bdtd - Universidade Federal Fluminense

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
GERSON ROMERO DE OLIVEIRA FILHO
ANÁLISE DOS IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS DA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
INDUSTRIAL DE CATAGUASES
NITERÓI
2006
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
GERSON ROMERO DE OLIVEIRA FILHO
ANÁLISE DOS IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS DA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
INDUSTRIAL DE CATAGUASES
Dissertação apresentada ao Curso de Pósgraduação em Geografia da Universidade
Federal Fluminense, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Geografia.
Área de concentração: Ordenamento Territorial
e Ambiental.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Franco da Silva
NITERÓI
2006
O48
Oliveira Filho, Gerson Romero de
Análise dos impactos sócio-ambientais da organização do
espaço industrial de Cataguases / Gerson Romero de Oliveira
Filho. – Niterói : [s.n.], 2006.
166 f.
Dissertação (Mestrado em Geografia) – Universidade
Federal Fluminense, 2006
.
1.Organização espacial. 2.Ordenamento territorial.
3.Indústria – Localização – Cataguases (MG). I.Título.
CDD 304.23098151
ii
GERSON ROMERO DE OLIVEIRA FILHO
ANÁLISE DOS IMPACTOS SÓCIO-AMBIENTAIS DA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
INDUSTRIAL DE CATAGUASES
Dissertação
apresentada
ao
programa
de
Pós-
Graduação em Geografia da Universidade Federal
Fluminense, como requisito para obtenção do título de
Mestre
em
Geografia.
Área
de
Ordenamento Territorial e Ambiental.
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Alberto Franco da Silva – Orientador
Universidade Federal Fluminense
_________________________________________________
Prof. Dr. Ruy Moreira
Universidade Federal Fluminense
_________________________________________________
Prof. Dr. Miguel Ângelo Ribeiro
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
NITERÓI
2006
concentração:
iii
Dedico esse trabalho à Ana Lúcia e Laura,
amores eternos, pela presença, confiança e
por acreditar que tudo vale a pena. Vocês são
o meu maior estímulo.
iv
AGRADECIMENTOS
A Deus pela presença constante em minha vida.
A meus pais, Gerson e Nair, que, mesmo de longe, ajudaram-me com as orações e as
palavras de carinho e confiança. A vocês, minha gratidão eterna.
À Ângela e Villas pela disponibilidade e auxílio nas pesquisas de campo em
Cataguases.Valeu pela força!
A meu irmão Gilson, que, mesmo distante, sempre torceu e acreditou.
À dona Léa pelo apoio constante e pelos conselhos sempre muito importantes.
A Pedro, sobrinho querido, um agradecimento pela ajuda na “informática” a tempo e a hora;
A todos da família Oliveira e Conceição pela paciência e estímulo;
A Leonardo Cintra, parceiro de trabalho, por toda a presença e pelo material produzido no
laboratório de Geoprocessamento;
Aos companheiros do corpo docente do curso de Geografia do CES-JF pelas palavras em
momentos bem especiais.
Aos empresários das indústrias de Cataguases que possibilitaram o meu acesso às
informações em acolhidas bem receptivas;
À Marina Beraldo pelo cuidado estético na produção dos mapas;
Aos amigos muito especiais, Cérix, Luísa, Áurea, Darci, Welson, Ana Beraldo que, mesmo
indiretamente, são fonte sempre de incentivo.
À Juliana, Jaqueline e Romildo pelas informações precisas sobre a Legislação Ambiental.
Ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da UFF, em especial aos
que estiveram ao meu lado, orientando-me a cada desafio. Aos mestres: Carlos Alberto
Franco da Silva, Ruy Moreira e Jacob Binzstock, a minha gratidão.
v
A PALAVRA MINAS
Carlos Drummond de Andrade
Minas não é palavra montanhosa.
É palavra abissal. Minas é dentro
e fundo.
As montanhas escondem o que é Minas.
No alto mais celeste, subterrânea,
é galeria vertical varando o ferro
para chegar ninguém sabe onde.
Ninguém sabe Minas. A pedra
o buriti
a carranca
o nevoeiro
o raio
selam a verdade primeira, sepultada
em eras geológicas de sonho.
Só mineiros sabem. E não dizem
nem a si mesmos o irrevelável segredo
chamado Minas.
vi
RESUMO
O município de Cataguases se destacou na economia da Zona da Mata Mineira pelo seu
pioneirismo industrial, cuja lógica de organização espacial apresenta dois padrões
industriais: o disperso e o concentrado. Esses dois arranjos espaciais revelam diferentes
impactos sócio-ambientais. No plano das ações, a ineficácia da fiscalização ambiental é
uma situação comum aos dois padrões. A falta de planejamento da prática industrial é outro
destaque tanto no padrão disperso quanto no Distrito Industrial. No tocante ao arranjo dos
objetos e dos impactos subseqüentes à prática industrial, verifica-se a importância da
indústria na extensão do tecido urbano e no desenvolvimento de atividades econômicas
correlatas à industrialização e urbanização. A singularidade de cada padrão se revela no
grau de poluição das empresas, visto que o padrão disperso é o de maior potencial poluidor.
Por fim, aspectos da organização espacial das empresas mostram diferenciações
significativas no que se refere à logística de transporte, tamanho das empresas, sítio e
posição. A fim de revelar tais aspectos a análise situa o desenvolvimento industrial de
Cataguases em escalas geográficas diversas, bem como afirma o papel da geografia física
e do espaço previamente construído como condicionantes à atividade industrial e dos
problemas ambientais que se apresentam no município.
Palavras – chave: Indústria – Localização – Cataguases(MG) – Impacto ambiental – Espaço
industrial – Política ambiental.
vii
ABSTRACT
The city of Cataguases has excelled in the economy of Zona da Mata for being a pioneer in
industry, whose logic of spatial organization displays two industrial patterns: the widespread
and the concentrated. These two spatial arrangements unfold different socio-environmental
impacts and, in what concerns taking actions, the two patterns are affected by the
ineffectiveness of environmental surveillance. Also, the lack of planning is enhanced in both
patterns, the widespread and the Distrito Industrial. As for the arrangement of objects and
impacts resulting from industrial practice, it is observed the relevance of industry throughout
the urban tissue, and in developing correlative economic activities to industrialization and
urbanization. The singularity of each pattern reveals itself in the degree of pollution of the
companies, in a much as the widespread pattern bears greater pollution potential. Lastly,
spatial organization aspects of the companies portray significant differentiations regarding
logistic of transport, size of the companies, site and position. In order to unveil such aspects,
the analysis places the industrial development of Cataguases in different scales, as well as it
asserts about the role of physical geography and the previously built space as conditioning
factors to industrial activity and the environmental problems observed in the city.
Keywords: Industry – Location – Environmental impact – Industrial space – Environmental
policy.
viii
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Crescimento da população brasileira e a taxa de urbanização ................... 29
Quadro 02 – Maiores aglomerações urbanas do mundo – ONU...................................... 30
Quadro 03 – Quadro Industrial de Cataguases ................................................................ 47
Quadro 04 – Quadro Industrial de Cataguases (1952) .................................................... 48
Quadro 05 – Cataguases: população residente ............................................................... 50
Quadro 06 – Cataguases: população ocupada por setores econômicos (2000................ 51
Quadro 07 – Indústrias de Cataguases (2001) ................................................................ 61
Quadro 08 – Principais Indústrias do Padrão Disperso (2006) ........................................ 61
Quadro 09 – Indústrias Têxteis de Cataguases (2006) .................................................... 62
Quadro 10 – Indústrias de papel de Cataguases (2006) ................................................. 63
Quadro 11 – Distritos Industriais Mineiros (Posição em 1979) ...................................... 75
Quadro 12 – Instituições e órgãos de apoio a indústrias em Minas Gerais ..................... 76
Quadro 13 – Distrito Industrial de Cataguases (2006) .................................................... 81
Quadro 14 – Indústrias do DI de Cataguases (2006) ....................................................... 83
Quadro 15 – Indústrias Têxteis (fiação) do DI (2006 ...................................................... 83
Quadro 16 – Geração de energia elétrica e atividades correlatas – CFLCL (2006)........ 84
Quadro 17 – Indústrias de reciclagem e embalagens plásticas do DI (2006)................... 85
Quadro 18 – Indústrias alimentícias do DI (2006) ........................................................... 85
Quadro 19 – Indústrias de artefatos de madeira e marcenaria do DI (2006) ................... 86
Quadro 20 – Indústrias Metalúrgicas do DI (2006) .......................................................... 87
Quadro 21 – Indústrias de confecções do DI (2006) ....................................................... 88
Quadro 22 – Indústrias eletromecânicas do DI (2006) .................................................... 88
Quadro 23 – Empresas transportadoras baseadas no DI (2006)..................................... 94
Quadro 24 – Ramos industriais e as origens das matérias-primas (2006)....................... 95
Quadro 25 – Abrangência espacial do mercado............................................................... 96
Quadro 26 – Estruturação da Legislação Ambiental no Brasil ......................................... 102
Quadro 27 – Instrumentos legais e políticas do Meio Ambiente ...................................... 103
Quadro 28 – Sistema Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais................................ 104
Quadro 29 – Impacto Ambiental da Atividade e competência legal de fiscalização ........ 106
Quadro 30 – Determinação da Classe do Empreendimento ............................................ 107
Quadro 31 – Produto Interno Bruto (PIB) a preços correntes ......................................... 136
ix
LISTA DE MAPAS
Mapa 1 – Minas Gerais (Mesorregiões) – Zona da Mata Mineira .................................. 36
Mapa 2 – Cartograma Altimétrico – Município de Cataguases – MG ............................ 38
Mapa 3 – Posição Gerográfica de Cataguases .............................................................. 39
Mapa 4 – Zona da Mata Mineira – Microrregiões ........................................................... 41
Mapa 5 – Microrregião de Cataguases – Minas Gerais .................................................. 42
Mapa 6 – Evolução da Cidade de Cataguases ............................................................... 45
Mapa 7 – Área de Concessão da CFLCL e de outras Concessionárias ......................... 57
Mapa 8 – Principais indústrias do padrão disperso (2006) – Município de Cataguases.. 59
Mapa 9 – Distrito Industrial de Cataguases – Abril de 2006 ............................................ 82
Mapa 10 – A rota dos poluentes: o acidente de Cataguases – (2003) ............................ 98
Mapa 11 – Rota do vazamento da lavagem de Bauxita: acidente em Mirai (2006) ........ 100
x
LISTA DE IMAGENS
Imagem de Satélite
Imagem de Satélite
Imagem de Satélite
Imagem de Satélite
Imagem de Satélite
1 – O DI de Cataguases e Trecho de Acesso à BR 120 (2006) .....79
2 – O DI de Cataguases e o Terreno da CBA (2006) .....................80
3 – Indústria Irmãos Peixoto (2006) ............................................... 111
4 – Companhia Industrial Cataguases (2006) ................................ 112
5 – Companhia Manufatora de Tecidos e Indústria Cataguases de
Papel (2006) .................................................................................... 113
Imagem de Satélite 6 – Indusfil Fios e Malhas (2006) ................................................... 114
Imagem de Satélite 7 – Indústria Cataguases de Papel (2006) ..................................... 116
Imagem de Satélite 8 – Fábrica de Papelão Cataguases (2006) ................................... 117
Imagem de Satélite 9 – Fundição Cataguases Metalúrgica (2006) ................................ 118
Imagem de Satélite 10 – Indústrias Químicas Cataguases (2006) .................................. 119
Imagem de Satélite 11 – Rio Pomba Minerações (2006) ................................................. 120
Imagem de Satélite 12 – Bairro Beira Rio e o Distrito Industrial (2006) ........................... 122
Imagem de Satélite 13 – Distrito Industrial de Cataguases (2006) .................................. 123
xi
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Esboço da infra-estrutura para melhoria da logística do DI de Cataguases .. 78
Figura 2 – Perfil da área do DI de Cataguases (Norte – Sul) .......................................... 90
Figura 3 –.Esboço da disposição dos terrenos no DI de Cataguases ............................. 91
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..........................................................................................................
13
CAPÍTULO 1 – A QUESTÃO AMBIENTAL SOB O PRISMA DA PRÁTICA
INDUSTRIAL .......................................................................................... 18
1.1 – A questão ambiental contemporânea diante do modelo de desenvolvimento
Capitalista................................................................................................................. 18
1.2 - Impactos ambientais em áreas urbano-industriais .................................................. 23
1.2.1 – A noção de impactos ambientais ...................................................................... 23
1.2.2 – A problemática ambiental nos espaços urbano-industriais .............................. 28
CAPÍTULO 2 – A ANÁLISE DO PADRÃO DISPERSO DE LOCALIZAÇÃO
URBANO-INDUSTRIAL DE CATAGUASES ........................................
2.1 – Sítio urbano e posição de Cataguases...................................................................
2.2 – A evolução urbana e industrial de Cataguases .....................................................
2.3 – A organização do espaço industrial disperso de Cataguases ...............................
2.3.1 – Padrão urbano-industrial disperso: uma proposta de definição .........................
2.3.2 – A dimensão geográfica das indústrias dispersas na cidade de Cataguases .....
2.3.3 – A estrutura industrial e os procedimentos tecnológicos da indústria dispersa ...
35
35
44
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52
53
60
CAPÍTULO 3 – O DISTRITO INDUSTRIAL DE CATAGUASES COMO
PADRÃO CONCENTRADO DE LOCALIZAÇÃO DAS INDÚSTRIAS ..
3.1 – A noção de DI enquanto recorte analítico do espaço geográfico ..........................
3.2 – A gênese do Distrito Industrial de Cataguases ......................................................
3.2.1 – A lógica de localização do DI de Cataguases ....................................................
3.2.2 – A estrutura industrial e os procedimentos tecnológicos das industrias do DI ...
3.3 - O arranjo espacial do DI de Cataguases ...............................................................
3.3.1 – As interações espaciais intra-distrito .................................................................
3.3.2 – As interações espaciais externas nas quais se insere o DI de Cataguases .....
67
67
73
77
81
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93
94
CAPÍTULO 4 – A PROBLEMÁTICA AMBIENTAL ENTRE AS LÓGICAS DE
ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL DISPERSA E CONCENTRADA DE
CATAGUASES ......................................................................................
4 1 – A (des)ordem ambiental sob o prisma da normatização ambiental .......................
4.1.1 – O diagnóstico ambiental do padrão disperso das indústrias...............................
4.1.2 – O diagnóstico ambiental do DI e do seu entorno................................................
4.1.3 – Análise comparativa da problemática ambiental entre os dois padrões de
organização industrial..........................................................................................
4.1.4 – O papel do poder público na questão ambiental das indústrias de
Cataguases........................................................................................................
4.2 – Os limites da expansão das atividades industriais em Cataguases .....................
98
98
109
121
125
130
135
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 140
BIBLIOGRAFIA............................................................................................................... 144
ANEXOS
..................................................................................................................... 149
13
INTRODUÇÃO
A problemática ambiental vem se firmando como uma das grandes questões de
preocupação mundial desde os anos 60 do século XX. A tomada de consciência de que
existe uma crise ambiental põe em questionamento a lógica de desenvolvimento da
sociedade industrial capitalista, cujo processo de acumulação se expande continuamente,
colocando em risco a relação sociedade/natureza. A degradação ambiental passa a ser uma
conseqüência inevitável desse modelo civilizatório que, apoiado na sociedade urbanoindustrial
e
no
consumismo,
tem
reafirmado
a
supremacia
da
razão
tecnológico/desenvolvimentista sobre a organização da natureza. Nesse sentido, o processo
de industrialização ganha relevância e ocupa posição central na discussão da problemática
ambiental. A indústria é um dos centros de gravidade da economia moderna e possui papel
ativo no ordenamento do ambiente com o qual se relaciona através dos seus variados
padrões tecnológicos. E é, principalmente, no ambiente urbano onde as indústrias mais se
inserem, que os problemas ambientais se intensificam. Daí os relatos diários produzidos
pela mídia a respeito dos acidentes ambientais ocorridos nos principais centros urbanos do
Brasil.
Cataguases é um desses centros urbano-industriais que, recentemente, ganhou
destaque na imprensa nacional, quando ocorreram dois acidentes ambientais, envolvendo
duas de suas grandes indústrias em 2003 (Indústria Cataguases de Papel) e 2006 (Grupo
Química Cataguases). Esses dois grandes acidentes serviram de ponto de partida para
constituição de eixos de investigação sobre a questão ambiental no município. De um lado,
destaca-se a análise dos procedimentos tecnológicos das indústrias e, do outro, o papel do
poder público em relação à questão ambiental. Apesar da falta de visibilidade política, os
problemas ambientais sempre fizeram parte do processo de desenvolvimento industrial da
cidade ao longo de todo o século XX, principalmente, no período anterior à década de 1980,
quando ainda não existia a Política Nacional do Meio Ambiente criada pela Lei no 6938 de
1981. A partir dessa data, as indústrias se adequaram às normas técnicas de qualidade
ambiental. No entanto, as exigências legais não impediram a ocorrência de acidentes
ambientais. A grande maioria desses acidentes atingiu diretamente o rio Pomba,
estendendo a poluição até o rio Paraíba do Sul, no Estado do Rio de Janeiro. O
transbordamento do problema ambiental para o Estado do Rio de Janeiro, através das
bacias hidrográficas, acarretou conflitos entre as Secretarias de Meio Ambiente dos dois
Estados e inseriu o IBAMA (Órgão Federal) na questão, em função da abrangência espacial
do acidente. A recorrência dos acidentes ambientais e as discussões sobre as
responsabilidades dos órgãos ambientais encarregados do licenciamento e fiscalização
14
desvelaram a existência de uma crise de competências que envolvem os órgãos e
secretarias do Município de Cataguases, do Estado de Minas Gerais e do Governo Federal.
Por isso, torna-se relevante uma análise da Política Nacional do Meio Ambiente para
investigar os domínios de competências e verificar a capacidade operacional dos órgãos
ambientais que atuam no Estado de Minas Gerais.
A
inexistência
de
trabalhos
acadêmicos
referentes
ao
processo
de
industrialização de Cataguases e suas implicações ambientais nos levaram a traçar um
segundo eixo de análise. Assim sendo, é mister recuperar a evolução histórica do setor
industrial para entender a sua lógica de organização espacial e os impactos socioambientais
produzidos. A abordagem de impactos não se prenderá exclusivamente à investigação dos
problemas ou efeitos deletérios. Partimos da premissa de que o ambiente não é só
receptáculo, uma vez que é social e historicamente construído. É passivo e ativo, isto é, ato
e potência, por isso exige uma abordagem dinâmica que permita compreender os impactos
socioambientais como processo de mudanças sociais e ecológicas em movimento
permanente. Daí o nosso interesse em investigar as mudanças socioespaciais que se
inscreveram em Cataguases como conseqüência da industrialização.
Ao se destacar na Zona da Mata mineira com seu pioneirismo industrial,
Cataguases produziu, internamente, dois padrões de organização espacial das indústrias: o
disperso e o concentrado. É a partir desses dois padrões de organização industrial que se
apoiará a análise dos impactos socioambientais. O disperso caracteriza-se pela ausência de
uma política de zoneamento e pela dispersão generalizada das indústrias no tecido urbano.
O padrão industrial concentrado, implantado a partir dos anos 70 do século XX, obedeceu à
lógica da indústria aglomerada materializada na forma de um Distrito Industrial. Por isso, foi
necessário trabalhar em base cartográfica com o objetivo de representar a espacialização
das indústrias e investigar suas lógicas locacionais, decifrando suas relações com o tecido
urbano. Como o Poder Público Municipal não possui esses mapas, tivemos que elaborá-los.
Obviamente, além do trabalho em laboratório de geoprocessamento, foram feitas várias
pesquisas de campo para coleta de dados indispensáveis à confecção dos mapas. A partir
de junho de 2006, inserimos as imagens de satélites (Google Earth – Digital Globe/2006)
disponibilizadas na Internet. Essas imagens foram utilizadas na fase dos diagnósticos
ambientais dos dois padrões e constituíram ferramentas importantes para referenciar nossa
base de informação cartográfica. Esse recurso nos permitiu, inclusive,
obter e verificar
algumas informações que nos foram negadas durante a fase de aplicação dos questionários
nas indústrias.
As principais omissões de informações estavam relacionadas às tecnologias
utilizadas e aos equipamentos e programas de manutenção da qualidade ambiental. No
entanto, os resultados obtidos com as entrevistas nos possibilitaram conhecer os
15
procedimentos tecnológicos das indústrias, a abrangência espacial dos mercados, os níveis
de articulação e complementaridade entre as empresas e a situação de cada indústria
diante das exigências legais das normatizações ambientais. Foram feitas também duas
entrevistas com o Secretário de Indústria, Comércio e Segurança e uma com o Secretário
de Agricultura e Meio Ambiente do município de Cataguases. Essas entrevistas serviram
para
investigar
como
o
poder
público
municipal
compatibiliza
as
políticas
desenvolvimentistas com as necessidades da manutenção da qualidade ambiental.
Enfim, o objeto de estudo é a organização industrial de Cataguases. O elemento
problematizador da pesquisa está no grau diferenciado dos impactos socioespaciais
provocados pelas indústrias. Logo, levando-se em consideração os padrões industriais de
Cataguases, os problemas ambientais e o papel do poder público em tal temática, vale
destacar a questão central da pesquisa: qual a dimensão geral e singular dos impactos
ambientais provocados pelos padrões de organização espacial das indústrias de
Cataguases, considerando seus dois arranjos espaciais: o disperso e o concentrado? Tal
questão se afirma em face da distribuição e tipologia das indústrias e dos procedimentos
tecnológicos requeridos para o funcionamento das empresas. Neste sentido, posição e sítio,
bem como padrões diferenciados de localização e a eficácia das políticas ambientais são
suporte à análise dos aspectos singulares da problemática ambiental no espaço urbanoindustrial de Cataguases.
A partir do objeto de pesquisa em destaque, cabe assinalar o objetivo central de
tal estudo: analisar a problemática ambiental da indústria em Cataguases, a partir dos
padrões disperso e concentrado de localização industrial.
A fim de responder a questão central, a dissertação se divide em 4 capítulos. No
capítulo 1, destaca-se a questão ambiental diante do modelo de desenvolvimento capitalista,
de modo a ressaltar sua lógica de funcionamento, baseada numa racionalidade
economicista, socialmente excludente e ambientalmente insustentável. Investigaremos a
diversidade dos conceitos de impacto ambiental para adotar aquele que mais se ajusta a
nossa proposta de trabalho, uma vez que estamos interessados, não só na identificação dos
problemas, mas também nos processos de mudanças socioespaciais.
Em seguida, no capítulo 2, a pesquisa se volta para a análise da expansão
urbano-industrial de Cataguases, tendo como referência o padrão de organização da
indústria dispersa. Como foi a primeira forma de organização espacial da indústria,
analisaremos sua evolução histórica, sua estrutura e os procedimentos tecnológicos
adotados. Discutiremos como o tecido urbano foi se moldando e se estendendo em função
de uma relação complexa com o desenvolvimento das indústrias. Usaremos
a
representação cartográfica para localizar as indústrias desse padrão. Nesta abordagem
investigaremos, exclusivamente, as grandes indústrias que, por serem também as mais
16
antigas, fornecerão informações fundamentais para o entendimento do processo de
industrialização de Cataguases.
A criação do Distrito Industrial de Cataguases inaugura uma nova forma de
organização espacial das indústrias. Trata-se do padrão concentrado, cuja lógica de
funcionamento e estruturação
será esclarecida no capítulo 3. De início, far-se-á uma
investigação das tipologias relativas à aglomeração industrial e, em seguida, um breve
resgate da noção de Distrito Industrial (DI), de modo a definir o tipo de distrito que melhor
se aplica à realidade de Cataguases. Fruto da primeira política de zoneamento urbano do
município, o DI será investigado quanto a sua gênese, organização espacial interna,
procedimentos tecnológicos das indústrias e níveis de interações internas e externas. Para
essa finalidade, foram realizadas entrevistas com os empresários ou responsáveis técnicos
das empresas. No entanto, a ausência de uma representação cartográfica do DI poderia
comprometer a qualidade da análise espacial. Assim, elaboramos um mapa atualizado do
DI que, complementado pelas imagens de satélites, nos permitirá localizar e identificar as
indústrias, a fim de fazer um balanço de ocupação da área. As imagens de satélite também
serão úteis na análise espacial do entorno, uma vez que a dinâmica de funcionamento do DI
e sua infra-estrutura produzem impactos que se projetam nos ambientes próximos.
No capítulo 4, a discussão estará centrada na problemática ambiental relativa às
lógicas de organização dos padrões industriais disperso e concentrado. Para isso, far-se-á,
em primeiro lugar, uma abordagem das normatizações ambientais de modo a revelar como
se estruturam e atuam os órgãos licenciadores e fiscalizadores, cujas competências incidem
sobre a unidade territorial em estudo. Apontaremos as causas das dificuldades operacionais
e demonstraremos como a deficiente integração entre os órgãos ambientais do Município,
Estado e Governo Federal dificultam a execução dos planejamentos econômicos e a
consolidação de uma política ambiental. Apresentaremos os diagnósticos ambientais dos
dois padrões dentro de uma perspectiva que evidencie, principalmente, os processos de
transformações espaciais induzidos pelo desenvolvimento industrial.
Esse diagnóstico ambiental será elaborado com base nos dados obtidos pelas
entrevistas,
observações de campo e
imagens de satélite Google Digital Globe 2006.
Nessa etapa, a consulta à listagem do Sistema Integrado de Informação Ambiental (SIAM),
disponibilizada pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável
(SEMAD), anuncia a situação das indústrias em relação às exigências legais impostas pela
normatização ambiental do Estado de Minas Gerais. De posse dos dados sobre o
andamento de todos os tipos de processos relativos às solicitações operacionais que as
indústrias encaminharam à FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente), IGAM (Instituto
Mineiro de Gestão das Águas) e IEF (Instituto Estadual de Floresta) será possível também
levantar o número de multas, advertências e Licenças Corretivas aplicadas, oficialmente, às
17
indústrias em função de falhas operacionais ou, descumprimento de normas técnicas que
produziram algum tipo de acidente ambiental.
A partir de tais diagnósticos, a análise volta para as práticas do poder público
municipal em relação à política ambiental, já que a Constituição Federal delega ao Município
papel ativo na gestão ambiental de sua unidade territorial. Interessa-nos saber se o poder
público Municipal está preparado para desempenhar, com competência, o licenciamento e a
fiscalização ambiental, bem como investigar seu comportamento frente aos imperativos dos
grupos econômicos que atuam em Cataguases.
Por fim, analisaremos as condições para expansão das atividades industriais no
município. Nesse item, o nosso objetivo é verificar se há limites, ou não, para a expansão
das indústrias. Para responder a esse questionamento, levaremos em conta o perfil
tecnológico do atual quadro industrial, os condicionantes de ordem física,
as políticas
públicas, a conjuntura macroeconômica, a qualidade das infra-estruturas disponíveis e a
capacidade de suporte ambiental.
CAPÍTULO 1 - A QUESTÃO AMBIENTAL SOB O PRISMA DA PRÁTICA INDUSTRIAL
Revelando-se como uma questão de alta complexidade, a problemática
ambiental tem se colocado como um dos principais temas do mundo contemporâneo. A
atual crise ambiental é reflexo do modelo de desenvolvimento adotado pela sociedade
moderna. Um desenvolvimento baseado na primazia do mercado e apropriação ilimitada dos
recursos naturais. Esse modelo tem acarretado problemas ambientais diversos. Portanto,
torna-se necessário compreender sua lógica de funcionamento e seus impactos,
principalmente nos espaços urbano-industriais.
1.1-
A questão ambiental contemporânea diante do modelo de desenvolvimento
capitalista.
A segunda metade do século XX vê surgir um intenso debate mundial sobre o
meio ambiente. Esse despertar para as questões ambientais foi motivado pela tomada de
consciência de que existe uma crise ambiental profunda provocada pelo modelo de
desenvolvimento da sociedade capitalista contemporânea. Segundo Guimarães (2003),
esse modelo de desenvolvimento, que estrutura e é estruturado pela sociedade moderna
urbano-industrial, se apóia na idéia da modernização e progresso ilimitados. Aqui a idéia de
progresso (e desenvolvimento) significa dominação da natureza e apropriação ilimitada de
seus recursos (GONÇALVES, 2004, p.24). Trata-se de um desenvolvimento baseado na
lógica privatista que produz uma acumulação desigual geradora de desigualdades sociais e
perpetuadora do subdesenvolvimento. Santos (1996), ao caracterizar o meio técnicocientífico-informacional, nos fala da união entre técnica e ciência sob o domínio do mercado.
Tal união favoreceu o surgimento e consolidação de um mercado global, aumentando as
possibilidades de acumulação em níveis jamais visto, e acelerando as relações predatórias
entre sociedade e natureza. Para Santos (1996, p. 202),
a busca de mais-valia no nível global faz com que a sede primeira do
impulso produtivo (que é também destrutivo, para usar uma antiga
expressão de J. Brunhes) seja apátrida, extraterritorial, indiferente às
realidades locais e também às realidades ambientais. Certamente por isso a
chamada crise ambiental se produz neste período histórico, onde o poder
das forças desencadeadas num lugar ultrapassa a capacidade local de
controlá-las, nas condições atuais de mundialidade e de suas repercussões
nacionais.
19
Neste ponto, Kurz (2002) ressalta que a economia moderna é totalitária. Ela
levanta uma pretensão total sobre o mundo natural e social. Tudo precisa estar submetido e
assimilado à sua lógica e essa privatização total do mundo estaria mostrando o absurdo da
modernidade. A sociedade capitalista estaria se tornando autocanibalista, pois a base
natural que sustenta sua existência é destruída com velocidade crescente. Bernardes e
Ferreira (2003) comentam que, sob o processo de acumulação, o capitalismo se expande
continuamente para sobreviver apropriando a natureza e seus recursos em escala mundial.
Globaliza-se o mercado e a produção, globaliza-se a crise ambiental. Uma vez globalizada,
a questão ambiental se coloca como uma problemática social e ecológica generalizada e de
alcance planetário. Desse modo, toda a natureza e sociedade são atingidas, pois como
afirma Gonçalves (2004, p. 48), “o meio ambiente é uma totalidade indissociável da natureza
e da sociedade. O ambiente é o lugar da convivência do que é diverso, onde natureza e
cultura são uma totalidade complexa e contraditoriamente estruturada”.
Para Santos (2000, p. 20), “os agravos à natureza são sobretudo originários do
modelo de civilização que adotamos”. “Um modelo civilizatório depredador e consumista
que, se universalizado, demandaria três planetas semelhantes ao nosso” (BOFF, 2003, p.
35 ). Leff (2001) vai além e comenta que a degradação ambiental se manifesta como
sintoma de uma crise de civilização, em que o modelo de modernidade é regido pelo
predomínio do desenvolvimento da razão tecnológica sobre a organização da natureza. Tal
crise nos obriga a pensar nos limites para o crescimento econômico, nos desequilíbrios
ecológicos, na pobreza e desigualdade social. Leff (2001, p. 62), ao explicar as origens da
atual crise ambiental, afirma que:
a problemática ambiental não é ideologicamente neutra nem é alheia a
interesses econômicos e sociais. Sua gênese dá-se num processo histórico
dominado pela expansão do modo de produção capitalista, pelos padrões
tecnológicos gerados por uma racionalidade econômica guiada pelo
propósito de maximizar os lucros e os excedentes econômicos a curto
prazo, numa ordem econômica mundial marcada pela desigualdade entre
nações e classes sociais. Este processo gerou, assim,efeitos econômicos,
ecológicos e culturais desiguais sobre diferentes regiões, populações,
classes e grupos sociais, bem como perspectivas diferenciadas de análises.
A insustentabilidade ambiental dos atuais padrões de desenvolvimento e
consumo vem produzindo uma sociedade de risco (GUIMARÃES, 2003, p. 87). Para
Gonçalves (2004), a sociedade de risco seria uma das contradições da sociedade capitalista
moderna, pois os riscos que a sociedade corre são, quase que exclusivamente, derivados
da própria intervenção (através dos sistemas técnicos) da sociedade humana no planeta.
