tubo de ferro preenchido com betume. Estes
tubos mediam, no máximo, seis metros de comprimento para
serem transportados com mais facilidade em carroças. A eles eram
acopladas emendas especiais criadas justamente com o objetivo de
aumentar seu tamanho somente no local de instalação.
Utilizando essa tecnologia de fios e cabos, Edson implantou,
em 22 de abril de 1882, o primeiro sistema de iluminação pública
incandescente da história; com 1600 lâmpadas de 50 W na tensão
de 100 V. O sistema deu certo, mas um ano depois o cientista
norte-americano resolveu modificá-lo. Isto porque no mesmo ano
em que Edson colocou seu projeto em funcionamento, o professor
inglês de engenharia elétrica, John Hopkinson, patenteou o
sistema de cabo trefilado para distribuição de corrente contínua,
que poupava mais de 50% em cobre.
Dessa forma, o projeto do cientista norte-americano
passou também a ter três condutores de cobre, sólidos,
redondos, isolados individualmente por gutta percha, reunidos
em triângulo sobre um quarto condutor, todo colocados
dentro do tubo de ferro preenchido com betume. O número
de lâmpadas alimentadas aumentou para 400 e o sistema
funcionou satisfatoriamente até 1950.
A curiosidade dessa história fica por conta da explicação do
surgimento da lâmpada de 110 V. Certo dia, Thomas Edison
observou, durante a alimentação de suas lâmpadas em baixa tensão,
Transmissão de energia elétrica
12-13
No que diz respeito a fios e cabos voltados para a transmissão
de energia elétrica, duas invenções tiveram grande importância
para que isso acontecesse. A descoberta das células voltaicas, em
1800, pelo físico italiano Alessandro Volta, que possibilitou a
reprodução repetitiva e contínua de eletricidade e, anos mais tarde,
em 1871, a criação do dínamo em anel, por parte do mecânico
belga Zénobe Gramme que tornou possível o uso prático de um
gerador de corrente contínua em alta tensão. A partir daí, sistemas
elétricos de luz e força viraram uma realidade, assim como fios e
cabos para transmissão e distribuição de energia.
Aqui, não se pode deixar de mencionar a participação do
cientista Thomas Alva Edison, inventor da lâmpada incandescente,
no desenvolvimento da tecnologia dos fios condutores de energia
perdas consideráveis de energia nos fios condutores de cobre,
o que acarretava uma redução de tensão na extremidade do
circuito. Como as perdas eram parte irremediável do processo,
o cientista resolveu aumentar a tensão de entrada para que a
tensão de saída fosse a que ele havia estipulado. Por ser um
número redondo, a tensão escolhida pelo cientista foi a de 100
V, e para que isso ocorresse, a tensão de entrada era um pouco
maior, ou seja, 110 V.
Dos primórdios dos fios e cabos até os dias de hoje, muita
coisa aconteceu. Com o avanço econômico e a democratização
da energia elétrica, muitos lugares foram iluminados e,
conseqüentemente, muitas linhas de transmissão e distribuição
tiveram de ser construídas e muitos condutores elétricos foram
utilizados. Desse modo, o condutor utilizado para transporte de
eletricidade difundiu-se e consolidou-se. O avanço tecnológico
desses equipamentos tornou-se uma constante.
Segundo o gerente de marketing da Prysmian, Rubens
Campos, a busca por mais segurança, facilidade de instalação e
menos perda de energia foram os propulsores destes avanços.
Usando cabos de baixa tensão como modelo, Campos destaca
alguns pontos desta evolução: o condutor flexível, por exemplo, foi
criado, principalmente, para facilitar a instalação do equipamento;
a isolação não propagante de chama e a isolação livre de halogênios
foram desenvolvidas para aumentar a segurança dos usuários das
instalações. Conforme o gerente da Prysmian, tanto em condutores
isolados como em cabos unipolares e multipolares, o que existe
de mais avançado no mercado são os fabricados com materiais
Apoio
livres de halogênios, com baixa emissão de fumaça escura e gases
tóxicos.
No que há de mais avançado em relação à tecnologia de
transporte de energia elétrica por meio de fios e cabos, Campos
cita a supercondutividade; um fenômeno físico, por meio do
qual, o condutor apresenta uma resistência elétrica próxima de
zero. No passado, esta característica já foi verificada em materiais
a temperaturas próximas do zero absoluto (-247 ºC). Hoje,
já existem materiais com estas características em temperaturas
próximas à ambiente. No entanto, de acordo com o gerente da
Prysmian, ainda existem poucas aplicações comerciais para a
supercondutividade no mundo.
Os isolantes
A evolução dos condutores de eletricidade é também a evolução
de seus materiais isolantes. Como foi visto, a planta asiática
gutta percha funcionou muito bem, o que não impediu a busca
por novos produtos. Entre as décadas de 1880 e 1890, diversas
substâncias foram testadas como isoladores de fios e cabos: gomas,
resinas, graxas, compostos betuminosos, fibras de vidro, areias e até
polpa fibrosa com sangue.
Um material até hoje empregado, mas que durante algum tempo
ficou esquecido, é o papel. Utilizado pela primeira vez, em 1795,
pelo espanhol Francisco Salva, o papel só voltou a figurar como
material isolante de cabos, no ano 1836, em uma apresentação
realizada pelo cientista inglês Michael Faraday na Academia Real de
n
rysmia
ação/P
Divulgação/Prysmian
Divulg
A indústria de fios e cabos passou
a usar o revestimento de PVC a partir
dos anos de 1950. Sua evolução,
entretanto, já apresentou compostos de
juta, papel, betume e outros elementos.
Transporte de uma
bobina de cabo elétrico
no início do século XX.
14-15
Londres, na qual ele demonstrou as ótimas propriedades isolantes
do material. As primeiras grandes aplicações de cabos isolados
com papel, no entanto, aconteceram algum tempo depois, mais
especificamente, em 1890, na cidade de Londres, utilizando cabos
com tensão de 10.000 V. Para que houvesse redução do efeito de
perda de isolação em função da umidade, o papel era impregnado
com betume.
A difusão do uso do papel como material isolante estimulou o
aumento das tensões utilizadas nos cabos e isto, por sua vez, teve
como conseqüência os primeiros problemas de descargas internas
e ionizaçôes nos cabos, provocando perfurações. A situação só
foi resolvida pelo engenheiro e chefe de engenharia da Pirelli
Company de Milão, Luigi Emanuelli, que inventou e patenteou,
em 1917, um novo tipo de cabo denominado “oilfilled”, cabo a
óleo também conhecido como “cabo Emanuelli”. O equipamento
era preenchido com líquido ou massa de material isolante tanto no
condutor quanto nos interstícios da isolação, mantido sob pressão
por vasos de compensação conectados a caixas de junção.
O primeiro cabo a óleo, no entanto, só foi fabricado em
1920 pela própria Pirelli para operar com uma tensão de 80 kV,
fato inédito, pois até aquele momento, o máximo que um cabo
tinha chegado em tensão era 66 kV. Foram quatro quilômetros
de cabos produzidos que, contudo, não foram utilizados porque
sua encomenda acabou sendo cancelada. Os cabos foram selados e
ligados a reservatórios de óleo.
Permaneceram guardados até 1924, quando foram empregados
em uma linha protótipo na Itália, mas já operando com uma
tensão de 132 kV, sem desenvolverem problemas técnicos. Dois
anos mais tarde, impulsionados pela bem-sucedida experiência
italiana, a Pirelli recebeu dois pedidos dos Estados Unidos: um da
Commonwealth Edson Company de Chicago, que encomendou
30 Km de cabos e outro da New York Edson Company, que
encomendou 58 Km. Posteriormente, os cabos a óleo foram
instalados em outros lugares do mundo, como França, Itália, Japão,
Brasil e Argentina. O produto começou a ser produzido também
por outras empresas, com licença da companhia italiana. Os níveis
de tensão, por sua vez, tornaram-se maiores, chegando até a 220
kV, em 1936, em um sistema implantado em Paris.
Simultaneamente ao papel e ao óleo, outros materiais isolantes,
como borracha natural, borracha vulcanizada da Índia e a própria
gutta percha também foram largamente utilizados. Entretanto, com
o avanço das pesquisas no âmbito da química orgânica, estes materiais
começaram a dividir o espaço com outros polímeros, que até então
não existiam. Um desses novos produtos foi o esmalte, que, por volta
de 1850, começou a ser utilizado sobre os fios para enrolamentos de
motores e transformadores. Seu uso também foi bastante difundido
em linhas aéreas de telégrafos, mas não com o intuito de isolar os
condutores e sim para evitar a sua corrosão e com o intuito de facilitar
aplicação de outros materiais isolantes no condutor de cobre.
A fabricação em série de fios esmaltados começou efetivamente
em 1910 e continua até hoje, contudo sua composição química
mudou bastante. De produto basicamente formado por óleo vegetal
ou sintético, o fio esmaltado agora apresenta uma formulação
muito mais complexa, conseqüência das novas descobertas nas
áreas da química de polímeros, termoplásticos sintéticos e resinas
termofixas. Com essa complexa composição química, os fios
começaram a ser utilizados para enrolamento de máquinas com
classe térmica de até 220ºC.
As isolações de cabos com polímeros cada vez mais sofisticados
acabaram por se tornar preponderantes em relação às isolações de
papel e óleo. Dentre esses novos produtos químicos, destaca-se para
a borracha etileno-propileno (EPR) o polietileno reticulado (XLPE)
e o silicone, comumente denominados borracha e para o cloreto de
polivinila, o famoso PVC, plástico fabricado a partir do petróleo. Este,
segundo o engenheiro eletricista, consultor e presidente da Associação
Nema Brasil, Hilton Moreno, por conta de seu custo mais atraente
em relação aos demais produtos, acabou tornando-se, para fabricantes
e consumidores, a opção mais popular de material de isolação de fios e
cabos elétricos. Dessa maneira, o PVC é utilizado em uma ampla gama
de aplicações, sendo que os cabos isolados em borracha tornaram-se a
escolha mais utilizada nas indústrias e grandes obras comerciais.
Os condutores
De acordo com o gerente de marketing da Prysmian, Rubens
Campos, quando se refere, de maneira técnica, a condutor elétrico
não está se falando do cabo ou do fio em sua totalidade e sim
ao seu miolo somente: a parte metálica. O cobre apareceu como
um dos primeiros condutores industrializados, posteriormente, o
alumínio. Desde o início da fabricação em larga escala de fios e
cabos elétricos, a situação não se modificou e estes dois materiais
permaneceram como os mais utilizados pelo mercado.
Segundo Moreno, cada metal (cobre e alumínio), atualmente, é
utilizado em uma área específica. O cobre, por exemplo, na maioria
das vezes, é empregado em instalações internas, pois, de acordo
com a norma de instalações elétricas de baixa tensão NBR 5410, é
proibido o uso de alumínio em fios e cabos dentro de residências
Apoio
e há grandes restrições ao seu uso em instalações comerciais e
industriais. Dessa forma, este metal, comumente, constitui as
linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica.
Os condutores são utilizados em diferentes áreas devido às suas
características de condutividade elétrica, secção e peso. Um fio de
cobre mole, por exemplo, de 1 metro de comprimento com 1 mm²
de seção, apresenta uma condutividade relativa de 100%, conforme
a norma International Annealed Copper Standard (IACS). Por sua
vez, a condutividade relativa de um fio de alumínio com as mesmas
medidas é de 60,6%. De acordo com Moreno, isto significa que
o alumínio conduz 39,4% menos corrente elétrica que o cobre,
considerando-se a mesma seção e, caso quisesse conduzir a mesma
corrente, deveria possuir uma seção entre 40% e 60% maior.
No entanto, apesar de demandar uma secção maior para conduzir a
mesma corrente, o alumínio compensa esse déficit com uma densidade
menor em relação ao cobre: 2,7 g/cm³ ante 8,9 g/cm³. Desse modo,
segundo o engenheiro eletricista, se calcularmos a relação entre o peso
de um condutor de cobre e o peso de um condutor de alumínio, ambos
transportando a mesma corrente elétrica, verificamos que o peso do
condutor de alumínio é quase metade do peso do de cobre.
Ou seja, a partir dessas características físicas que os definem,
estabeleceu-se uma divisão clássica (porém não obrigatória) quanto ao
uso dos dois metais nas redes elétricas. Em linhas aéreas, por exemplo,
em que as dimensões de torres e postes e os vãos entre eles dependem
diretamente do peso dos cabos sustentados, utiliza-se o alumínio. Já
em residências, cuja preocupação maior é com o espaço e não com o
peso dos fios e cabos, o cobre é a opção mais inteligente.
Pesquisa:
Revista Pirelli Club, edições de 1 a 5 - artigos de autoria do engenheiro eletricista Hilton Moreno
Por Bruno Moreira
Fotos: Sérgio Kanazawa
biografia
Engenheiro
“dois em um”
A engenharia civil foi sua primeira opção, posteriormente, percebeu que a elétrica
poderia ser um desafio e, hoje, aos 81 anos, Eurico Freitas Marques já fez muito
pelas duas áreas e ainda quer fazer mais
16-17
O homenageado desta edição não entrou na faculdade de engenharia pensando em trabalhar
na área elétrica, mas acabou tornando-se um dos grandes nomes do setor. Ministrando aulas,
realizando projetos, lutando pelos honorários da classe e atuando em reuniões da Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), Eurico Freitas Marques, pouco a pouco, ganhou a
confiança e a admiração de seus colegas e por isso, segundo eles, merece ter sua história contada
na páginas que se seguirão.
Pode-se dizer que a carreira de Eurico Freitas Marques começou em 1952, quando ele se
formou em engenharia civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Amigo
de Marini Barros, um arquiteto renomado da época, o recém-formado engenheiro tornou-se
responsável pelos projetos de instalações hidráulicas de todos os trabalhos realizado por Barros.
“Ele me dava todas as causas de hidráulica, mas em contrapartida me desafiava a realizar os
projetos na área de instalação elétrica”, lembra Marques.
Contudo, havia um obstáculo para que Eurico ficasse responsável também pela parte elétrica
dos projetos realizados por Barros: a formação recebida por ele na faculdade de engenharia civil
só o habilitava a trabalhar com instalações que funcionassem com potência de até 75 kW.
Diante disso, o engenheiro resolveu enfrentar, em meados da década de 1960, mais três anos
Eurico ainda desenvolve projetos de instalações elétricas e hidráulicas em escritório localizado na zona sul de São Paulo.
de engenharia elétrica no Instituto Presbiteriano Mackenzie.
“Eram para ser seis anos, mas, como eu já havia feito a Poli
antes, consegui eliminar grande parte das matérias”, conta.
Segundo Eurico, essa foi uma fase difícil em sua vida, pois
a volta para a faculdade, mais de dez anos após terminada
a primeira, acarretou algumas mudanças em sua rotina. O
engenheiro civil havia casado em 1957 e já tinha duas filhas
na época e possuía outras responsabilidades além daquelas de
quando jovem. Tanto tempo assim também foi chocante para
Eurico no que se referia às roupas e ao comportamento de seus
colegas de classe. “A mudança foi radical; os alunos já assistiam
à aula usando bermudas e chinelos. Para você ter uma idéia, na
época da Poli, eu usava terno e gravata e levantava quando o
professor chegava, como sinal de respeito”, relembra.
Em 1968, já formado pela segunda vez, o engenheiro
civil, agora também engenheiro eletricista, foi chamado para
ser professor no próprio Mackenzie, lecionando a respeito
de instalações hidráulicas e elétricas. Lá, em pleno regime
ditatorial, acompanhou de perto a briga entre o Comando de
Caça aos Comunistas (CCC), organização direitista formada
por alguns estudantes do Mackenzie que entrou em conflito,
em plena Rua Maria Antônia, com os estudantes da Faculdade
de Filosofia, Ciências e Letras da USP, que na época estava
localizada no prédio em frente da universidade presbiteriana.
Junto com as aulas ministradas no Mackenzie, Eurico
também lecionava na Faculdade Armando Álvares Penteado
(Faap), mais especificamente, na área de eletrotécnica
aplicada. E foi lá que participou de algumas situações no
Apoio
mínimo inusitadas. Depois de um período de adaptação como
professor no Mackenzie, o engenheiro ficou mais seguro diante
de seus alunos e pôde colocar isso em prática na Faap. Segundo
Eurico, ele sempre foi um professor muito liberal e deixava
os estudantes à vontade para saírem da sala se não quisessem
prestar atenção em suas aulas. “Certo dia, no entanto, um
aluno começou a ler jornal no meio da minha aula. Eu não
pensei duas vezes e com o cigarro que fumava coloquei fogo
no jornal”, relembra.
Não era apenas Eurico que pregava peças em seu alunos.
Eles, também, aprontavam das suas. Certa feita, o engenheiro,
que costumava levar à suas classes uma caixa de sapatos cheia
de equipamentos para montar um interruptor em paralelo,
esqueceu uma lâmpada. “Eu fui pegar a lâmpada e quando
voltei a abrir a caixa havia um gato lá dentro. Tomei um susto
e tanto”, conta. Dessa forma, Eurico levou suas aulas na Faap
e quando saiu de lá deixou grandes amigos.
De acordo com o engenheiro, a tarefa dobrada, de dar aulas
na Faap e no Mackenzie, porém, ficava menos árdua, porque
tomava somente dois dias de sua semana; segunda-feira ele
trabalhava como professor na Faap e quarta-feira no Mackenzie.
O restante da semana era passado em seu escritório, no qual
o engenheiro trabalhava projetando instalações hidráulicas e
elétricas de edifícios em construção.
O engenheiro eletricista e civil abriu o seu escritório em
1966 e, desde então, realizou importantes projetos no Estado
de São Paulo. “Fizemos toda a infra-estrutura de Alphaville,
Aldeia da Serra e Tamboré, além de implantarmos o sistema
“A mudança foi radical: os alunos já assistiam
à aula usando bermudas e chinelos. Para você
ter uma idéia, na época da Poli, eu usava
terno e gravata e levantava quando o professor
chegava, como sinal de respeito.”
18-19
de iluminação do primeiro trecho da rodovia Castelo Branco”,
diz. Eurico prestava serviço para a empresa Albuquerque
Takaoka, construtora de renome da época e que construiu
grandes edifícios no País.
Foi nesse período que o atual proprietário da consultoria
LFM Engenharia, Luis Fernando Navarro, conheceu Eurico.
Navarro estagiava na construtora Fioravante Junqueira,
empresa para qual o engenheiro realizava os projetos de
instalação elétrica e hidráulica e pôde acompanhar de perto
o crescimento profissional de Eurico e de sua empresa. “Foi o
primeiro boom do setor imobiliário, época do Banco Nacional
de Habitação (BNH) e de grandes construtoras como Guarantã
e Albuquerque Takaoka. O Eurico fez muitos trabalhos com
essas empresas”, conta.
Segundo Navarro, a firma de Eurico Freitas Marques foi
uma das maiores no setor de instalações elétricas e hidráulicas.
“Foi uma época interessante, na qual se construiram muitos
prédios, como agora, guardadas as devidas proporções, e pelo
que sei o Eurico foi o grande projetista daquele momento”,
lembra. O importante para o consultor, entretanto, é que,
durante os mais de 30 anos que eles se conhecem, o engenheiro
civil manteve-se atualizado e por isso ainda está na ativa. “Isto
demonstra que ele é um profissional de qualidadde e com
grande capacidade de criar projetos”, diz.
Outro amigo de Eurico que o conheceu no início de
sua carreira foi o engenheiro e atualmente proprietário da
consultoria Engenharia SC Ltda., Carlos Vieira, que tem em
comum com Eurico o fato de ter feito também o curso de
engenharia civil e elétrica. “A diferença é que eu fiz as duas
faculdades em simultâneo”, comenta.
De acordo com Vieira, por ser mais antigo na profissão,
Eurico já era conhecido quando ele começou a atuar na década
de 1960. Este foi o primeiro contato que Vieira teve com
Eurico. Posteriormente, por realizar trabalhos em conjunto e
assistir suas palestras, o proprietário da SC acabou se tornando
um grande amigo de Eurico. “Pessoalmente nos conhecemos
há cerca de 20 anos e hoje conversamos muito sobre serviços,
pois ele é um profissional de muito respeito e que tem um
profundo conhecimento da parte técnica”, conta.
O engenheiro eletricista e civil só tem elogios ao
companheiro de profissão. “Costumo dizer que Eurico é
‘gente’. Ele é inteligente e formidável”, diz. Vieira já conheceu
muitos engenheiros na sua trajetória e, segundo ele, encontrar
alguém como Eurico, que une a competência profissional
com o jeito agradável de tratar companheiros de profissão e
clientes, é uma tarefa muito difícil.