20
Logo, esses riscos também são decorrentes do modo de vida criado pela moderna
sociedade industrial que, além de produzir em escala planetária, estimula o consumo no
mesmo nível. Para Santos (2002), as empresas hegemônicas têm como estratégia produzir
o consumidor antes mesmo de produzir os produtos. Daí a composição: publicidade +
materialidade; publicidade + serviços (SANTOS, 2002, p. 49). Sob o domínio do império da
informação e da publicidade consolida-se o processo de massificação cultural. Para
Bernardes e Ferreira (2003), a era moderna assiste ao aumento considerável do consumo,
uma vez que todas as coisas se tornaram objetos a serem consumidos num ritmo sem
precedentes. Ergue-se uma economia que se caracteriza pelo desperdício, pois os objetos
são consumidos e descartados muito rapidamente. É certo que o consumo desenfreado
força demandas por mais recursos e aumenta a produção de resíduos (lixo). Além disso,
Santos (2002) nos chama a atenção para o fato de que ser consumidor não significa
necessariamente ser cidadão. Segundo Santos (2002), o consumo seria o grande
fundamentalismo do nosso tempo com fortes conseqüências ambientais e inerciais para a
sociedade.
Esse modelo de sociedade moderna capitalista urbana, financeira, industrial,
globalizada, predadora dos recursos, neoliberal, fragmentária, reducionista, individualista,
consumista, excludente e concentradora de renda estabelece um rigoroso controle político e
econômico de forma a perpetuar a ordem hegemônica. No entanto, apesar da
insustentabilidade ambiental do atual padrão de desenvolvimento, já se percebem
movimentos de reação que poderão ajudar a abrir caminhos para a construção de uma
racionalidade produtiva alternativa (LEFF, 2001).
Bernardes e Ferreira (2003) comentam que a crise ambiental se tornou mais
evidente na segunda metade do século XX através de um dos mais importantes movimentos
sociais dos últimos anos – “a revolução ambiental“. A humanidade começa a perceber que
os recursos são finitos e que o seu uso incorreto pode representar o fim de sua própria
existência.
Segundo Capra (1982, p. 19),
As últimas duas décadas de nosso século vêm registrando um estado de
profunda crise mundial. É uma crise complexa, multidimensional, cujas
facetas afetam todos os aspectos de nossa vida – a saúde e o modo de
vida, a qualidade do meio ambiente e das relações sociais da economia,
tecnologia e política. É uma crise de dimensões intelectuais, morais e
espirituais; uma crise de escala e premência sem precedentes em toda a
história da humanidade. Pela primeira vez,temos que nos defrontar com a
real ameaça de extinção da raça humana e de toda a vida no planeta.
A consciência ambiental surge nos anos 1960 e o livro “SILENT SPRING”,
21
escrito pela bióloga Rachel Carson, denunciando os perigos dos inseticidas e pesticidas,
tornou-se uma das primeiras marcas da “revolução ambiental“ (BERNARDES E FERREIRA,
2003, p. 27). Na seqüência, Leff (2004) relata que a consciência ambiental se expandiu nos
anos 1970, depois da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano,
celebrada em Estocolmo, em 1972. A Conferência de Estocolmo acaba induzindo a criação
do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (PNUMA). A
CMMAD é a grande responsável pela elaboração do Relatório Brundtland (1987), sob o
título “Nosso Futuro Comum”. Esse relatório lança as bases de discussão do conceito de
Desenvolvimento Sustentável: “aquele que atende às necessidades do presente sem
comprometer a possibilidade das gerações futuras de atenderem a suas próprias
necessidades” (BARBIERI, 1997, p. 23). O ano de 1987 também registra o Protocolo de
Montreal que bane toda uma família de produtos químicos (os cloro-fluor-carbono ou CFC) e
estabelece prazos para sua substituição (OLIVEIRA e MACHADO, 2004). A RIO–92 ou
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento reafirma que
a questão ambiental deve ultrapassar os limites das ações isoladas e localizadas e envolver
toda a humanidade. Cinco temas ambientais globais estiveram no centro das discussões: a
preservação da biodiversidade, o aquecimento global, proteção da camada de ozônio,
proteção das florestas e a promoção do desenvolvimento sustentável. Para Oliveira e
Machado (2004), a assinatura da Agenda 21 foi um dos principais resultados da RIO – 92.
Aprovada por 170 países, visa um plano de ação mundial para se alcançar o
desenvolvimento sustentável a médio e longo prazos. A década de 1990 ainda vai
presenciar mais um marco ambientalista importante, o Protocolo de Kyoto. Firmado em
1997, fixa metas de redução na emissão de gases causadores do aquecimento global. As
maiores resistências vêm justamente dos países que mais poluem como é o caso dos EUA,
responsáveis por cerca de 25% das emissões de gases estufas. A matriz energética que
sustenta o dinamismo econômico norte-americano se apoia fundamentalmente no consumo
de grandes quantidades de combustíveis fósseis. No entanto, em 2005, com a adesão da
Federação Russa, o Protocolo de Kyoto entrou em vigor.
O século XXI inicia-se com a realização da RIO + 10, a terceira Conferência das
Nações Unidas sobre o Meio Ambientes e o Desenvolvimento (2002). Dessa vez os temas
para discussão foram: erradicação da pobreza; padrões insustentáveis de produção e
consumo;
manejo
sustentável
de
recursos
naturais
e
compatibilização
GLOBALIZAÇÃO/DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.
Iniciada na Segunda metade do século XX, a “revolução ambiental“ (ou
ambientalismo) é um movimento que problematiza os padrões de produção e de consumo,
os estilos de vida e as orientações e aplicações do conhecimento no processo de
desenvolvimento. O desafio está lançado. Romper com o modelo hegemônico e globalitário
22
(SANTOS, 2002) não é tarefa fácil, daí as crescentes críticas ao conceito de
desenvolvimento sustentável proposto pela Comissão Brundtland (1987). Alguns críticos
afirmam que a proposta tem carater generalista e negligencia as diferentes condições
socioespaciais, políticas, econômicas e ambientais que caracterizam o espaço mundial.
Para Guimarães (2003), sustentabilidade ainda é um conceito ambígüo, contraditório, que
evita conflitos e não rompe com a lógica economicista e desenvolvimentista contemporânea.
Também não deixa claro como é possível conciliar (se é que é possível) preservação e
crescimento no contexto de uma racionalidade capitalista. E por não romper com a ordem
estabelecida, acredita nas forças do mercado para solucionar problemas ambientais.
Guimarães afirma que é preciso discutir profundamente as relações no interior do processo
produtivo, pois as discussões centradas exclusivamente nos seus efeitos ou externalidades
só alimentarão as soluções tecnicistas não alterando a forma social de produção. Kurz
(2002, p. 11), ao criticar a proposta do desenvolvimento sustentável, argumenta que:
Todo debate sobre o chamado “desenvolvimento sustentável” ignora o
carater do princípio abstrato da valorização e do crescimento, que não
possui nenhum senso para as qualidades materiais, ecológicas e sociais e,
por isso, é também completamente incapaz de tomá-las em
consideração. Absurdo por inteiro é o projeto de querer que a economia
industrial contabilize em seus balanços os custos da destruição da
natureza que ela tem acumulado.
As reflexões herdadas do ambientalismo nos orientam no sentido de
percebermos que há limites para a relação da humanidade com o planeta. Aumenta a
consciência de que os riscos não são só locais, mas globais e que nossas ações estão
reflexivamente nos atingindo. No entanto, a globalização neoliberal continua ditando as
ordens, submetendo o planeta e a humanidade à primazia do mercado, onde o imperativo é
o crescimento e a expansão, mesmo que se acelerem as relações predatórias com reflexos
negativos para o ambiente.
Estamos cientes de que a questão ambiental se revela como uma problemática
multidimensional e, portanto, de alta complexidade. Como tal exigirá uma reflexão crítica
permanente para buscar ações que efetivamente sejam capazes de deter o curso das
tendências mundiais ditadas pelo atual modelo. Acreditamos que:
23
A solução da crise ambiental – crise global e planetária não poderá surgir
apenas por uma gestão racional da natureza e dos riscos da mudança
global. A crise ambiental leva-nos a interrogar o conhecimento do mundo,
a questionar este projeto epistemológico que tem buscado a unidade,
a uniformidade; e a homogeneidade; este projeto que anuncia um futuro
comum, negando o limite, o tempo, a história;a diferença, a diversidade, a
outridade (LEFF, 2001, p. 194)
Após discutirmos a questão ambiental sob a lógica de funcionamento do
capitalismo, torna-se necessário investigar a natureza dos impactos produzidos nas áreas
urbano-industriais.
1. 2 - Impactos ambientais em áreas urbano-industriais
1.2.1- A noção de impactos ambientais
O atual modelo de desenvolvimento econômico, baseado numa racionalidade
econômico-tecnicista e predatória, tem provocado conseqüências socioeconômicas e
ambientais diversas. Um crescente quadro de degradação das condições ambientais
anuncia os limites ecológicos e socioeconômicos desse modelo. Analisar suas
conseqüências será de vital importância para instrumentalizar políticas e mecanismos que
contribuam para a melhoria das condições ambientais. Daí a importância dos estudos de
impactos ambientais.
Etimologicamente, a palavra impacto deriva do latim impactus que significa
impelido contra, ir de encontro a, bater contra (HOUAISS, 2000, p. 1578). Obviamente não
se trata de qualquer impacto, pois a discussão em curso centra-se na questão ambiental.
Por isso Custódio (1995, p.47) e Milaré (2002, p.54), ao discutirem a legislação ambiental
brasileira, explicam que na terminologia do Direito Ambiental a palavra impacto aparece com
o sentido de “choque ou colisão (sólidos, líquidos ou gasosos), de radiações ou de formas
diversas de energia, decorrentes das realizações de obras ou atividades com danosa
alteração do ambiente natural, artificial, cultural ou social”.
O termo ambiental significa: relativo a/ou próprio do ambiente. Ambiente,
derivado do latim ambiens, entis – part. pres. de ambire significa andar ao redor, cercar,
rodear; tudo que rodeia ou envolve os seres vivos e/ou coisas; o meio ambiente (HOUAISS,
2001, p.183). Para Art (1998, p. 22-23), “ambiente é o conjunto de condições que envolvem
24
e sustentam os seres vivos na biosfera, como um todo ou em parte desta, abrangendo
elementos do clima, do solo , da água e de organismos. Percebe-se que essas concepções
são dissociativas e fragmentárias, pois afirmam que o ambiente é tão somente o meio que
envolve, ou seja, negam o princípio fundamental da relação que existe entre sociedade e
natureza. Lima-e-Silva (2002, p. 11) define ambiente como “conjunto de fatores naturais,
sociais e culturais que envolvem um indivíduo e com os quais ele interage influenciando e
sendo influenciado por eles”. Aqui percebemos uma abordagem que trata o meio ambiente
como uma totalidade indissociável da natureza e da sociedade, resgatando uma visão
multidimensional do ambiente indispensável para uma maior compreensão da problemática
ambiental.
Coelho (2001, p. 23) conduz o debate afirmando que:
o ambiente ou meio ambiente é social e historicamente construído. Sua
construção se faz no processo da interação contínua entre uma sociedade
em movimento e um espaço físico particular que se modifica
permanentemente. O ambiente é passivo e ativo. É, ao mesmo tempo,
suporte geofísico, condicionado e condicionante de movimento,
transformador da vida social. Ao ser modificado, torna-se condição para
novas mudanças, modificando, assim, a sociedade.
Essa abordagem rompe de vez com a noção de que o ambiente é
exclusivamente o meio que circunda. Partindo de uma abordagem dialética, Coelho (2001)
afirma que o ambiente é uma construção social, produto de uma complexa interação entre
sociedade e natureza. Na mesma linha de raciocínio Leff (2001) trata o ambiente como um
todo dinâmico que , ao ser modificado, cria condições para novas mudanças modificando
também a sociedade.
A noção de impactos ambientais, assim como a de meio ambiente, carrega uma
diversidade de interpretações, segundo a formação ou objetivos do pesquisador.
Santos (2004, p. 110), ao abordar o estudo sobre avaliação dos impactos
ambientais, apresenta vários conceitos de impacto ambiental, segundo diferentes autores:
Qualquer alteração no sistema ambiental físico, químico, biológico, cultural e
sócio-econômico que possa ser atribuída a atividades humanas, relativas às
alternativas em estudo para satisfazer às necessidades de um projeto
(Canter, 1977).
Qualquer alteração de condições ambientais ou criação de um novo
conjunto de condições ambientais, adversas ou benéficas, causadas ou
induzidas pela ação ou conjunto de ações em consideração (Raw, 1980).
25
Impacto ambiental é a estimativa ou julgamento do significado e do valor do
efeito ambiental para os receptores natural, socioeconômico e humano.
Efeito ambiental é a alteração mensurável da produtividade dos sistemas
naturais e da qualidade ambiental, resultante de uma atividade econômica
(Horberry, 1984).
Diferença entre o estado futuro do meio ambiente se uma ação ocorrer e
o estado se nenhuma ação ocorrer (Ortolano, 1997).
Mudança num parâmetro ambiental, dentro de um determinado período e
numa determinada área, resultante de uma determinada atividade,
comparada com a situação que ocorreria se a atividade não tivesse sido
iniciada (Wathern, 1988).
Qualquer alteração significativa do meio ambiente – e um ou mais de seus
componentes – provocada por uma ação humana (Moreira, 1992).
Qualquer alteração da qualidade ambiental que resulta da modificação de
processos naturais ou sociais provocada por uma ação humana (Sánchez,
1998).
Ação modificadora causada em um ou mais atributos ambientais num dado
espaço em decorrência de uma determinada atividade antropogênica. A
existência ou não de impactos ambientais está diretamente relacionada com
o uso e ocupação da terra e sua escala de abrangência e magnitude estão
relacionadas a basicamente aos determinantes naturais e à forma como se
dá a apropriação dos recursos naturais pelo homem ( Thomaziello, 1998).
Impacto ambiental é o resultado do efeito de uma ação antrópica sobre
algum componente ambiental biótico ou abiótico ( Espíndola, 2000).
Nota-se que os conceitos apresentados possuem forte enfoque na relação
causa/efeito, pois em geral afirmam que os impactos são conseqüências diretas das ações
humanas sobre o meio. Os impactos seriam as alterações causadas pelas intervenções
econômicas da sociedade. Mas dois conceitos diferem um pouco do conjunto apresentado.
Raw (1980) já demonstra uma incipiente preocupação de abordar o impacto ambiental como
processo, quando afirma em seu conceito que os impactos podem criar novas condições
ambientais. Por outro lado, Horberry (1984) relativiza o conceito ao afirmar que impacto
ambiental é a estimativa ou julgamento do significado e do valor do efeito ambiental. Essa
abordagem nos chama a atenção para o fato de que os impactos terão efeitos diferenciados
sobre o meio ambiente, já que este é uma construção social e, portanto, caracterizado por
uma espacialização diferencial das classes.
26
Para Santos (2004, p. 110), impacto ambiental é “toda alteração perceptível no
meio, que comprometa o equilíbrio dos sistemas naturais ou antropizados, podendo decorrer
tanto das ações humanas como de fenômenos naturais”. Este conceito se diferencia
daquele usado pela política brasileira dos EIA/RIMA, que se refere somente às mudanças
decorrentes da realização de projetos, ou atividades de caráter econômico. Assim, a
legislação brasileira (Resolução CONAMA no 001/86) define impacto ambiental como sendo
“qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente,
causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades que, direta ou
indiretamente, afetam”:
I- a saúde, a segurança e o bem estar da população;
II- as atividades sociais e econômicas;
III- a biota;
IV- as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente;
V- a qualidade dos recursos ambientais.
O conceito de impacto ambiental apresentado está instrumentalizando a
legislação, cujo objetivo é a normatização do ordenamento ambiental. Pode-se notar que, o
texto do EIA/RIMA trata o impacto ambiental como uma relação de causa/efeito
fragmentando também a noção de meio ambiente. Brito (1995), ao discutir os erros e
acertos da política do EIA/RIMA, critica a baixa qualidade dos estudos de impacto ambiental
aceitos pelas entidades oficiais de meio ambiente. A autora afirma que, além da baixa
qualidade, o EIA/RIMA tem se transformado em mais uma rotina burocrática com risco de
servir de aval para a degradação. Os órgãos ambientais oficiais são negligentes na
fiscalização e monitoramento da evolução dos impactos e da eficiência das medidas
mitigadoras implantadas pelas empresas (BRITO, 1995). Moreira (2002), apesar de
considerar a legislação ambiental brasileira avançada do ponto de vista normativo, sustenta
que o EIA/RIMA é um documento que precisa estar atento para incorporar as discussões
que envolvem as reformulações paradigmáticas das ciências e as transformações materiais
do mundo atual.
Lima-e-Silva (2000, p. 133) define impacto ambiental como:
qualquer alteração no ambiente causada por atividades antrópicas. Pode
ser negativo, quando destrutivo ou degradador dos recursos naturais, ou
positivos, quando regenerador
de
áreas e/ou funções naturais
anteriormente destruídas. Um impacto ambiental potencial é aquele que
ainda não aconteceu, mas cuja possibilidade existe em decorrência do
funcionamento, normal ou acidental, e uma determinada atividade.
27
Essa definição também se refere somente às alterações provocadas pelas ações
humanas negligenciando as que podem ser provocadas por fenômenos naturais. Outro
aspecto presente nessa definição é a incorporação não relativizada dos termos positivo e
negativo. Para Coelho (2001, p. 35), “o que é positivo para uma classe social pode não ser
para outra ou o que é positivo num momento do processo pode não ser em outros”. Outro
problema nessa definição se refere à ambigüidade do que vem a ser impacto ambiental
potencial, principalmente quando se refere ao funcionamento normal ou acidental de uma
determinada atividade. A definição não esclarece o que vem a ser funcionamento acidental.
A noção de impacto ambiental que será utilizada para fundamentar o presente
trabalho é a defendida por Coelho (2001, p. 24-25):
Impacto ambiental é, portanto, o processo de mudanças sociais e
ecológicas causado por perturbações (uma nova ocupação e/ou construção
de um objeto novo: uma usina, uma estrada ou uma indústria) no ambiente.
Diz respeito ainda à evolução conjunta das condições sociais e ecológicas
estimuladas pelos impulsos das relações entre forças externas e internas à
unidade espacial e ecológica, histórica ou socialmente determinada. É a
relação entre sociedade e natureza que se transforma diferencial e
dinamicamente. Os impactos ambientais são escritos no tempo e incidem
diferencialmente, alterando as estruturas
das
classes sociais e
reestruturando o espaço.
Essa noção rompe com as interpretações mecanicistas de causa e efeito
abordando o impacto ambiental não só como resultado de uma determinada ação sobre o
ambiente, mas como um processo de mudanças sociais e ecológicas em contínuo
movimento. Sendo um processo em movimento permanente, o impacto ambiental é, ao
mesmo tempo, produto e produtor de novos impactos, acarretando mudanças de relações
ecológicas e sociais que precisam ser investigadas incessantemente. Essa abordagem
permite incorporar a estrutura de classes à análise, pois os problemas ambientais não
atingem igualmente todo o espaço. Em geral, as classes sociais menos favorecidas são as
mais atingidas por problemas das mais diversas ordens. Para Costa e Braga (2004, 196 –
197), “ os segmentos mais pobres e com menor capacidade de se fazerem ouvir estão mais
expostos a riscos ambientais de toda ordem, em seus locais de moradia e trabalho”.
Segundo Coelho (2001), a maioria dos recentes trabalhos sobre estudos de impactos
ambientais ainda são bastantes influenciados pelos fundamentos da ciência ocidental
moderna, seguindo métodos naturalistas. Por isso separam rigidamente impactos biofísicos
de impactos sociais não estabelecendo nenhuma lógica relacional. Cristofoletti (2004), ao
discutir as abordagens da Teoria do Caos e Geometria Fractal em Geografia, comenta que
28
os fenômenos naturais e socioeconômicos, quando analisados, não são lineares. Se
comportam como sistemas dinâmicos e caóticos aumentando a complexidade para a
análise. Portanto, uma abordagem holística, como a defendida por Capra (1982), torna-se
necessária para o estudo dos impactos ambientais, pois favorecerá a análise ambiental
como um todo integrado e não como uma coleção de partes dissociadas.
Ao abordarmos o meio ambiente como social e historicamente construído,
queremos dizer que sua construção é fruto de uma interação contínua entre sociedade e espaço
(condições ecológicas). Ambos em movimento permanente. Logo, toda estrutura socioespacial
é temporal, pois impactos provocam rupturas e reestruturam o espaço e esse permanecerá
relativamente estável até que um novo impacto provoque uma nova ruptura (COELHO, 2001).
A concepção de impacto ambiental que nos interessa extrapola a preocupação
com as alterações e efeitos imediatos que determinadas ações podem provocar no meio.
Nossa abordagem não ficará centrada exclusivamente na identificação dos efeitos deletérios
provocados pelas ações impactantes. Interessa-nos, sobretudo, investigar as mudanças
socioespaciais (novas estruturas, formas e arranjos espaciais) que se inscrevem no
ambiente como conseqüência dessas ações. É dentro dessa concepção que, no próximo
item, passaremos à discussão da problemática ambiental decorrente da organização e
funcionamento dos espaços urbano-industriais.
1.2.2- A problemática ambiental nos espaços urbano-industriais
As sociedades urbanizadas, em que a maioria das pessoas vive agrupada em
cidades, representam um estágio da evolução social com características universais. É,
portanto, um fato irreversível permeando praticamente todo o planeta. “No início do século
XX apenas 10% da humanidade residiam em áreas urbanas; hoje, metade, mais de 2,9
milhões, vive em cidades” (SIRKIS, 2003, p. 215). As grandes aglomerações que
caracterizam a população urbana atual suscitam nas autoridades políticas e científicas
grandes preocupações (DAVIS, 1977 e CAVALHEIRO, 1995). Segundo o IBGE, no Censo
2000, o Brasil apresentou uma população absoluta de 169.544.443 e uma taxa de
população urbana de 81,2% (Quadro1).
29
Quadro 1 – Crescimento da população brasileira e a taxa de urbanização
População em
População urbana
milhões
(%)
1970
93,1
55,9
1980
118,0
68,2
1991
146,8
75,6
1996
157,1
78,4
2000
169,0
81,2
Ano
Fonte: Ministério das Cidades (2003)
Segundo o Ministério das Cidades (2003), a urbanização no Brasil tem
apresentado algumas tendências como:
- Taxa reduzida de crescimento na cidade-núcleo da área metropolitana;
- Aumento da taxa de crescimento nas áreas periféricas;
- Aumento expressivo da população em cidades médias que se constituem em pólos
regionais de crescimento econômico.
Em documento intitulado “a questão da drenagem urbana no Brasil” , o Ministério
das Cidades (2003) chama a atenção para o fato de que “ os processos inadequados de
urbanização e de impacto ambiental que se observaram nas Regiões Metropolitanas
brasileiras estão hoje se reproduzindo nessas cidades de médio porte.
Os três estados que possuem as maiores concentrações industriais do Brasil,
também possuem as maiores taxas de população urbana: São Paulo (93,4%), Rio de
Janeiro (96%) e Minas Gerais (82%) (Censo 2000). Castells (1999), ao abordar a
urbanização no terceiro milênio, lista 13 megacidades, ou seja, grandes aglomerações de
seres humanos com mais de 10 milhões de habitantes em 1992, sendo que quatro
projetadas para ultrapassar 20 milhões em 2010 (Quadro 2). Percebe-se que, a maioria das
megacidades estão localizadas em países subdesenvolvidos e são conseqüência de um
rápido e descontrolado processo de urbanização, em que o crescimento das cidades se
processou sem um adequado acompanhamento de obras infra-estruturais vitais ao
funcionamento do espaço urbano.
30
Quadro 2 – Maiores aglomerações urbanas do mundo – ONU
Classificação
Aglomeração
Pais
População (milhões)
1
Tóquio
Japão
25,772
2
São Paulo
Brasil
19,235
3
Nova York
EUA
16,58
4
Cidade do México
México
15,276
5
Xangai
China
14,053
6
Bombaim
Índia
13,322
7
Los Angeles
EUA
11,853
8
Buenos Aires
Argentina
11,753
9
Seul
República da
11,589
Coréia
10
Pequim
China
11,433
11
Rio de Janeiro
Brasil
11,257
12
Calcutá
Índia
11,106
13
Osaka
Japão
10,535
Fonte: Castells (1999)
A concentração humana e as atividades a ela relacionadas provocam uma
ruptura do funcionamento do ambiente natural (CAVALHEIRO, 1995). Para Corrêa (2001, p.
156):
A grande cidade capitalista constitui, primeiramente, o lugar onde o meio
ambiente é caracterizado predominantemente pela magnitude da
segunda natureza. Trata-se, por excelência do meio ambiente construído,
onde a importância da natureza primitiva apresenta-se, em muitos locais,
muito reduzida.
Ab’ Saber (2002), ao discutir a importância dos estudos de previsão de impactos
ambientais, afirma que a produção de um espaço humanizado, como os estabelecimentos
industriais, cidades e metrópoles, não é feita no ar. Precisam de um suporte territorial físico
e ecológico consumindo grande quantidade de áreas, tamponando-as. Logo, a urbanização
e o crescimento das cidades provocam uma ruptura no funcionamento do ambiente natural
com perdas para ecossistemas raros, solos férteis e biótopos. À medida que se ampliam as
áreas urbanizadas, o ciclo hidrológico é afetado aumentando o escoamento superficial e
diminuindo a infiltração das águas no solo. Desse modo, a urbanização interfere no
rearranjo do armazenamento (estocagem hídrica) e na trajetória das águas (GONÇALVES e
GUERRA, 2001).
Ross (2005) e Ab’ Saber (2002) são unânimes em afirmar que o adensamento
urbano, conjugado com as altas taxas de impermeabilização dos solos e ocupações
irregulares das encostas, têm provocado inundações freqüentes e deslizamentos durante as
31
fortes chuvas de verão que atingem principalmente o Sudeste brasileiro.
Monte-Mor (2004), ao tratar de uma nova visão para a urbanização no Brasil
contemporâneo, contribui para ampliar o debate sobre a problemática ambiental nas áreas
urbanas. Trata-se da urbanização extensiva que ocorre de forma fragmentada, descontínua
e segmentada sobre o território (Limonad, 2003). Um processo que ocorre de modo
diferente da expansão em malha compacta e contínua que caracterizava o processo de
urbanização no século XX. A urbanização extensiva ocorre de forma difusa. Os espaços
naturais (unidades de conservação) são apropriados para fins residenciais ou industriais e
provocam, nessas novas áreas ,vários problemas ambientais devido às precárias ou
inexistentes infra-estruturas. Penna (2002), ao debater a problemática ambiental ligada à
questão urbana, comenta que novas áreas de expansão urbana estão se constituindo na
periferia das cidades como um novo e dinâmico mercado imobiliário que trás como apelo a
necessidade de habitar em contato com áreas verdes, longe do caos urbano. Essa
estratégia imobiliária induz ao consumo da natureza (áreas destinadas à preservação),
causando sua degradação. É comum, nesses casos, muitas ocupações ocorrerem sobre
áreas de mananciais, comprometendo a sustentabilidade hídrica das cidades e elevando os
custos do tratamento da água (Ministério das Cidades, 2003).
Além da preocupação com o modo de crescimento e estruturação do tecido
urbano, faz-se necessário investigar a forma de organização espacial das indústrias para um
melhor entendimento do quadro ambiental. Segundo Moreira (2003, p.23), “nas cidades
industriais, em particular, a poluição industrial se soma aos efeitos ambientais do
urbanismo”. A industrialização se caracteriza por ser um fenômeno concentrado no espaço
enquanto produto da aglomeração de meios de produção, mão-de-obra, capitais e
mercadorias, por isso as cidades se tornaram sua base territorial (SPOSITO, 1991). A
cidade se configura como o lugar que reuni as melhores condições para o desenvolvimento
do processo industrial. Esse, por sua vez, acaba provocando mudanças no papel e na
estruturação do espaço interno das cidades. Logo,o desenvolvimento industrial induz
mudanças significativas nas cidades assumindo o papel de comando na reprodução
espacial (CARLOS, 1989). Moreira (2003, p. 10), ao discutir o modelo industrial e o meio
ambiente, afirma:
Espaço de relações, o espaço industrial é por isso um todo a um só tempo
diferencial e articulado em rede, ordenado numa lógica de mercado, que,
por meio da técnica , se difunde e engravida o meio ambiente
profundamente.
32
Estamos nos referindo a um fenômeno que gera grandes aglomerações,
articulando e subordinando outras parcelas do espaço e extrapolando os limites do local
para se inter-relacionar com espaços mais amplos de modo a permitir a integração de
vastas áreas. No entanto, Carlos (1989) e Sampaio (1988) esclarecem que a indústria
capitalista moderna não depende necessariamente da existência de uma base urbana para
se instalar podendo buscar uma localização para além dos limites das cidades, inclusive ao
longo de rodovias ou zonas rurais. Existem também vários casos em que a implantação das
indústrias é que determinou a aceleração do processo urbano. A cidade de Volta Redonda é
um exemplo de como um projeto industrial (Companhia Siderúrgica Nacional) pode provocar
a gênese de um espaço urbano a ponto de interferir em sua estruturação interna
(MOREIRA, 2003).
Carlos (1989) comenta que as indústrias modernas, para se desenvolverem,
aproveitam ao máximo as vantagens proporcionadas pelas economias de aglomeração
enquanto socializam as desvantagens como os elevados índices de poluição e
congestionamentos viários. Desse modo, ao organizarem um arranjo espacial produtivo,
exclusivamente favorável à acumulação, acabam degradando o ambiente. Por isso, Moreira
(2003, p. 25) afirma que “não por mera coincidência, o mapa da acumulação e o das
degradações é o mesmo”.
Uma outra face dos impactos que atingem os espaços urbano-industriais tem
relação direta com a matriz energética adotada pelo modelo de desenvolvimento das
economias modernas. O consumo crescente de combustíveis fósseis (petróleo e carvão
mineral), indispensáveis ao funcionamento dos setores produtivos urbano-industriais, tem
agravado o problema da poluição nos países desenvolvidos e também nos países
subdesenvolvidos de industrialização tardia, com reflexos negativos locais e globais.
Brandão (2001, p. 51), ao discutir a urbanização como processo derivador do clima, ressalta
que, “ a partir do século XX, as atividades humanas tiveram atuação decisiva na mudança
de composição da atmosfera, sobretudo em função da atividade industrial”. Os aglomerados
de edificações conjugados com o domo de poluição urbana criam uma espécie de cúpula
climática, caracterizando a existência de um verdadeiro clima urbano (CAVALHEIRO, 1995
e BRANDÃO 2001). Os sistemas urbano-industriais apresentam elevada complexidade na
relação dos seus elementos constitutivos. As indústrias, a concentração dos edifícios, o
asfaltamento, trânsito intenso de veículos, o excesso de ruídos sonoros, a grande densidade
populacional,a impermeabilização dos solos, a diminuição da cobertura vegetal e todas as
atividades que liberam os poluentes primários (SO2, NOx, CO e materiais particulados)
acabam provocando alterações na composição química original da atmosfera, no seu
comportamento térmico e em sua dinâmica de circulação. A alteração do regime
pluviométrico, as freqüentes inundações de verão, as inversões térmicas no inverno e a
33
formação de “ilhas de calor” são as conseqüências mais diretas que afetam a qualidade de
vida das populações urbanas. Segundo Brandão (2001, p.56):
Os sistemas urbano-industriais caracterizam-se pelo incremento na sua
capacidade e transformação. Energia hidroelétrica, combustíveis fósseis,
matérias-primas, mão de obra
e água entram nas cidades sendo
metabolizados em bens e serviços; porém, os processos produtivos e a
urbanização geram, um ritmo acelerado, calor excedente, ruídos, gases e
partículas, despejos e resíduos não reciclados
nem biodegradados
rapidamente pela natureza, traduzindo-se na destruição dos recursos
naturais e na degradação do ambiente urbano.
Ab’ Saber (2003), discutindo a sociedade urbano-industrial e o metabolismo
urbano, comenta que o metabolismo dos grandes organismos urbanos se completa gerando
uma gama muito variada de subprodutos ou rejeitos (descartes) relacionados a processos
biológicos, produção industrial, atividades comerciais, circulação de veículos e atividades
que dão funcionalidade ao organismo urbano. Nessa abordagem o lixo é tratado como um
tipo obrigatório de descarte proveniente do metabolismo urbano de difícil solução numa
sociedade em que o consumismo virou uma espécie de regra geral. Logo, a escolha do sítio
mais apropriado para a postagem do lixo urbano (doméstico, industrial, hospitalar e entulhos
de construção civil) constitui objeto de preocupação permanente para as políticas de
saneamento básico em virtude da escassez (ou não existência) de locais seguros e da
natureza dos materiais e substâncias descartados que, em sua maioria, não são
biodegradáveis. A solução mais adequada seria o armazenamento do lixo em aterros
sanitários, situação que não ocorre na grande maioria das cidades brasileiras. No Brasil, a
escolha do local de postagem do lixo tem sido fortemente influenciada pelos interesses do
setor imobiliário que exerce pressão junto aos órgãos públicos para que se coloque os lixões
longe das áreas destinadas à especulação. Assim, as áreas destinadas a futuros
loteamentos residenciais não terão seus preços aviltados pela presença dos lixões. Isso
garante a margem de lucro dos especuladores. Por outro lado, os lixões serão instalados em
terrenos baldios nas proximidades das favelas ou bairros carentes. Para Ab’ Saber (2003),
tal escolha é socialmente injusta, pois privilegia o setor especulativo imobiliário em
detrimento das camadas sociais menos favorecidas.
Tratar o ambiente urbano como um organismo significa valorizar uma
abordagem sistêmica que contribua para a construção de um conhecimento objetivo da
dinâmica interna das cidades industriais. Para Ab’ Saber (2003), a emergência da
consciência ecológica contribuiu para uma mudança positiva no tratamento da ecologia
urbana. Para o autor, “a nova ecologia urbana compreende o estudo das formas de projeção
34
da sociedade e das funções econômico-sociais sobre o espaço e o ambiente das cidades,
envolvendo a funcionalidade do organismo urbano em todos os sentidos” (AB’ SABER,
2003, p. 55).
Quanto à gravidade dos impactos e suas implicações sociais, Brandão (2001)
comenta que é necessário considerar o nível de desenvolvimento econômico dos países.
Coelho (2001), ao defender a incorporação da estrutura de classes à análise dos impactos,
concorda com a tese de Brandão, pois argumenta que a vulnerabilidade aos efeitos
deletérios dos impactos ambientais está associada à situação socioeconômica da
população.
Os problemas ambientais não atingem, com a mesma intensidade, todo o
espaço urbano. O espaço físico das classes sociais menos favorecidas, em geral, são os
mais atingidos. Por isso Coelho (2001, p.37) afirma: “o mapeamento de impactos ambientais
certamente guardará estreita relação com a espacialização diferencial das classes sociais
na cidade”.
O estudo dos ambientes urbano-industriais tem se constituído num desafio para
os cientistas e planejadores por envolver uma realidade multidimensional, dinâmica e de
extrema complexidade, exigindo uma renovação, não só das técnicas, mas, principalmente,
dos instrumentais teórico-metodológicos. Acreditamos que, só através do conhecimento da
dinâmica de funcionamento dos espaços urbano-industriais, ou de seu metabolismo, é que
teremos condições de fornecer subsídios para uma política de ordenamento que minimize
as degradações ambientais. É desse modo que, nos próximos capítulos, estaremos
abordando, especificamente, a organização e a dinâmica de funcionamento do espaço
industrial de Cataguases para desvelar os impactos socioambientais.
CAPÍTULO 2 – A ANÁLISE DO PADRÃO DISPERSO DE LOCALIZAÇÃO URBANOINDUSTRIAL DE CATAGUASES (MG)
Desde o início do século XX, Cataguases sempre se destacou na economia
mineira como sendo uma cidade industrial. A disponibilidade de energia, mão de obra,
recursos hídricos, transporte ferroviário e rodoviário favoreceram o desenvolvimento das
indústrias e contribuíram para o processo de urbanização da cidade. Impulsionado por
esses fatores e pela ausência de uma política de zoneamento, o desenvolvimento urbanoindustrial de Cataguases obedeceu mais aos interesses logísticos das empresas, num
período que não existiam instrumentos normativos de política ambiental. Portanto, à medida
que a indústria se dispersava, o tecido urbano também se expandia. Esse processo
produziu um padrão urbano-industrial disperso que analisaremos neste capítulo.
2.1- Sítio urbano e posição de Cataguases
Localizada na “Zona da Mata” mineira (Mapa 1), Cataguases, assim como outras
cidades do sudeste brasileiro, se instalou nos domínios dos “Mares de Morros”,
aproveitando-se de um alvéolo para esquadrinhar seu traçado urbano inicial às margens do
rio Pomba, afluente do rio Paraíba do Sul (AB’ SABER, 2003; GUERRA, 1978). Inicialmente,
a cidade edificou-se e ocupou uma seção alargada do vale do rio Pomba (um alvéolo de
forma grosseiramente triangular com terraços) e, ao longo do processo de expansão urbana,
houve a necessidade de ocupar também as encostas dos morros, uma vez que o relevo em
torno do alvéolo possui fortes ondulações, características de um modelado formado
predominantemente por agrupamento de morros com vertentes policonvexas (AB’SABER,
2003 e CARDOSO, 1955). As formações rochosas da região de Cataguases são datadas do
Pré-Cambriano Inferior, fazendo parte do Grupo Paraíba (IGA, 1981). Predominam os
gnaisses e rochas metassedimentares. Os granitos, veios de quartzo e pegmatitos, também
são encontrados. Atuando sobre estas rochas do Complexo Cristalino, o intemperismo
químico favoreceu o surgimento de um espesso manto de alteração, típico da pedogênese
tropical. Nas partes mais baixas das vertentes predomina o latossolo vermelho-amarelo,
enquanto que nas várzeas ocorrem solos hidromórficos. Nos topos e nas partes mais
elevadas das vertentes ocorrem Neossolos Litólicos de coloração vermelho-amarelo
(LEPSCH, 2002; EMBRAPA, 1999).
36
37
Na caracterização morfoestrutural, a região de Cataguases faz parte dos
Planaltos Cristalinos rebaixados com nível altimétrico médio em torno de 300m (Mapa 2).
No entanto, alguns pontos da cidade se encontram em altitudes menores como é o caso da
Estação Ferroviária que registra 167m de altitude. Esse evidente desnivelamento altimétrico
possibilita o abastecimento de água na cidade por efeito gravimétrico. O relevo
movimentado com vários desníveis acentuados e a existência de uma boa rede de
drenagem possibilitaram a construção de hidrelétricas (PCH) na região, como a Usina
Maurício (Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina), construída no rio Novo, afluente
do rio Pomba.
A rede de drenagem do município é densa, possuindo como principais afluentes
do rio Pomba: o rio Novo, os córregos Pirapetinga, Canadá e Lava Pés; os ribeirões Passa
Cinco, Cágado e Meia Pataca. O rio Pomba descreve meandros e, em alguns trechos, corre
em vales abertos, cortando várzeas e, em outros trechos, ele corre em vales encaixados,
obedecendo a controles estruturais. Os vales de alguns desses córregos e ribeirões também
favoreceram a expansão urbana ao promover o alongamento contínuo do tecido urbano ou
produzir povoamentos isolados que acabaram se unindo ao núcleo central.
Com um regime fluvial tropical, a bacia do rio Pomba apresenta uma maior
vazão no verão e menor vazão no inverno. Em geral, as enchentes na cidade ocorrem no
verão, mas atingem, principalmente, os córregos. O rio Pomba, na maioria das vezes, não é
o causador direto das enchentes, mas quando o seu volume aumenta, acaba represando as
águas do ribeirão Meia Pataca que transborda, provocando inundações de setores da
cidade (CARDOSO, 1955).
Posicionada na Zona da Mata de Minas Gerais, Cataguases apresenta boa
capacidade de acesso por rodovias pavimentadas aos sistemas viários que atendem os
principais centros urbanos do Sudeste brasileiro (Mapa 3).
A cidade de Cataguases está localizada a 22 Km da rodovia Rio-Bahia (BR 116);
120 Km de Juiz de Fora (onde passa a BR 040); 320 Km de Belo Horizonte; 232 Km da
cidade do Rio de Janeiro. A cidade também se beneficia de uma ferrovia (antiga RFFSA,
hoje sob concessão da Central Atlântica, transportando minério de bauxita a serviço da
CBA) pela qual se conecta a Campos (RJ) e Três Rios (RJ). Portanto, o desenvolvimento
econômico de Cataguases sempre esteve ligado às facilidades de comunicação (rodovias e
ferrovia) com a região Sudeste, principal destino das mercadorias produzidas no município.
Foi através da ferrovia (inaugurada em 1877) e depois da rodovia Rio-Bahia (1939) que a
cidade recebeu, desde cedo, os insumos materiais e tecnológicos que alavancaram o
desenvolvimento industrial e incrementaram o comércio e os serviços em geral. Essas
mesmas facilidades de comunicação com o Sudeste trouxeram, no início do século XX,
38
39
Mapa 3 – Posição Geográfica de Cataguases
Fonte: IGA (1981)
fortes influências culturais para a cidade, possibilitando uma articulação entre a
industrialização e a produção cultural (Miranda e Baraçal, 1999). Cataguases ficou marcada
por uma intelectualidade modernista que se refletiu nas produções literárias (final dos anos
1920), nos modelos arquitetônicos e artes plásticas dos anos 1940. Miranda e Baraçal
(1999, p.12), ao discutirem a arquitetura e as artes plásticas no início do século XX, em
Cataguases, argumentaram que:
Nessa efervescência pode-se conceber a inquietação intelectual do grupo
que, ao findar a década de 1920, estimula a discussão modernista. Há em
Cataguases um substrato cultural e empresarial propulsor de novo surto
de modernidade, cerca de duas décadas adiante, na contramão da
desorganização do pós-guerra.
40
Cardoso (1955, p. 60) também confirma a situação de destaque que Cataguases
apresenta nos anos 1940 em relação às cidades da Zona da Mata ao afirmar que:
Graças principalmente à grande iniciativa particular de capitais locais, é que
Cataguases começa aos poucos a apresentar feições diferentes das demais
cidades da Zona da Mata, não só devido à formação de um pequeno
parque industrial como também em suas linhas arquitetônicas, o que
demonstra, sem dúvida, alto grau de adiantamento.
Com uma população de 63900 habitantes (IBGE,2000), Cataguases se destaca
no cenário econômico pela expressividade de suas indústrias (FIGUEIREDO e DINIZ, 2000).
Apresenta um quadro bastante diversificado de atividades industriais, no qual se destacam
as indústrias têxteis, químicas, metalúrgicas, fundição, papel, tipográficas, elétrica, extrativa
mineral, embalagens e alimentícias. Atualmente, em virtude do processo de globalização,
algumas indústrias como as têxteis e metalúrgicas já exportam seus produtos. No entanto,
essa favorável localização geográfica e meios de comunicação, que contribuem para
inserção da cidade numa economia cada vez mais globalizada, também favorece a
importação dos mais diversos produtos. Esse cenário tem forçado as indústrias
cataguasenses
a
se
reestruturarem
para
sobreviverem
num
ambiente
de
forte
competitividade. A expressividade do comércio e setor de serviços contribui para que a
cidade exerça uma polarização em nível da microrregião, atingindo os municípios de
Argirita, Recreio, Pirapetinga, Astolfo Dutra, Dona Euzébia, Piraúba, Itamarati, Laranjal,
Miraí, Santana e os distritos de Cataguarino, Sereno e Vista Alegre. Classificada pelo IGA
(1981) como centro microrregional (Mapa 4 e 5), Cataguases se subordina hierarquicamente
ao Centro Macrorregional de Juiz de Fora que, por sua vez, exerce forte polarização sobre
toda a mesorregião da Zona da Mata.
No contexto geral, o Estado de Minas Gerais sempre apresentou desníveis
econômicos regionais. Em recente estudo sobre a distribuição regional da indústria mineira,
Figueiredo e Diniz (2000) classificaram a mesorregião Zona da Mata como área estagnada
ou de lento crescimento. Nesse caso, atualmente, a microrregião de Cataguases também se
enquadra nessa classificação. O mesmo estudo esclarece, no entanto, que a estagnação
econômica não se deve a fatores clássicos (distância de mercados consumidores, infraestrutura, transportes, energia, acesso a centros tecnológicos ou serviços urbanos), mas às
41
42
apa 5
43
estruturas sociais, políticas, gerenciais (métodos de gestão empresarial superados) e
econômicas consolidadas, cuja rigidez não permite uma reestruturação produtiva compatível
com as novas tendências em curso. Os autores também colocam que o menor crescimento
da economia do Estado do Rio de Janeiro reflete nas microrregiões mineiras polarizadas
pelo mesmo. Podemos exemplificar, com o caso do transporte ferroviário. Até a década de
1980 a RFFSA conectava intensamente Cataguases com outras cidades do interior de
Minas (até Ponte Nova) e com o Rio de Janeiro, transportando uma gama variada de
produtos. Atualmente, o ramal ferroviário funciona exclusivamente até Cataguases, mas o
único produto transportado é a bauxita que segue até Sorocaba (São Paulo), usando o Rio
de Janeiro somente para transbordamento do minério para vagões maiores. Portanto, pela
ferrovia, Cataguases relaciona-se exclusivamente com São Paulo, comprador da Bauxita
produzida na Zona da Mata. Obviamente as relações com o Rio de Janeiro continuam
existindo, através do transporte rodoviário, mas a relação com São Paulo e outros Estados
se ampliaram, colocando Cataguases numa rede mais ampla de relações.
Fica patente que uma boa localização frente a fatores clássicos, anteriormente
listados, não garante um ritmo dinâmico de crescimento econômico, pois as profundas
transformações por que tem passado a economia mundial, impactam as economias locais,
exigindo destas, novas posturas frente às necessidades da acumulação capitalista. Segundo
Santos (1996, p.205), “os espaços da globalização apresentam cargas diferentes de
conteúdo técnico, de conteúdo informacional, de conteúdo comunicacional”. Essa
diferenciação da densidade e do conteúdo técnico dos lugares acaba alterando a lógica e o
padrão de localização dos equipamentos produtivos, acentuando as diferenças espaciais.
Por outro lado, a globalização, as privatizações, a desregulamentação dos mercados, a
“guerra fiscal” e a crise fiscal do Estado diminuem a capacidade de investimentos públicos
em infra-estrutura e recursos para as indústrias e regiões que foram menos favorecidas, ou
excluídas dessa nova ordem. As grandes corporações são os grandes atores hegemônicos
que, com suas verticalidades, comandam a emergência de uma mais-valia mundial. Essa
nova estrutura de comando segmenta o território. Os lugares mais ativos serão aqueles que
reúnem condições de atender as exigências impostas pelo mercado mundial. Santos (2001,
p.106) comenta que “as novas vocações regionais são amiúde produtoras de alienação,
pela pressão da ordem global sobre as populações locais”. Segundo Castells (1999, p. 159),
a arquitetura da economia global apresenta um mundo assimétrico
interdependente, organizado em torno de três regiões econômicas principais
e cada vez mais polarizado ao longo de um eixo de oposição entre as áreas
prósperas produtivas e ricas em informação, e as áreas empobrecidas,
sem valor econômico, e atingidas pela exclusão social.
Nesse quadro de economia cada vez mais competitiva e globalizada, a crise
44
(estagnação econômica) é um risco constante. Portanto, novos caminhos precisam ser
descobertos para revitalizar a economia da Zona da Mata e em especial da microrregião de
Cataguases. A ação governamental pode ser decisiva como desencadeadora de um efeito
que possa dinamizar a região estagnada, promovendo sua integração produtiva com outras
regiões do Estado e do país.
Se sítio e posição não são os únicos fatores fundamentais diante dos reclames
de novos padrões produtivos de localização industrial, vejamos de que maneira outros
fatores fazem parte do processo de evolução urbano-industrial de Cataguases.
2.2- A evolução urbana e industrial de Cataguases
A origem da cidade de Cataguases está relacionada ao projeto de abertura de
uma estrada na década de 1820 com o objetivo de ligar a província de Minas Gerais aos
campos de Goitacazes, aproveitando o vale do Rio Pomba. A obra estava sob
responsabilidade técnica da Terceira Divisão Militar do Rio Doce que havia se aquartelada
numa pequena localidade, na margem esquerda do rio Pomba. Em 1828, o então Coronel
Comandante das Divisões Militares do Rio Doce, Guido Thomaz Marlière, em visita de
inspeção aos trabalhos da estrada, recebe, em nome do governador da província, um
terreno onde é construída uma capela em homenagem a Santa Rita de Cássia. Nessa
localidade, que até então se chamava Porto dos Diamantes, foi fundado um povoado com o
nome de arraial de Santa Rita do Meia Pataca ou, arraial do Meia Pataca (COSTA, 1977 ;
CARDOSO, 1955). Esse nascente povoado se instalava no entorno da capela com algumas
choupanas que serviam, durante muito tempo, de apoio logístico aos tropeiros (pouso de
tropas).
Segundo Cardoso (1955, p. 44), nessa mesma época de fundação, o governo da
província ditou regras especiais para as futuras edificações, “ a fim de que se formasse um
povoamento bem regular”. Essas regras foram determinantes para a geometria do traçado
urbano do núcleo central como demonstra o mapa 6 sobre a evolução da cidade de
Cataguases (CARDOSO, 1955, p. 47). Nele se percebem as formas retilíneas das ruas e
cruzamentos em ângulos retos do traçado urbano original anterior a 1890. Esse traçado
geométrico regular passa a orientar a evolução urbana, à medida que a economia se
desenvolve.
Após 1830 a cultura cafeeira chega à Zona da Mata provocando mudanças
importantes na vida do arraial do Meia Pataca. Nessa época começa a aumentar o número de
fazendas de café na região gerando impactos sem precedentes na economia e no ambiente.
45
Intensifica-se a abertura de novos caminhos e estradas impulsionando o povoado que passa a
se configurar como um centro de comércio (casas comerciais) para atender às necessidades
dos fazendeiros da região (IGA, 1981). Em 1854, o arraial passa a integrar o município de
Leopoldina. O progresso proporcionado pela cultura do café e o desenvolvimento do comércio
foram decisivos para elevar o arraial à categoria de vila, constituindo sede de um município que
abrangia as freguesias mais próximas. Assim, em 1875, o arraial separa-se da comarca de
Leopoldina e a vila e o município recebem o nome de Cataguases, oficialmente instalados em 7
de setembro de 1877. No mesmo ano em que o arraial é elevado à categoria de vila, inaugurase a Estrada de Ferro Leopoldina conectando Cataguases com o Estado do Rio de Janeiro. A
vila de Cataguases assume a posição de linha-tronco, sendo “ponta de trilhos”, polarizando uma
grande área e ampliando sua função de centro comercial. Grande parte da produção do café da
região era escoada para o porto da cidade do Rio de Janeiro pela estação ferroviária de
Cataguases. Diante das novas perspectivas, Cataguases atraía comerciantes e algumas
indústrias pequenas como os engenhos para beneficiamento de café, fábricas de bebidas e
sabão (CARDOSO, 1955).
Mapa 6
Fonte: CARDOSO (1955)
46
Em 1881, pela Lei Provincial no 2776, a vila de Cataguases é elevada à
categoria de cidade. (IBGE/CNG, 1958)
O avanço da linha férrea para o interior de Minas Gerais tirou Cataguases da
situação de “ponta de trilhos”, mas não interrompeu o progresso da cidade que se firmava
cada vez mais como praça comercial bastante movimentada. Localizada fora do centro
comercial (Praça Rui Barbosa – antigo Largo do Comércio), a estação ferroviária contribuiu
para o expansão do tecido urbano, pois as casas comerciais começaram a se instalar
próximas à estação, principalmente o comércio atacadista. Segundo Miranda e Baraçal
(1999, p. 5), “a trama urbana sofre um deslocamento imediato, puxada para dentro do vale
pela Estação, que torna-se o novo elemento polarizador de todo o movimento. Uma intensa
atividade construtiva corresponde à nova realidade econômico-social”.
O início do século XX parece promissor e, em 1905, é organizada a primeira
indústria têxtil de maior porte da cidade. Trata-se da Cia de Fiação e Tecelagem de
Algodão. Segundo Costa (1977, p. 297), “a fábrica foi inaugurada com 20 teares, dos mais
modernos da época, fabricado na Inglaterra. A maquinaria era, inicialmente, movida por um
motor a vapor de 8 HP que, depois, foi substituído por um motor elétrico de 20 HP. E é
nessa mesma época, precisamente em julho de 1908, que Cataguases assegura o
crescimento industrial com a inauguração da energia elétrica na cidade pela Cia. Força e
Luz Cataguases Leopoldina, empresa que, atualmente, é responsável por 100% do
fornecimento de energia para a cidade e grande parte dos municípios da Zona da Mata. No
Brasil, segundo Suzigan (2000, p. 127), “a transição para a energia de origem hidrelétrica
começou nas décadas de 1900 e 1910, especialmente no Rio de Janeiro e São Paulo”.
Logo, Cataguases seria uma das poucas exceções em Minas Gerais, sendo que o acesso à
energia elétrica antes da Primeira Guerra contribuiu para colocar a cidade em condições
estruturais vantajosas.
Apesar de o café ainda ser a atividade econômica principal, em 1911,
Cataguases já apresentava um emergente processo de industrialização, cujos produtos
atendiam as demandas locais e da região (Quadro 3).
47
Quadro 3 - Quadro Industrial de Cataguases
Ano: 1908
Ano: 1911
Tipo de Indústria
Quantidade
Tipo de Indústria
Quantidade
Fábrica de tecido
1
Fábrica de tecido
4
de meias
2
Fábrica de meias
0
de macarrão
1
Fábrica de macarrão
0
de cerveja
1
Fábrica de cerveja
1
de bebida alcoólica
1
Fábrica de bebida alcoólica
0
de sabão
1
Fábrica de sabão
0
de açúcar
2
de açúcar
1
Tinturaria
1
Tinturaria
0
Serraria
0
Serraria
1
Alimentícias
0
Alimentícias
2
de cerâmica
0
de cerâmica
2
de moagem de cereais
0
de moagem de cereais
1
de laticínios
0
de laticínios
2
de beneficiamento de café
0
de beneficiamento de café
2
Fonte: Ávila (1999, p.17) e Cardoso (1955, p.56)
Predominavam indústrias de bens de consumo corrente, mas já se podia notar
que a indústria têxtil, com quatro fábricas, começava a se firmar como ramo base do setor.
Até a década de 1930, o crescimento da cidade restringia-se ao alvéolo (sítio
inicial do povoamento) do rio Pomba em sua margem esquerda, estendendo o tecido urbano
até a Estação Ferroviária, onde ocorria um intenso movimento comercial. Mas, a partir
desse período, a cidade começava a se subordinar aos vales do ribeirão Meia Pataca e
córrego Lava-Pés. No entanto, esgotadas as possibilidades de ocupação do alvéolo, as
encostas dos morros também surgiam como alternativas de ocupação.
A decadência do café, no início do século XX e a crise de 1929, inicia um
período de transição. Aproveitando uma boa infra-estrutura já existente (ferrovia, energia
elétrica e comércio) a cidade assume seu perfil industrial. Em 1936, ocupando pela primeira
vez o terraço da margem direita do rio Pomba, instala-se outra grande indústria têxtil – Cia.
Industrial Cataguases. Essa indústria foi determinante para o processo de urbanização da
margem direita, pois acompanhando a construção de uma vila operária, surgem dois bairros:
Vila Minalda e Vila Tereza, também ocupados por operários. Nessa época, mais
precisamente em 1939, a rodovia Rio-Bahia (BR116) chega à Leopoldina, distante 21 Km de
48
Cataguases. Para Cardoso (1955) a estrada de rodagem começa a provocar uma mudança
importante no sistema de comunicação – de ferrovia para rodovia – com o caminhão
despontando como o principal meio de transporte. Se a ferrovia conectava exclusivamente
Cataguases ao Rio de Janeiro, a rodovia representava uma ampliação das possibilidades de
conexões. Como afirmam Estall e Buchanan (1976, p. 46) “a utilização eficiente do
transporte rodoviário permite que a entrega seja mais intimamente coordenada com a
produção, podendo o fabricante tratar a rodovia como parte virtual do seu sistema de
esteira transportadora”.
As casas comerciais tanto varejistas como atacadistas podem mais facilmente
estabelecer contatos com São Paulo e Belo Horizonte. Cardoso (1955) ressalta que a
depressão econômica e o “cansaço da terra” contribuíram para o êxodo rural: “os campos e
fazendas foram abandonados e os capitais, que até então eram empregados nas atividade
rurais, passaram a ser empregados na cidade” (CARDOSO, 1955, p. 56). O êxodo rural
também fornecia a mão de obra que era absorvida nas indústrias.
A década de 1940, com a instalação de mais uma grande indústria têxtil (Cia
Manufatora de Fio de Algodão), registra-se a ampliação do quadro industrial com um novo
impacto na trama urbana (Quadro 4).
Quadro 4 - Quadro Industrial de Cataguases (1952)
Tipo de Indústria
Quantidade
fábricas de fiação e tecelagem
4
de algodão hidrófilo
1
Usina de açúcar
1
de massas alimentícias
2
de bala (doces)
1
de aguardente
2
de pregos
3
de azulejos
1
de ladrilhos
1
de móveis
5
de telhas e tijolos
1
serrarias
4
pedreiras
2
de malas
2
de beneficiamento de arroz
2
de beneficiamento de café
2
Fonte: CARDOSO (1955, p. 56)
49
As empresas começavam a se afastar do núcleo central e a gerar um padrão mais
disperso, inclusive algumas empregavam mão de obra residente em suas vilas operárias,
construídas junto às fábricas. Assim, além da Cia Manufatora de Fio de Algodão (1943), a Cia.
Mineira de Papéis (1954), a Fábrica de Papelão Cataguases (1957), a Fundição Cataguases
(1958) e a Indústrias Químicas Cataguases Ltda (1961) são indústrias que se alojaram mais
distantes da área central da cidade em busca de mais espaço para suas plantas. O padrão
locacional intra-urbano, que era respaldado pelas economias de aglomeração, dá lugar a uma
nova lógica com as indústrias se afastando das áreas centrais À medida que essas indústrias se
instalavam, surgiam outras atividades complementares indispensáveis ao processo (comércio,
serviços, oficinas, restaurantes, firmas transportadoras). Por outro lado, o poder público tratava
de melhorar o acesso viário a essas novas fábricas (ruas pavimentadas, rede elétrica, água
encanada), estimulando a incorporação dessas áreas ao tecido urbano. Assim, a cidade se
expandia tendo as indústrias como catalizadores. Segundo o IGA (1981), tratava-se de uma
dispersão relativa, ou um padrão mais ou menos disperso, pois a maioria dos grandes
estabelecimentos se instalava ao longo do vale do ribeirão Meia Pataca.
A partir da década de 1970, a organização do espaço industrial da cidade começa
a obedecer a um padrão concentrado, fruto de um política de deslocamentos dirigidos ou
planejados (SAMPAIO, 1988). O congestionamento das áreas urbanas centrais e a falta
generalizada de espaço, forçaram a Prefeitura, através de Lei Municipal, a criar o Distrito
Industrial de Cataguases em 1971. Acompanhando a tendência de desconcentração, o DI se
instalou a 3 Km do centro da cidade em área de antigo imóvel rural, margeando a antiga estrada
que ligava Cataguases a Leopoldina, na margem direita do Rio Pomba (COSTA, 1977). Esse
novo padrão espacial caracteriza-do pela ”periferização concentrada” das indústrias cria um
novo eixo de urbanização, induzindo a expansão linear do tecido urbano do centro até o DI, pela
margem direita do rio Pomba. A implantação, de infra-estrutura de acesso, por parte da
Prefeitura, melhorou a conexão entre o DI e o núcleo central da cidade, favorecendo o
surgimento de novos bairros como o Beira Rio, Paraíso e Santa Clara. Dentro da área do DI a
Prefeitura autorizou a construção de um conjunto habitacional que hoje se chama bairro
Taquara Preta.
Segundo o IBGE (1980), em Cataguases havia 127 indústrias em 1980: têxtil (07);
alimentícia (33); móveis (13); papel, celulose e papelão (02); extrativismo mineral (06);utensílios
domésticos (08); energia elétrica (01); construção civil (09); química (01); madeiras (07);
fundição (03); metalúrgica (01); bombas hidráulicas (01); mancais (01); calçados (04);
serralheria (04); confecções (06); peças para indústrias (04); construção civil (08); tipográficas
(07) e plásticos (01). Dessas 127 indústrias, o DI alocava, em 1980, 10 grandes empresas, que
se instalaram na década de 1970. Obviamente, podia-se inferir que várias pequenas indústrias
50
ainda se instalavam fora do DI, obedecendo ao antigo padrão disperso, porém, intra-urbano. Em
geral, são pequenas e micro empresas (marcenarias, serralherias, oficinas de usinagem de
peças, confecções, tipografias, utensílios domésticos) que geram baixo impacto ambiental,
consomem pouco espaço e se instalam nos bairros residenciais ,aproveitando mão de obra
local. O DI estava destinado a receber empresas de maior porte.
Em 2001, segundo o IBGE e dados da Assembléia Legislativa de Minas Gerais,
Cataguases contava com 317 indústrias representadas nos seguintes ramos: confecções
de artigos de vestuário, extrativismo mineral metálico, extrativismo mineral não metálico,
fundição, fábrica de artigos de borrachas e pláticos, embalagens de papelão, mecânicas,
móveis, alimentícias, produtos de madeira, química, têxtil, metalúrgica, construção civil,
tipográficas, serralheria, energia elétrica, papel, desinfetante, calçados, sacolas plásticas,
tipográficas. Das 317 indústrias, atualmente , conforme pesquisa de campo realizada em
julho de 2005, 26 indústrias estão instaladas na área do DI. As demais se encontram
dispersas pela cidade, sendo, em sua maioria, pequenas e micro empresas. De fato as
indústrias aumentaram em número, mas mantiveram o mesmo nível de diversificação
industrial.
Cataguases apresenta elevado percentual de população urbana (94,53%),
acima do percentual nacional, que é de 83 % (IBGE, 2000), demonstrando a importância e o
peso dos setores urbanos na economia da cidade (Quadro 5).
Quadro 5 - Cataguases: população residente
Ano
1970
Urbana
33.434
Rural
10.493
Total
43.927
Percentual
urbano
76,11
1980
43.106
7.095
50.201
85,86
1991
53.439
4.728
58.167
91,87
1996
58.132
3.832
61.964
93,81
2000
60.482
3.498
63.980
94,53
Fonte: Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e IBGE.
Quanto à distribuição da PEA, o quadro 6 demonstra que 7457 trabalhadores
estavam empregados no setor industrial (Secundário). Isso significa 32% da PEA e reafirma
o peso das indústrias no setor produtivo da economia, caracterizando Cataguases como
uma cidade industrial.
51
Quadro 6 - Cataguases: população ocupada por setores econômicos (2000)
Setores
Nº de pessoas
Agropecuário, extração vegetal e pesca
1.199
Industrial
7.457
Comércio e mercadorias
4.367
Serviços
10.387
Total
23.410
Fonte: IBGE (2000)
Para
Manzagol
(1985),
a
urbanização
está
diretamente
associada
à
industrialização. Na mesma linha de raciocínio, Carlos (1989, p. 46) afirma que, “com a
industrialização, a urbanização experimenta um impulso considerável a ponto de constituirse num aspecto indissociável dela”. Sendo assim, podemos considerar que a atividade
industrial é predominantemente urbana. Mesmo levando em conta que existe uma tendência
recente de desconcentração industrial por deslocamento espontâneo ou dirigido (planejado),
a indústria ainda possui papel importante na estruturação e dinâmica do sistema urbano. No
caso de Cataguases isso ficou bastante evidente, pois à medida que as indústrias se
afastavam do núcleo central, acabavam contribuindo para o crescimento do tecido urbano,
tornando a relação indústria-cidade mais diversificada e complexa.