Ainda na ativa
Com 81 anos completados em janeiro, Eurico, como
disse Navarro, continua trabalhando no seu escritório na rua
Tabapuã. Sua carreira de professor ficou para trás. Em 1982,
deixou de dar aulas. “Praticamente ao mesmo tempo parei
de lecionar nas duas universidades”, diz. Em 2002, porém,
voltou, mesmo que momentaneamente, a lecionar a matéria
de Patologia das Instalações Hidráulicas e Elétricas em um
curso de pós-graduação.
Fez isso até 2003, mas já há muito havia diminuído seu
ritmo. “Tenho me poupado um pouco”, comenta o engenheiro
que, além de realizar seu projetos, continua participando
Apoio
“Deveria ser obrigatório constar
o nome da firma de engenharia
responsável pelo projeto nos
lançamentos publicitários
dos edifícios.”
O projetista foi um dos responsáveis pela criação da tabela de honorários utilizados pelos engenheiros.
20-21
de reuniões que ajudam a decidir os rumos do setor
de construção civil no País. De acordo com Eurico, sua
história como militante da área começou no início de sua
carreira no campo docente . “Como professor eu tinha que
me atualizar e uma maneira de fazer isso era fazendo parte
das reuniões da ABNT”, relata.
De acordo com Eurico, na época de juventude, sua
participação nessas reuniões era mais assídua, contudo, até
hoje, ele freqüenta as assembléias do Comitê Brasileiro 24
-CB- 24, realizadas no Corpo de Bombeiros e que discutem
as normas de hidrantes e mangotinhos. E o engenheiro
salienta a importância dos encontros. “Nessa reuniões
aparecem fabricantes, consumidores e interessados de todas
as regiões do País”, afirma.
Entretanto, Eurico comenta que há situações relativas
a esses encontros que o deixam chateado. “Ouvi de alguns
colegas engenheiros que as reuniões da ABNT deixaram
de se pautar pelo aspecto técnico e se transformaram em
um fórum econômico”, conta. “É óbvio que há diversos
interesses em jogo, mas a discussão é importante e deve ser
prestigiada”.
A relevância desses eventos é tão grande para Eurico que
ele também faz questão de participar dos grupos de trabalho
do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e
Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais de
São Paulo (Secovi). São reuniões comandadas pelo diretor
engenheiro Paulo Rewald e ligadas ao setor imobiliário
e versam sobre sistemas prediais. “Contribuem para a
atualização na parte técnica”, explica.
Tabela de honorários
Quando soube que o homenageado desta edição
seria o seu amigo Eurico Freitas Marques, o renomado
engenheiro eletricista Paulo Barreto elogiou a escolha.
Segundo ele, Eurico fez muito pelo setor da construção
civil, principalmente na área hidráulica. Barreto falou
dos pontos mais importantes que para ele tornariam justa
a homenagem ao engenheiro civil; falou de sua carreira
como professor universitário; da sua atuação na ABNT;
seu profundo conhecimento da parte hidráulica; e frisou
o trabalho de Eurico na realização da primeira tabela de
honorários para os engenheiros.
Eurico conta que o desenvolvimento da tabela foi uma
verdadeira guerra. Isto porque, segundo ele, a classe não
era muito unida e até hoje não é. “Cada um cobrava o que
queria e ainda é assim. Eu sigo a tabela”, afirma. Contudo,
a responsabilidade de sua criação não pode ser somente
creditada na conta de Eurico. “Foi um trabalho em equipe”,
explica. “Foram várias reuniões que começarm na minha
casa e depois se transferiram para o Instituto de Engenharia
da USP”. Esse trabalho, aliás, culminou na criação de uma
divisão de Instalações Prediais para as áreas hidráulica e
elétrica dentro do Instituto, que, posteriormente, recebeu
o nome de Associação Brasileira de Engenharia e Sistemas
Prediais (Abrasip).
De acordo com Eurico, a tabela de honorários era
imprescindível para a classe, já que, além da falta de critérios
definidos, o que acarretava em uma salada de cobranças por
serviços prestados, já havia uma orientanção por parte do
Conselho Regional e Engenharia, Arquitetura e Agronomia
de São Paulo (Crea-SP), mas que, segundo Eurico, era
abrangente e não muito clara. “Ela não acompanhou o
desenvolvimento tecnológico das instalações elétricas, por
exemplo”, afirma. Segundo Eurico, antigamente a parte
elétrica possuía apenas dois circuitos: de iluminação (110
V) e de chuveiro (220 V). Agora, há a parte de telefonia e de
dados, o que torna o serviço do engenheiro mais complexo
e, conseqüentemente, os honorários a serem pagos precisam
ser atualizados.
Apoio
O que ainda falta fazer
Depois de todas suas realizações na parte profissional,
poderia se pensar que Eurico não desejaria realizar mais nada
para o setor, mas não é bem isso. Aos 81 anos, o engenheiro
ainda tem suas expectativas e anseios. Um deles refere-se ao
reconhecimento de sua classe nos projetos da construção civil.
“Deveria ser obrigatório constar o nome da firma de engenharia
responsável pelo projeto nos lançamentos publicitários
dos edifícios”, conta. “Isso já acontece, atualmente, com
os arquitetos e não com os engenheiros porque a classe é
desunida”.
Outra questão que ainda instiga Eurico refere-se ao
Interruptor Diferencial Residual (IDR). Segundo ele, já foi
difícil aprovar a obrigatoriedade do uso de tal dispositivo e
agora está sendo mais difícil ainda fazer os responsáveis pela
construção dos edifícios utilizá-lo em seus projetos. “É um
dispositivo que detecta a corrente de fuga que se passar de 50
mA torna-se muito perigosa”, explica. Por isso, de acordo com
o engenheiro, deveria ter uma fiscalização para que o dispositvo
fosse usado.“Em São Paulo, por exemplo, a distribuidora de
energia elétrica AES Eletropaulo deveria ver isso, já que está
especificado o uso obrigatório do aparelho”, argumenta.
dentro da lei
Penalidades
Por Leonardo Faria e Flávia Lima Possíveis penalidades decorrentes de decisões judiciais ou de atos administrativos
para aqueles que descumprirem as exigências de portarias, decretos e outras
legislações envolvendo normas técnicas.
I – multa;
II – apreensão do produto;
III – inutilização do produto;
IV – cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V – proibição de fabricação do produto;
VI – suspensão do fornecimento de produtos e serviços;
VII – suspensão temporária de atividade;
VIII – revogação de concessão ou permissão de uso;
IX – cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X – interdição, total ou parcial, de estabelecimento, obra ou de atividade;
XI – intervenção administrativa;
XII – imposição de propaganda.
Qualidade e segurança
são opcionais?
Normas técnicas asseguram o mínimo de qualidade e segurança a serviços e produtos, especialmente os elétricos. Mas,
afinal de contas, o seu cumprimento é obrigatório ou voluntário?
22-23
O papel de uma norma técnica é, fundamentalmente, fornecer os critérios mínimos de
segurança e qualidade de produtos e serviços. Tratando-se de produtos elétricos, a atenção com
os procedimentos normativos é ainda maior, considerando que a eletricidade mal utilizada
pode trazer riscos de acidentes aos usuários. Entretanto, a grande questão que envolve o assunto
e o polemiza é: o cumprimento de uma norma técnica é obrigatório ou facultativo?
Responsável pela publicação de todas as normas técnicas brasileiras, a Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABNT) afirma que a norma é voluntária e a define como “documento
estabelecido por consenso e aprovado por um organismo reconhecido que fornece, para uso
comum e repetitivo, regras, diretrizes ou características para atividades ou seus resultados,
visando à obtenção de um grau ótimo de ordenação em um dado contexto”. Denomina ainda
aquelas normas chamadas de “mandatórias” como documento com aplicação obrigatória em
virtude de uma lei geral, ou de referência exclusiva em um regulamento.
A lei e o regulamento mencionados referem-se a Portarias, Resoluções e Leis que determinam
o uso obrigatório de determinada norma. É o caso, por exemplo, das Resoluções do Instituto
Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), que exigem a
certificação compulsória de determinados produtos.
Por alguns destes regulamentos, os fabricantes devem,
obrigatoriamente, obedecer à norma específica e caracterizada
nos procedimentos do Inmetro para que a comercialização do
produto seja permitida. O mesmo acontece com resoluções
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e outros
regulamentos de âmbito federal, estadual ou municipal, que
possuem força de lei e exigem o cumprimento de normas.
Nesses casos, a norma técnica deixa de ser voluntária para
ser obrigatória. Vale lembrar que não é obrigatório que uma
resolução, portaria ou lei faça referência às normas da ABNT,
podendo a própria regulamentação conter os requisitos
técnicos desejados.
No entanto, há uma discussão controversa que ronda
debates da própria comunidade técnica. A causa da polêmica
é a Lei nº 8078, de 11 de setembro de 1990, que instaura
o Código de Defesa do Consumidor (CDC). O parágrafo
VIII do seu artigo 39 determina que é vedado ao fornecedor
de produtos ou serviços “colocar, no mercado de consumo,
qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas
expedidas pelos órgãos oficiais competentes ou, se normas
específicas não existirem, pela Associação Brasileira de Normas
Técnicas ou outra entidade credenciada pelo Conselho
Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial
(Conmetro)”.
Dessa forma, pelo CDC, o respeito às normas da ABNT
é obrigatório e sua desobediência corresponde a uma infração
legal e sujeita às sanções prescritas. Isso significa que, sob
o ponto de vista legal, a norma técnica é imprescindível e
problemas comprovadamente gerados pelo não atendimento à
regulamentação podem implicar graves conseqüências jurídicas
para o responsável pelo produto ou serviço prestado.
Algumas jurisprudências dos tribunais nacionais são
categóricas e determinam penalidades pelo não cumprimento
Apoio
das normas técnicas. Em uma apelação cível, de 2001, por
exemplo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais conferiu à
distribuidora de energia local a responsabilidade por uma
morte ocasionada por choque elétrico em rede de distribuição
de energia elétrica residencial que estava em desconformidade
com as normas da ABNT. A concessionária teve de pagar uma
indenização. Em outro caso, o contrato de uma construtora foi
anulado devido à execução de obras e serviços em desacordo
com as normas técnicas. (Veja quadro das penalidades)
A ABNT defende que a norma é inteiramente voluntária,
pois é impossível identificar o seu conteúdo com a mesma
relevância de um regulamento técnico ou de uma Lei pública.