2.3 - A organização do espaço industrial disperso de Cataguases
O padrão disperso foi a primeira forma de organização espacial das indústrias de
Cataguases. Começou a se estruturar a partir da primeira década do século XX e se
estendeu até o início dos anos 1970. Condicionado pela ausência de uma política de
zoneamento urbano, trouxe como conseqüências a expansão do tecido urbano, o
desenvolvimento de atividades econômicas correlatas e problemas ambientais diversos.
Torna-se, portanto, fundamental uma análise da organização espacial do padrão disperso
para uma melhor compreensão de sua dimensão geográfica, estrutura e procedimentos
tecnológicos.
52
2.3.1- Padrão urbano-industrial disperso: uma proposta de definição
Espaço industrial, enquanto recorte geográfico, é produto e condição de práticas
sociais. Na cidade, o espaço industrial não envolve apenas a fábrica. As práticas de
produção industrial articulam os recursos naturais, os bairros, as estradas, os serviços de
apoio técnico, energia, comunicações, sistema bancário e relação com outras indústrias e o
poder público. Desse modo, o espaço industrial demanda uma rede socioespacial e produz
outra para si próprio. Logo, em área de ocupação urbana preexistente a atividade industrial
resulta de pré-condições de um espaço geográfico em que fatores locacionais se
apresentam, de modo a influenciar a decisão empresarial. Neste sentido, a atividade
industrial dispersa em uma área urbana é constituída por uma trama de ações que integra
escalas geográficas diversas e por um arranjo de objetos que é apropriado e funcional à
dinâmica de reprodução do capital industrial, tais como a existência de mão-de-obra (capital
humano),
matérias-primas,
mercado
consumidor,
logística
de
transporte,
energia,
comunicações, incentivos fiscais, etc. Assim sendo, em alguns casos, não podemos tomar o
espaço industrial como uma unidade espacial dissociada do espaço urbano, visto que a
atividade industrial é uma das formas de fragmentação e estruturação interna da cidade. Se
o espaço urbano é o pano de fundo à prática industrial, o padrão industrial disperso é
condicionado pela ausência de um zoneamento urbano ou pela própria atividade industrial
preexistente, que influencia a decisão ou não de novos investimentos industriais. De um
certo modo, o padrão industrial disperso decorre de decisões individuais planejadas frente a
interesses logísticos da empresa, bem como do arranjo de ações e objetos que a cidade
possua. Por outro lado, tal arranjo também pode significar práticas de relocalização
industrial se houver deseconomias de aglomerações presentes na cidade. Além disso, a
expansão urbana e industrial pode se constituir um único processo em que tanto a indústria
condiciona a extensão do tecido urbano quanto a cidade influencia a atração de indústrias.
Em linhas gerais, sítio e posição são fatores fundamentais à logística de instalação
de indústria numa área urbana. Além disso, alguns fatores weberianos (mão-de-obra, matériaprima, mercado e transporte) ainda são elementos considerados na decisão empresarial. Logo,
o padrão industrial disperso constitui um arranjo de indústrias distribuídas no tecido urbano em
função de tais requisitos locacionais e da dinâmica interna da cidade. Se o padrão é disperso, a
tipologia da indústria é, normalmente, diversificada e condicionada pela geografia física da
cidade e pelas formas de ocupação e disponibilidade de áreas para os requisitos locacionais da
empresa. Enfim, tal padrão corresponde a uma organização espacial de indústrias, a partir de
decisões próprias dos empresários em face da dinâmica do capital e do papel do Estado em
53
suas diversas escalas (federal, estadual e municipal).
Vale lembrar que, a dispersão das indústrias no interior da cidade não é
necessariamente uma decisão tomada pelo capital transformado em sujeito racional. Em
grande medida, o padrão resulta do nível geral e desigual de desenvolvimento das forças
produtivas e das diferentes relações inter e intra-setores e o poder público em geral. Assim,
a diferente distribuição de fatores como energia, incentivos fiscais, informação,
disponibilidade de terrenos, meios de comunicação e força de trabalho têm importância
central para as possibilidades de concentração ou dispersão.
O padrão disperso da indústria na cidade constitui uma geografia complexa em
que se incluem a busca pelo melhor sítio e posição e as tramas sociais, econômicas,
políticas e ideológico-culturais envolvidas com o processo de reprodução do capital. Neste
cenário, a decisão racional dos empresários de se localizar em determinada parte da cidade
não é o único fator principal. Isso porque muitas prefeituras através do zoneamento urbano
determinam as áreas destinadas à indústrias. Além disso, o perfil ideológico do Estado e
suas práticas de estímulo à indústria também contribuem para uma configuração singular do
espaço industrial de uma cidade.
Em resumo, pode-se definir o padrão industrial disperso como uma distribuição
desigual da indústria no espaço urbano, a partir dos seguintes fatores, a saber:
1
-
Da
geografia
física
da
cidade:
recursos
naturais,
geomorfologia,
disponibilidade de terrenos, etc;
2 - Da ausência ou presença de zoneamento urbano;
3 - Da posição da indústria em relação às redes de circulação (rodovias,
ferrovias, portos, aeroportos, energia, telecomunicações, sistema bancário, etc);
4 - Da própria dinâmica interna da cidade, que pode provocar práticas de atração
industrial.
Finalmente, demais fatores como incentivos fiscais, presença de mão-de-obra,
mercado consumidor, matérias-primas, etc podem contribuir tanto para a concentração
(caso dos distritos industriais), quanto para a dispersão no tecido urbano.
2.3.2 A dimensão geográfica das indústrias dispersas na cidade de Cataguases
O padrão disperso que caracteriza o primeiro arranjo espacial produtivo da
atividade industrial de Cataguases resulta de uma complexa interação entre diversos
54
fatores. A cidade começou a se estruturar ocupando primeiramente os terraços mais amplos
e parte das planícies de inundações formatando um tecido urbano, cujo arranjo e
funcionalidade influenciaram nas decisões locacionais tomadas pelos primeiros empresários
industriais. As primeiras indústrias, ainda na segunda metade do século XIX, eram de
pequeno porte e se localizavam na margem esquerda do rio Pomba, buscando uma maior
proximidade com o centro comercial. Eram pequenos estabelecimentos de beneficiamento
de café, produção de bebidas (cerveja), sabão, açúcar (rapadura), forjarias, cuja finalidade
era atender as demandas locais de consumo. As indústrias de maior porte só começaram a
se instalar no início do século XX (a partir de 1905), também na margem esquerda do rio
Pomba, principalmente ao longo da bacia do ribeirão Meia Pataca (afluente de margem
esquerda do rio Pomba), aproveitando a disponibilidade de amplos terrenos de baixos
custos, planos e a facilidade de obtenção de água para os processos produtivos. Essa
localização também coincidia com a rua e a linha férrea que acompanhavam o ribeirão Meia
Pataca, desde a estação ferroviária até a saída da cidade em direção a Miraí (IGA, 1981). A
margem direita do rio Pomba, no setor próximo ao núcleo central da cidade, por apresentar
terraços mais estreitos, somente recebeu uma grande indústria em 1936, sendo necessário
intensa movimentação de terra. Segundo Ab’ Saber (2003), o domínio dos “mares de
morros” constitui o meio físico e paisagístico, onde é difícil encontrar sítios favoráveis a
parques industriais avantajados. Em estudo geomorfológico sobre Cataguases, o IGA (1981)
confirma a tese de Ab’ Saber ao afirmar que o rio Pomba passa por trechos com vales mais
abertos (amplas várzeas) e trechos com vales mais encaixados. Portanto, é de se esperar
que o sítio do município, ao não favorecer as grandes aglomerações industriais, contribua
para uma maior dispersão das unidades produtivas.
A instalação dos grandes estabelecimentos próximos dos principais cursos
d’água garantia o uso da água como recurso e também como destino final dos efluentes
líquidos não tratados. Prática muito comum até o final dos anos 1980, quando a atuação de
órgãos ambientais oficiais (federal e estadual) passou a exigir uma maior adequação das
grandes empresas às legislações ambientais. Essas empresas passaram a tratar os
efluentes, através das ETEs (Estação de Tratamento de Efluentes), antes de lançá-los nos
cursos d’água. É o caso das grandes indústrias têxteis e da fábrica de papel, que utilizam
grandes quantidades de água. As grandes indústrias de Cataguases que caracterizam o
padrão disperso são também as mais antigas e não tiveram suas instalações influenciadas
por um zoneamento urbano. As decisões para instalação eram tomadas considerando, além
dos fatores de ordem física (sítio / tamanho da área física disponível), a preexistência ou
facilidade de acesso aos sistemas viários (rodovias / ferrovia), energia, comércio e mão de
obra. Um grande exemplo foi a instalação em 1905 da primeira grande indústria têxtil Indústria Irmãos Peixotos S A, distante aproximadamente 100 metros da estação ferroviária.
55
Além de terreno plano e proximidade do ribeirão Meia Pataca, essa indústria pioneira
buscava uma melhor localização, uma vez que, nessa época, o entorno da estação
ferroviária se consolidava como centro comercial ativo. As demais indústrias também
obedeciam à mesma lógica, porém com uma tendência ao distanciamento do centro
comercial, cujo crescimento diminuía e tornava mais caro os espaços físicos para novas
indústrias. Segundo Cardoso (1955, p 54),
a análise da planta funcional da cidade mostra a existência de várias
fábricas formando um pequeno parque industrial, estando a maior parte
localizada nos extremos da cidade. Este fato é perfeitamente explicável,
pois os estabelecimentos industriais precisando, em geral, de muito espaço,
procuraram a periferia da cidade, pois, no centro, a ocupação muito antiga
já absorvera todas as áreas disponíveis; além disto, os terrenos estão muito
valorizados.
Desse modo, o vale do ribeirão Meia Pataca tornou-se o eixo preferencial para
instalação das grandes indústrias, desde o início do século XX até o final dos anos 1950.
Como exemplo, temos as instalações da Cia Manufatora de Tecidos de Algodão em 1943 e
Cia Mineira de Papéis em 1954. A exceção ocorreu com a Cia Industrial Cataguases (têxtil)
e sua respectiva vila de operários (Bairro Jardim), que desde 1936, já havia se instalado e
ocupado os estreitos terraços da margem direita do rio Pomba e a encosta do morro
adjacente. Na margem direita, o povoamento já havia começado, na primeira década do
século XX, na Vila Tereza. Depois, na Vila Minalda, no início dos anos 1930. A chegada da
Cia Industrial Cataguases com sua vila operária expandiu ainda mais o tecido urbano e
transformou a margem direita do rio Pomba em uma zona proletária (CARDOSO, 1955).
Contudo, a dispersão se fazia sem grandes problemas, uma vez que existiam novos
terrenos com baixos custos e as vias de acesso garantiam ligação das novas indústrias com
o centro da cidade, onde se localizava o comércio e a estação ferroviária. Portanto, a
circulação não ficava comprometida.
A chegada da energia elétrica à cidade foi outro fator infra-estrutural importante.
Com sede administrativa e foro jurídico em Cataguases, é organizada, em 1905, a
Companhia Força e Luz Cataguazes-Leopoldina (CFLCL). A primeira usina geradora (Usina
Maurício) construída utilizava as águas do rio Novo (afluente do rio Pomba), em área
correspondente à jurisdição do município de Leopoldina. Os equipamentos entraram em
operação em 1908, fornecendo, inicialmente, energia para quatro cidades: Cataguases,
Leopoldina, São João Nepomuceno e Rio Novo (COSTA, 1977). Mas antes da unidade
geradora entrar em operação, a CFLCL registrou-se na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro
56
em 1907. A CFLCL foi a terceira S/A a obter registro na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.
Esse procedimento fortaleceu a relação da empresa com a economia de mercado
emergente e o vínculo com seus acionistas (AVE LUZ, 2005). É importante constatar que,
até esse período, segundo Suzigan (2000), a quase totalidade das indústrias têxteis do
Brasil funcionava utilizando força hidráulica ou a vapor. Ter acesso a energia elétrica, nessa
época, representava uma revolução técnica para os estabelecimentos industriais,
eliminando também os custos com a importação do carvão para usos nos maquinários a
vapor. O ingresso na geração da energia elétrica ajudava Cataguases a se consolidar como
área promissora para os investimentos no setor industrial, pois a partir dessa época podiase garantir a chegada da energia elétrica nos mais diversos pontos do município.
Atualmente, o município de Cataguases possui sua demanda energética plenamente
atendida e com possibilidades de garantir o fornecimento de eletricidade para novos
empreendimentos. A CFLCL, desde sua fundação, passou por diversas expansões,
modernizações tecnológicas, novas associações e incorporações que acabaram ampliando
a área de concessão (mapa 7). Outro marco estratégico da empresa foi a construção da
primeira usina termelétrica a gás natural de Minas Gerais. Trata-se da Usina Termelétrica de
Juiz de Fora (UTEJF) de 82 MW de potência, construída pela Cat Leo Energia S/A em
associação com a Alliant Energy (empresa norte-americana) em 2001. Na área ambiental, a
CFLCL criou duas RPPN (Reserva Particular do Patrimônio Natural): a RPPN Usina
Maurício com 313 hectares e a RPPN Usina Coronel Domiciano com 212 hectares. Ambas
possuem reconhecimentos do IBAMA e IEF (Instituto Estadual de Floresta). Na área cultural,
a empresa, através da Fundação Cultural Ormeo Junqueira Botelho, criou o Museu da
Eletricidade, o CTM (Centro das Tradições Mineiras) e os projetos Usina Cultural e Café
com Pão Arte e Confusão (AVE LUZ, 2005). Ambos nas áreas de educação e valorização
da cultura e da arte.
57
Mapa 7 - Área de Concessão da CFLCL e de Outras Concessionárias do
Sistema Cataguases-Leopoldina (2005)
FONTE: http://www.cenf.com.br/html/infcorpl.htm
Um outro dado importante que impactou significativamente a organização do
espaço industrial e a economia de Cataguases foi a chegada da estrada Rio-Bahia (hoje BR
– 116) em Leopoldina (cidade distante 20 Km de Cataguases) em 1939. Até essa data, a
ferrovia era quem, na verdade, garantia o desenvolvimento das indústrias, uma vez que as
matérias-primas, os insumos e os maquinários chegavam de trem. O que era produzido na
cidade e entorno também saia de trem tendo como destino principal o Rio de Janeiro. Desse
modo, durante toda a primeira metade do século XX, as indústrias que se instalavam fora da
área central procuravam se alojar próximas ao eixo ferroviário, ou criar esquemas de acesso
facilitado à estação ferroviária. Com a chegada da rodovia Rio – Bahia em Leopoldina, o
transporte rodoviário significou uma nova opção que gradativamente foi ganhando forma e
estimulando aberturas de estradas secundárias na região. Aos poucos o trem dava lugar ao
caminhão, que passaria a constituir o principal meio de transporte da produção,
principalmente depois da pavimentação da estrada que ligava Cataguases à BR – 116, em
Leopoldina. A partir dos anos 1940, com a flexibilização nos transportes, as indústrias
passaram a se beneficiar duplamente. Primeiro porque seus produtos podiam atingir um
mercado maior com repercussão positiva nos “custos de transferência” (ESTALL e
BUCHANAN, 1976). Segundo, com o desenvolvimento do transporte rodoviário, flexibiliza-se
58
ainda mais a localização industrial dando maior grau de autonomia às indústrias na escolha
dos melhores locais para instalação. Dentro dessa nova perspectiva as indústrias que mais
dispersaram foram a Fábrica de Papelão Cataguases S A, instalada em 1957 na Vila
Minalda (margem direita do rio Pomba); a Fundição Cataguases S A implantada no Bairro
Popular (antigo bairro Matadouro) em 1958; a Indústrias Químicas Cataguases Ltda que se
instalou no bairro Vila Reis em 1961 e a Rio Pomba Minerações instalada na localidade de
Barão de Camargos (distante 6 Km do centro da cidade) às margens do rio Pomba e da
ferrovia (mapa 8).
Quanto à força de trabalho, desde o início do processo de industrialização,
Cataguases era bem servida de mão de obra local. Esse contingente que ingressava nas
fábricas era formado por recém-chegados da zona rural como relata Cardoso (1955, p 59):
Como conseqüência da industrialização na cidade nota-se um verdadeiro
êxodo rural no município. A mão de obra das fábricas é, na maioria,
procedente do campo; são antigos lavradores que abandonam a zona rural
a fim de melhorar o seu padrão de vida, fato assinalado pela Comissão
Nacional de Política Agrária, em inquéritos promovidos na cidade.
No entanto, à medida que aumentava o número de indústrias, fazia-se necessário
contratar mão de obra cada vez mais qualificada em virtude da diversificação do quadro e das
mudanças tecnológicas em curso. Para suprir essa demanda, em 1950 foi inaugurada uma
Escola de Aprendizagem do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) com apoio
decisivo de empresários locais, principalmente do setor têxtil. O SENAI formava mão de obra
nos cursos de ajustagem, tornearia, mecânica geral e desenho técnica para a manutenção de
máquinas, consertos e fabricação de peças de reposição. Também se ministrava cursos para
áreas de administração, aperfeiçoamento de secretarias, treinamentos para fiação e tecelagem
e aperfeiçoamento de mestres e contramestres têxteis (COSTA, 1977). A mão de obra formada
pelo SENAI era, em sua maior parte, absorvida pelas indústrias locais. Uma parte dos que não
eram aproveitados localmente, se deslocava para trabalhar em outros estados, principalmente
São Paulo e Rio de Janeiro. Havia sempre um contingente que acabava abrindo pequenas
oficinas de tornearia, mecânica de manutenção e serralherias prestando serviços terceirizados
para diversas empresas – prática ainda muito usual na cidade. Essas pequenas oficinas e
serralherias, em geral, microempresas (SEBRAE, 2005), encontram-se
dispersas por toda
cidade ocupando garagens, fundos de residências e pequenos terrenos em diversos bairros.
À medida que novas indústrias se instalavam, contribuíam para aumentar a
extensão do tecido urbano com o surgimento de novos bairros residenciais. Esses iam se
formando nos eixos de ligação das indústrias com o centro da cidade, ou no entorno dos
59
60
estabelecimentos
industriais.
A
expansão
urbana
e
industrial
se
amalgamavam
espacialmente num único e complexo processo, no qual a indústria estimulava o
crescimento da cidade e esta, por sua vez, passava a atrair mais indústrias.
O início da década de 1970 se caracterizou como um momento em que a
administração pública passou a se preocupar em desenvolver uma política para o setor
industrial, através da implantação de um zoneamento que visava disciplinar o arranjo espacial
das indústrias. Trata-se da criação do Distrito Industrial de Cataguases (1971) que inicia uma
nova lógica locacional. A partir desse momento as indústrias passaram a se instalar (ou
relocalizar), preferencialmente, na área do DI, onde a Prefeitura Municipal garantia toda infraestrutura de acesso (estrada calçada, energia elétrica, água encanada, rede de esgoto) e a
doação do terreno aos empresários. Desse modo concluímos que, a cidade, atualmente,
apresenta dois padrões espaciais: o disperso (relativo ao processo pioneiro da industrialização)
e o concetrado (relativo ao Distrito Industrial). No entanto, apesar do DI ser o alvo principal da
política municipal para o desenvolvimento industrial, o padrão disperso ainda é, atualmente, o
mais representativo por conter o maior número de indústrias e as de maior porte. Cabe também
ressaltar que o padrão disperso continua incorporando novas unidades de micro e pequenas
empresas que não conseguiram se instalar na área do DI. Essas empresas possuem baixo
potencial de impacto ambiental e se dispersam pelo tecido urbano se alocando em garagens,
fundos de quintais e pequenos lotes em áreas residenciais. No item seguinte estaremos
analisando a estrutura e os procedimentos tecnológicos das indústrias mais representativas da
organização espacial do padrão disperso.
2.3.3 -A estrutura industrial e os procedimentos tecnológicos da indústria dispersa.
O padrão disperso é composto por um conjunto de indústrias que se instalaram,
e ainda se instalam, fora do DI de Cataguases. Segundo o IBGE (2001), Cataguases possui
um total de 317 indústrias (Quadro 7).
61
Quadro 7 - Indústrias em Cataguases (2001)
Ramos Industriais
Indústria Extrativa Mineral
Indústria de Transformação
Número de Empresas
14
276
Produção e Distribuição de Energia
1
Construção Civil
26
Total
317
Fonte: Adaptado do site do IBGE/cidades @, consultado em 25/07/2005.
Aproximadamente 90% do total de indústrias se localizam no padrão disperso. A
indústria dispersa compreende, quanto ao gênero, um quadro bastante diversificado, mas
quanto ao tamanho, há uma predominância das micro e pequenas empresas (SEBRAE,
2005).
Em nosso estudo estaremos nos referindo especificamente às indústrias mais
significativas desse padrão, que também são as maiores e as mais antigas. Algumas delas,
principalmente as têxteis, por serem pioneiras da fase industrial de Cataguases, foram as
responsáveis, direta e indiretamente, pelo surgimento de outras indústrias, atividades
econômicas e serviços (Quadro 8)
Quadro 8 - Principais Indústrias do Padrão Disperso (2006)
Indústrias
Gênero
Ano de Fundação
Indústrias Irmãos Peixoto*
Têxtil
1905
Companhia Industrial Cataguases (matriz)
Têxtil
1936
Cia. Manufatora de Tecidos de Algodão
Têxtil
1943
Indústria Cataguases de Papel
Papel
1954
Fábrica de Papelão Cataguases
Papelão
1957
Fundição Cataguases Indústria Metalúrgica
Metalúrgica
1958
Indústrias Químicas Cataguases
Química
1961
Indusfil Fios e Malhas
Têxtil
1967
Rio Pomba Minerações
Extrativa Mineral
1961
Fonte: Costa (1977) e Prefeitura Municipal de Cataguases (2006)
*A Indústria Irmãos Peixoto S/A deixou de existir efetivamente ao ser incorporada, em 1998,
pela Companhia Industrial Cataguases. Atualmente, no prédio da fábrica Irmãos Peixoto
funciona o Instituto Francisca de Souza Peixoto.
As indústrias têxteis representam o setor pioneiro e o mais expressivo da
industrialização de Cataguases. A primeira grande fábrica do setor foi a “Companhia de
Fiação e Tecelagem de Cataguases fundada em 1905, mas que em função de uma crise
62
financeira mudou de proprietário e de nome, passando a se chamar “Manuel Inácio Peixoto”
em 1911. No entanto, o nome definitivo só se incorpora em 1917 quando a fábrica passa a
se chamar “Indústria Irmãos Peixoto S.A.” (COSTA, 1977). Foi a primeira fábrica a utilizar
teares modernos de fabricação inglesa com sistema a vapor que, depois, ainda na primeira
década do século XX, foi substituído por motor elétrico. Essa mudança na matriz energética
só foi possível porque a Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina já disponibilizava
energia elétrica para a cidade desde 1908. A chegada da energia elétrica permitiu a
modernização da empresa, desde a fiação até a tecelagem e acabamento. Com a
ampliação das perspectivas de crescimento e a escassez de espaço, o setor de fiação da
empresa se transferiu para o DI em 1976. A tecelagem continuou no prédio antigo até 1998,
ano em que a empresa deixou de existir efetivamente e foi incorporada pela Cia. Industrial
Cataguases. O prédio, onde funcionava a indústria, passou a abrigar, desde 1999, o Instituto
Francisca de Souza Peixoto, onde são desenvolvidos projetos nas áreas de educação, arte,
cultura, esporte, saúde e cidadania (CATAGUASES, 2005).
O padrão disperso apresenta, atualmente, três indústrias têxteis em funcionamento
(Quadro 9).
Empresas
Quadro 9 - Indústrias Têxteis de Cataguases (2006)
Número de
Produção
Classificação
empregados
(mês)
(SEBRAE)
Cia Industrial
2500000 m
Grande
900
Cataguases
tecidos
empresa
Cia manufatora de
1 milhão m
Grande
Tecidos
de
846
tecidos/ 120 ton.
empresa
Algodão
algodão
80 toneladas
Média
Indusfil Fios e
120
de malhas
empresa
Malhas
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006.
Abrangência
espacial do
mercado
MG, RJ, SP
Exportação
MG, RJ, SP
Exportação
Zona da Mata (MG)
RJ e SP
Trata-se de indústrias modernas características de um setor que vem avançando
com incorporações de novas tecnologias. As duas maiores indústrias (Companhia Industrial
Cataguases e Cia Manufatora de Tecidos de Algodão) têm investido em importações de
tecnologia de automação e controle informatizado de todos os segmentos, gerando
impactos positivos na produtividade e produção. Por outro lado, há uma redução gradativa
de postos de trabalho.
Por serem empreendimentos de grande porte, classificam-se, segundo a
Deliberação Normativa no 74/2004 do Conselho Estadual de Política Ambiental
(COPAM/MG), como indústrias têxteis de grande potencial poluidor. Isso obriga essas
63
indústrias a investirem em equipamentos de monitoramento, controle e tratamento de
resíduos e efluentes através, por exemplo, das ETEs. No caso de caldeiras a óleo
combustível, é necessário o uso de filtros para evitar a poluição atmosférica.
A terceira indústria têxtil, a Indusfil Fios e Malhas, é classificada pelo SEBRAE
(2005) como uma média empresa. Sem o mesmo volume de recursos das primeiras e, sem
possibilidades de expansão física, optou por fazer uma reestruturação através da aquisição
de novas máquinas para produção de malhas. São máquinas modernas, automáticas, mas a
empresa ainda não se encontra totalmente informatizada. Classificada como indústria de
baixo potencial poluidor, não precisou investir em equipamentos de controle, monitoramento
e tratamento de resíduos e efluentes.
O segundo ramo importante é o de papel e papelão representado por duas
empresas (Quadro 10).
Quadro 10 - Indústrias de Papel de Cataguases (2006)
Número de
Produção Classificação
Abrangência
trabalhadores
(mês)
(SEBRAE)
espacial / mercado
Indústria Cataguases
500 ton.
Média
MG, SP, BA
250
de Papel
papel
Empresa
Região Sul
Fábrica de Papelão
50 ton.
Pequena
25
MG, SP, RJ e ES
papelão
Empresa
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006.
Empresas
A Indústria Cataguases de Papel foi, originalmente, fundada em 1954 com o
nome de Companhia Mineira de Papéis por empresário ligado ao ramo têxtil da cidade, Sr.
Manoel Inácio Peixoto. A fábrica produzia celulose e papéis para impressão (COSTA, 1977).
Em 1978, o Grupo Matarazzo compra a fábrica que passa a se chamar Indústria Matarazzo
de Papéis S/A. Os procedimentos tecnológicos utilizados, desde os primórdios da empresa,
consumiam muitos produtos químicos tóxicos, cujos resíduos eram lançados, sem
tratamento, no ar e no Ribeirão Meia Pataca. Foi justamente esse processo industrial que
gerou o acidente de 2003, quando ocorreu o vazamento de 1,2 bilhão de litros de resíduos
tóxicos que estavam, inadequadamente, armazenados em uma barragem (MARTINS,
2003). Em 1992, o Grupo Matarazzo, atravessando um período de dificuldades financeiras,
resolveu paralisar as atividades da unidade de Cataguases. Um novo proprietário assume a
empresa em 1994. Trata-se do Grupo IBERPAR Empreendimentos e Participações. A
fábrica passa a se chamar Indústria Cataguases de Papel. Os profissionais que trabalhavam
na antiga Matarazzo são recontratados e a empresa passa por uma reestruturação de
equipamentos e máquinas. Atualmente a empresa produz exclusivamente “papel miolo” e
64
“papel capa” a partir de “papel velho”. Não há produção de celulose. Em 2005 investiu em
laboratório de controle de qualidade e está implantando novos equipamentos de
monitoramento da produção. A madeira armazenada em seu pátio é para combustível de
caldeira. Apesar de utilizar “papel velho”, a empresa apresenta grande potencial poluidor.
Por isso investiu em equipamentos para a ETEs ( Estação de Tratamento de Efluentes),
principalmente por utilizar a água do Ribeirão Meia Pataca. A atual empresa foi
responsabilizada pelo acidente de 2003 por ter herdado um “passivo ambiental” do Grupo
Matarazzo. O Grupo IBERPAR, atual proprietário, assinou e já está cumprindo o TAC
(Termo de Ajustamento de Conduta). A empresa realiza atualmente um programa, junto à
Secretaria Municipal de Educação, na área ambiental relativo a reciclagem de papel que
envolve palestras, concursos de redação e visita das escolas à fábrica.
A Fábrica de Papelão Cataguases S/A, fundada em 1957, opera atualmente com
os mesmos procedimentos técnicos originais. A matéria-prima é o papel velho e o produto
final é o “papelão pardo”, usado em embalagens diversas e capas duras para cadernos e
livros. Atualmente a fábrica ainda utiliza tração animal (carroça) para retirar o papelão
produzido do interior da fábrica para ser secado ao ar livre no pátio da empresa. Por ser
uma pequena empresa e produzir cerca de 50 toneladas/mês possui baixo potencial
poluidor. Daí a inexistência de investimentos em monitoramento e controle ambiental.
No setor de metalmecânica, desde 1958, quando foi fundada, a Fundição
Cataguases Metalúrgica LTDA se destinava a fabricar peças de reposição das maquinarias
dos setores de fiação e tecelagem das indústrias têxteis da cidade. A principal matéria-prima
é o ferro gusa, adquirido nas guseiras do interior de Minas Gerais. Mas com a ampliação e
diversificação das demandas, a empresa passou a trabalhar também com ligas de ferrosilício, ferro-manganês, alumínio e bronze produzindo proteções de válvulas, mancais de
carcaças, implementos agrícolas, bombas hidráulicas e peças fundidas em geral. A fundição
funciona por indução elétrica e os procedimentos tecnológicos, em geral, não são os mais
modernos. Não opera com controle de produção informatizado e não possui espectrômetro
de massa para controle de qualidade das peças produzidas. Considerada pelo SEBRAE
(2005) como empresa de médio porte, a Fundição Cataguases opera com 128 empregados,
ocupando uma área de 3200 m2 no Bairro Popular. Percebe-se que a urbanização de
entorno transformou o local em bairro residencial, envolvendo a fundição e impedindo
qualquer estratégia de expansão física da empresa. A liberação de vapores e gases dos
processos de fundição e usinagem incomodam a população do entorno. Os empresários
reconhecem, mas alegam que não têm como financiar uma relocalização da empresa.
Trata-se de um caso típico de empresa que, segundo Estall e Buchanan (1976), apresenta
elevado nível de inércia geográfica em virtude da natureza de seus equipamentos produtivos
e instalações. A empresa funciona sem nenhum procedimento de controle e monitoramento
65
de resíduos ou emissões. Atende ao mercado local e outras cidades dos estados de MG e
SP.
Em 1961, um grupo de empresários da cidade, inclusive ligados ao setor têxtil,
fundou a Indústrias Químicas Cataguases Ltda, no bairro Vila Reis. Segundo Costa (1977,
p. 314), o objetivo da empresa era “a exploração industrial e comercial de produtos
químicos, inclusive mineração”. Seu primeiro e principal produto foi o Sulfato de Alumínio,
extraído da bauxita, minério muito comum na Zona da Mata mineira. Com o passar do
tempo, a indústria empreendeu um conjunto de transformações relativas a aprimoramentos
tecnológicos (inclusive pesquisa) e expansão empresarial. Atualmente, é a empresa líder do
Grupo Química Cataguases que atua no ramo industrial, oferecendo tecnologia qualificada,
através de uma linha de produtos químicos para tratamento de água em usos industrial,
residencial (piscina, água potável), abastecimento urbano, ETEs e esgoto. Os principais
insumos utilizados pela indústria são: água, bauxita, minério de ferro, ácido sulfúrico,
hidróxido de alumínio, cloro, cal hidratada, soda cáustica líquida e outros reagentes. Os
principais produtos produzidos pela empresa são: Aluminato de Sódio, Sulfato de Alumínio,
Cloreto de Alumínio, Policloreto de Alumínio, Sais Férricos, Hipocloreto de Cálcio e Sais de
Flúor.