De acordo com o diretor de normalização da ABNT, Eugênio
Tolstoy, a norma não é obrigatória, pois não é formulada
no âmbito legislativo do Estado. “A norma é elaborada pela
sociedade, por isso é voluntária. Já a Lei ou regulamento técnico
é totalmente diferente, pois é produzido e regulamentado por
meio de uma legislação e é imposta à sociedade”, esclarece.
Outro ponto destacado pelo diretor e que, no seu
entender, exime o caráter de obrigatoriedade de uma norma
é o seu aparecimento, como menção e recomendação, em
procedimentos legais. “Em diversas leis e regulamentos
técnicos, os legisladores indicam a norma para identificar
como deve ser realizado um procedimento específico. Nesse
caso, podemos dizer que a norma se torna obrigatória, pois
ela faz parte de um requisito legal. Entretanto, o conteúdo da
norma unicamente não possui atividade compulsória”, explica
Tolstoy.
Os pareceres jurídicos que atestam o caráter obrigatório
das normas técnicas e a afirmação da ABNT em considerá-las
como voluntárias causam certa confusão e descontentamento
no mercado. Para o presidente do Instituto Tecnológico de
Estudos para a Normalização e Avaliação de Conformidade
A elaboração de uma norma
A estrutura normativa brasileira passa por algumas etapas até chegar à sociedade como um todo. A ABNT, composta
por 60 comitês responsáveis pela criação, manutenção e fiscalização de uma norma técnica, administra e publica todas as
normas técnicas brasileiras. Os grupos normalizadores estão divididos por áreas em Comitês Brasileiros (CB). O CB-3,
por exemplo, é o comitê responsável pela elaboração e revisão de normas relacionadas ao setor de eletricidade. Existem,
atualmente, cerca de 10 mil normas técnicas brasileiras, envolvendo os mais diversos setores industriais e econômicos do
País.
Para a criação de uma nova norma técnica, os fabricantes, os consumidores e as chamadas instituições neutras
(universidades, ONGs, associações filantrópicas, etc.) formam comissões que trabalham em conjunto com o seu CB
respectivo. Dentro dessas comissões, cada categoria da sociedade participante – consumidor, fabricante e instituição
neutra – possui um voto dentro da discussão. Por uma determinação da ABNT, uma norma brasileira deve ser criada,
preferencialmente, por consenso entre todas as partes.
Após a conclusão do primeiro texto da nova norma, ele é disponibilizado no site oficial da ABNT (www.abnt.org.br)
para consulta da sociedade e para que sejam feitas eventuais críticas e sugestões para o seu conteúdo. Terminado o prazo de
consulta pública, que varia de 30 a 120 dias, a comissão reúne-se para analisar os comentários recebidos, concluir o texto
e enviá-lo para a ABNT. Passado todo este processo, a associação chancela o novo texto, publica em formato eletrônico ou
papel e comercializa a norma para os setores interessados.
(Itenac), o engenheiro eletricista Mauricio Ferraz de Paiva,
um dos argumentos usados para definir a voluntariedade da
norma é a existência de documentos com caráter de orientação.
“A única brecha para aqueles que dizem que a norma não é
obrigatória é que 1% de todo o conteúdo não possui caráter de
norma e sim de diretrizes ou guias. Exemplo disso é a norma
para monografia acadêmica”, analisa.
O contraponto é o assunto “segurança”, crucial para
aqueles que defendem a obrigatoriedade da norma. Paiva
explica que um produto fabricado fora dos preceitos de uma
regulamentação normativa pode oferecer risco de acidentes
e não garantir qualidade. “Um fabricante, caso a norma
técnica não seja obrigatória, pode disponibilizar no mercado
um produto totalmente inadequado ao consumidor”, afirma
Paiva. Ele cita o exemplo de uma lâmpada, que pode ter
durabilidade menor que a exigida pela norma e oferecer riscos
à segurança pessoal, caso os materiais utilizados não estejam
em conformidade com o conteúdo técnico preestabelecido.
Comércio de normas
24-25
A observância da norma associada ao atual sistema de
comercialização dos conteúdos técnicos é outro tema de
discussão. A principal reclamação refere-se aos preços de
normas ultimamente cobrados pelo órgão competente.
Em 2008, para se ter uma idéia, o preço de uma norma
variou entre R$ 90 e R$ 200, mas chegou a custar R$ 30 em um
passado mais distante. O diretor do Itenac, Mauricio Ferraz de
Paiva, considera que o valor de aquisição de uma norma técnica
deveria incorporar apenas os efetivos gastos (papel, impressão
e distribuição). Enquanto alguns profissionais alegam que o
custo de uma norma é abusivo, tornando a distribuição de
conteúdo técnico em negócio, a ABNT contesta. O diretor
da entidade, Eugenio Tolstoy, compara a comercialização
das normas aos métodos de certificação de produtos: “Para
conseguir certificar um produto, o Inmetro exige que o
produtor procure um laboratório cadastrado e pague para este
estabelecimento realizar testes e ensaios, almejando obter o
laudo favorável para a certificação”.
O mercado se apóia na argumentação de que, como as
normas são produzidas pela sociedade – especialistas, empresas,
consumidores e neutros, todos voluntários – e a ABNT é um
órgão sem fins lucrativos, as normas deveriam ter um valor
mínimo apenas para cobrir os gastos com as reproduções, pois
são documentos produzidos e direcionados para a utilidade
pública. Na opinião de Paiva, não se pode cobrar pelo conteúdo
da norma, pois não é uma propriedade privada.
Para entender melhor, sob o ponto de vista jurídico,
a Justiça se baseia na seguinte ordem de importância: lei;
regulamento técnico (que atua como complemento da Lei);
e normas, caso os dois mecanismos anteriores não sejam
suficientes para uma decisão judicial.
Segundo a ex-procuradora-geral do Estado de São Paulo e
professora associada de Direito Constitucional da Faculdade
de Direito da Universidade de São Paulo, Anna Cândida da
Cunha Ferraz, na maioria dos casos, os juízes dão o veredicto
baseados na legalidade das normas técnicas, pois elas são
citadas no texto do Código do Consumidor.
A professora completa afirmando que o argumento principal
utilizado por aqueles que defendem a voluntariedade das
normas é errado pela diferença entre os termos: regulamento
e norma. “O regulamento técnico é um dispositivo criado
pelo Estado com o intuito de complementar a informação de
alguma Lei. Já a norma técnica é um conteúdo criado por
um grupo de técnicos especializados no respectivo assunto e
atestado por um órgão selecionado pelo Estado (no caso do
Brasil, a ABNT). Essa diferença não tira a observância da
norma técnica”, explica Anna Cândida.
Em outros países
A normalização e o seu caráter de cumprimento, assim
como os valores comercializados, variam de país para país.
Mas, de qualquer forma, existem organizações nacionais que
concentram as atividades de normalização e as internacionais
International Organization for Standardization (ISO) e a
International Electrotechnical Commission (IEC) são bem
aceitas em parte do mundo. A IEC, chamada de “braço elétrico”
da ISO, atua nos setores de eletrotécnica, eletrônica, iluminação
e telecomunicações e, com mais de 60 países membros, exerce
grande influência sobre a normalização brasileira.
Observando a obrigatoriedade da norma em outros países,
percebemos que a situação não é muito diferente da vivida
no Brasil. O Instituto Português da Qualidade (IPQ), órgão
normalizador de Portugal, especifica a venda de normas como
uma de suas atribuições e esclarece que, de forma geral, as
normas são voluntárias, tornando-se obrigatórias apenas
quando houver legislação que determine o seu cumprimento.
Este é, basicamente, o princípio que rege a questão normativa
na maioria dos países. O site oficial da Canadian Standards
Apoio
Association (CSA), por exemplo, traz a mesma informação
que o organismo português, mas acrescenta: “este conteúdo
técnico (norma), só possui poder de lei quando é citada dentro
dos recursos legislativos”. No caso brasileiro, o caso pode ser
um pouco mais agravante, por conta do Código de Defesa do
Consumidor, como já abordado.
Os valores cobrados pelas normas também variam
conforme a nação. No Canadá, o documento técnico pode
ser encontrado desde a US$ 50 até US$ 195; no Japão, os
preços variam entre 945 e 15 mil ienes (US$ 9 a US$ 138).
Já nos Estados Unidos e na Austrália, muitas normas podem
ser baixadas gratuitamente da internet, inclusive a norma
australiana de instalações elétricas. O formato impresso é
cobrado. Na Austrália, é possível comprar normas por preços
que variam entre US$ 18 e US$ 111, enquanto, nos Estados
Unidos, os valores podem ir de US$ 30 a US$ 2.000.
Apenas para efeito comparativo, o NEC, código norteamericano para instalações elétricas de baixa e média tensão,
custa US$ 75, ao passo que, no Brasil, a NBR 5410 (apenas
para instalações elétricas de baixa tensão) é comercializada por
R$ 165, aproximadamente US$ 100. Outra diferença é que,
enquanto a primeira possui cerca de 700 páginas e envolve
baixa e média tensão, além de especificações para alarmes,
interfones e outros, a brasileira tem 210 páginas e trata apenas
de baixa tensão.
Esses dados comprovam que a discussão sobre a obrigato­
riedade das normas técnicas atravessa fronteiras e chega a
outros países, assim como os valores cobrados para adquirir
uma norma técnica são discutíveis e apresentam-se em
diferentes formatos pelo mundo afora.
Fotos: Inmetro
Por Flávia Lima
conformidade
Laser de hélio-neônio com câmara de iodo do
Laboratório Nacional de Metrologia. É utilizado para a
realização da unidade de comprimento, o metro (m).
Sob controle
Mecanismos de avaliação da conformidade tiveram impulso com a globalização e com
os avanços industriais e tecnológicos, que passaram a exigir padrões, além de mais
qualidade e segurança, dos produtos comercializados
26-27
Pesos e medidas, como os consolidados quilograma e metro, além de outras convenções
adotadas pelo mundo inteiro – com algumas exceções –, podem ser considerados como o
start up para o avanço e para a solidificação da metrologia, a ciência das medições. Com o
desenvolvimento da indústria, a necessidade de padronizações e de critérios de qualidade foi
ainda mais determinante para o seu progresso.
A partir da década de 1960, a difusão das técnicas de controle da qualidade nos Estados
Unidos e na Europa representou uma transformação nas atividades comerciais, especialmente
as transnacionais. Todos os setores econômicos – do varejo às compras governamentais –
passaram a exigir a obediência não apenas às normas, mas também aos procedimentos e
requisitos de qualidade.
Até então, a qualidade de determinados processos, serviços ou produtos era atestada
por consultores, quando havia algum método de avaliação. A partir de então, começou-se a
implantar efetivamente técnicas de qualidade e surgiram entidades nacionais e internacionais
de certificação, organizações capazes de averiguar as condições de qualidade e de segurança,
muitas vezes, em conformidade com padronizações internacionais.
José Luciano de Mattos Dias diz no livro de sua autoria,
Medida, normalização e qualidade industrial, que “em menos
de uma década, a utilização dos conceitos e técnicas da
qualidade transformou-se em elemento decisivo na competição
comercial internacional e na própria organização da atividade
industrial”. A difusão das técnicas de qualidade conferiu nova
relevância à exatidão das medidas, as quais passaram a ser
cruciais para a redução do desperdício nos processos produtivos
e necessárias para a padronização de insumos e equipamentos,
especialmente com a globalização, com a tecnologia e com a
crescente relação comercial entre países.
Desse modo, laboratórios, instituições de metrologia e
organismos de certificações foram nascendo para atender
com idoneidade à demanda da indústria e da sociedade de
modo geral, como veremos adiante.
O início
A história da metrologia advém da pesquisa científica, que
abandona os gabinetes privados para unir-se às universidades,
fato que acontece, principalmente, a partir das décadas de
1830 e 1840. Mattos Dias conta que, entre 1873 e 1913,
foram criados 23 laboratórios de física experimental na
Alemanha. Estes laboratórios começaram a oferecer insumos
cada vez mais decisivos para o fortalecimento da indústria
e para o surgimento de novos segmentos industriais,
principalmente com o desenvolvimento da energia elétrica.
Inúmeras convenções de pesos e medidas foram
estabelecidas ao longo da história. Um ponto final na
definição do sistema métrico foi a criação do Bureau
Internacional de Pesos e Medidas (BIPM), em 1877, que
conferiu 30 padrões do metro e do quilograma, repassados
aos países signatários da Convenção do Metro (incluindo o
Brasil), entre 1875 e 1889. Segundo o autor, a história da
metrologia pode ser escrita como a história do impacto da
ciência sobre o conceito de medida.
A afinidade entre a ciência e o mundo dos negócios ficou
evidenciada com o Congresso Internacional de Eletricidade
de 1893, em Chicago, e confirmada pela Conferência
Internacional de Londres, de 1908. Por ocasião desta
Apoio
conferência, foram definidas as unidades de corrente e de
resistência elétricas. “O significado industrial das novas
medidas já era então muito claro e sua utilização concreta
não passava mais simplesmente pela calibração de padrões
internacionais, mas também pela sua adequação e difusão”,
relata Dias.
Nos Estados Unidos, a história da metrologia foi
estimulada muito mais pelo desenvolvimento industrial que
pela ciência. As primeiras atividades de cunho metrológico
remontam ao Coastal Survey, que, a princípio, disseminou
padrões de pesagem ingleses. Anos depois, a necessidade
de oferecer produtos com mais qualidade para o mercado
internacional, a força da defesa do consumidor e a expansão
da indústria de eletricidade promoveram diversas discussões,
que culminaram na criação, em 1901, do Bureau of
Standards.
Mais tarde, as técnicas de qualidade romperam com o
modelo fordista de produção. Ao contrário deste, que não
exigia muita qualificação do operário, as novas técnicas de
qualidade requeriam maior envolvimento do trabalhador
com o processo produtivo e uso cada vez mais intenso da
tecnologia. Somam-se a isso o advento de computadores,
controles numéricos, robotização, técnicas de gerenciamento,
bancos de dados, desenvolvimento da infra-estrutura, enfim,
características que geraram, cada vez mais, processos de
aperfeiçoamento da produção. Tal propriedade também
contribuiu para o aperfeiçoamento dos procedimentos e dos
requisitos de qualidade.
Avaliação da conformidade no Brasil
Os primeiros sinais de preocupação com a padronização
técnica no Brasil foram dados pelo setor elétrico. Prova
disso é a constituição do Comitê Eletrotécnico Brasileiro
em 1908, criado para acompanhar os passos da evolução da
normalização técnica internacional, dados pela Comissão
Internacional de Eletrotécnica (International Eletrotechnical
Comission – IEC), instituída apenas dois anos antes. Embora
essa preocupação tenha sido contemporânea aos principais
acontecimentos mundiais nesse sentido, o estabelecimento
“A história da metrologia
pode ser escrita como a
história do impacto da ciência
sobre o conceito de medida”
28-29
registro das normas brasileiras, e como órgão executivo do
Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade
Industrial (Sinmetro).
Em 1978, o Conmetro credencia o primeiro laboratório
de ensaios: o Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA) para
certificação de conformidade à primeira norma compulsória,
a NBR 5929, relativa a motores a álcool. Para entender, o
Conmetro era o responsável pela classificação das normas,
as quais poderiam ser registradas/voluntárias, compulsórias,
referendadas ou probatórias.
A Secretaria de Tecnologia Industrial (STI), do Ministério
da Indústria e Comércio, passou a cooperar com as atividades
vinculadas às áreas de metrologia e qualidade industrial. A
partir de 1984, apesar da conjuntura econômica e política
não favorável, a ampliação das exportações e a busca pela
redução dos custos industriais e pela satisfação do consumidor
levaram a STI, segundo Mattos Dias, às seguintes ações:
• Ampliação do acervo de normas técnicas por meio do
fortalecimento da ABNT;
• Incorporação da rede de centros tecnológicos nacionais
e regionais, incluindo laboratórios especializados em ensaios
de verificação da qualidade de produtos;
• Estruturação de um sistema de certificação de qualidade
com os procedimentos adotados internacionalmente;
• Incorporação apenas de máquinas ou equipamentos que
utilizassem o Sistema Internacional de Unidades (SI).
O fato é que, com a definitiva implantação e
reconhecimento do Inmetro, em 1980, adotaram-se
medidas para acelerar a criação dos sistemas de normas e de
certificação de qualidade. No mesmo ano, cria-se a Rede
Nacional de Calibração (RNC), constituída por laboratórios
credenciados pelo Inmetro, segundo normas internacionais,
para a calibração de padrões de instrumentos de medição
não usados em transações comerciais ou incluídos no âmbito
da metrologia legal. Um ano depois, novas resoluções do
Conmetro publicam procedimentos para o credenciamento
de laboratórios de ensaios pelo Inmetro, no âmbito da
Rede Nacional de Laboratórios de Ensaios (RNLE), mais
tarde alterada para Rede Brasileira de Laboratórios de
Ensaios (RBLE). Sem contar ainda com um sistema efetivo
de certificação de qualidade, foi formado pelo Instituto
Brasileiro de Qualidade Nuclear (IBQN), em 1985, o
primeiro grupo de auditores da qualidade do Inmetro.
laboratórios acreditados
de critérios de qualidade e a avaliação da conformidade
evoluíram muito lentamente no País.
De acordo com Pedro Carlos da Silva Telles, em História
da engenharia no Brasil – século XX, a Estação Experimental
de Combustíveis e Minérios (EECM), criada em 1922, foi
a primeira instituição oficial no Brasil com a finalidade
específica de realizar pesquisas tecnológicas e ensaios de
materiais. Até então, havia algumas pesquisas e ensaios
realizados, como o “Manual de resistência dos materiais”,
de 1905, considerada a primeira publicação brasileira sobre
o assunto. Em 1934, foi fundado o Instituto de Pesquisas
Tecnológicas (IPT), sob a estrutura da Escola Politécnica
de São Paulo. Tais instituições nasceram para suprir a
necessidade de “estabelecimento de padrões técnicos, apoio à
indústria e aos órgãos técnicos e empresas governamentais”,
cita o autor.
Enquanto na Europa e nos Estados Unidos os programas
de qualidade já estavam bem difundidos, no Brasil, havia
pouco interesse, principalmente pela falta de capacitação e
de coordenação de atividades de normalização e certificação
de qualidade, os quais partiam de níveis bastante baixos.
Além disso, o Brasil não possuía um histórico de avaliação
da conformidade. Teria de partir do zero. Dessa forma,
seria necessário construir e capacitar laboratórios, adquirir
equipamentos e encontrar profissionais qualificados, além de
angariar recursos de empresas públicas e privadas.
José Luciano Mattos Dias diz que o sistema de metrologia
industrial deveria ser instalado por meio da articulação com
laboratórios no exterior e as atividades de normalização
deveriam adquirir novo ritmo com a reestruturação da ABNT.
Assim, o Conselho Nacional de Metrologia, Normalização
e Qualidade Industrial (Conmetro), instalado em 1974,
determinou que até que fosse criado o Instituto Nacional de
Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro),
o existente Instituto Nacional de Pesos e Medidas ficaria
credenciado como organismo nacional de certificação de
qualidade, responsável pela classificação, bem como pelo
A rede de acreditação do Inmetro
conta, em 2008, com 293 laboratórios de ensaios (RBLE) e 212
laboratórios de calibração (RBC).
O governo Collor trouxe algumas mudanças significativas
no âmbito da normalização/certificação. A principal delas
foi o lançamento do Programa Brasileiro da Qualidade e
Produtividade (PBQP), que responsabilizou o Inmetro pelas
atividades: divulgar a qualidade e a produtividade para o
grande público, consolidar os laboratórios metrológicos,
capacitar as redes brasileiras de calibração e laboratórios de
ensaios, implantar sistemas de qualidade, integrar as entidades
de defesa do consumidor e estimular a criação de entidades
certificadores, o desenvolvimento da normalização e a difusão
da informação tecnológica.
Essa medida foi promulgada a fim de incentivar o
envolvimento de empresas privadas e órgãos governamentais
com os processos normativos e certificadores. E funcionou.
Apoio
“A demanda do setor produtivo pelos serviços do Instituto
tornou-se finalmente uma realidade, uma vez que a adoção
das técnicas de gestão da qualidade não só se mostraram
fonte de ganhos de produtividade em mercados competitivos
internamente, mas a certificação de qualidade tornou-se o
passaporte de acesso aos mercados internacionais”, relata o
livro Medida, normalização e qualidade.
A continuidade dos trabalhos culminou na criação, em
1992, do Comitê Brasileiro de Certificação (CBC), com a
função de aprovar procedimentos, critérios e regulamentos
para o credenciamento de organismos de certificação. Com
estes procedimentos, o Instituto passava a credenciar e auditar
os organismos de certificação públicos e privados.