A fim de produzir parte dos insumos que a Indústrias Químicas Cataguases
precisa, foi constituída uma outra empresa. Trata-se da Rio Pomba Minerações, mais uma
empresa do Grupo Química Cataguases. A Rio Pomba Minerações é uma indústria extrativa
mineral e de transformação primária localizada às margens do rio Pomba, no distrito de
Barão de Camargos. Com reservas próprias de bauxita (30 milhões de toneladas) e de
calcita (240 mil toneladas), a Rio Pomba Minerações atua em Cataguases produzindo
Bauxita Ferrosa, Bauxita Branca e Cálcio.
A Indústrias Químicas Cataguases e a Rio Pomba Minerações possuem grande
potencial poluidor, por isso foram obrigadas a investir em controle e monitoramento
ambiental através de aparelhamento técnico de controle de emissões de gases, tanques
para estabilização de rejeitos de mineração e ETEs. As duas empresas atuam com
equipamentos informatizados em todos os setores, laboratórios químicos e setor de
pesquisa. Os produtos da Indústrias Químicas Cataguases atendem cerca de 1000
municípios brasileiros distribuídos pelas regiões Sudeste, Sul e Nordeste principalmente. O
Grupo Química Cataguases, controlador das duas empresas, criou a Fundação Cultural
Cataguases visando o desenvolvimento de atividades educativas, artísticas e culturais.
Atualmente, esse grupo emprega 750 funcionários em 9 unidades produtivas distribuídas
pelos Estados de SP, MG, BA e PE.
Na análise da estrutura industrial do padrão disperso ficou evidente a
importância do setor têxtil. Indutoras do processo de urbanização, as indústrias têxteis, além
66
de representarem o ramo predominante na cidade, concentram também o maior número de
pessoal ocupado. São também as indústrias que investiram significativamente em novos
procedimentos tecnológicos e empresariais para enfrentar as dificuldades conjunturais da
economia nos anos 90 do século XX. Nesse período, centenas de fábricas têxteis foram
fechadas no Brasil, segundo a ABIT (Associação Brasileira da Indústria Têxtil) em virtude da
intensificação da abertura comercial que inseriu o setor num ambiente de competitividade
globalizada (CATAGUASES, 2005).
A CFLCL (Companhia Força é Luz Cataguases Leopoldina) é outra empresa
importante que, atuando no setor de energia elétrica, garantiu o funcionamento das
indústrias e o desenvolvimento da economia regional da Zona da Mata mineira. É a empresa
que apresenta a mais complexa
estrutura societária, atuando na geração, distribuição,
concessões e projetos com parcerias tecnológicas, como é o caso da associação com a
empresa norte-americana Alliant Energy, consolidada no ano 2000. Também é uma das
poucas empresas que investem nos setores ambiental (2 RPPN), artístico-cultural e
educacional da cidade.
Quase todas as principais indústrias do padrão disperso possuem área física
para expansão. A Fundição Cataguases é a única empresa que já ocupa toda extensão de
sua propriedade.
A Fábrica de Papelão e a Fundição Cataguases são indústrias que ainda operam
com maquinarias tradicionais, caracterizando um padrão produtivo de baixa eficiência.
Portanto, as empresas que possuem uma maior abrangência espacial de mercado (local,
regional, nacional e internacional) são também as que mais investiram na modernização dos
procedimentos tecnológicos. Daí o destaque para as grandes indústrias têxteis, o Grupo
Química Cataguases e a CFLCL (Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina).
Enfim, como é sabido, o padrão disperso é apenas uma das manifestações
espaciais da atividade industrial em Cataguases. A concentração de indústrias, na forma de
um Distrito Industrial, revela outro padrão de organização e dinâmica dos estabelecimentos
industriais. . Assim sendo, a pesquisa se volta para a análise do DI de Cataguases, onde
objetivamos analisar sua gênese, estrutura e procedimentos tecnológicos, para fins de
investigação dos impactos socioambientais.
CAPÍTULO 3 – O DISTRITO INDUSTRIAL DE CATAGUASES COMO PADRÃO
CONCENTRADO DE LOCALIZAÇÃO DAS INDÚSTRIAS
A década de 1970 marcou o início de uma nova fase do processo de
industrialização em Cataguases. Trata-se da criação do Distrito Industrial aprovada pela Lei
Municipal nO 684 de 31/12/1971. Com o objetivo de ser um instrumento disciplinador e
promotor do desenvolvimento industrial, o DI inaugurou a primeira política de zoneamento
que influencia diretamente na organização espacial das indústrias de Cataguases.
Contrastando com a lógica de organização espacial do padrão disperso, o DI cria o padrão
concentrado, cuja forma, estrutura e dinâmica serão analisadas no presente capítulo.
3.1- A noção de DI enquanto recorte analítico do espaço geográfico
Os Distritos Industriais constituem formas específicas de arranjos espaciais
produtivos, que se inserem de maneira articulada, num contexto produtivo mais amplo do
espaço geográfico. Trata-se de uma das muitas configurações do espaço industrial. Sua
existência e dinâmica contribui para produzir e integrar diversas áreas e atividades gerando
uma cadeia de unidades produtivas e serviços interligados devido à capacidade de
articulação espacial inerente às indústrias. Fruto de um desenvolvimento “espontâneo” ou
planejado (política de zoneamento), os Distritos Industriais constituem espaços concretos
possuidores de uma especificidade histórica real. Caracterizados como unidades produtivas
locais, suas dinâmicas vinculam-se a um processo de industrialização espacialmente mais
abrangente e que se conecta a uma lógica reticular multi-escalar. Uma análise da
organização e funcionalidade dos DIs torna-se importante para o entendimento das
complexas redes socioespaciais construídas a partir das articulações que se estabelecem
entre esses arranjos produtivos e as economias local, regional e nacional. Logo, os DIs, do
ponto de vista espacial, resultam da divisão territorial do trabalho num dado momento da
história econômica de uma sociedade. Portanto, a análise desse arranjo produtivo nos
permitirá uma compreensão maior de como a sociedade organiza sua economia, em
especial a atividade industrial. Por isso, os estudos sobre a organização da atividade
industrial e a estruturação de seus arranjos espaciais produtivos sempre despertaram
interesses dos geógrafos, sociólogos e economistas. No que se refere especificamente ao
estudo da organização espacial da indústria concentrada , Souza (2005, p.1) afirma que
“essas concentrações geográficas de empresas vêm recebendo da literatura vários
68
nomes: Distritos Industriais, Sistemas Produtivos Locais, Arranjos Produtivos, Sistemas
Locais de Inovação, Aglomerações Industriais e Clusters”. Como o tema é alvo de diferentes
preocupações ou áreas de conhecimento, cada disciplina desenvolveu abordagens
compatíveis com seus instrumentais teórico-analíticos. Por isso os parâmetros conceituais e
tipologias são pouco consensuais. É nesse sentido que Suzigan (2005, p.4) divide em cinco
as abordagens mais relevantes para analisar as aglomerações industriais:
A da chamada Nova Geografia Econômica, cujo expoente é P. Krugman
(1998); a de Economia de Empresas, na qual se destaca M. Porter (1998);
a de Economia Regional, na qual há várias correntes, mas a que mais se
aproxima do tema específico dos Clusters é aquela liderada por A . Scott
(1998); a abordagem da Economia da Inovação, para qual contribuem
muitos autores, entre os quais se destaca, pelo foco em políticas, D. B.
Audrestch (1998), e finalmente a abordagem que trata de Pequenas
Empresas/Distritos Industriais, com destaque para as contribuições de H.
Schmitz (1997; 1999).
Garcia e Costa (2006, p.1), utilizando a expressão sistemas produtivos locais,
destacam os trabalhos de autores como Marshall (1920 [1988]), Perroux (1967), Krugman
(1991), Garofoli (1993), Markusen (1994), Langlois e Robertson (1995), Porter (1998) entre
outros. Estes autores apresentaram diversas Tipologias de Redes de Empresas localizadas
na Europa, América e Ásia.
Gorayeb (2002, p. 24) também nos alerta
que as tipologias referentes às
aglomerações setoriais de PEs (Pequenas Empresas) não são homogêneas na literatura
científica e nos programas públicos de desenvolvimento regional e industrial. São várias as
designações, entre as quais:
Sistemas de Pequenas Empresas (Garofoli, 1994), Sistemas Produtivos
Descentralizados (Costa, 2001), Sistemas Produtivos Localizados
(Vidal, 2000), Arranjos Locais de PEs ( Cassioloato e Lastres, 1999),
Modelo Comunitário (apud Souza, 1995), Clusters (vários autores),
Sistemas Industriais Locais (Courlet e Pecquer, 1991 e Colletis et alli,
1990), Sistemas Produtivos Locais (Garofoli, 1993) e”Milieu
Innovateurs” (Crevoisier e Maillat, 1991 e Camagni, 1991) – últimas cinco
citações apud Humphrey e Schmitz, (1995), Clusters Regionais e Rede de
Inovação Regional (European Communities, 2002).
Neste estudo daremos ênfase à discussão sobre a noção de Distrito Industrial
(DI), uma vez que essa expressão foi oficialmente escolhida pelo poder público de
Cataguases como um marco político de ordenamento territorial para as indústrias a partir de
69
1970. Destacaremos os conceitos de externalidades positivas (economias externas) de
Marshall (1996), eficiência coletiva de Schmitz (1997) e nos apoiaremos também nas
evidências empíricas dos DI italianos (3a Itália) e na tipologia proposta por Sampaio (1988)
para o caso brasileiro.
As
primeiras
referências
a
respeito
desse
arranjo
espacial
produtivo
(concentração da produção industrial em determinados espaços – os DI) podem ser
encontradas nos estudos de Marshall (1996) sobre a dinâmica da organização espacial das
pequenas indústrias na Inglaterra. Em sua obra, Principles of Economics, publicada em
1920, Marshall destacou as economias que podem ser asseguradas pela concentração de
várias pequenas empresas, de um mesmo setor produtivo, em determinada localidade.
Segundo Garcez (2000), essas localidades foram chamadas por Marshall de Indústria
localizada ou distritos industriais. Em sua obra, Marshall denominou de “economias
externas” os ganhos ou economias alcançadas pelas pequenas empresas que puderam
auferir vantagens comparativas em função de participarem da formação de aglomerações
setoriais.
Segundo
o
autor,
as
vantagens
econômicas,
também
chamadas
de
“externalidades positivas”, ocorrem principalmente em função de:
- acesso a trabalhadores qualificados (concentração local de mão-de-obra);
- fácil acesso a fornecedores de matérias-primas e serviços correlatos à atividade
principal. Nesse - sentido, Marshall (1996, p. 320) argumenta que:
acabam por surgir, nas proximidades desse local, atividades subsidiárias
que fornecem à indústria principal instrumentos e matérias-primas,
organizam seu comércio e, por muitos meios, lhe proporcionam economia
de material;
- a concentração geográfica contribui para criar um ambiente propício a inovações. Para
Marshall (1996, p. 320), se um lança uma idéia nova, ela é imediatamente adotada por
outros, que a combinam com sugestões próprias e , assim, essa idéia se torna uma fonte
de outras idéias novas.
Marshall (1996), considerado chefe da chamada “escola neoclássica de
Cambridge”, deteve suas investigações especificamente sobre as causas do dinamismo de
pequenas empresas da Inglaterra , concentradas em distritos industriais na segunda metade do
século XIX e início do século XX (SATRAUCH, 1996; GORAYEB, 2002). No entanto, as
chamadas vantagens marshallianas, resultantes dos efeitos aglomerativos das indústrias, se
70
referem somente àquelas que ocorrem de forma não-intencional (incidental) (SOUZA, 2005;
GORAYEB, 2002). Para além das externalidades marshallianas e trazendo o debate para o
contexto atual, Gorayeb (2002, p. 27), apoiando-se em Schimitz (1997), ressalta que a simples
aglomeração de empresas não é suficiente para a obtenção de ganhos econômicos.
Principalmente no atual contexto da economia mundial em que as empresas e os arranjos
produtivos locais são colocados em um ambiente de competitividade internacional. Para que as
empresas adquiram competitividade real e sustentada é necessário a busca pela “eficiência
coletiva”. Essa se refere às vantagens competitivas derivadas das economias externas locais
espontâneas e das ações em conjunto (relações colaborativas e planejadas das empresas e do
setor público). Estruturando ações em conjunto, as Pequenas Empresas (PEs) minimizam
deficiências operacionais, melhoram as complementaridades, compartilham tecnologia, formam
consórcios para exportação e podem criar centros para pesquisa. A busca de eficiência
coletiva promove ligações e cooperações mais intensas entre as empresas, mas gera também
um ambiente de competitividade, que estimula a difusão de inovações tecnológicas e melhorias
organizacionais ao nível local. O conceito de eficiência coletiva, que também possui forte
inspiração marshalliana, foi desenvolvido por H. Schimitz (1997) em trabalhos relacionados aos
Distritos Industriais Italianos (SOUZA, 2005). Segundo Garcez (2000, p.354), a expressão
distrito industrial foi utilizada por Becattini, apud Humphrey e Schimitz (1996), para identificar
as bem sucedidas aglomerações de pequenas empresas (PEs) da “Terceira Itália”. A
expressão Terceira Itália foi utilizada como forma de distinguí-la do Norte (desenvolvido e com
grandes empresas) e do Sul (região com menor desenvolvimento econômico e ainda com sérios
problemas sociais). Fazem parte da Terceira Itália as regiões de Véneto, Trentino, FriuliVenezia, Giulia, Emilia-Romagna, Toscana, Marche e parte da Lombardia. Os DIs Italianos são
arranjos espaciais produtivos que cresceram rapidamente a partir dos anos 1970, chamando a
atenção dos meios acadêmicos e despertando interesses de órgãos que cuidam de políticas
setoriais e desenvolvimento regional. Para Gorayeb (2002, p. 47), os DIs Italianos ganharam
realce por constituírem:
além de uma forma de organização produtiva que torna viável a
sobrevivência prolongada das pequenas empresas (PEs), também um modo
de organização industrial que, em termos capitalistas, conseguiu conjugar
melhorias nos indicadores econômicos das empresas e benefícios sociais
para os trabalhadores, para os pequenos empresários das firmas
participantes do DI e também para a região como um todo. Desse modo,
identificou-se nos DIs Italianos uma característica “virtuosa”, valorizada
principalmente em momentos de crise de acumulação do capital, qual seja,
a união de obtenção de lucratividade e divisão relativamente equilibrada e
harmoniosa dos resultados econômicos.
71
Os principais ramos identificados nos DIs Italianos são: têxtil, metal-mecânico,
confecções, artigos de couro, calçados, móveis, cerâmica, brinquedos e instrumentos musicais.
Os DIs Italianos, além de contarem com as vantagens das economias de aglomeração e com a
especialização setorial, apresentam um elevado grau de colaboração interfirmas, competição
baseada na inovação, compartilhamento de valores que fortalecem a identidade sócio-cultural
(identidade coletiva), estrutura social baseada no predomínio das pequenas empresas e
trabalhadores industriais, existência de organizações de apoio às empresas e participação dos
governos regionais e municipais (GARCEZ, 2000; GORAYEB, 2002). Os DIs Italianos foram
considerados, por muitos estudiosos, como o caso mais completo e “ideal de aglomerações
setoriais virtuosas de pequenas empresas” (Gorayeb, 2002, p. 47).
Gorayeb (2002) ressalta que a expressão “Distrito Industrial” deveria ser
utilizada somente em situações em que há muita semelhanças com as aglomerações
italianas. Obviamente, os DIs representam apenas uma das formas de organização entre
firmas localizadas.
Na atual conjuntura , as exigências impostas pela competição na chamada
“nova economia” obriga as empresas a se reestruturarem em busca de novas competências
organizacionais e aumento da capacidade de inovação (GARCEZ, 2000). Por isso
assistimos a emergência de novos arranjos espaciais produtivos e o uso de novas tipologias
como os Clusters (Industrial Clustering), Sistemas Produtivos Locais e Sistemas
Locais de Inovação, principalmente entre os economistas (BRITTO E ALBUQUERQUE,
2001; SOUZA 2005; SUZIGAN, 2000; GARCEZ, 2000)
No Brasil é muito comum os poderes públicos, através de seus projetos
urbanísticos e zoneamentos, utilizarem a expressão “Distrito Industrial” para se referirem a
qualquer local escolhido para instalação de indústrias dos mais diversos setores e diferentes
portes. Geralmente tratam-se de arranjos espaciais produtivos diferentes do modelo dos DI
Italianos e, na maioria das vezes, não são do mesmo ramo, possuem baixa
complementaridade, não atuam em conjunto, compartilham poucos serviços comuns, não são
exclusivamente constituídos por pequenas empresas e não há relação entre o ambiente
industrial e o patrimônio sócio-cultural da localidade. Possuem, em geral, uma sistemática
organizacional pouco dinâmica e de baixa eficiência coletiva. No entanto, em relação ao nosso
trabalho, não podemos negar que o DI representa a materialização de uma política de
zoneamento que visa disciplinar e promover o desenvolvimento industrial. Mesmo não sendo
especializado (OLIVEIRA, 1976) ou mono-estruturado (SAMPAIO, 1988), o DI de Cataguases
representa uma forma de organização espacial distinta do padrão industrial disperso, cuja lógica
de estruturação e funcionamento não obedece a uma política oficial de zoneamento. Realmente
significa uma nova forma de organização do espaço industrial. Por isso uma definição de DI que
mais se ajusta ao nosso trabalho é a proposta por Oliveira (1976, p. 24):
72
Distrito Industrial é uma área reservada para indústrias, onde o planejador
promove a implantação de uma infra-estrutura necessária à indução de um
processo de desenvolvimento industrial. Portanto, além de oferecer lotes de
boa qualidade, deve oferecer uma série de facilidades e serviços a seus
ocupantes.
Complementando
essa
definição
buscaremos
subsídios
operacionais
importantes em Sampaio (1988) que, ao estudar o processo de periferização das indústrias
nos espaços urbanos brasileiros, propõe uma classificação tipológica para os Distritos
Industriais. Segundo Sampaio (1988, p.31), entre os diferentes tipos existentes podem ser
citados os Distritos Industriais:
a) de Relocalização: destinados a indústrias que se transferem das áreas centrais das
cidades:
b) de Atração de Novos Investimentos: destinados a novas indústrias;
c) Mistos: que abrigam estabelecimentos dos dois tipos citados, como é o caso do
Distrito Industrial de Rio Claro;
d) Reservados Exclusivamente a Indústrias Poluentes: siderúrgicas, químicas,
petroquímica;
e) Mono-estruturados: destinados a concentrar indústrias do mesmo ramo industrial,
interessadas em desfrutar de economias de aglomeração;
f) Integrados: nos quais se agrupam indústrias que se caracterizam pela integração
vertical, ou seja, pela complementaridade ou seqüência que desempenham nos
processos de produção.
Portanto, adotando as contribuições de Oliveira (1976) e Sampaio (1988) podemos
definir o DI de Cataguases como uma área reservada para instalações de indústrias (novos
empreendimentos ou relocalizações) dos mais diversos ramos e portes, onde o poder Municipal
garante a infra-estrutura necessária, permitindo que outros empreendimentos, nos setores de
serviços públicos e urbanização, também possam se instalar. Além disso, o DI de Cataguases
reflete e condiciona processos de expansão do tecido urbano-indutrial, visto que sua dinâmica
de reprodução de capital contribui para avanços da malha urbana dentro e fora de seus limites a
partir da infra-estrutura que se projeta no DI.
Com base nessa definição de DI, a pesquisa se volta para a gênese, localização,
estrutura e interações espaciais do DI de Cataguases adotando como referencial analítico
os conceitos de externalidades positivas, eficiência coletiva, e as tipologias para os DIs
brasileiros propostas por Sampaio (1988).
73
3.2 A gênese do Distrito Industrial de Cataguases
Até 1970, a industrialização de Cataguases se processou sem uma política de
zoneamento que disciplinasse a localização das indústrias. Por isso, até esse período,
podemos falar em um padrão disperso de arranjo espacial das indústrias. Esse arranjo
tornou mais complexa a relação indústria-cidade, favorecendo a expansão do tecido urbano.
Atualmente, exceto a empresa Rio Pomba Minerações, todas as indústrias do padrão
disperso encontram-se em área urbanizada, cercada por bairros residenciais. Problemas
como dificuldades de tráfego pela área central da cidade, falta de espaço físico de
ampliação, especulação imobiliária e riscos de acidentes ambientais graves acabam
gerando deseconomias de aglomeração. Mediante a ampliação de forças dispersivas, o
poder público municipal implementou, em 1971, sua primeira política de zoneamento que
afetou o ordenamento espacial das indústrias no município. Trata-se da criação de uma área
destinada a alocação de futuras indústrias, conforme atesta a Lei Municipal no 684 de
31/12/1971 que, em seu Artigo 1o, decreta:
Fica o prefeito municipal de Cataguases autorizado a adquirir a Fazenda
da Saudade, com 31 alqueires de terras, nas imediações desta cidade,
para ali ser localizado o novo cemitério, instalações de futuras indústrias
e outros serviços públicos, inclusive loteamento e urbanização.
Para Costa (1977, p.318), “a criação de uma área para futuras instalações
industriais constituía-se numa opção necessária à já saturada zona central da cidade. O DI
teria o papel de instrumento disciplinador e promotor do desenvolvimento industrial de
Cataguases”.
Na verdade, Cataguases já refletia uma tendência nacional que era a de ter os
DIs como importante instrumento de política industrial. De acordo com Mannarino (1983),
essa tendência se fortaleceu no Brasil, no decorrer dos anos 1970, quando os DIs foram
mais incentivados após a divulgação das diretrizes do II Plano Nacional de Desenvolvimento
(1975 -1979). Em nível de política industrial nacional, o II PND, além de objetivar o aumento
do nível de crescimento industrial, buscava um efeito estratégico redistributivo, visando a
correção das desigualdades espaciais relativas ao desenvolvimento industrial brasileiro.
Segundo Moreira (2004, 134):
74
O objetivo é redistribuir a indústria excessivamente concentrada na região
metropolitana de São Paulo, corrigir seus efeitos, de modo a aprovar maior
repartição da infra-estrutura e interações espaciais por todo o território do
Brasil em vista de projetos de integração nacional – o projeto Brasil Grande.
Nesse período, os órgãos federais Conselho de Desenvolvimento Econômico (CDE),
Conselho de Desenvolvimento Industrial (CDI), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) e a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), com seus instrumentos
normativos, creditícios e fiscais buscavam, com o apoio estratégico dos governos estaduais e
municipais, promover políticas de localização industrial. O objetivo, segundo Mannarino (1983),
era romper com os desequilíbrios regionais, promovendo simultaneamente o desenvolvimento do
setor industrial em novas áreas.
Atendendo aos imperativos da política nacional, nos vários estados da
Federação, foram criados órgãos especializados como bancos, institutos técnicos , e
Companhias de Distritos Industriais. Em Minas Gerais, Oliveira (1976, p. 57) comenta que
na década de 1970,
além da CEMIG (Centrais Elétricas de Minas Gerais), outros órgãos
especializados como o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais
(BDMG), a Companhia de Distritos Industriais (CDI - MG), o Instituto de
Desenvolvimento Industrial (INDI), garantem diversas formas de apoio
(financiamento, incentivos, facilidades na compra de terrenos, etc.) para a
continuidade e sucesso da política de desenvolvimento industrial do Estado
de Minas Gerais.
Apesar de todo esse aparato institucional e instrumental para criação dos DIs em
Minas Gerais, o poder público municipal de Cataguases assumiu, em 1971, a iniciativa da
criação de um loteamento para a instalação de indústrias, sem solicitação dos serviços de
consultoria e apoio do CDI – MG. Essa atitude já era constatada, segundo Mannarino
(1983), em vários municípios brasileiros nos anos 1970. Para Oliveira (1976), essa
proliferação dos DIs, sem o apoio das instituições e órgãos públicos especializados, trazia
um problema na origem, pois carecia de um planejamento mais cuidadoso e, ao não
incorporar uma visão regional mais ampla, acabava comprometendo seus resultados. Para a
autora, Minas Gerais sempre se destacou na política de instalação dos DIs e exemplifica o
pioneirismo do Estado mineiro com a construção, na década de 1940, do DI Coronoel
Juventino Dias, no município de Contagem. Sem dúvida, representa um dado bastante
relevante, uma vez que a política oficial de implantação dos DIs em Minas Gerais só foi
dinamizada com a criação do INDI (Instituto de Desenvolvimento Integrado de Minas Gerais)
75
em 1969 e da CDI-MG (Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais) em 1971.
Por não ter solicitado apoio institucional junto ao INDI e ao CDI-MG, o DI de
Cataguases, freqüentemente não figurava nas estatísticas oficiais de distritos industriais do
Estado mineiro. Esse fato pode ser confirmado com a listagem dos municípios mineiros que
possuíam DI em 1979 apresentada por Mannarino (1983) no Quadro 11.
Quadro 11 - Distritos Industriais Mineiros (Posição em 1979)
Distritos Industriais
Área (há)
Ind. Implantadas Ind. em implantação
Governador Valadares
37
5
Itajubá
130
2
4
Juiz de Fora
98
7
16
Montes Claros
202
4
13
Pirapora
205
4
5
Betim
406
6
9
Sete lagoas
124
2
1
Santa Luzia I
70
9
5
Santa Luzia II
198
10
1
Uberlândia
188
1
11
Uberaba
65
4
8
Vespasiano
124
1
3
Contagem
497
95
Belo Oriente
1.213
1
Fonte: Mannarino 1983 / CDI-MG 1979.
Em 1979, segundo a Prefeitura Municipal, o DI de Cataguases já contava com 8
unidades industriais instaladas e funcionando, embora não figurasse nas estatísticas oficiais
do Estado.
De fato, ao examinarmos cuidadosamente a Lei que “criou o DI de Cataguases”,
percebe-se que não houve a preocupação com um planejamento (estudo de viabilidade
econômica e elaboração de projeto técnico-econômico e urbanístico) específico para
alocação das indústrias. A própria Lei, em seu Artigo Io, exprime que o imóvel rural
desapropriado serviria para instalação de indústrias, um cemitério, serviços públicos e
urbanização, ou seja, a princípio não seria exclusivamente para indústrias. No entanto, a
área em questão foi, aos poucos, tomando forma de um DI em função da predominância das
indústrias em relação às demais atividades não industriais. A partir da instalação das
primeiras indústrias (9, nos anos 1970), a expressão Distrito Industrial começou a ganhar
força entre empresários e políticos, incorporando-se ao discurso oficial do poder público
municipal. Desse modo, a área da “Reta da Saudade” (Av. Manoel Inácio Peixoto) se firmou
como prioritária para instalação das indústrias, consolidando-se como um DI. Atualmente
(2006), o DI de Cataguases conta com 26 indústrias dos mais variados ramos sendo, por
isso, classificado como não especializado e servindo para instalação de novos
76
empreendimentos ou relocalização. Embora tenha sido um processo autônomo de criação,
as indústrias atualmente podem recorrer, de acordo com suas necessidades, aos órgãos de
fomento e institutos de apoio ligados à Secretaria de Estado de Desenvolvimento
Econômico (SEDE) de Minas Gerais.
Minas Gerais conta com novos órgãos de apoio, financiamento, incentivos e
consultorias para estimular a política de desenvolvimento industrial nos municípios mineiros
(Quadro 12).
Quadro 12 - Instituições e Órgãos de Apoio às Indústrias de Minas Gerais
Instituição/Órgão de Fomento
SEDE
–
Secretaria
de
Desenvolvimento Econômico
Forma de Atuação
Estado
e Planejamento e controle das atividades de
promoção e incentivo ao desenvolvimento
industrial
COIND – Conselho de Industrialização (ligado Participa na formulação de normas básicas de
à Secretaria de Indústria, Comércio e Serviços) política de industrialização
BDMG – Banco de Desenvolvimento de Minas Disponibiliza linhas de créditos para
Gerais
modernização e expansão das indústrias
INDI – Instituto de Desenvolvimento Integrado Órgão consultor de apoio a empreendimentos
de Minas Gerais
industriais
FINDI – Fundo de Incentivo à Industrialização Dar suporte financeiro para o desenvolvimento
industrial e agroindustrial
CODEMIG – Companhia de Desenvolvimento Planejar áreas e distritos industriais dotando-os
Econômico de Minas Gerais (substituiu o de infra-estrutura
extinto CDI)
Fonte: SEDE (Secretaria de Estado e Desenvolvimento Econômico), 2006.
O DI de Cataguases não possui um centro administrativo. As indústrias atuam de
modo independente e se dirigem aos órgãos de fomento estaduais toda vez que necessitam
de recursos para ampliação e modernização. O poder público municipal atua apenas como
regulador das relações contratuais de instalação e relocalização.
Com uma taxa de ocupação de 90% da área, o poder público municipal já
demonstra preocupação com a capacidade limite do DI para novos investimentos. Segundo
a Secretaria Municipal de Planejamento Estratégico, uma nova área para um novo DI já faz
parte das preocupações da atual administração (2005 –2008).
Após a contextualização da gênese do DI de Cataguases, faz-se necessário
investigar a lógica de sua localização, a partir do espaço preexistente e dos condicionantes
do quadro físico.
77
3.2.1- A lógica de localização do DI de Cataguases
Como foi relatado anteriormente, o DI de Cataguases foi criado para estimular e
disciplinar (instrumento corretivo) o desenvolvimento industrial do município, uma vez que a
área central e adjacências estavam saturadas e já produziam deseconomias de aglomeração.
Portanto, para não comprometer o desenvolvimento industrial, buscava-se encontrar uma nova
área mais afastada do perímetro urbano central. Essa nova área deveria apresentar amplo
espaço plano e facilidade de acesso ao núcleo urbano e às rodovias federais. A geomorfologia
regional, com relevos de “mares de morros” sempre constituiu um fator limitante para a
implantação de áreas industriais mais amplas (Ab’Saber, 2003). No entanto, ao longo do traçado
do Rio Pomba, o relevo se alterna entre vales encaixados (controle estrutural) e algumas
poucas e amplas planícies de inundação e terraços alveolares. Os terraços dos alvéolos, por
dificilmente serem atingidos pelas cheias, constituem a topografia mais adequada à
aglomeração industrial. E foi levando em conta esse fator que o poder público municipal
escolheu a área da antiga “Fazenda da Saudade” para implementar sua política de localização
industrial. Com a aquisição da fazenda, a prefeitura disponibilizou 96,025 hectares para a
instalação das indústrias. A área fica situada na margem direita do Rio Pomba, a jusante da
cidade (3km em linha reta) acompanhando o trajeto da antiga estrada Cataguases-Leopoldina,
até hoje (2006) não pavimentada (Mapa 8).
A escolha do local foi uma decisão exclusiva do poder municipal e não teve um
estudo criterioso por parte dos órgãos estaduais competentes que já existiam no Estado
(INDI e CDI-MG). A escolha se apoiou nos conhecimentos empíricos da realidade espacial
e econômica do município por parte do poder público. Segundo Costa (1977), o apoio dos
empresários industriais da cidade, que obviamente seriam favorecidos
com doações de
terrenos, foi decisivo para efetivação da escolha e desapropriação do local.
A ligação da área central da cidade com o DI precisou ser complementada com
calçamento de paralelepípedos, uma vez que nesse eixo de ligação o processo de urbanização
era menos denso e as infra-estruturas não chegavam à área do DI. A área escolhida estava fora
dos principais eixos de expansão do tecido urbano e do processo de industrialização. Mas a sua
localização a sudeste da mancha urbana lhe conferia uma posição bastante interessante e
adequada pelos seguintes motivos:
1 - A área escolhida permite conexões viárias com o padrão industrial disperso
por avenida pavimentada e iluminada. É uma localização estratégica fortemente vinculada à
área urbano-industrial da cidade.
2 – As indústrias poderão ser favorecidas pela proximidade do transporte
ferroviário, cuja linha férrea passa na margem oposta ao DI (margem esquerda do Rio
78
Pomba). Assim, a construção de uma ponte e de um terminal de transbordamento de cargas
poderá disponibilizar o transporte ferroviário às indústrias do DI (Figura 1). Atualmente a
linha férrea é de uso exclusivo para transporte de minério de bauxita da CBA (Companhia
Brasileira de Alumínio – Grupo Votorantin).