A certificação compulsória ficou restrita à saúde,
segurança e meio ambiente, devendo ser realizada por
organismo acreditado (credenciado), sob a coordenação do
Inmetro. Até meados de julho de 2008, havia 15 produtos
destinados especificamente para a área elétrica com programas
compulsórios de certificação (veja tabela). O chefe substituto
da Divisão de Programas de Avaliação da Conformidade da
Diretoria de Qualidade do Inmetro, Leonardo Machado
Rocha, esclarece que o Inmetro desenvolve as regras dos
regulamentos com base nos processos internacionais, como
os da ISO e os da IEC. Da mesma maneira, as políticas de
acreditação de laboratórios e organismos certificadores são
embasadas nos critérios internacionais.
A Resolução nº 01, publicada pelo Conmetro em maio
de 2008, lista 111 produtos e serviços que devem ter
programas compulsórios de Avaliação da Conformidade
desenvolvidos no próximo quadriênio (2008 – 2011).
Da lista publicada, os seguintes itens são relativos ao
setor elétrico: cabos elétricos isolados livres de halogênio
e com baixa emissão de fumaça e gases tóxicos, 750 V e
1 kV; central de alarme; detector de fumaça; detector de
temperatura contra incêndio; filtro de linha/protetor de
rede elétrica; cabos e cordões flexíveis, para tensões de 450
V a 750 V (IEC 60245-4); cordões flexíveis para tensões de
Geradores para a padronização primária de força, por
meio de massas suspensas sob ação da gravidade. À
esquerda, para a força de 10 kN e, à direita, para
100 kN. Laboratório Nacional de Metrologia.
Protótipo do quilograma padrão de 1889, marcado com a letra K, mantido em cofre no prédio do
Bureau Internacional de Pesos e Medidas (BIPM), em Sèvres, na França.
450 V a 750 V, com isolação e cobertura externa de PVC (IEC
60227-5); instalações elétricas de casas populares; lâmpadas
incandescentes; nobreak até 10 kVA; e reator para lâmpadas de
alta intensidade.
A certificação voluntária, até o ano de 2006, era possível no
âmbito do Inmetro, mas, com a publicação da Portaria 73/2006,
os produtos com conformidade avaliada voluntariamente por
organismos acreditados pelo Inmetro, e não decorrente de
Programas de Avaliação da Conformidade do Instituto, devem
conter unicamente a marca do organismo avaliador para demonstrar
que a conformidade foi atestada.
Tipos de avaliação da conformidade
- Inmetro
Define-se avaliação da conformidade como um processo
sistematizado, com regras predefinidas, devidamente acompanhado
e avaliado, de forma a propiciar adequado grau de confiança de
que um produto, processo ou serviço, ou ainda um profissional,
atende a requisitos preestabelecidos em normas ou regulamentos.
Apresenta-se nos seguintes mecanismos:
30-31
• Certificação
Realizada por uma organização independente acreditada, a
certificação consiste em avaliar o atendimento de determinado
produto ou processo à norma ou ao regulamento técnico específico.
Essa análise pode ser executada por meio de ensaios, inspeções,
coletas de amostras no fornecedor e/ou no comércio e auditorias.
Trata-se de um modelo de avaliação de conformidade de
terceira parte.
• Declaração de fornecedor
Processo pelo qual um fornecedor, sob condições
preestabelecidas, dá garantia escrita de que um produto,
processo ou serviço está em conformidade com requisitos
especificados. Trata-se de um modelo de avaliação de
conformidade de 1ª parte.
• Inspeção
Observação e julgamento acompanhados, conforme apropriado,
por medições, ensaios ou uso de calibres. As inspeções visam à
determinação da conformidade aos regulamentos, normas ou
especificações. É importante esclarecer que os resultados das
inspeções podem apoiar a Certificação e a Etiquetagem, e o
Ensaio pode integrar as atividades de Inspeção.
• Etiquetagem
Trata-se de etiqueta informativa que indica seu
desempenho de acordo com os critérios estabelecidos.
Esta etiqueta pode ser comparativa entre produtos de um
mesmo tipo ou somente indicar que o produto atende a
um determinado desempenho especificado, podendo ser,
ainda, de caráter compulsório ou voluntário.
• Ensaios
Operação técnica que consiste na determinação de uma
ou mais características de um dado produto, processo ou
serviço, de acordo com um procedimento especificado. É o
mecanismo mais utilizado, podendo atuar com a inspeção.
- Internacionais
A conformidade de um produto a uma norma ou regulamento
pode ser verificada de forma voluntária por outros organismos ligados
ou não ao Inmetro, conforme desejo ou necessidade do fabricante.
A americana UL, por exemplo, começou suas operações no
Brasil em julho de 1999, com o objetivo de auxiliar a indústria
local a exportar os seus produtos. O gerente de marketing e
vendas da UL do Brasil, Péricles Arilho, conta que foi feita
uma pesquisa de mercado para identificar as áreas de maior
demanda e que o primeiro segmento a ser trabalhado foi o de
equipamentos para atmosferas explosivas.
Além de certificar produtos destinados principalmente à
exportação, de acordo com as normas UL e com os requisitos
normativos norte-americanos (NEC), a UL foi acreditada pelo
Inmetro, em 2002, e passou também a avaliar a conformidade
de produtos com as normas da ABNT. Ademais, as empresas
que objetivam comercializar seus produtos em mercados
estrangeiros devem atender a diferentes requisitos.
Na América Latina, nem todos os países exigem
certificações de produtos elétricos. Dentre os que
exigem, estão, além do Brasil, a Argentina, e o México,
observando as variações locais: marca Inmetro no Brasil;
S na Argentina; NOM no México. Sobre isso, Arilho
afirma que as normas brasileiras são bem respeitadas aqui
Apoio
e no exterior, mas ainda há muito que fazer: “o Brasil
evoluiu bastante, entretanto, o mercado cresceu mais do
que a fiscalização pode dar conta”. Segundo ele, o sistema
poderia ser mais rápido e um pouco mais descentralizado.
“Há muitos produtos que poderiam ter avaliação da
conformidade compulsória, mas ainda não são, tais como
equipamentos eletrônicos, de iluminação e de Tecnologia
da Informação (TI)”, analisa.
Na União Européia, os produtos elétricos devem estar
harmonizados com as normas européias da Cenelec. Já na
América do Norte, para serem mais facilmente aceitos, os
produtos precisam atender às especificações das normas Ansi,
UL, Nema, IEEE, NFPA, entre outras, nos Estados Unidos,
ou CSA, no Canadá. Além disso, existem algumas normas
harmonizadas pela Canena para o comércio de produtos
elétricos no âmbito do Nafta (área de livre comércio entre
México, Estados Unidos e Canadá). Em diversos países, como
Japão e Austrália, os produtos devem estar em conformidade
com as normas da IEC.
Embora não haja certificação compulsória de produtos
nos Estados Unidos, o NEC – norma de instalação elétrica
mais aceita no País – diz que “todos os produtos utilizados
nas instalações devem ser aprovados pelas autoridades
competentes”. Essa responsabilidade está a cargo das
prefeituras ou do Corpo de Bombeiros, que elaboram a sua
relação de produtos (com especificações técnicas e fabricantes)
ou incorporam listas de entidades normativas reconhecidas,
como a da própria UL.
Produtos destinados à área elétrica com certificação compulsória
Equipamento para a realização do
metro, utilizando um laser estabilizado,
em laboratório do BIPM.
Cronologia
Algumas datas importantes na história da metrologia
32-33
1830 - Início da história da metrologia brasileira. Projeto de
adoção do sistema métrico decimal.
1875 - Dezessete países, incluindo o Brasil, assinam, em Paris, a
Convenção do Metro.
1877 - Criado o Bureau Internacional de Pesos e Medidas.
1930 - Regulamentação para calibração de pesos e medidas sem
alterações nas tabelas de taxas.
1933 - Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC)
incorpora o Instituto Nacional de Tecnologia (INT).
1938 - INT assume a gestão de um sistema de metrologia legal
no âmbito nacional.
1940 - Criação da Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT).
1954 - Foram escolhidas seis unidades fundamentais: metro
(extensão, definição desde 1889); quilograma (padrão de massa,
desde 1889); segundo (tempo); ampère (corrente elétrica, desde
1948). Apenas a unidade de tempo não tinha definição aprovada
pelo CGPM.
1956 - Criação da Organização Internacional de Metrologia
Legal/OIML.
1960 - Institucionalização do Sistema Internacional de Unidades – SI.
1961 - Reestruturação do Ministério da Indústria e Comércio,
determinada pela Lei nº 4.048/61, criando o Instituto Nacional
de Pesos e Medidas (INPM), transferindo as atividades de cunho
metrológico do INT para este novo órgão.
1971 - Instalação do prédio inaugural do Centro Nacional de
Metrologia e transferência do INPM para Xerém – Duque de
Caxias – RJ.
1973 - Nasce o Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e
Qualidade Industrial (Sinmetro).
1973 - Criação do Inmetro, autarquia federal vinculada ao
MIC, com personalidade jurídica e patrimônio próprios.
1974 - Instalação do Conselho Nacional de Metrologia,
Normalização e Qualidade Industrial (Conmetro).
1978 - Conmetro define os critérios para a certificação de
conformidade às normas brasileiras e cria o Comitê Nacional de
Metrificação.
1978 - Aprovada a primeira norma brasileira na vigência da
nossa legislação, a norma compulsória NBR 5929 relativa a
motores a álcool.
1980 - Definitiva implantação do Inmetro com a transferência
das atribuições do INPM.
1980 - Criação da Rede Nacional de Calibração (RNC), mais
tarde chamada de Rede Brasileira de Calibração (RBC).
1981 - Resoluções do Conmetro detalhando os procedimentos
para o credenciamento de laboratórios de ensaios pelo Inmetro, no
âmbito da Rede Nacional de Laboratórios de Ensaios (RNLE).
1990 - Lançamento do Programa Brasileiro da Qualidade e
Produtividade (PBQP).
1992 - Criação do Comitê Brasileiro de Certificação, com a
função de aprovar procedimentos, critérios e regulamentos para o
credenciamento de organismos de certificação.
1995 - Criação do International Accreditation Forum (IAF).
1996 - Criação do Interamerican Accreditaion Cooperation
(Iaac), organização que elegeu o Brasil (Inmetro) como seu
primeiro representante.
2000 - Assinatura do Acordo de Reconhecimento Mútuo para
Credenciamento de Laboratórios entre o Inmetro e o International
Accreditattion Cooperation (Ilac).
Produtos
Órgão regulamentador
Documento legal
Data
Disjuntores
Inmetro
nº 35 de 14/02/2005
17/02/2005
Equipamentos elétricos para atmosferas
potencialmente explosivas, nas
condições de gases e vapores inflamáveis
Inmetro
Portaria do Inmetro
nº 083 de 03/04/2006
06/04/2006
Inmetro
Portaria Inmetro
nº 262 de 12/07/2007
18/07/2007
NBR 14373:2006
Inmetro
Portaria do Inmetro
nº 086 de 26/05/2003
27/05/2003
NBR 7288
Inmetro
Portaria do Inmetro
nº 085 de 26/05/2003
27/05/2003
NBR 13249
Portarias Inmetro nº
087 de 20/05/2003,
184 de 04/12/2003 e
175 de 19/10/2004
Portaria Inmetro
nº 101 de 16/07/2001 e
Resolução Conmetro
nº 15 de 12/10/1988
Portaria Inmetro
nº 234 de 30/06/2008
Resolução Conmetro
nº 08 de 26/07/1988,
Portarias do Inmetro nº 136 de
04/10/2001 e nº 134 de 15/07/2002
Portaria Inmetro
nº 188 de 09/11/2004
27/05/2003,
08/12/2003 e
21/10/2004
NBR NM
247-3
19/07/2001 e
21/10/1988
NBR 5113, NBR 5157,
NBR 6523, NBR 6280,
NBR 6254 e NBR 6996
Inmetro
Portaria Inmetro
nº 20 de 29/01/2002
05/02/2002
NBR 5114/1998
NBR 5172/1998
Inmetro
Portaria Inmetro n° 281 de
19/07/2007
23/07/2007
NBR 14898:2002
Inmetro
Portaria Inmetro n° 282 de
19/07/2007
23/08/2007
NBR 14897:2002
23/08/2007
NBR 14633:2000
23/08/2007
NBR 14.936:2006
Estabilizadores de tensão monofásicos,
com saída de tensão alternada, com
tensão nominal de até 250 V em
potências de até 3 kVA/3 KW
Fios e cabos elétricos - cabo de potência
com isolação sólida extrudada, de PVC,
para tensões de 0,6/1,0 kV
Fios e cabos elétricos - cabos e cordões
flexíveis para tensão até 750 V, com
isolação/cobertura extrudada de cloreto
de polivinila (PVC)
Fios e cabos elétricos - condutores
isolados com policloreto de vinila
(PVC), para tensões de 450/750 V, sem
cobertura, para instalações fixas
Fusíveis tipo rolha e tipo cartucho
Interruptores para instalação elétrica fixa
doméstica, análoga, para tensões de até 440 V
Plugues e tomadas para
uso doméstico e análogo
Inmetro
Inmetro
Inmetro
Inmetro
Reatores eletrônicos alimentados em
corrente alternada para lâmpadas
fluorescentes
Reatores para lâmpadas fluorescentes
tubulares
Cabos flexíveis isolados com borracha
etilenopropileno (EPR), para aplicações
especiais em cordões conectores de
aparelhos eletrodomésticos,
em tensões até 500 V
Cabos e cordões
flexíveis isolados com policloreto de vinila
(PVC) para aplicações especiais em cordões
conectores de aparelhos eletrodomésticos, em
tensões até 500 V
Cordões flexíveis com isolação extrudada de
polietileno de clorossulfonato (CSP) para
tensões até 300 V
Adaptadores de plugues e tomadas
Inmetro
Inmetro
Inmetro
Portaria Inmetro n° 286 de
19/07/2007
Portaria do Inmetro
nº 324 de 21/08/2007
03/07/2008
A BNT NBR NM
60.669-1:2004
11/08/1988,
18/10/2001 e
17/07/2002
NBR 6147 e
IEC 60884-1
11/11/2004
NBR 14417/1999
NBR 14418/1999
Pesquisa:
Medida, normalização e qualidade, de José Luciano de Mattos Dias / História da engenharia no Brasil – século XX, de Pedro Carlos da Silva Telles
Confederação Nacional da Indústria (CNI) / Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro)
Apoio
Documento normativo
NBR 5361,
NBR IEC 60947-2
NBR IEC 60898 ou
NBR NM IEC 60898
NBR 9518,
NBR 5363,
NBR 8447 e
NBR 9883
Por Flávia Lima
Fotos: Centro Paula Souza
formação
Fachada do edifício que abrigava o Instituto Profissional Feminino, atual ETE Carlos de Campos.
Alunos da Escola Profissional Masculina aguardando o sinal de
início das aulas no pátio da escola. Foto da década de 1910.
Educação profissional
Indústria é a grande fomentadora do desenvolvimento dos ensinos técnico e tecnológico
34-35
Cerca de 200 jovens, com idade entre 8 e 12 anos, aprendiam diversos ofícios, ao mesmo
tempo em que recebiam técnicas de desenho e lições de escrita. Órfãos, indigentes ou filhos
de pais reconhecidamente pobres, aos 21 anos, obtinham o certificado de mestre em uma
especialidade e eram contratados como operários efetivos, passando a ser remunerados. O ano
era 1884 e os aprendizes eram escalados para trabalhar no Arsenal de Guerra do Rio de Janeiro.
Podemos dizer que este foi o início do ensino profissionalizante no Brasil. Mas, de lá para cá,
muita coisa mudou: escolas técnicas e de tecnologia foram instituídas e os cursos oferecidos
ganharam reconhecimento como legítimos formadores de profissionais, especialmente, para a
indústria. Vejamos alguns passos dessa evolução.
Uma data importante para a educação profissional foi 1909, ano em que foi publicado
o Decreto nº 7.566, assinado pelo então presidente Nilo Peçanha, que criou as Escolas de
Aprendizes e Artífices que tinham como objetivo a formação de mão-de-obra especializada
para atender ao crescente desenvolvimento industrial brasileiro. Essas escolas começaram a
se espalhar por todo o País, mas ainda eram direcionadas aos “filhos dos desfavorecidos da
fortuna”, conforme denominava a lei.
As escolas existentes no fim do Império e início do século
XX eram raras, mantidas e dirigidas por ordens religiosas ou por
alguns grupos de imigrantes e dedicava-se, majoritariamente,
à educação de crianças das classes mais privilegiadas. Quanto
ao ensino profissional, as primeiras escolas oficiais do Estado
foram criadas em 1910, como parte do projeto de constituição
de um mercado interno de mão-de-obra qualificada. O objetivo
dessas escolas era atingir uma parcela da população específica,
os filhos de trabalhadores que iriam “seguir a profissão de
seus pais” e constituíam “uma fonte de inesgotável atividade
e energia, alimentando as forças vivas de nosso Estado”,
conforme consta do relatório apresentado ao presidente do
Estado em 1912.
Em 1911, começam a funcionar em São Paulo, a Escola
Profissional Masculina (atual ETE Getúlio Vargas) e a Escola
Profissional Feminina (ETE Carlos de Campos), destinadas
ao ensino das artes industriais para os meninos e economia
doméstica e prendas manuais para as meninas. Ao final da
década de 1920, o ensino profissional funcionava regularmente
em diversas regiões do País.
A partir da década de 1940, as principais transformações
ocorreram no ensino secundário e o ensino profissional
preocupou-se em formar trabalhadores. Dessa maneira, foi
dada maior autonomia para as escolas e para os Estados, na
tentativa de romper a tradição de que o ensino “técnico” era
destinado às classes subalternas e o “acadêmico” para a elite e
para as classes dirigentes.
Antes, porém, uma escola americana lançava as bases do
ensino técnico propriamente dito no Brasil. O Mackenzie
College, que foi fundado com o intuito de expandir o
protestantismo, dava início, em 1896, à Escola de Engenharia
Mackenzie. Em 1932, o Mackenzie lançava um curso técnico
Apoio
de eletricidade e, dois anos depois, outro curso técnico, de
química. Celso Suckow da Fonseca explica, em seu livro
História do ensino industrial no Brasil, que os cursos técnicos
visavam atender aos que não podiam fazer estudos mais
extensos, de seis ou sete anos, depois de completadas as cinco
séries ginasiais, até por falta de preparação exigida por Lei
para se matricular nos cursos superiores oficiais.
O fato é que a Escola Técnica Mackenzie antecipava-se às
escolas que surgiriam em 1942 com a Lei Orgânica do Ensino
Industrial. “Na data em que foi fundada, ainda não existiam
escolas técnicas com a finalidade de preparo de pessoal
que ficasse em nível de cultura intermediário entre o dos
engenheiros e o dos operários”, afirma Fonseca. Segundo ele,
o Mackenzie pode ser considerado um precursor do ensino
técnico no País.
Com o Decreto-Lei n. 4.048/1942, assinado pelo então
Presidente da República, Getúlio Vargas, a educação destinada
à qualificação profissional de trabalhadores industriais
passaram a ser geridas pelo Serviço Nacional de Aprendizagem
Industrial (Senai). “Era um momento histórico marcante,
em que a indústria brasileira enfrentava as circunstâncias da
Segunda Guerra Mundial, que agravava a questão da demanda
de mão-de-obra qualificada”, explica o professor e gerente
de Tecnologia Industrial do Senai São Paulo, Osvaldo Lahoz
Maia.
O ensino técnico
A definição do termo técnico aplica-se a “toda pessoa
que trabalha em uma profissão que exige conhecimentos
científicos e técnicos intermediários entre as do trabalhador
qualificado e as do engenheiro ou dos quadros superiores. O
técnico pode desempenhar tarefas de inspeção e manutenção,
Bandeirantes técnicos, na cidade de Franca (SP), em 1935.
36-37
de aparelhamento de processos de execução, de controle da
produção. A colaboração com o engenheiro constitui parte
essencial de seu trabalho”. Esta é a designação adotada pela
Conferência Geral da Unesco, realizada em 1962. Os níveis
profissionais podem ser assim definidos: nível técnico, nível
técnico superior e nível superior (engenheiro).
O ensino técnico foi conquistando espaço na medida em que
as necessidades das indústrias cresciam e não havia profissionais
o suficiente para suprir essa demanda. Particularmente, nos
países em desenvolvimento, o número dos que se formam não
era suficiente para corresponder à procura. Todos os países
passaram por isso, inclusive o Brasil. “Esta penúria de técnicos
manifestou-se com agudeza nos Estados Unidos, mas o mesmo
aconteceu na Europa Ocidental”, afirma o autor do livro O
ensino técnico e profissional, Hugh Warren.