Figura 1 – Esboço da infra-estrutura para melhoria da logística
do DI de Cataguases (2006)
3 – É possível reativar a saída para Leopoldina (acesso à BR 116) através da construção de um
acesso pavimentado ligando o DI à BR – 120. Para isso foi encaminhada uma Emenda ao
PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias) feita em 2003 por um Deputado Federal de
Minas Gerais, que solicitou recursos para construção do citado trecho. Parte das obras já foram
79
feitas, conforme podemos localizar na parte inferior da imagem de satélite 1. Aguardam-se mais
recursos. Essa obra de acesso à BR – 116, uma vez concluída, possibilitará às indústrias do DI
uma rota alternativa ao já congestionado trajeto que passa pela “Vila Minalda”.
Imagem de Satélite 1- O DI de Cataguases e Trecho de Acesso à BR 120 (2006)
4 – A escolha da área foi extremamente favorável à instalação de uma subestação de
energia elétrica operada pela CFLCL (Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina). O
local foi considerado favorável à chegada e saída das linhas de alta tensão.
5 – O projeto de instalação de uma unidade de produção de alumina da CBA distando,
aproximadamente 5 Km à jusante do DI, na margem oposta do rio Pomba, poderá gerar um
novo eixo de desenvolvimento econômico no município através das conexões viárias e infraestruturas locais. O DI, à esquerda da imagem de satélite 2, funcionaria como um catalisador
desse processo tendo o rio Pomba como eixo de estruturação (Imagem de satélite 2).
80
Imagem de Satélite 2- O DI de Cataguases e o Terreno da CBA (2006)
Mesmo considerando a ausência de um estudo prévio e detalhado de viabilidade
técnica e econômica, podemos afirmar que, a localização do DI é adequada e permite uma
boa conexão com os esquemas produtivos locais, regionais e nacionais. Essas conexões
podem melhorar se ocorrerem as implementações infra-estruturais acima relatadas,
conjugando-as com instrumentos de regulação que evitem as deseconomias de
aglomeração.
É imperativo que se pense a política industrial integrada com a política urbana. O
Plano Diretor é um dos instrumentos que pode orientar no sentido de promover essa
articulação. Apesar de ter uma população de 63.980 habitantes (IBGE, Censo 2000),
Cataguases terá seu primeiro Plano Diretor em 2006. A partir desse momento, o poder
público municipal terá condições de implementar suas políticas de desenvolvimento
econômico, inclusive localização industrial, seguindo critérios mais rigorosos, apontados
pelas orientações do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e pelos órgãos estaduais de
apoio ao desenvolvimento econômico.
Uma vez analisada a lógica de localização industrial, vale destacar o estudo da
estrutura e procedimentos tecnológicos das indústrias que se instalaram no DI.
81
3.2.2 – A estrutura industrial e os procedimentos tecnológicos das indústrias do DI
O DI é composto por um conjunto de indústrias que se instalaram em terrenos
doados pela prefeitura ao longo da Avenida Manoel Inácio Peixoto, também conhecida como
“reta da saudade” . Com a instalação da primeira indústria em 1972, começa a se estruturar,
no município, um novo padrão de organização espacial, cuja finalidade é disciplinar o
desenvolvimento industrial. A destinação de uma área específica para instalação de
indústrias faz surgir um padrão espacial concentrado abrigando, principalmente, as micro e
pequenas empresas (Mapa 9).
A distribuição das indústrias se verifica no Mapa 9. No Quadro 13, observa-se a
localização das indústrias do DI, tendo como base a numeração proposta e sua associação
com a posição indicada no Mapa 9.
Indústrias
Quadro 13 - Distrito Industrial de Cataguases (2006)
Localização
Av. Manoel Inácio Peixoto
1- Almoxarifado (CFLCL)
Av. das Indústrias
2- Antares
3- Tempero Soluções
Av. Manoel Inácio Peixoto
4- JAS Metalúrgica
Av. das Indústrias
5- INDISCEL
“
6- Fábrica de Calçados
“
7- Temperos Vitalho
“
8- CAT-LEO
Av. Manoel Inácio Peixoto
9- Subestação Geradora (CFLCL)
“
10- Paloosa Confecções
“
11- CELT Projetos Elétricos
“
12- Terra Embalagens
“
13- Mapoan Madeiras
“
14- Machado Eletrônica
“
15- CIC (Companhia Industrial Cataguases)
“
16- Friatec – RHEINHUTTE
"
17- Vellemetal
“
18- Premaldados Zezinho
“
“
19- Chands Confecções
“
20- Conpar Confecções
“
21- ZOLLERN Metalúrgica
“
22- Cinta Moderna
“
23- São Jorge Eletrônica
“
24- Biscoito No 1
“
25- Realplastic
“
26- Carpintaria e Marcenaria Simões
“
27-Têxtil Goitacazes
“
28- Reciclibem
FONTE: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006
82
83
Esse padrão concentrado compreende, quanto aos ramos industriais, um quadro
bastante diversificado, já que se trata de um DI não especializado (Quadro 14)
Quadro 14 - Indústrias do DI de Cataguases (2006)
RAMOS INDUSTRIAIS
NÚMERO DE INDÚSTRIAS
Geração de Energia (Subestação)
1
Reciclagem e Embalagens Plásticas
3
Alimentícias
3
Artefatos de madeira/Marcenaria
3
Metalúrgicas
5
Eletromecânica
2
Pre-maldados de concreto
1
Calçados
1
Produtos Químicos de Limpeza
1
Têxteis (fiação)
2
Confecções
4
TOTAL
26
Fonte: Os dados sobre as indústrias foram obtidos através de entrevistas realizadas
em janeiro fevereiro de 2006.
As indústrias têxteis estão representadas no DI com duas unidades produtivas
distintas. Ambas trabalham somente com fiação de algodão (Quadro 15).
Quadro 15 - Indústrias Têxteis (fiação )do DI (2006)
Número de
empregados
Produção
(mês)
Classificação
(SEBRAE)
Cia Industrial
Cataguases (filial)
300
400 ton
grande
Têxtil Goitacazes
45
80 ton
pequena
EMPRESAS
Abrangência
espacial
do mercado
Exclusiva para CIC
Matriz (padrão
disperso)
Local, RJ,SP e SC
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006.
A Têxtil Goitacazes se instalou no DI em 1980 em função da doação do terreno
por parte da prefeitura e devido à existência de infra-estrutura. Possui espaço para
ampliação, e em 2000 importou novas máquinas automáticas para fiação. Isso gerou
aumento de produtividade e redução de 50% no quadro de empregados. Os resíduos de
algodão são reaproveitados e a empresa está licenciada, junto a Fundação Estadual do
Meio Ambiente (FEAM) com uma Licença de Operação (LO).
84
A Companhia Industrial Cataguases (CIC) ocupa o prédio da antiga Indústria
Irmãos Peixoto S A e é a maior empresa do DI. Foi contemplada em 1977, ainda quando era
Irmãos Peixoto S A, com a maior doação de terreno. Opera com máquinas automáticas
modernas e importadas de países europeus sendo que toda a linha de produção está sob
controle informatizado. É filial da unidade
principal (matriz) que se localiza no padrão
disperso. Toda a produção vai para tecelagem da indústria matriz. Possui
Licença de
Operação e os resíduos são vendidos para gerar recursos que são aplicados em projetos na
área social, cultural, ambiental e de cidadania (Instituto Francisca de Souza Peixoto).
As duas indústrias têxteis apresentam baixo potencial poluidor por trabalharem
exclusivamente com fiação de algodão.
No setor energético, a Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina (CFLCL)
se faz presente ocupando três terrenos para desenvolver três atividades distintas, mas
relacionadas diretamente ao setor (Quadro 16).
Quadro 16 - Geração de Energia Elétrica
e Atividades Correlatas – CFLCL (2006)
Atividades
Número de Empregados
Função
Aumoxarifado
6
Reposição de peças
Subestação
0
Redistribuição de Energia
Cat-Leo Energia SA
130
Projetos e Assistência Tecnológica
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006
Como relatado anteriormente, a CFLCL foi a grande responsável por
disponibilizar a energia elétrica para o desenvolvimento industrial do município desde o
início do século XX. É na área do DI que a CFLCL instalou a subestação que redistribui a
energia elétrica para a cidade. O comando e operação da subestação são feitos à distância,
através de uma sala de controle informatizada, portanto, não há empregados fixos na
subestação. O almoxarifado ocupa o lugar da antiga fábrica de postes e funciona de modo
convencional com 6 empregados. A CAT-LEO Energia SA é uma subsidiária de geração da
CFLCL, executando projetos de geração, transmissão e distribuição de energia. Com a
CAT-LEO, a CFLCL entrou no mercado das termoelétricas construindo a Usina
Termoelétrica de Juiz de Fora (UTEJF), com 82 MW de potência. Essa usina utiliza gás
natural fornecido pela Petrobrás.
A CAT-LEO utiliza equipamentos de ponta e opera em rede com sistema totalmente
informatizado. As atividades da CFLCL instaladas no DI são classificadas como de baixo
potencial poluidor por atuarem mais na prestação de serviços e distribuição de energia.
No setor de plásticos existem três empresas operando no DI (Quadro 17).
85
Quadro 17 - Indústrias de Reciclagem e Embalagens Plásticas do DI (2006)
Abrangência
Número de
Classificação
Empresas
Produção(mês)
espacial do
empregados
(SEBRAE)
mercado
Reciclibem
15
40 ton polite
micro
Local, MG e RJ
Realplastic
46
90 ton sacolas
pequena
Local e MG
Terra Embalagens
20
50 ton sacolas
pequena
Local, MG e RJ
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro e fevereiro de 2006.
São empresas que utilizam maquinários convencionais não informatizados. A
Reciclibem só produz granulados de polietileno de baixa densidade, matéria-prima para
produção de sacolas. A Terra Embalagens só produz as sacolas e compra o polietileno da
Reciclibem e de outros fornecedores da região Sudeste. A Realplastic é a única mais
verticalizada, ou seja, produz o próprio polietileno (alta e baixa densidade) e as sacolas e
sacarias industriais. A Reciclibem e a Realplastic produzem resíduos das lavagens primárias
dos “plásticos velhos” usados como matérias-primas. Esses resíduos vão para a coleta de
lixo urbano feita pela prefeitura.
No ramo de indústrias alimentícias existem três empresas alojadas na área do DI
(Quadro 18).
Quadro 18 - Indústrias Alimentícias do DI (2006)
Número de
Produção Classificação Abrangência espacial
Empresas
empregados
(mês)
(SEBRAE)
do mercado
Biscoitos no 1
80
50 ton
pequena
MG,RJ,SP e região Sul
Tempero Soluções
8
20 ton
micro
Local e MG
Temperos Vitalho
6
25 ton
micro
Local, MG e RJ
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006
Nesse setor predomina a produção de temperos à base de alho e sal com alguns
condimentos extras. A produção utiliza técnicas rudimentares com operações manuais e
trituradores/misturadores elétricos. Os empresários alegam que a produtividade é baixa e
precisam investir mais em maquinários para alcançar novos mercados.
A fábrica de biscoitos se destaca pelo volume de produção e abrangência
espacial do mercado. Utiliza máquinas elétricas para as misturas das massas, mas grande
parte das operações é manual, pois são fabricados biscoitos finos
que
precisam ser
acabados e embalados cuidadosamente. Utiliza água própria de fonte artesiana e não opera
com licença ambiental, pois possui baixo potencial de impacto. Os resíduos produzidos
86
pelas indústrias alimentícias vão para a coleta do lixo (cascas de alho, de cebola e restos de
embalagens) feita pela prefeitura.
No setor de artefatos de madeira e marcenaria três microempresas se destacam
atuando em áreas distintas (Quadro 19).
Quadro 19 - Indústrias de Artefatos de Madeira e Marcenaria do DI (2006)
Abrangência
Produção
Classificação
Número de
espacial do
Empresas
empregados
(mês)
(SEBRAE)
mercado
Não soube
Mapoam Madeiras
3
micro
Local
informar
Carpintaria e Marc.
50 a 80 urnas
6
micro
Local e MG
Simões
funerárias
Ind. Vassouras Santa
1500 a 2000
5
micro
Local e MG
Rita
peças
Fonte: Pesquisa de campo realizada em fevereiro de 2006
São empresas caracterizadas pela forte presença do trabalho manual técnico e
artesanal. A empresa Mapoan Madeireira fornece caibros, tábuas, retalhos e guarnições
para a construção civil sob encomendas. A Carpintaria e Marcenaria Simões Ltda produz
urnas
funerárias,
empregando
máquinas
convencionais
e
acabamento
artesanal
diversificado. A Indústria de Vassouras Santa Rita também utiliza maquinário convencional
para produzir vassouras de piaçava/padrão. As três empresas produzem resíduos de
madeira que são doados a comunidade (cavacos e serragens) ou vão para a coleta do lixo
urbano (resíduos de piaçava).
O ramo da metalurgia é o que congrega o maior número de empresas, inclusive
com a participação de duas multinacionais européias (Quadro 20).
87
Empresas
Quadro 20 - Indústrias Metalúrgicas do DI (2006)
Abrangência
Número de
Produção
Classificação
espacial
empregados
(mês)
(SEBRAE)
do mercado
Rheinhutte
78
500 a 600 itens
pequena
Zollern
198
800 a 1500 tens
média
Vellemetal
22
JAS
12
60 válvulas
500
contrapesos
Variável
pequena
micro
MG, SP, BA e
exportação
MG, RJ, SP, região
Sul e exportação
Local, RJ e SP
Local e MG
INDISCEL
7
Variável
micro
Local, RJ e SP
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro/fevereiro de 2006.
A indústria Friatec- Rheinhutte do Brasil produz bombas, válvulas especiais e
conexões em polietileno de alta tecnologia. A Zollern BHW do Brasil produz vários tipos de
mancais, casquilhos, buchas, bronzinas, engrenagens, perfis de aço e fundição de precisão.
Essas empresas são as de maior porte do setor e representam investimentos do capital
internacional europeu em Cataguases.
A Zollern é a única empresa que precisou de LO (Licença de Operação junto a
FEAM-MG) por ser classificada como empresa de grande potencial poluidor. A Zollern e a
Rheinhutte operam com equipamentos
modernos e importados da União Européia.
Possuem toda a produção assistida por sistema informatizado e são as únicas empresas
que exportam produtos para outros países da América do Sul.
A Vellemetal é uma fundição de ferrosos e ligas especiais que utiliza
equipamentos convencionais e forno a óleo combustível. Produz componente para as
indústrias metalúrgicas e têxteis do DI e do padrão disperso. A JAS trabalha sob encomenda
com concertos de máquinas e fabricação de novas peças para indústrias do DI e da cidade.
Trabalha com tornos modernos, mas não informatizados. A Indiscel produz discos para
refinação de celulose de papel, utilizando aparelhos e máquinas convencionais, também não
informatizados. Atende encomendas do Rio de Janeiro, São Paulo e, em Cataguases,
produz discos somente para a Indústria Cataguases de Papel. A Vellemetal, a JAS e a
Indiscel são consideradas empresas de baixo potencial poluidor. A Vellemetal é a única que
opera com óleo combustível, mas recolhe os resíduos e possui tanque receptor para evitar
contaminação do solo.
No DI estão instaladas quatro indústrias de confecções (Quadro 21)
88
Quadro 21 - Indústrias de Confecções do DI (2006)
Abrangência
Número de
Produção Classificação
Empresas
Espacial do
empregados
(mês)
(SEBRAE)
mercado
Conpar
50
3500 peças
pequena
MG,RJ e SP
Cinta Moderna*
Paloosa
30
5000 peças
pequena
MG,RJ,SP e ES
Chands
32
4500 peças
pequena
MG e RJ
Fonte: Pesquisa de campo realizada em fevereiro de 2006.
* A empresa Cinta Moderna não estava funcionando no período da pesquisa. Havia dado
férias coletivas aos funcionários e realizava reformas.
Desse grupo, a Conpar é a única que produz capas para colchões, sofás, lençóis e
toalhas. A Cinta Moderna produz linha de peças íntimas femininas e peças para gestantes. A
Paloosa e a Chands trabalham com confecções utilizando tecidos de algodão e fibras sintéticas.
Todas essas empresas utilizam máquinas de costura elétricas industriais convencionais
operadas individualmente. O número de empregados contratados pode oscilar em função do
nível de encomendas. São empresas de baixo potencial poluidor e os resíduos (retalhos de
tecidos) são reaproveitados ou vão para a coleta do lixo.
No setor de eletromecânica duas empresas se destacam na prestação de
serviços às indústrias locais (Quadro 22).
Quadro 22 - Indústrias Eletromecânicas do DI (2006)
Abrangência
Número de
Produção
Classificação
Espacial
Empresas
empregados
(mês)
(SEBRAE)
do mercado
Machado
Eletrônica
30
variada
pequena
Local e MG
Dragão
Eletromecânica
10
variada
micro
Local, MG e RJ
Fonte: Pesquisa de campo realizada em fevereiro de 2006.
Essas empresas trabalham com reparos e montagens de máquinas e motores
elétricos, prestando serviços às indústrias do DI e do padrão disperso. Trabalham com
equipamentos de precisão para aferição de peças, corrente elétrica, transformadores e
fabricam algumas peças para reposição. Os resíduos plásticos vão para a coleta de lixo e
os cavacos de aço são recolhidos e vendidos para os “ferro velhos”. São empresas que,
embora não informatizadas, precisam continuamente de atualização técnica e investimentos
em equipamentos para medições e montagem.
89
A única indústria do setor químico do DI é a empresa Antares que trabalha com
produtos de limpeza em geral. É uma micro empresa (6 empregados) e opera manualmente
produzindo detergente, desinfetantes, água sanitária e HCl. Atende ao mercado local e
outras cidades de Minas Gerais. A produção não é informatizada e nem mecanizada. Os
produtos são pesados, medidos e misturados manualmente. A empresa não possui licença
ambiental apesar de trabalhar com substâncias tóxicas e ácidos.
A empresa Premaldados Zezinho Ltda produz manilhas, blocos para calçamento
e meio-fio. Opera com 8 empregados (micro empresa) e utiliza misturador de concreto
elétrico convencional. É uma empresa que utiliza o trabalho braçal e usa como matériasprimas as britas, areias, água e cimento. Todo resíduo é reaproveitado, mas opera sem
licença ambiental. O empresário reconhece o baixo nível tecnológico, mas afirma que não
consegue recursos para modernização.
A fábrica de calçados Regina produz linha feminina com 4 empregados (micro
empresa) em época de baixa encomenda, dobrando o número quando necessário. Utiliza
máquinas convencionais com costuradeiras elétricas e trabalho manual nas colagens. O
proprietário reconhece a baixa produtividade, mas alega que mesmo assim gera lucro. Os
resíduos (curvin, pvc, latas de cola, plásticos) vão para a coleta do lixo.
A análise da estrutura industrial do padrão concentrado nos revela um quadro
bastante diversificado de ramos industriais, com larga predominância das micro e pequenas
empresas. As indústrias que mais investiram na modernização dos procedimentos
tecnológicos foram as têxteis (Têxtil Goitacazes e CIC – Companhia Industrial Cataguases),
as metalúrgicas (Zollern e Rheinhutte) e as eletromecânicas que precisam de constante
atualização
de equipamentos de precisão para a prestação de serviços em máquinas
modernas.
O setor metalúrgico é o que mais utiliza água, sendo que a Zollern usa água do
Rio Pomba e a Rheinhutte possui poço artesiano. A Realplastic e a Reciclibem também
utilizam água do Rio Pomba. É cobrado um imposto pelo uso da água do rio pela ANA
(Agência Nacional das Águas).
A pesquisa revelou um dado importante. Apesar de existir um conjunto
habitacional na área do DI, a maior parte dos empregados das indústrias vem de outros
bairros. Isso prova que o DI já se encontra bem conectado ao restante da cidade sendo
atendido por várias linhas de ônibus a cada trinta minutos.
Das empresas pesquisadas, as únicas que atendem ao mercado internacional
são as metalúrgicas Zollern e Rheinhutte. São empresas multinacionais que destinam de
15% a 20% de suas linhas de produção ao mercado externo. A CIC (Companhia Industrial
Cataguases) do DI não exporta, pois o seu setor de fiação abastece, exclusivamente, a CIC
matriz/tecelagem localizada no padrão disperso.
90
Ficou constatado que todas as empresas possuem espaço físico para ampliações
de área útil.
De modo geral, predomina no DI um modelo que ainda utiliza procedimentos
tecnológicos da estrutura industrial antiga. Mesmo entre aquelas que atualizaram os
equipamentos, não há nenhuma que pertença às novas gerações que produzem tecnologias
de ponta,
microeletrônica ou novos materiais. Na verdade, com exceção
das duas
multinacionais, são indústrias que ainda estão presas aos tradicionais esquemas de gestão
empresarial.
Passaremos, no próximo item, à análise do arranjo espacial do DI para avaliar os
níveis de interações entre as empresas.
3.3- O arranjo espacial do DI de Cataguases
O DI de Cataguases se instalou em terraços fluviais a jusante da área urbana
central aproveitando o alargamento da margem direita do rio Pomba (Figura 2).
Figura 2 - Perfil da área do DI de Cataguases (Norte – Sul)
É realmente uma das poucas áreas mais planas do município que podem
permitir a aglomeração industrial.
Podemos dividir a área do DI em dois setores. O primeiro setor foi o pioneiro e é
91
hoje o mais importante por concentrar 90% das indústrias. Sua área é cortada ao meio pela
Avenida Manoel Inácio Peixoto. Trata-se de uma via pública de circulação em duplo sentido,
mas separada por um canteiro central que permite a instalação de indústrias dos dois lados
(Figura 3). Portanto, as indústrias se arranjaram linearmente (direção W – E), lado a lado,
ao longo da avenida central. É uma área de circulação livre, ou seja, não há impedimento
ao tráfego de pessoas ou veículos. A disposição linear das indústrias favorece o tráfego de
veículos, mas, às vezes, dificulta as manobras de entrada e saída feitas por grandes
caminhões de carga que prestam serviços de transporte no DI.
Figura 3. Esboço da disposição dos terrenos no DI de Cataguases
A ocupação legal dessa área já está em, aproximadamente, 90%, sendo que as
empresas ainda podem expandir suas áreas úteis para os fundos de seus terrenos. No
entanto, para os terrenos que estão mais próximos ao rio, o fator limitante é a planície de
inundação. Essa constitui um faixa de terrenos aluviais, abaixo dos terraços, sujeita à
inundações nos períodos chuvosos.
Para os terrenos que estão no lado oposto (à direita de quem entra no DI vindo
do centro urbano), o fator limitante seria a existência de um morro com declividade
92
acentuada (Mapa 9).
A possibilidade de expansão linear das indústrias também foi impedida devido à
construção de dois conjuntos habitacionais: o bairro residencial “Taquara Preta” e o bairro
“São Cristóvão”. A existência de um conjunto habitacional inserido na área do DI funciona
como fator limitante à instalação de indústrias de grande potencial poluidor, por representar
riscos para comunidade. Por não existir um instrumento legal de regulação, a ocupação da
área
produziu uma faixa de transição, onde algumas indústrias se misturaram com as
residências do bairro “Taquara Preta”.
Nesse setor do DI, as observações de campo e as entrevistas também
constataram que faltam normas mais rígidas para aprovação de projetos. Esse fato acabou
gerando superdimensionamento
dos terrenos. Foi possível constatar que as empresas
(todas) obtiveram aforamentos de áreas bem acima do que precisavam. Alegavam, em
geral, necessidades de expansão futura. No entanto, somente três empresas promoveram
expansões de área útil significativa, após instalação e funcionamento: a Zollern, a CIC e a
CAT-LEO.
O segundo setor que compõe o DI de Cataguases corresponde à Avenida das
Indústrias no bairro Santa Clara. É uma área de instalação industrial mais recente e também
linear. Apresenta 5 indústrias classificadas como micro empresas. Essas poucas indústrias
se misturam com residências, comércio e uma escola. Nesse setor a via de circulação é
precária, sem manutenção e não há mais espaço para novas indústrias.
Fazendo um balanço de ocupação da área total do DI (incluindo os dois setores),
constatamos, em janeiro de 2006, a existência de 4 áreas livres para a instalação de novas
indústrias e 7 galpões vazios que também podem abrigar novas unidades produtivas (Mapa
9).
O DI de Cataguases possui um arranjo espacial simples e de configuração linear
evidenciando a ausência de um plano urbanístico prévio e mais elaborado que pudesse
quebrar a rigidez estabelecida pela justaposição dos empreendimentos. Essa justaposição
limita a circulação à avenida central e, ao “esconder” a profundidade dos terrenos (ou
impedir o acesso), inviabiliza a possibilidade de um aproveitamento mais justo da área por
mais empresas. Principalmente devido ao fato de predominarem as micro e pequenas
empresas.
Com certeza esse arranjo espacial também influencia na qualidade das
interações intra-distrito. Assunto que estaremos abordando no próximo tópico.
93
3.3.1- As interações espaciais Intra-Distrito (2006)
Em estudo sobre a política de implantação industrial em Minas Gerais, Oliveira
(1976) afirma que, no caso dos DIs mineiros,
não existe uma preferência por tipos
específicos de indústrias ou por determinados portes. Nesse sentido, o DI de Cataguases
reflete essa realidade. Com 26 indústrias e larga predominância das micro e pequenas
empresas, o DI apresenta 11 ramos industriais distintos. E como já foi apontado
anteriormente, o DI de Cataguases não passou por um estudo prévio de viabilidade técnicoeconômico e nem teve um planejamento urbanístico mais elaborado.
É notório que, um quadro tão diversificado de ramos industriais produza um
baixo nível de articulação e complementaridade entre as empresas. Tal fato acaba gerando
uma baixa eficiência coletiva e o aprofundamento do isolamento das indústrias.
No DI de Cataguases só existem dois ramos de indústrias que apresentam um
certo nível de articulação. O primeiro é o grupo comandado pelas duas metalúrgicas
multinacionais: a Zollern e a Rheinhutte. Não há articulação entre essas empresas, mas
elas contratam serviços e compram peças fabricadas pelas empresas do mesmo ramo e do
setor eletromecânico instaladas no DI: Vellemetal, JAS Metalúrgica, Machado Eletrônica e
Dragão Eletromecânica.
O segundo grupo que também possui um certo nível de articulação é o de
reciclagem e embalagens plásticas. Nesse ramo constatamos que a empresa Reciclibem é
uma das fornecedoras de polietileno de baixa densidade para a Terra Embalagens que
produz sacolas plásticas.
Obviamente, no caso da energia elétrica ocorre uma articulação forçada, pois
por
necessidade e facilidade infra-estrutural, todas as empresas compram energia da
Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina (CFLCL), cuja subestação geradora se
encontra instalada na área do DI. É o único caso em que uma só empresa (a CFLCL) se
articula com todas. Mesmo assim, a indústria Têxtil Goitacazes já instalou um gerador
próprio de energia elétrica (a óleo combustível) com o objetivo de não ficar refém de um
único fornecedor.
No ramo têxtil, embora existam duas empresas de fiação, elas não se articulam
e nem vendem para o setor de confecções do DI. A Têxtil Goitacazes atende mercados fora
do DI e a CIC (Companhia Industrial Cataguases) é fornecedora exclusiva da CIC
matriz/tecelagem que se localiza no padrão disperso.
Um outro tipo de interação bastante relevante ocorre entre as indústrias e as
empresas de transportes baseadas no DI (Quadro 23).
94
Quadro 23 - Empresas Transportadoras Baseadas no DI (2006)
% de serviços
% de sereviços
Número de
Ano de
Empresas
prestados no
prestados fora do
empregados instalação
DI
DI
Esplanada
5
2003
50
50
Eureka
20
2002
-
100
VT transportes
90
1992
60
40
20
2001
50
50
-
-
-
-
Camilo dos
Santos
Transeguro*
Fonte: Pesquisa de campo realizada em fevereiro de 2006.
*A empresa Transeguro trabalha com transporte de valores financeiros e segurança
patrimonial. Alegando motivos de segurança e sigilo, não informou dados.
A maioria das indústrias dá preferência às transportadoras do DI. A Eureka é a
única transportadora que não consegue cargas no DI. A Eureka alega que a empresa VT,
por ser a maior e a mais antiga, monopoliza e impõe os valores dos fretes. Os empresários
entrevistados afirmaram que a existência das transportadoras no DI é bastante positiva,
pois ajuda na redução dos custos de frete, em função da concorrência.
O DI de Cataguases apresenta uma deficiência que acaba refletindo no baixo
nível de interação. Não possui um centro administrativo (uma entidade para gerir as
atividades jurídico-administrativas) que pudesse
atuar como elemento organizador e
regulador de sua dinâmica interna. Por isso, as economias de aglomeração alcançadas se
referem basicamente àquelas geradas pelo uso das infra-estruturas que foram
disponibilizadas pelo poder público municipal. Não se produziu uma eficiência coletiva, pelo
contrário, percebe-se um elevado grau de isolamento das indústrias que, em sua grande
maioria, se instalaram nessa área porque foram contempladas com a doação de terrenos.
3.3.2 – As interações espaciais externas nas quais se insere o DI de Cataguases (2006)
No ítem anterior relatamos que o DI de Cataguases apresenta um baixo grau de
eficiência coletiva em função da pouca interatividade e complementaridade das empresas,
que numa mesma área representam 11 ramos industriais distintos. Se as interações internas
são fracas, as externas são bastante significativas, principalmente em relação à aquisição
de insumos e matérias-primas. Isso acaba deslocando a complementaridade do processo
produtivo, em sua maior parte, para as relações com as empresas externas ao DI. Tal fato
95
fica bastante evidente quando rastreamos a origem das matérias-primas e a abrangência
espacial dos mercados atendidos pelas indústrias do DI.
Quanto a origem das matérias-primas, percebe-se que a relação mais intensa
ocorre na própria região Sudeste com destaque para as compras realizadas com outras
cidades de Minas Gerais e Estado de São Paulo. As aquisições feitas no padrão disperso
estão em equilíbrio com as efetuadas com o Estado do Rio de Janeiro. As únicas compras
realizadas fora da região Sudeste se referem ao algodão proveniente da região CentroOeste e a piaçava originária da região Nordeste (Quadro 24).
Quadro 24 - Ramos Industriais e as Origens das Matérias-primas (2006)
Origens das matérias-primas
RAMOS
Reg. Reg. Reg. Mercado
Local MG
RJ
SP
ES
INDUSTRIAIS
CW
S
NE
Externo
Energia Elétrica
X
Plásticos/Rec.
X
X
X
X
Alimenticia
X
X
X
Art.Mad/Marcenaria
X
X
X
X
Metalurgia
X
X
X
X
Confecções
X
X
X
Eletromecânica
X
X
X
Química/Mat. Limp.
X
X
Premaldados/Conc.
X
Calçados
X
Têxtil
X
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro e fevereiro de 2006
A CFLCL, que possui sede em Cataguases e subestação no DI, obtém energia
elétrica de usinas que se instalaram fora do município de Cataguases. Por outro lado, as
indústrias de confecções do DI não compram suas matérias-primas das indústrias têxteis de
Cataguases. Como trabalham com o jeans e fibras sintéticas, optam por comprá-los de outras
cidades de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Portanto, podemos concluir que, quanto a
origem das matérias-primas, as relações do DI se circunscrevem predominantemente na região
Sudeste.
No que se refere à abrangência espacial do mercado, a região Sudeste também
concentra a maior parte das relações. Todos os ramos do DI atendem o mercado local e
outras cidades de Minas Gerais. Fora de Minas Gerais percebe-se um maior direcionamento
para os mercados do Estado do Rio de Janeiro e depois para o Estado de São Paulo
(Quadro 25).
96
Quadro 25 - Abrangência Espacial do Mercado (2006)
Ramos industriais
Local MG
RJ
SP
ES
Reg.
CW
Reg.
S
Reg.
NE
Mercado
Externo
X
X
Energia Elétrica
X
X
Plásticos/ Rec.