Ele explica ainda que certos países, levados pelo
entusiasmo de ter criado uma universidade, quase sempre
custosa, mas formando apenas poucos especialistas, tendiam
a negligenciarem a formação de nível técnico e de técnico
superior. Mas, segundo ele, a formação no nível intermediário
é menos cara e corresponde às necessidades da indústria
tão bem ou ainda melhor que a formação de engenheiros
diplomados. Tanto que hoje o ensino técnico é um dos que
mais se desenvolve.
Maia concorda: “no passado havia realmente um certo
preconceito injustificado quanto à formação técnica em
detrimento do diploma de graduação, mas, hoje, a procura
Alunos e professores na aula de mecânica. Década de 1930.
por técnicos e outros profissionais qualificados é bastante
intensa”, avalia.
Para se ter idéia, em 1947, havia em São Paulo 26.430
indústrias, com 579.228 funcionários, o que significava um
vasto campo de trabalho. Os segmentos de fiação e tecelagem
(27%), mecânica e material elétrico (15,3%), construção e
mobiliário (15,2%) e alimentação (10,8%) representavam
juntos 68,3% do total de empregados na indústria.
Dessa forma, para atender às necessidades de pessoal
especializado para as fábricas de tecidos, o Senai inaugurou,
em 1945, a primeira Escola Têxtil de São Paulo, ensinando
o ofício de fiandeiro e tecelão de algodão, de lã e de seda.
Mais tarde, em Jundiaí, no lugar da Escola Municipal e do
Núcleo de Ensino Ferroviário, passa a funcionar a Escola
Industrial Dr. Antenor Soares Gandra, oferecendo os cursos
industriais de mecânica de máquinas, aparelhos elétricos e
telecomunicações, fundição, cerâmica, tecelagem, motores a
explosão, alvenaria e construções, além de corte e costura.
Na década de 1990, o Senai contou com apoio técnico
e financeiro de instituições de diversos países, como
Alemanha, Canadá, Japão e Estados Unidos. A média
de 15 mil alunos anuais, nos primeiros anos da entidade,
passou para 2 milhões. As primeiras escolas deram origem
a uma rede de 696 unidades operacionais, distribuídas por
todo o País, onde são oferecidos cerca de 2.200 cursos de
formação profissional, além de programas de qualificação e
aperfeiçoamento específicos.
Ensino superior de tecnologia
A expansão automobilística, vivida principalmente nos
anos de 1970, foi outra grande fomentadora do ensino técnico.
“Naquele momento, vivíamos o milagre econômico e a idéia
do governo era oferecer um profissional que não precisasse
cursar uma faculdade por cinco anos para atender à demanda
da indústria, que era urgente”, explica o tecnólogo Décio
Moreira.
Assim, os cursos de tecnologia surgem no Brasil em 1969,
com um Decreto-lei assinado pelo então governador de São
Paulo, Abreu Sodré, que criava uma entidade autárquica
destinada a desenvolver a educação tecnológica nos graus de
ensino médio e superior. Assim, o Centro Paula Souza iniciava
suas atividades em 6 de outubro daquele ano, ainda chamado
de Centro Estadual de Educação Tecnológica de São Paulo.
A princípio, os cursos eram basicamente voltados para os
ensinos mecânico e civil voltados para o setor produtivo. Só
depois de alguns anos, esses cursos passaram a ser chamados
de “ensino superior de tecnologia”. A Faculdade de Tecnologia
de Sorocaba foi a primeira das “Fatecs”, criada em 20 de maio
de 1970. Seu primeiro dia letivo contou com 66 alunos,
que começavam seus estudos no curso técnico superior de
Oficinas, atual Processos de Produção. No ano seguinte,
a Fatec de Sorocaba passou a ser subordinada ao Centro
Estadual de Educação Tecnológica de São Paulo, atualmente
Centro Estadual de Educação Tecnológica “Paula Souza”.
Apoio
Em 1978, o Centro Federal de Educação Tecnológica
Celso Suckow da Fonseca (Cefet) foi criado, no Rio de Janeiro,
como autarquia de regime especial, vinculado ao Ministério
da Educação e Cultura. O Cefet integrou a rede de ensino
tecnológico, passando a ofertar cursos de graduação e pósgraduação, atividades de extensão e realização de pesquisas na
área tecnológica.
Professor da Fatec São Paulo há 30 anos, Décio Moreira
conta que, mesmo com o surgimento de diversas instituições
de ensino tecnológico, esses cursos eram enxergados com
certo preconceito. “As empresas não entendiam um curso de
tecnologia como graduação, mesmo as universidades públicas
demoraram a aceitar os tecnólogos em seus cursos de pósgraduação stricto sensus”, conta.
A partir de 1996, entretanto, com a nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional, a situação mudou. A nova lei
passou a contemplar os cursos de tecnologia como educação
superior e, assim como a procura aumentou, a oferta também.
Os cursos oferecidos pelas escolas de tecnologia, de acordo
com o Ministério da Educação (MEC), devem ter de 1.600
horas a 2.400 horas, dependendo da formação. Essa carga
horária equivale a dois ou três anos de graduação.
Para se ter idéia, o Centro Paula Souza, atualmente,
a maior rede estadual de ensino profissional do País, é
responsável pela formação de cerca de 140 mil estudantes
nas 141 Escolas Técnicas (Etecs) e nas 39 Faculdades de
Tecnologia (Fatecs).
Senai-SP/Acervo Projeto Memória
Oficina de carpintaria da Escola Senai “Félix Guisard”, de Taubaté (SP), ano de 1943.
Aula de desenho, em 1940. As carteiras, de madeira, possuíam forma de pranchetas.
Integração com a indústria
A mulher e a eletricidade na favela
“Uma senhora que mora em uma favela vizinha à escola foi nos
procurar para fazer o curso de eletricidade. Ela ganha a vida
lavando e passando roupa para os outros. Num belo dia, inventou
de comprar um super ferro industrial, para facilitar a vida no
trabalho. E não é que o ferro da mulher pôs fogo no barraco?
Parece que ele tinha 2.600 W e, em toda tomada que ela colocava,
a tomada derretia. Ela então nos procurou para saber: “por que
será que, logo agora que o ferro novo ia resolver o meu problema,
o danado está pondo fogo no barraco?”. Eu sei que, conversa vai,
conversa vem, ela decidiu fazer o curso conosco. E fez: subiu
escada, instalou lâmpada fluorescente, não teve problema que
não enfrentasse. Na hora de subir na escada, prendia a saia entre
as pernas e ia em frente; do jeito que os outros faziam ela fazia
também. Depois que terminou o curso, não conseguiu emprego
nenhum em firma. Ficou dentro da favela mesmo. Agora, ela
passou a ser uma referência lá dentro: tem resolvido os problemas
de eletricidade das vizinhas e de outros moradores. Possivelmente,
essa mulher já evitou alguns desastres dentro daquela favela! Para
mim, foi muito gratificante ter aquela senhora na sala de aula.”
Depoimento de um professor de eletricidade de uma escola técnica de São
38-39
Paulo (in A eletricidade em educação, 2001).
As escolas de ensino técnico e superior de tecnologia
nasceram, fundamentalmente, estimuladas por uma
necessidade da indústria. Dessa forma, durante quase toda a
história do ensino profissional, as instituições mantinham – e
continuam mantendo – parcerias com empresas, que recorrem
às escolas em busca de corpo técnico e de pesquisas.
A Fatec São Paulo, por exemplo, conta com uma fundação
de apoio, que incorpora professores e alunos da faculdade,
desenvolvendo pesquisas e prestando serviços técnicos e
tecnológicos. “Por meio desses trabalhos, os alunos aprendem
mais e podem ser contratados pelas empresas para as quais
executaram algum serviço”, afirma Moreira.
O professor Maia, do Senai, explica que os técnicos têm
sua própria identidade profissional, bem como seu espaço de
atuação, não havendo a necessidade de superposição com as
atividades de engenheiros ou outros graduados. “Muitos jovens
estão preferindo investir na carreira de técnico especializado,
em detrimento de uma formação acadêmica generalista, que
nem sempre oferece uma colocação no mercado de trabalho”,
conta.
Quanto à posição no mercado, os técnicos ocupam
normalmente a posição de chefia média nas empresas. “Eles
têm autonomia para responder por projetos até onde as suas
atribuições legais permitem. Normalmente, além de trabalhos
técnicos, eles também podem chefiar equipes e desenvolver
Apoio
projetos de novos produtos ou ainda atuar fortemente em
departamentos de manutenção”, explica Maia. No entanto,
uma preocupação ainda não foi superada pelos tecnólogos.
Algumas restrições do sistema Crea/Confea impedem que
tecnólogos sejam responsáveis por projetos técnicos ou
pela direção de obras ou processos nas áreas de arquitetura,
engenharia e agronomia.
De qualquer forma, o curso técnico não substitui o curso
de graduação, mas o professor Osvaldo Maia esclarece que
há uma grande necessidade de técnicos de nível médio na
indústria e sempre haverá necessidade de profissionais desse
nível, desempenhando atividades especializadas.
Estatísticas do Senai revelam que 80% dos alunos
formados estão empregados em até dois anos após a conclusão
do curso. Um indicador da competência da instituição é a
empregabilidade. Uma pesquisa realizada pelo Sistema
de Avaliação Institucional (SAI), do Centro Paula Souza,
concluiu que, em 2007, os tecnólogos atingiram um índice de
empregabilidade de 92% e os técnicos, de 77%.
Pesquisa:
O ensino técnico e profissional: um estudo comparativo da situação atual e tendências em 10
países, FGV – Hugh Warren
História do ensino industrial no Brasil, volumes 1 e 2, 1961/1962 - Celso Suckow da Fonseca
Egressos do ensino técnico industrial no Brasil: um estudo de caso, 1990 – Maria Laura P. Barbosa
Franco e Annete Serber
A eletricidade em educação – Memória de oficinas, 2001
Contribuição para a racionalização do ensino industrial, tese, 1961 – Moysés Brejon
Escolas profissionais públicas do Estado de São Paulo – uma história em imagens, Centro Paula
Souza, 2002 – Organização de Carmen Sylvia Vidigal Moraes e Júlia Falivene Alves
descontração
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diagrama as palavras da relação abaixo,
respeitando os cruzamentos. Divirta-se!
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Condutor
Curto
Dicróica
Disjuntor
Eletrodo
Elétron
Epi
Esco
Fusível
Haste
Hertz
Hidrelétrica
Iec
Joule
Motriz
Neutro
Nobreak
Ohm
Potencia instalada
Potência
Resistência
Resistor
Surto
Tensão
Timer
Trifásico
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