X
X
X
Alimenticia
X
X
X
X
Art.Mad./Marcenaria
X
X
Metalurgia
X
X
X
X
Confecções
X
X
X
X
Eletromecânica
X
X
X
Química/Mat. Limp.
X
X
Premaldados/Conc.
X
Calçados
X
X
X
Têxtil
X
X
X
X
Fonte: Pesquisa de campo realizada em janeiro e fevereiro de 2006
Para as regiões mais distantes quem sobressai é o setor metalúrgico (Zollern e
Rheinhutte) que atende a regiões do Nordeste e também exporta para vários países da
América do Sul. A Têxtil Goitacazes é a única indústria do DI que atende a região Sul. Essa
empresa possui um contrato de exclusividade para fornecimento de fios de algodão para
uma indústria têxtil localizada no Estado de Santa Catarina.
A pesquisa revelou também que as interações de complementaridade entre as
indústrias do DI e as do padrão disperso não são bastante significativas. Se restringem a
alguns poucos ramos, caracterizando uma articulação pontual e segmentada, destacando,
mais uma vez, os setores de energia elétrica, metalurgia e têxtil. Energia elétrica porque a
subestação da CFLCL localizada no DI é quem redistribui a eletricidade para toda a cidade
e distritos do município. No setor metalúrgico a Zollern e a Rheinhutte contratam serviços de
fabricação de algumas peças da Fundição Cataguases. Já a CIC é uma filial que trabalha
exclusivamente com fiação de algodão para atender a CIC – matriz
que executa a
tecelagem.
No setor de transporte de cargas, como já foi apontado no quadro 23, as
transportadoras instaladas no DI são as empresas que mais se articulam com o padrão
disperso. O volume de serviços prestados fora do DI varia de 40% a 100%, dependendo da
empresa.
Desse modo, em função do que foi exposto, concluímos que se as interações
internas do DI são fracas, as externas são bastante relevantes e, em sua maior parte,
ocorrem dentro da própria região Sudeste. Foi detectado uma maior freqüência nas
interações comerciais locais e com outros município de Minas Gerais. Embora menos
significativas na freqüência, as interações com os Estados do Rio de Janeiro e São Paulo
97
são consideradas estratégicas tanto para o fornecimento de insumos e matérias-primas,
quanto no volume de compras efetuado por estes Estados, cujos
valores financeiros
acabam sendo bastante expressivos.
Uma vez conhecida a forma como se estrutura e funciona a atividade industrial
de Cataguases passaremos, no próximo capítulo, a analisar os impactos sócio-ambientais
relacionados à forma de organização espacial de seus dois padrões: o disperso e o
concentrado.
CAPÍTULO
4
–
A
PROBLEMÁTICA
AMBIENTAL
ENTRE
AS
LÓGICAS
DE
ORGANIZAÇÃO INDUSTRIAL DISPERSA E CONCENTRADA DE CATAGUASES.
A Política Nacional do Meio Ambiente, criada em 1981, representa um marco
político importante para questão ambiental no Brasil. Por isso, nesse capítulo analisaremos
o papel do poder público no cumprimento dessa política e faremos também os diagnósticos
ambientais dos padrões industriais disperso e concentrado.
4.1 – A (Des)ordem Ambiental sob o Prisma da Normatização Ambiental
Em março de 2003, o rompimento da barragem de rejeitos da empresa Indústria
Cataguases de Papel Ltda produziu graves impactos ambientais. Os rejeitos da indústria de
papel atingiram o rio Pomba e, posteriormente, o rio Paraíba do Sul, comprometendo o
abastecimento de água das cidades ribeirinhas da Zona da Mata e norte do Estado do Rio
de Janeiro.
Os agentes poluidores (soda cáustica, lignina, sulfeto de sódio, enxofre e
organoclorados ) produziram um composto de cor preta chamado de licor negro. Esse
material estava armazenado havia mais de 15 anos. Eram resíduos da produção de celulose
que remontam ao tempo em que o grupo Matarazzo comandava a fabricação de papel e
celulose em Cataguases. Todas as cidades que dependiam diretamente do uso da água
(abastecimento urbano, irrigação, piscicultura, pesca e agricultura de várzea) foram
prejudicadas, pois o acidente impediu temporariamente o desenvolvimento dessas
atividades (Mapa 10).
Mapa – 10 A Rota dos Poluentes: o acidente em Cataguases (2003)
Fonte: Folha de São Paulo 04/04/2003
99
Os debates e ações relativos a esse grave acidente ambiental, mobilizou a
imprensa, os órgãos de governos (Federal, Estaduais e Municipais), Crea-MG, sociedade
civil, universidades e ONGs ligadas ao meio ambiente. As discussões foram intensas
envolvendo
os
órgãos
encarregados
do
licenciamento
e
fiscalização
ambiental
evidenciando, nos dois Estados, uma crise de competências, principalmente em relação à
eficiência e escalas de atuação.
O acidente também produziu um conflito entre as Secretarias Estaduais de Meio
Ambiente dos Estados envolvidos, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Segundo o Jornal Estado
de Minas (02/04/2003), o Secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano do Rio de
Janeiro acusou o Secretário Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais de omissão e
incompetência na gestão ambiental. Como o acidente ultrapassou os limites do Estado de
Minas Gerais e atingiu o Estado do Rio de Janeiro, o Governo Federal, através do Ministério
do Meio Ambiente, foi acionado e enviou técnicos do IBAMA para uma avaliação do
problema. Na mesma semana do acidente, o Ministério do Meio Ambiente anunciou a
criação de um Sistema Integrado de Prevenção e Combate aos Riscos Ambientais para
evitar novos acidentes. O sistema seria responsável por fazer o mapeamento dos
procedimentos e da estrutura técnica disponível em todo o país para o combate a danos
causados por grandes acidentes ambientais (ESTADO DE MINAS, 02/04/2003). Esse
acidente revelou como é precário o sistema de prevenção e fiscalização dos órgãos
governamentais.
Passados três anos, em março de 2006, um novo acidente de grandes
proporções envolve mais uma grande empresa de Cataguases. Dessa vez foi o vazamento
de 400 milhões de litros de rejeito de bauxita da Rio Pomba Minerações, uma empresa do
Grupo Química Cataguases que opera a lavagem desse minério no município de Miraí
(MG). O vazamento foi provocado pelo rompimento do vertedouro da barragem de rejeitos e,
mais uma vez, os impactos ambientais ultrapassaram os limites do Estado de Minas Gerais,
pois a lama da lavagem da bauxita atingiu o rio Muriaé e, posteriormente, o rio Paraíba do
Sul, no Estado do Rio de Janeiro. Embora a lama da lavagem da bauxita seja menos tóxica,
a contaminação dos rios Muriaé e Paraíba do Sul interrompeu o abastecimento de água nas
cidades de Muriaé e Patrocínio, em Minas Gerais e Lages, Itaperuna, Italva e Cardoso
Moreira, no noroeste fluminense. Mais uma vez, um acidente atingiu, através da bacia do
rio Paraíba do Sul, dois Estados da Federação – Minas Gerais e Rio de Janeiro (Mapa 11).
A proposta feita em 2003 pelo Governo Federal de criação de um Sistema Integrado de
Prevenção e Combate aos Riscos Ambientais não funcionou, deixando transparecer a
ineficiência e a falta de articulação dos órgãos municipais, estaduais e federais , em relação
à problemática ambiental.
100
Mapa 11 – Rota do Vazamento da Lavagem da Bauxita: acidente em Miraí (2006)
Fonte: Folha de São Paulo 04/03/2006
Como as empresas envolvidas nos dois acidentes, acima relatados, possuem suas
sedes em Cataguases, faz-se necessário analisar os instrumentos normativos legais e as
esferas de competências dos órgãos e entidades ambientais que, juntos, deveriam
regulamentar e fiscalizar as atividades econômicas no Estado de Minas Gerais, em especial a
atividade industrial.
A Constituição Federal é a lei principal, a base segundo a qual as demais normas
são emanadas. No que se refere ao meio ambiente, a Constituição Federal, em seu Art.
225, deixa claro que:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de
uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao
Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preserva-lo para as
presentes e futuras gerações.
No entanto, sabemos que é só através da lei que a sociedade organizada tem
condições de cumprir a
obrigação constitucional de preservação e defesa do meio
ambiente. No Brasil, a norma federal cria a Política Nacional do Meio Ambiente e esta, por
sua vez, define as Diretrizes Estadual e Municipal de Meio Ambiente.
A Política Nacional do Meio Ambiente foi criada através da Lei no 6938, de 31 de
agosto de 1981, constituindo o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA). O SISNAMA é
o conjunto de órgãos e instituições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
101
que são encarregados da proteção do meio ambiente. É composto pelos seguintes órgãos
(FEAM, p. 11 e 12, 2003):
1– Conselho de Governo: órgão superior que assessora o
Presidente da República na formulação da política nacional e nas
diretrizes governamentais para o meio ambiente;
2- Conselho Nacional do Meio Ambiente – (CONAMA) :
órgão consultivo e deliberativo com a finalidade de assessorar o
Conselho de Governo e deliberar sobre normas e padrões
compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado
essencial à sadia qualidade de vida.
3- Ministério do Meio Ambiente – (MMA): planeja,
coordena, supervisiona e controla a política nacional e as diretrizes
governamentais fixadas para o meio ambiente.
4- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
Naturais Renováveis – (IBAMA): tem a finalidade de executar e fazer
executar a política e diretrizes governamentais para o
meio
ambiente.
5- Órgãos Seccionais – órgãos ou entidades estaduais
responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e
fiscalização de atividades capazes de provocar degradação
ambiental.
6- Órgãos Locais – órgãos municipais responsáveis pelo
controle e fiscalização de atividades capazes de provocar
degradação ambiental.
O Art. 23 da Constituição Federal ao colocar que a proteção do meio ambiente
e o combate da poluição são competências comum da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, acaba repartindo a responsabilidade legal, uma vez que cada
ente público terá que estabelecer os seus próprios princípios normativos.
Assim fica claro que a Constituição Federal permite que o município possa
legislar sobre o meio ambiente, conforme consta das competências dos municípios
expressas no Art. 30 :
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
Os quadros 26 e 27 demonstram como se estrutura a legislação ambiental e os
instrumentos legais pertinentes as competências de cada ente público.
102
Quadro 26 - Estruturação da Legislação Ambiental no Brasil
Fonte: FEAM, 2003
103
Quadro 27 - Instrumentos Legais e Políticas do Meio Ambiente
Constituição Federal
Leis e Decretos Federais
Resoluções CONAMA
Política Nacional
de Meio Ambiente
Leis e Decretos Estaduais
Deliberações Normativas COPAM
Resoluções COPAM
Política Estadual
de Meio Ambiente
Lei Orgânica (Códigos Ambiental de
Obras e Posturas)
Leis e Decretos Municipais
Deliberações Normativas CODEMA
Política Municipal
de Meio Ambiente
Fonte: FEAM 2003
Na implementação de sua política ambiental, o Estado de Minas Gerais optou por
um sistema de administração com a participação da sociedade civil, através da Comissão de
Política Ambiental (COPAM), criada em 1977. Em 1987, a Comissão de Política Ambiental foi
transformada em Conselho Estadual de Política Ambiental, mantendo a mesma sigla - COPAM.
Trata-se de um órgão normativo, colegiado, consultivo e deliberativo, com finalidade de decidir
sobre diretrizes , políticas, normas e padrões ambientais, visando a preservação do meio
ambiente e dos recursos ambientais. O COPAM está subordinado à Secretaria de Estado de
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – SEMAD.
O COPAM é composto pelo Plenário, instância superior de deliberação, por sete
Conselhos Regionais, com sede em Diamantina, Divinópolis, Governador Valadares, Montes
Claros, Ubá, Uberlândia e Varginha e por sete Câmaras Especializadas:
1- Câmara de Política Ambiental: CPA;
2- Câmara de Atividades Industriais: CID;
3- Câmara de Atividades Minerarias: CMI;
4- Câmara de Atividades de Infra-Estrutura: CIF;
5- Câmara de Atividades de Agrossilvopastoris: CAP;
6- Câmara de Proteção da Biodiversidade: CPB;
7- Câmara de Recursos Hídricos: CRH.
104
Existem três órgãos executivos e de assessoramento técnico às Câmaras
Especializadas, aos Conselhos Regionais e ao Plenário, vinculados à SEMAD (Quadro 28):
-
FEAM: Fundação Estadual do Meio Ambiente. Assessora três das sete
Câmaras do COPAM: Câmara de Atividades industriais; Câmara de
Atividades Minerarias e Câmara de Atividades de Infra-Estrutura.
-
IEF: Instituto Estadual de Floresta. Assessora a Câmara de Atividades
Agrossilvopastoris e a Câmara de Proteção da Biodiversidade.
-
IGAM: Instituto Mineiro de Gestão das Águas. Assessora a Câmara de
Recursos Hídricos.
Quadro 28 – Sistema Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais
Fonte: FEAM, 2003
O Sistema Estadual do Meio Ambiente criou as chamadas três agendas: Azul,
Verde e Marron.
A Agenda Azul trata dos temas relacionados com as águas. O IGAM é o órgão
responsável pela concessão de outorga de direito de uso das águas estaduais e proteção
de mananciais.
105
A Agenda Verde abrange a preservação das matas e florestas, a criação e
manutenção de unidades de conservação, o controle do desmatamento, a proteção da
biodiversidade, a política de pesca, além do controle da degradação ambiental provocada
pelas atividades agrossilvopastoris. O IEF é o órgão responsável pela concessão de
autorizações de supressão de vegetação, pelo controle da pesca e pela instrução de
processos de licenciamento ambiental e de aplicação de penalidades referentes às
atividades agrícolas, pecuárias e florestais.
A Agenda Marrom trata do controle da degradação ambiental decorrente das
atividades industriais, minerarias e de infra-estrutura. A FEAM é o órgão responsável pelos
processos de licenciamento ambiental e de aplicação de penalidades relativas à indústria,
minerações e obras de infra-estrutura, tais como rodovias, ferrovias, gasodutos, usinas
hidrelétricas, loteamentos, estações de tratamento de água, estações de tratamento de
esgotos e aterros sanitários.
Fazendo valer o princípio da autonomia administrativa garantida pelo Art.30 da
Constituição Federal, o Município pode legislar sobre o meio ambiente e instituir secretarias,
órgãos municipais ou conselhos de meio ambiente para deliberarem sobre assuntos de
interesse local. De acordo com a Resolução CONAMA no 237/97, para integrar o Sistema
Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), o Município deve implementar o Conselho
Municipal de Meio Ambiente, com caráter deliberativo e participação da sociedade e ainda
possuir um órgão técnico-administrativo, com profissionais legalmente habilitados. No
entanto, a abrangência espacial de atuação se restringirá à unidade territorial administrada
pelo poder público Municipal. Segundo a FEAM (2003), em Minas Gerais já existem mais de
200 Conselhos Municipais de Meio Ambiente ou também chamados de Conselho Municipal
de Conservação e Defesa do Meio Ambiente (COMDEMA). O COMDEMA é órgão
colegiado, criado por lei municipal, formado preferencialmente por representantes da
Administração Municipal, Câmara de Vereadores e da sociedade civil organizada.
Recomenda-se a representação paritária entre o Poder Público e a sociedade civil. As
atribuições do Conselho são definidas pela lei de sua criação.
Em relação ao que foi exposto podemos sistematizar um quadro da competência
legal de fiscalização e licenciamento em função da abrangência territorial dos
empreendimentos e dos impactos ambientais por eles causados (Quadro 29).
106
Quadro 29 - Impacto Ambiental da Atividade e Competência Legal
de Fiscalização e Licenciamento.
Local de maior
Competência para
Tipo de impacto
impacto
fiscalizar e licenciar
IBAMA
ABRANGÊNCIA DE DOIS
ESTADOS
Resolução CONAMA
237/97
COPAM/FEAM
IMPACTO
MUNICÍPIO
Delib. Norm. COPAM
AMBIENTAL REGIONAL
01/90
IMPACTO
PREFEITURA E CODEMA
AMBIENTE LOCAL
Lei Municipal
ATIVIDADES SEM
IMPACTO AMBIENTAL
Fonte: FEAM, 2003.
Pelo esquema apresentado no Quadro 29, fica claro que, em Minas Gerais, o
licenciamento ambiental é de competência do Conselho Estadual de Política Ambiental
(COPAM) que reúne as funções de órgão normativo e deliberativo. Junto ao COPAM, atuam
a FEAM, o IEF e o IGAM, órgãos técnicos executivos que são responsáveis pela elaboração
de pareceres técnicos e jurídicos que irão fornecer subsídios para as decisões sobre o
licenciamento ambiental e a concessão de outorgas para as atividades de grande porte e
potencial poluidor ou degradador. Esses órgãos verificarão se o empreendimento e o local
de sua instalação estão de acordo com as normas municipais, estaduais e federais de uso
do solo. Compete também a esses órgãos convocar as audiências públicas sobre os
projetos e proceder à avaliação dos seus impactos. As atividades ou empreendimentos
potencialmente modificadores do meio ambiente deverão seguir as três fases do
licenciamento que são:
-
LP (Licença Prévia): é requerida na fase preliminar de planejamento
do empreendimento ou atividade. Nessa primeira fase do licenciamento
avalia-se a localização e a concepção do empreendimento, atestando a sua
viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos a serem
atendidos nas próximas fases. É durante a análise da LP que poderá ocorrer
a audiência pública.
-
LI (Licença de Instalação): nesta fase são analisados os projetos
executivos de controle ambiental sendo avaliada a sua eficiência, conforme
tenha sido prevista na fase anterior. A LI concede o direito para a instalação
do empreendimento e obras como movimentação de terra, cortes e aterros,
aberturas de vias, construção de edificações, galpões, diques, barragens e
107
montagens de equipamentos técnicos necessários à execução do conjunto da
obra.
-
LO (Licença de Operação): autoriza a operação do empreendimento,
após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças
anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes
determinadas para a operação. Portanto, a concessão da LO vai depender do
cumprimento daquilo que foi examinado e deferido nas fases de LP e LI.
Para os empreendimentos instalados anteriormente à legislação ambiental de
10/03/1981, regulamentada pelo COPAM, é adotado o licenciamento corretivo através de
convocação para licenciamento. No entanto, esses empreendimentos só têm obrigação de
apresentarem LO se forem convocados para licenciamento pelo COPAM ou por seus órgãos
seccionais.
A necessidade de autorização ambiental para as atividades potencialmente
poluidoras ou degradadoras do meio ambiente acaba criando uma demanda de análises e
estudos detalhados de projetos bastante elevada. Com o objetivo de agilizar e
desburocratizar as autorizações, o COPAM, através da Deliberação Normativa no 74, de 09
de setembro de 2004, estabelece critérios para classificação , segundo o porte e potencial
poluidor, dos empreendimentos e atividades modificadoras do meio ambiente que deverão
apresentar o licenciamento ambiental em todas as suas fases.
Para atingir esse objetivo os empreendimentos e atividade modificadoras do
meio ambiente foram enquadradas em seis classes que conjugam o porte e o potencial
poluidor ou degradador do meio ambiente (1,2,3,4,5 e 6), conforme o quadro 30:
Quadro 30 - Determinação da Classe do Empreendimento
a partir do Potencial Poluidor da Atividade e do Porte.
Potencial poluidor/degradador geral da atividade
Porte do
Empreendimento
P
M
G
P
1
1
3
M
2
3
5
G
4
5
6
Fonte: DN no 74/2004 – COPAM (MG)
108
O potencial poluidor/degradador da atividade pode ser considerado pequeno (P),
médio (M) ou grande (G), em função das características da atividade , conforme as listagens
A,B,C,D,E,F e G:
Listagem A: Atividades Minerarias
Listagem B: Atividades Industriais/Metalúrgicas
Listagem C: Atividades Industriais/ Indústrias Químicas
Listagem D: Atividades Industriais/ Alimentícias
Listagem E: Atividades de Infra-Estrutura
Listagem F: Serviços e Comércio Atacadista
Listagem G: Atividades Agrossilvipastoris
O potencial poluidor
diz respeito à capacidade que cada atividade tem de
impactar o ar, as águas e os solos.
O porte do empreendimento também se classifica em pequeno (P), médio (M) e
grande (G), de acordo com os limites fixados nas listagens
(relativos à área útil do
empreendimento e a natureza e volume de produção).
A partir das informações fornecidas previamente pelas empresas através do
preenchimento
do FCE (Formulário de Caracterização do Empreendimento), o órgão
responsável pelo licenciamento (FEAM) conhecerá
potencial poluidor.
o porte do empreendimento e seu
Para identificação da classe do empreendimento basta lançar os
dados no Quadro 30. O Art. 1o da DN no 74/2004 ratifica que os empreendimentos e
atividades modificadoras do meio ambiente sujeitas ao licenciamento ambiental no nível
estadual são aqueles enquadrados nas classes 3, 4, 5 e 6. Portanto, esses deverão cumprir
todo o processo de licenciamento obedecendo a seqüência LP - LI – LO. Os
empreendimentos enquadrados nas classes 1 e 2, como representam baixo risco para o
ambiente, precisarão obter somente o alvará de funcionamento em conformidade com as
normas e regulamentos municipais.
Podemos concluir que o Estado de Minas Gerais possui uma estrutura normativa
ambiental bastante complexa, mas que ainda enfrenta dificuldades operacionais relativas às
competências de seus órgãos seccionais. No que diz respeito aos licenciamentos
ambientais, ainda não existe uma eficiente comunicação entre os órgãos estaduais (e
destes com os municipais) para uma integração documental e operacional. O ideal seria o
licenciamento integrado para melhorar a eficiência técnica e reduzir o tempo da tramitação
do processo de licenciamento (LP, LI, LO), evitando os problemas e excessos relativos às
109
exigências documentais nos níveis municipal, estadual e federal.
No que se refere às fiscalizações, as reincidências dos acidentes ambientais no
Estado demonstram falhas e ineficiências técnicas operacionais. Segundo a FEAM, falta
maior aparelhamento e pessoal técnico para cumprir a fiscalização preventiva de forma a
evitar os problemas ambientais. Além dessas dificuldades, há de se considerar
que o
Estado de Minas Gerais é uma unidade territorial bastante ampla com uma área de
586.528,3 Km2, comportando 853 municípios. Por outro lado, os Conselhos Municipais de
Defesa do Meio Ambiente (COMDEMA), além do baixo nível de articulação com os órgãos
estaduais, quando existem, operam com baixa eficiência técnica e sofrem fortes pressões
dos políticos locais e dos setores econômicos envolvidos.
É dentro desse quadro que estaremos, nos próximos itens, fazendo um
diagnóstico das condições ambientais
em função da organização industrial dispersa e
concentrada de Cataguases.
4.1.1 – O diagnóstico ambiental do padrão disperso das indústrias
Caracterizado pela ausência de um zoneamento urbano, o padrão disperso foi
a primeira forma de organização espacial da indústria de Cataguases. As decisões
locacionais eram exclusivamente tomadas pelos empresários que procuravam obter
vantagens frente a fatores indispensáveis à logística de suas empresas como o sítio, a
posição, a mão de obra, os meios de transportes, o mercado e a energia. Produzia-se,
então, uma distribuição desigual da indústria no espaço urbano. Essa dispersão, à medida
que tornou mais complexa a relação indústria - cidade, favoreceu também a expansão do
tecido urbano. Atualmente, segundo a Prefeitura Municipal de Cataguases (2006), a cidade
conta com 317 indústrias dos mais variados ramos, sendo que 90% se localizam no padrão
disperso.
O diagnóstico ambiental do padrão disperso tem como referência as indústrias
mais significativas. Por serem as maiores e mais antigas, são também as primeiras da fase
industrial de Cataguases. Essas empresas contribuíram para o surgimento de outras
indústrias, várias atividades econômicas, serviços e urbanização. A análise baseia-se nas
entrevistas feitas com os empresários ou representantes técnicos das empresas, nas
imagens de satélites Digital Globe/Google 2006 e nos instrumentos legais que subsidiam as
Políticas do Meio Ambiente que direta ou indiretamente incidem sobre o Estado de Minas
Gerais, em especial o Município de Cataguases. Utilizaremos também as informações
constantes na listagem do SIAM (Sistema Integrado e Informação Ambiental) disponibilizada
110
pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD).
A proposta de diagnóstico ambiental focaliza os problemas ambientais e os
processos de mudanças sócio-espaciais causados pelo desenvolvimento industrial.
Cataguases sempre se destacou mais pelo desenvolvimento da indústria têxtil. É
o ramo pioneiro da fase industrial de Cataguases que começa com a Indústria Irmãos
Peixoto (1905), sendo seguida pela Companhia Industrial Cataguases (1936), Companhia
Manufatora de Tecidos de Algodão (1943) e Indusfio Fios e Malhas (1967). Esse é um dos
ramos que, até os anos 1980, era responsável por parte da poluição atmosférica e das
águas que atingiam diretamente o Município. A cadeia produtiva do setor têxtil envolve,
resumidamente, três etapas: a fiação, a tecelagem e o acabamento. Durante essas etapas,
numerosas operações consomem matérias-primas, insumos, água e energia, produzindo
efluentes líquidos, emissões atmosféricas e resíduos sólidos. As características dos
efluentes e o níveis de poluição dependem, principalmente, dos procedimentos tecnológicos
empregados, da qualidade dos produtos
e da fonte de energia utilizada. Em geral, os
efluentes líquidos são os principais causadores de problemas ambientais. São derivados de
operações da fase de acabamento, em função da diversidade de produtos químicos e
elevado volume de água consumidos. Já as emissões atmosféricas poluidoras dependem da
fonte de energia utilizada para aquecimento de caldeiras (lenha, óleos derivados de petróleo
ou gás natural). Além dos efluentes líquidos e gasosos, o setor têxtil também produz
resíduos sólidos e poluição sonora.
Todas as indústrias têxteis de Cataguases apresentavam elevado grau de
poluição, principalmente em relação aos efluentes líquidos que eram lançados diretamente,
sem tratamento, no ribeirão Meia Pataca e rio Pomba. Mas com a obrigatoriedade do
Licenciamento Ambiental (Lei Federal 6.938/1981), o COPAM-MG (Comissão de Política
Ambiental de Minas Gerais) passou a cobrar dessas empresas a adequação às normas
técnicas e padrões de qualidade ambiental. Como essas indústrias foram criadas antes da
referida Lei Federal, o COPAM-MG exigiu o Licenciamento Corretivo. Atualmente, todas as
grandes indústrias têxteis de Cataguases possuem Estações de Tratamento de Efluentes
(ETEs) e “lavador de gases” (filtros para exaustão de caldeiras).
A imagem de satélite 3 retrata a localização da primeira indústria têxtil de
Cataguases: Companhia de Fiação e Tecelagem de Cataguases fundada em 1905 e
renomeada de Indústria Irmãos Peixoto S A em 1917.
111
Imagem de Satélite 3 – Indústria Irmãos Peixoto (2006)
Em 1905 essa área se firmava como centro comercial potencializado pela
presença da estação ferroviária, cujo prédio ainda pode ser observado na parte inferior da
imagem. Essa indústria, com sua vila operária, contribuiu para a expansão do tecido urbano
e a formação da Vila Domingos Lopes e o Bairro Haydée Fajardo Dutra. O contínuo
desenvolvimento urbano e os equipamentos residenciais instalados no entorno da indústria
limitaram sua expansão física. Em 1976 a indústria transferiu o setor de fiação para o DI,
ficando no prédio original somente a tecelagem. Posteriormente, em 1998, a Indústria Irmão
Peixoto S A foi incorporada à Companhia Industrial Cataguases e o prédio foi desocupado,
dando lugar ao centro cultural Instituto Francisca de Souza Peixoto.
A imagem de satélite 4, além de mostrar o alvéolo (margem esquerda do rio
Pomba) onde se instalou inicialmente a cidade, demonstra também a localização da
Companhia Industrial Cataguases (margem direita do rio Pomba entre as duas pontes).
Fundada em 1936, foi a segunda grande indústria têxtil a se instalar em Cataguases, mas a
primeira a ocupar a margem direita do rio Pomba.
112
Imagem de Satélite 4 – Companhia Industrial Cataguases (2006)
Como o terraço era mais estreito, foi necessário
desmatamento e intensa
movimentação de terra para instalar a planta industrial e a vila operária. Além da criação do
bairro Jardins (antiga vila operária), a instalação da Companhia Industrial Cataguases
estimulou a formação da Vila Tereza e Vila Minalda, ambas na margem direita do rio
Pomba. Segundo a SEMAD (2006), a Companhia Industrial Cataguases está com a Licença
de Operação em dia e solicitação de renovação de outorga (2006) de uso da água do rio
Pomba em análise junto ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM).
Na parte superior da imagem de satélite 5, nós temos a Companhia Manufatora
de Tecidos de Algodão fundada em 1943 na margem esquerda do ribeirão Meia Pataca, ao
lado do antigo ramal ferroviário que ligava Cataguases a Miraí. Sua implantação contribuiu
para estender o tecido urbano da área central da cidade até o bairro Popular que se localiza
a montante dessa área, acompanhando curso do ribeirão Meia Pataca. Essa indústria faz
uso intensivo das águas do ribeirão Meia Pataca e possui Estação de Tratamento de
Efluentes. Segundo a SEMAD (2006),
a Companhia Manufatora cumpriu 4 autos de
infração de 1990 a 1993 por falhas operacionais e está com a renovação da outorga/2006
113
de uso da água em análise junto ao IGAM. Faz divisa com a Indústria Cataguases de Papel
e encontra-se cercada por bairros residenciais e área comercial, mas ainda possui área
física para futuras expansões.
Imagem de Satélite 5- Companhia Manufatora de Tecidos e
Indústria Cataguases de Papel (2006)
A imagem de satélite 6 nos fornece a localização da indústria Indusfil Fios e
Malhas. Ocupando o centro da imagem, em três quarteirões do bairro Vila Domingos Lopes,
percebemos que essa indústria não possui mais espaço físico para expansão. Os prédios do
entorno são, predominantemente, residenciais e essa indústria funciona somente com o
alvará junto à prefeitura. Opera principalmente com o setor de fiação. A produção de malhas
representa uma atividade que só foi incorporada à fábrica no ano de 2005. É classificada
como indústria de baixo potencial poluidor (DN no 74/2004 – COPAM). No entanto, nossa
pesquisa de campo realizada em janeiro de 2006 detectou que os moradores do entorno
reclamam do excesso de ruído (poluição sonora), principalmente à noite.
114
Imagem de satélite 6 – Indusfil Fios e Malhas (2006)
O segundo ramo importante é o de papel e papelão representado por duas
empresas. A primeira empresa é a Indústria Cataguases de Papel. Fundada em 1954 com o
nome de Companhia Mineira de Papéis, produzia, inicialmente, celulose e papéis para
impressão. É um ramo industrial que, em função de utilizar produtos tóxicos com insumos,
apresenta elevado potencial poluidor. Para obtenção da celulose, a indústria utilizava soda
cáustica e sulfeto de sódio. O cloro ativo ou hipocloreto de sódio era usado na etapa de
branqueamento da polpa de celulose. Esse procedimento tecnológico produzia grandes
quantidades de compostos organoclorados, que eram lançados, sem tratamento, no ribeirão
Meia Pataca. A substância era extremamente tóxica; tinha mal cheiro e produzia efeitos
deletérios na ictiofauna do ribeirão Meia Pataca, rio Pomba e rio Paraíba do Sul (no Estado do
Rio de Janeiro). Em 1978, o Grupo Matarazzo compra a fábrica que passa a se chamar
Indústria Matarazzo de Papéis S A . A produção aumenta e a poluição também. Mas, em
meados dos anos 1980, o COPAM-MG
obriga a Matarazzo de Papéis a construir dois
reservatórios (barragens) para armazenar os efluentes tóxicos. Esses reservatórios localizam-se
a 14 Km da indústria, na zona rural de Cataguases. Segundo a SEMAD (2006), de 1970 a 1993,
a indústria recebeu oito autos de infração por inadequações técnicas e poluição. Como as
115
multas não foram pagas, o Estado as encaminhou para a dívida ativa da empresa. Em 1992, o
Grupo Matarazzo entra em crise financeira e paralisa as atividades da unidade de Cataguases.
O Grupo IBERPAR Empreendimentos e Participações assume a empresa em 1994 e troca seu
nome para Indústria Cataguases de Papel. A empresa abandona a produção de celulose e
passa a produzir “papel miolo” e “papel capa” para embalagens a partir de “papel velho”
(reciclagem). Essa mudança operacional diminuiu acentuadamente as emissões de poluentes
pela empresa. Mesmo assim, de 1996 a 2003 a Indústria Cataguase de Papel foi multada 3
vezes, mas têm pagado em dia as infrações. Embora não produza celulose, a atual empresa
herdou o “passivo ambiental” do Grupo Matarazzo. Portanto, quando um dos reservatórios
rompeu, em 2003, produzindo um vazamento de 1,2 bilhão de litros de resíduos tóxicos, o
Grupo IBERPAR passou a ser responsabilizado. A empresa foi multada e obrigada a fazer um
TAC (Termo de Ajuste de Conduta) para se adequar às normas técnicas de qualidade
ambiental. Pela imagem de satélite 5 percebemos que a Indústria Cataguases de Papel (parte
inferior) faz divisa com a Companhia Manufatora de Tecidos de Algodão. Já na imagem de
satélite 7, percebemos que a Indústria Cataguases de Papel localiza-se na margem (esquerda)
do ribeirão Meia Pataca, onde faz uso intensivo da água. É possível visualizar a ETE (na parte
superior da imagem), a lenha para aquecimento de caldeira e os fardos de aparas de papel e
“papel velho” armazenados no pátio da empresa. Os rejeito da lavagem do “papel velho” são
armazenados em tanques de estabilização em outra área pertencente à empresa, fora do
perímetro urbano. Funciona com outorga de uso da água junto ao IGAM. Percebe-se que a
indústria ainda possui espaço físico para futuras expansões, mas segundo os responsável
técnico, a empresa está passando por uma reestruturação tecnológica para melhorar a
eficiência produtiva e diminuir os riscos ambientais. Por isso desenvolve também programas na
área de educação ambiental junto às escolas da rede pública de ensino do Município.
116
Imagem de Satélite 7 – Indústria Cataguases de Papel (2006)
Como o acidente de 2003 ocorreu em área de passivo ambiental (provocado
pelos antigos donos – Grupo Matarazzo), os atuais proprietários da empresa alegam que
foram injustamente condenados pelos órgãos públicos ambientais e , principalmente, pela
imprensa.
Ocupando a porção centro-direita da imagem de satélite 8, pode-se observar a
Fábrica de Papelão Cataguases, fundada em 1957. Foi a segunda fábrica a se instalar na
margem direita do rio Pomba na encosta média de um morro do bairro Primavera. Esse
bairro cresceu no entorno da fábrica. Percebe-se, na parte superior da imagem, a estrada
asfaltada, que é a principal via de ligação de Cataguases com o município de Leopoldina,
onde passa a BR 116. Trata-se de uma estrada com precárias condições de manutenção e
muitas vezes se congestiona com o tráfego de caminhões de carga e ônibus. A Companhia
Industrial Cataguases e a Fábrica de Papelão funcionaram como vetores de uma
urbanização linear que deu origem aos bairros residenciais Vila Minalda e Primavera.
Atualmente percebe-se que a Fábrica de Papelão Cataguases está cercada por
equipamentos residenciais, mas ainda possui espaço para ampliação.
117
Imagem de satélite 8 - Fábrica de Papelão Cataguases (2006)
Seus procedimentos tecnológicos são pouco avançados e opera transformando
“papel velho” em papelão para capas (livros e cadernos) e arquivos. Possui baixo potencial
de impacto devido ao volume relativamente baixo de produção. Parte dos resíduos sólidos
vão para a coleta do lixo e a outra parte fica armazenada em tanque de rejeitos. Não produz
emissões de gases poluentes e tem formalizado outorga de uso da água junto ao IGAM
desde o ano 2000.
Acompanhando a micro bacia do ribeirão Meia Pataca, no bairro Popular, no
setor nordeste da cidade, encontramos a Fundição Cataguases Metalúrgica LTDA. A
Fundição Cataguases, com sua cobertura escura, ocupa a parte inferior da imagem de
satélite 9 numa propriedade com área útil em forma de trapézio. Opera por indução elétrica
fabricando peças de reposição para maquinarias das indústrias têxteis de Cataguases e
cidades próximas. Produz também válvulas, mancais, implementos agrícolas e peças
fundidas em geral. Percebe-se na imagem 9 que a urbanização de entorno (bairro Popular)
impede a expansão física da empresa. Os empresários reconhecem as deficiências
tecnológicas e a escassez
de espaço, mas alegam
não terem recursos para uma
relocalização por se tratar de um empreendimento com alta inércia geográfica.
118
Imagem de Satélite 9 – Fundição Cataguases Metalúrgica (2006)
O principal problema ambiental provocado pela empresa são os fortes odores (mal
cheiro) produzidos pelas emissões de vapores e gases dos processo de fundição e usinagem
de peças. A população do entorno reclama do mal cheiro relacionando-o, inclusive, com
problemas de saúde ligados ao aparelho respiratórios e casos de alergia. Todavia, na Secretaria
de Saúde não há registros de casos confirmando as denúncias da população do bairro Popular.
A instalação da Fundição Cataguases contribuiu, junto com a estrutura viária, para estender o
eixo de urbanização ao longo do ribeirão Meia Pataca (a montante). Na imagem de satélite 9, o
ribeirão aparece, em destaque, descrevendo um meandro. Apesar do impacto ambiental
provocado pelas emissões gasosas, a Fundição Cataguases nunca foi vistoriada pela FEAM e
opera somente com alvará de funcionamento obtido junto à Prefeitura. Em junho de 2006
encaminhou, junto à FEAM, seu primeiro pedido de licenciamento para modificação do processo
de fundidos de ferro e aço, sem tratamento químico superficial.
A porção superior direita da imagem de satélite 10
destaca a Indústrias
Químicas Cataguases LTDA. Fundada em 1961, oferece produtos químicos para tratamento
de água para indústrias, residências, abastecimento urbano, ETEs e tratamento de esgoto.
119
Imagem de Satélite 10 – Indústrias Químicas Cataguases (2006)
Teve papel importante na formação do bairro Vila Reis, localizado na porção
esquerda da imagem de satélite. Possui espaço físico para ampliação e passa
periodicamente por fiscalização da FEAM por ser considerada indústria de alto potencial de
poluição. Portanto, a empresa possui LO (Licença de Operação). Na imagem percebemos
também, dentro da área da empresa,
duas represas para estabilização de rejeitos.
Segundo informações da empresa não há riscos de vazamentos, pois além do
monitoramento constante, a indústria tem possibilidades de construir novos tanques em área
da própria empresa no município de Cataguases. Opera com outorga do IGAM para uso
industrial de água e em 2005 entrou com pedido de licenciamento ambiental para produção
de novas substâncias químicas inorgânicas.
A imagem de satélite 11 registra a localização da empresa Rio Pomba
Minerações que pertence ao Grupo Química Cataguases. É classificada como indústria
extrativa mineral e de transformação primária, pois extrai bauxita e calcita, bem como
produz bauxita ferrosa, bauxita branca e cálcio.
120
Imagem de Satélite 11- Rio Pomba Minerações (2006)
Instalou-se na margem esquerda do rio Pomba na localidade de Barão de
Camargos (Fazenda do Cruzeiro), a, aproximadamente, 5 km da mancha urbana de
Cataguases. Faz uso intensivo da água em quase todas as etapas de produção e é
classificada pela FEAM como indústria de alto potencial de poluição. A imagem de satélite
11 nos permite observar tanques de estabilização de rejeitos de mineração (lavagens) em
atividade na direção Nordeste da empresa. É possível notar também a estocagem de
minério a céu aberto e, junto da empresa, antigos tanques de estabilização que já foram
esgotados. Os atuais tanques estão em posições altimétricas mais elevadas que a planta da
indústria, por isso precisam ser permanentemente monitorados para evitar vazamentos. O
vazamento desses tanques pode comprometer o abastecimento de água em Cataguases, já
que a indústria e os tanques estão localizados a montante da estação de captação e
tratamento de água da cidade. Em médio prazo a indústria terá dificuldades para construir
novos tanques de rejeitos no entorno. Por isso a Rio Pomba Minerações já opera com
outra unidade no município de Miraí, onde também faz a lavagem da bauxita contando com
um espaço maior para barragens de rejeitos. Foi justamente na localidade de Miraí que, em
março de 2006, aconteceu um acidente ambiental com vazamento de 400 milhões de litros
121
de rejeitos de bauxita. A lama da lavagem da bauxita atingiu o rio Muriaé e, posteriormente,
o rio Paraíba do Sul no Estado do Rio de janeiro. O acidente só não se estendeu mais, pois,
ao atingir o Estado do Rio de Janeiro, gradativamente o sedimento argiloso foi decantando
(assoreamento) ao longo do percurso. A empresa possui outorga de uso da água junto ao
IGAM, licença de operação
e cumpre auto de infração e Licenciamento Corretivo na
unidade de Miraí em função do acidente ambiental, segundo a SEMAD (2006).
As indústrias consideradas nessa análise são as maiores e mais significativas do
processo urbano-industrial de Cataguases. Essas indústrias tiveram papel ativo na
expansão do tecido urbano da cidade e da infra-estrutura viária. Favoreceram o surgimento
de outras atividades econômicas e de serviços correlatos garantindo à Cataguases o perfil
de uma cidade industrial. As demais indústrias do padrão disperso são classificadas como
micro e pequenas empresas (oficinas de tornearia, serralherias, tipografias, alimentícias,
confecções, fundições e marcenarias). Apresentam baixo potencial de poluição e funcionam
somente com alvará obtido junto à Prefeitura.
Para completar a análise ambiental em relação à organização espacial da
indústria de Cataguases, passaremos, no próximo item, ao diagnóstico ambiental do Distrito
Industrial e do seu entorno.
4.1.2 - O diagnóstico ambiental do distrito industrial e do seu entorno.
O DI de Cataguases representa a primeira política de zoneamento implementada
pelo poder público municipal a partir dos anos 1970. O sítio escolhido é de terraço aluvial e
planície de inundação localizado na margem direita do rio Pomba. Uma das poucas áreas
mais planas capaz de receber um parque industrial exigindo pouca movimentação de terra.
A área escolhida corresponde à antiga “Fazenda da Saudade” que era cortada por uma
estrada, não pavimentada, que ligava Cataguases ao município de Leopoldina. Antes da
criação do DI, o acesso a área se fazia por estrada parcialmente calçada. O calçamento se
estendia da área central da cidade até o início do bairro Beira Rio. Portanto, foi a partir da
criação do DI que o poder público municipal estendeu o calçamento até a área onde seriam
instaladas
as
indústrias
e
disponibilizou
a
energia
elétrica
para
os
primeiros
empreendimentos, doando, em 1973, 77.425 m2 de terreno à Companhia Força e Luz
Cataguases Leopoldina (CFLCL) para a construção da Subestação Geradora. Essas duas
obras de infra-estrutura produziram, de imediato, dois impactos importantes. O primeiro foi a
urbanização linear que se processou, ao longo do acesso pavimentado, ligando o centro da
cidade à área do DI (Imagem de Satélite 12).
122
Imagem de Satélite 12- Bairro Beira Rio e o Distrito Industrial (2006)
A imagem de satélite 12 nos permite observar essa expansão linear do tecido
urbano desde as imediações da área central (canto superior esquerdo da imagem) até a
área do DI (canto inferior direito da imagem) pela margem direita do rio Pomba. Percebe-se
pela imagem que a existência de infra-estrutura viária e a instalação das indústrias
estimularam a ocupação da margem direita do rio, ao passo que na margem esquerda o
processo foi pouco intenso. O bairro Beira Rio se configurou como uma área residencial e
comercial. Posteriormente, já na década de 1980, como se percebe à esquerda da imagem
de satélite 12, surge o bairro residencial Paraíso quebrando um pouco a linearidade do
primeiro eixo de urbanização.
O segundo impacto importante foi a construção do conjunto habitacional Taquara
Preta, aproveitando a última secção ampla do terraço aluvial, no fim da Avenida Manoel
Inácio Peixoto, à direita da Imagem de Satélite 13.
123
Imagem de Satélite 13 – Distrito Industrial de Cataguases (2006)
A construção do conjunto habitacional Taquara Preta só foi possível após a
chegada do calçamento e, principalmente da energia elétrica em 1973. Na parte superior da
imagem, ao longo da Av. Manoel Inácio Peixoto, é que se localizam as principais indústrias
do DI. A parte central da imagem não está ocupada, pois tratam-se de terrenos elevados. O
quase esgotamento do espaço útil da área principal do DI forçou o poder público Municipal
a abrir um eixo secundário para instalação de indústrias. Trata-se da Av. das Indústrias, via
principal localizada na porção esquerda da imagem de satélite 13 , onde está o bairro Santa
Clara. Apresenta poucas indústrias em funcionamento (5 micro empresas) em setor
predominantemente residencial. A imagem também nos permite observar a movimentação
de terra junto ao bairro Taquara Preta. São obras de construção de um novo conjunto
habitacional de casas populares chamado São Cristóvão. Percebe-se, então, que o entorno
da área industrial começa a se configurar como área de ocupação residencial. O próprio
poder público municipal que administra a ocupação do DI, através da Secretaria
de
Indústria, Comércio e Segurança, considera a área inviável para novos projetos industriais
de médio e grande porte.
No DI de Cataguases a maioria das indústrias são classificadas como micro e
124
pequenas empresas, funcionando somente com alvará
expedido pelo poder público
municipal, por apresentarem baixo potencial de poluição. As empresas do DI que possuem
processo de licença ambiental requeridos junto à FEAM e ao IGAM são a Zollern
Metalúrgica, a Companhia Industrial Cataguases, a Têxtil Goitacazes, a Reciclibem, a
Paloosa e a Cat-Leo (CFLCL).
Segundo a SEMAD (2006), a Zollern Metalúrgica possui Licença de Operação
junto à FEAM e outorga para uso da água junto ao IGAM. Em 2003 recebeu um auto de
infração por falhas técnicas operacionais forçando a empresa cumprir Licença de Operação
Corretiva.
A Têxtil Goitacazes (indústria de fiação) teve sua Licença de Operação renovada
em 2005, mas ainda aguarda aprovação de processo, encaminhado ao IGAM, para uso da
água do rio Pomba.
No setor de reciclagem de plásticos, a Reciclibem solicitou, em 2005, junto à
FEAM autorização para utilizar processo de reciclagem à base de lavagem com água. Se
aprovado, a empresa passará a apresentar médio potencial poluidor, precisando se
submeter à Licença de Operação Corretiva para funcionar.
A Cat-Leo (CFLCL) formalizou, junto à FEAM, em 2005, Licença de Operação
para efetuar tratamento e recuperação de óleo de transformadores. Se aprovado, a empresa
também subirá na classificação de risco ambiental, passando a médio potencial poluidor.
No setor de confecções, a empresa Paloosa encaminhou, em 2006, processo
para operar com lavanderias industriais com tingimento e amaciamento de tecidos. Se o
processo for aprovado, junto à FEAM, a empresa precisará passar por processo de Licença
Corretiva.
Apesar das mudanças de procedimentos tecnológicos estarem ocorrendo em
algumas indústrias do DI, no geral, trata-se de uma área de baixo risco ambiental, em
função dos ramos industriais instalados. Grande parte dos resíduos
de produção são
sólidos e vão para coleta de lixo ou reciclagem. As indústrias têxteis e as de reciclagem de
plásticos são as que mais produzem ruídos, mas
estão distantes dos conjuntos
residenciais. Segundo informações da Prefeitura, através da Secretaria da Indústria,
Comércio e Segurança, nunca ocorreram acidentes ambientais na área do DI. A mesma
Secretaria reconhece que a Lei de criação do DI e a atual Lei de Concessão de Direito Real
de Uso são os únicos instrumentos legais que deliberam sobre a ocupação da área. Não há,
nas Leis, restrições quanto ao ramo e porte das indústrias que queiram se instalar ou
relocalizar no DI. Mas o perfil residencial do entorno precisará ser levado em conta, pelos
órgãos ambientais do Estado, quando forem analisar as solicitações de alterações dos
procedimentos tecnológicos das indústrias.
A imagem de satélite 1 (capítulo 3) nos permite visualizar um novo impacto
125
ambiental que está sendo produzido pela dinâmica de funcionamento do DI. Na parte
Inferior da imagem conseguimos visualizar um trecho, já pavimentado, da rodovia de acesso
à BR 120. A obra está paralisada aguardando aprovação de recurso Federal para conclusão
do projeto. A BR 120 é a rodovia de 21 Km que faz a ligação de Cataguases com a BR 116.
A construção desse acesso deverá diminuir o tráfego de caminhões de carga que servem
ao DI e que, atualmente, precisam
passar por áreas mais congestionadas e de difícil
trânsito. Portanto, produzirá um efeito positivo de descongestionamento da área central da
cidade que, além do tráfego dos caminhões, também é cortada por um ramal ferroviário por
onde os vagões da Central Atlântica transportam o minério de bauxita da CBA.
O DI e sua infra-estrutura têm atuado como vetores de novas transformações
espaciais. Segundo informações da Secretaria de Indústria, Comércio e Segurança, a
tendência é realmente estender o desenvolvimento industrial de Cataguases para jusante da
área do DI, utilizando também a margem esquerda do rio Pomba.
A política da indústria aglomerada deverá ser mantida e a Prefeitura já adquiriu
área para um novo DI. No entanto, já que os Municípios têm competência legal na gestão
ambiental de sua base territorial, é preciso que os contratos de Concessão e Uso das novas
áreas industriais incorporem uma política mais criteriosa de seleção dos ramos industriais
que queiram se instalar em Cataguases. Outro aspecto importante é a execução prévia de
um planejamento urbanístico para melhor ocupação do espaço e fluidez de tráfego,
principalmente em função do porte dos empreendimentos industriais que mais procuram o
município que, em geral, são de micro e pequenas empresas.
Uma análise da dinâmica de funcionamento do atual DI deverá ser de extrema
utilidade para o planejamento e condução mais criteriosa de novas políticas industriais no
município que visem a continuidade do desenvolvimento industrial, tendo como modelo, as
aglomerações industriais.
4.1.3- Análise comparativa da problemática ambiental entre os dois padrões de organização
industrial.
A organização espacial da indústria de Cataguases apresenta dois padrões
distintos que representam lógicas locacionais diferentes configuradas ao longo da história
econômica do município. O padrão disperso começou a ganhar forma logo na primeira
década do século XX, e se
caracteriza pela ausência de uma política de zoneamento
urbano e de qualquer preocupação ambiental por parte do poder público municipal.
Contando com a disponibilidade de terrenos planos (terraços), cursos d’água, ferrovia e
energia elétrica, desde 1908, Cataguases reunia condições infra-estruturais para ingressar
126
na era industrial (CARDOSO, 1955 e COSTA, 1977). Assim, de entreposto para o
escoamento do café produzido na Zona da Mata até o Rio de Janeiro, Cataguases passava,
gradativamente, a uma nova fase da economia – a fase industrial que se acelerou ainda na
primeira metade do século XX. Em 1952, Cataguases já contava com 34 indústrias de
ramos variados sendo que o setor têxtil era o mais importante e congregava as três maiores
indústrias. Até essa época, como não havia instrumentos legais de política ambiental, as
indústrias não enfrentavam restrições quanto ao uso dos recursos hídricos, desmatamentos,
movimentação de terras, emissões de gases, produção de resíduos sólidos ou lançamentos
de efluentes líquidos. As maiores indústrias têxteis sempre lançaram os efluentes líquidos
sem tratamento no ribeirão Meia Pataca e rio Pomba, situação que só começou a mudar
com a instalação obrigatória das ETEs (décadas de 1980 e 1990) que provocou uma
redução significativa dos níveis de poluição dos rios. Também na década de 1950 ocorreram
as instalações de uma fábrica de celulose e papel, uma de papelão e uma fundição. Dessa
três, a que sempre provocou maiores impactos ambientais foi a Companhia Mineira de
Papéis, fundada em 1954. Essa empresa, até os anos 1980, lançava no ribeirão Meia
Pataca, a “lixívia” ou “licor negro” (efluente líquido extremamente tóxico resultante do
processo de deslignificação da madeira e clareamento da celulose) que, além do mal cheiro
(poluição atmosférica), contaminava os rios Pomba e Paraíba do Sul, atingindo o Estado do
Rio de Janeiro. Eram descargas diárias. A poluição só foi controlada
no final dos anos
1980, quando a empresa, na época já pertencendo ao Grupo Matarazzo, foi obrigada, por
efeito de Deliberação Normativa do COPAM-MG, a construir dois tanques para estocar os
efluentes. Mas foi justamente um desses tanques, localizado na zona rural de Cataguases,
que vazou o “licor negro” e produziu o acidente ambiental de março de 2003. Esse foi
considerado o maior acidente ambiental produzido por uma indústria de Cataguases. Ficou
evidente nesse acidente que houve negligência dos atuais proprietários da empresa
(Indústria Cataguases de Papel Ltda – Grupo IBERPAR Empreendimentos e Participações)
que herdaram o passivo ambiental do Grupo Matarazzo. Atualmente a empresa (Indústria
Cataguases de Papel) reduziu a poluição, pois possui ETEs e utiliza o “papel velho” como
matéria-prima na fabricação do “papel miolo” e “papel capa”. No entanto, de 1996 a 2003, a
indústria cumpriu 3 autos de infração e pagou multas por problemas operacionais, segundo
informações da SEMAD (Secretaria
de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável).
No padrão disperso também se instalou a Indústrias Químicas Cataguases, em
1961, que produz sulfato de alumínio e
uma linha variada de produtos químicos para
tratamento de água residencial e industrial. Essa empresa não chegou a gerar grandes
problemas ambientais no bairro Vila Reis, local onde está instalada. Mas a Rio Pomba
Minerações,
empresa do Grupo Química Cataguases, operava
a lavagem da bauxita
127
jogando os rejeitos do minério no rio Pomba. Nos anos 80 do século XX, a empresa foi
obrigada a construir tanques de estabilização de rejeitos na própria área de processamento
como forma de adequação às normas técnicas de qualidade ambiental, conforme exigências
deliberativas do COPAM-MG. Mas com o crescimento do Grupo Química Cataguases, a Rio
Pomba Minerações passou a atuar no Município de Miraí, onde também efetua a lavagem
da bauxita. Nesse município ocorreu, em 2006, o segundo maior acidente ambiental
provocado por uma indústria de Cataguases. Trata-se do vazamento de 400 milhões de
litros de rejeitos de bauxita que contaminaram os rios Muriaé e Paraíba do Sul. Os laudos
técnicos constataram negligência da empresa, pois o rompimento do vertedouro denotou
falha técnica operacional ou de manutenção de equipamentos. No padrão disperso, à
medida que as indústrias se distanciavam das imediações do centro comercial, puxavam
uma rede de infra-estrutura viária e de energia favorecendo a expansão do tecido urbano.
Por isso, como comentado nos itens anteriores, algumas indústrias acabaram sendo
cercadas por bairros residenciais, acarretando problemas como escassez de espaço físico
para novas expansões e conflitos com os moradores do entorno. É o caso da poluição
sonora produzida pela Indusfil Fios e Malhas e a poluição atmosférica produzida pela
Fundição Cataguases Indústria Metalúrgica que gera um forte mau cheiro e incômodo aos
moradores do Bairro Popular.
As grandes empresas do padrão disperso que possuem grande potencial
poluidor (têxteis, papel, fundição e química) foram fundadas antes de 1981. Essa data é um
marco para a questão ambiental no Brasil, pois através da aprovação da Lei no 6.938, de 31
de agosto de 1981, o Governo Federal cria a Política Nacional do Meio Ambiente. A partir
dessa data é conferido aos Estados e Municípios papel ativo no controle e fiscalização de
atividades capazes de provocar degradação ambiental. As indústrias começam a se
enquadrar nas normas técnicas de qualidade ambiental reduzindo os impactos. Tornam-se
obrigatórias as licenças ambientais (LP, LI e LO) para os novos empreendimentos e, em
2004, com a aprovação da Deliberação Normativa no 74 pelo COPAM – MG, as indústrias
passam a ser classificadas segundo o Potencial Poluidor e Degradador. Aplicando essa
metodologia no padrão disperso, podemos afirmar que todas as grandes empresas atingem
níveis elevados variando de 4 a 6. Portanto, todas as grandes empresas do padrão
disperso, mesmo tendo sido fundadas antes de 1981, precisam apresentar a LO ou a
Licença Corretiva. O caso mais crítico se refere à Fundição Cataguases que opera sem
qualquer tipo de licença ambiental e com procedimentos tecnológicos pouco modernos,
gerando poluição atmosférica.
Todas as adequações às normas técnicas de qualidade ambiental empreendidas
pelas grandes empresas foram determinadas pela FEAM-MG, após inspeção técnica. No
entanto, sabemos que os técnicos da FEAM-MG não visitaram todas as empresas. A
128
Fundição Cataguases e a Fábrica de Papelão alegaram que nunca foram fiscalizadas por
parte desse órgão ambiental.
Além das grandes empresas, no padrão disperso existem as micro e pequenas
empresas que se inserem no tecido urbano e, em geral, possuem baixo potencial poluidor.
Sempre estiveram presentes desde o início do processo de industrialização de Cataguases.
Surgiram, inicialmente, como indústrias de bens de consumo correntes, atendendo as
necessidades básicas de consumo da população. Depois se diversificaram e passaram,
inclusive, a prestar serviços às grandes empresas. São indústrias que, aparentemente,
possuem baixo potencial poluidor. Para se ter a certeza do potencial poluidor seria
necessário o preenchimento do FCE (Formulário de Caracterização de Empreendimento),
que já é um mecanismo obrigatório para todo o Estado de Minas Gerais. Através desse
formulário, entregue ao órgão competente municipal e enviado à FEAM, é possível aplicar a
metodologia proposta pela DN no 74/2004 e saber o potencial poluidor da empresa. Como a
Deliberação Normativa é recente, nenhuma micro ou pequena empresa do padrão disperso
preencheu o FCE. A Prefeitura afirmou que essa empresas operam somente com o alvará
de funcionamento. O problema é que muitas, embora classificadas como micro empresas,
manipulam linhas de produtos tóxicos como ácidos, solventes, óleos, graxas, combustíveis,
inflamáveis e caixas de lavagem de peças cujos resíduos não são recolhidos ou
acondicionados corretamente. Como o maior número de indústrias de Cataguases (90%) se
encontra no padrão disperso (inseridas das mais diversas maneiras no tecido urbano) fica
mais difícil a fiscalização, mesmo porque o poder público municipal não possui um órgão ou
secretaria específica, devidamente aparelhada, para realizar a fiscalização preventiva de
rotina.
Essa dificuldade ou inoperância da fiscalização ambiental também se aplica à
área do Distrito Industrial (padrão concentrado). Criado em 1971 com objetivo principal de
disciplinar o desenvolvimento industrial do município, o DI vai se configurar num espaço de
uso múltiplo, onde encontramos indústrias, conjuntos habitacionais, comércio, serviços e
transportadoras. Implementado sem um planejamento urbanístico mais elaborado, passou a
alocar indústrias dos mais diversos ramos e portes. Das 26 indústrias em funcionamento, 7
são anteriores 1981, ano da criação da Política Nacional do Meio Ambiente. As maiores
indústrias do DI, Rheinhutte, Zollern , Companhia Industrial Cataguases, Têxtil Goitacazes e
Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina fazem parte do grupo que se instalou
antes de 1981. No entanto, somente a Zollern (metalurgia), a Companhia Industrial
Cataguases e a Têxtil Goitacazes passaram por Licenciamento Corretivo para se
adequarem às normas técnicas de qualidade ambiental por apresentarem potencial poluidor.
A indústria Têxtil Goitacazes, que só trabalha com fiação de algodão, não iria precisar da
Licença Corretiva , mas como solicitou recurso junto ao BDMG (Banco de Desenvolvimento
129
de Minas Gerais) para construção de um gerador de energia elétrica a óleo combustível, foi
obrigada a cumprir a adequação à legislação ambiental como condição para liberação do
recurso financeiro. As demais indústrias só operam com alvará de funcionamento expedido
pela Prefeitura, pois são empresas de baixo potencial poluidor. Embora não haja uma
fiscalização técnica preventiva de rotina por parte dos órgãos ambientais Municipal e
Estadual, podemos afirmar que o DI de Cataguases, desde sua criação, nunca registrou
acidentes ambientais significativos. Os moradores dos dois conjuntos habitacionais que
limitam o DI, bairro Taquara Preta e bairro Santa Clara, nunca registraram queixas das
indústrias. Obviamente, vários moradores desses bairros trabalham em empresas do DI,
embora não sejam a maioria, conforme acusou o trabalho de campo e entrevista feita nas
indústrias. No entanto, constatamos que duas indústrias merecem mais atenção dos órgãos
públicos fiscalizadores. Tratam-se da Antares e da Velllemetal . A primeira, por usar
substâncias químicas variadas na confecção de produtos de limpeza.
A segunda por
utilizar, no processo de fundição, forno a óleo combustível e estar localizada bem próxima
de residências. As demais indústrias do DI (alimentícias, artefatos de madeira/marcenaria,
eletromecânica, pré-moldados de concreto, calçados e confecções) produzem resíduos
sólidos que são reciclados, doados ou vão para a coleta do lixo efetuada pela Prefeitura.
São empresas que atualmente (2006), pela metodologia classificatória do COPAM-MG,
possuem baixo potencial poluidor.
O DI, por ter sido criado com o objetivo de estimular e disciplinar o
desenvolvimento industrial, acaba também criando condições mais favoráveis em relação à
implementação de políticas ambientais. Isso porque, ao contrário do padrão industrial
disperso, o padrão concentrado do DI cria condições favoráveis às ações de fiscalização
ambiental por parte dos órgãos competentes, uma vez que as indústrias encontram-se
espacialmente aglomeradas. Portanto, as ações regulatórias podem ser mais facilmente
implantadas e fiscalizadas.
Fica evidente que, ao longo da história do desenvolvimento industrial de
Cataguases, as indústrias do padrão disperso foram as que mais produziram e produzem
problemas ambientais. Primeiro porque o padrão disperso abriga 90% do universo das
indústrias de Cataguases, incluindo as de maior porte e grande potencial poluidor. Segundo,
porque todas as grandes indústrias se instalaram antes da criação da Política Nacional de
Meio Ambiente em 1981. Portanto, durante décadas ficaram fora das imposições legais dos
instrumentos de regulação que obrigam as empresas a cumprirem normas técnicas de
qualidade ambiental. Em terceiro, podemos apontar a negligência dos empresários ou a
deliberada intenção de , a qualquer custo, aumentar os lucros em detrimento de gastos com
proteção ambiental. Em quarto, podemos considerar a ineficiência ou inexistência de órgãos
ambientais qualificados tecnicamente (Municipal ou Estadual) para executar a fiscalização
130
preventiva e corretiva no padrão disperso, onde as indústrias criaram uma trama complexa
de envolvimento espacial com o tecido urbano.
Tanto o padrão industrial disperso, protagonista dos principais problemas
ambientais, quanto o DI são arranjos espaciais produtivos que, desde suas origens,
careceram de uma política ambiental consistente e duradoura. Entender como o poder
público tratou e trata a questão, torna-se indispensável. Passaremos então a investigar, no
próximo item, o papel do poderes públicos, principalmente o Municipal, na condução da
questão ambiental frente aos imperativos do desenvolvimento industrial de Cataguases.
4.1.4- O papel do poder público na questão ambiental das indústrias de Cataguases
Criada em 1981 através da Lei no 6938, a Política Nacional do Meio Ambiente
passa a representar um passo muito importante para equacionamento da problemática
ambiental. Esta política, ao estabelecer o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA),
determina que a União, Estados e Municípios estão encarregados da proteção do meio
ambiente. Para isso foram constituídos instituições e órgãos relativos a cada esfera do
poder. Assim, no nível Federal foi criado o IBAMA, no nível Estadual cada Estado criou seus
Órgãos Seccionais e no nível Municipal cada cidade deve ter seus Órgãos Locais.
Reforçando a Política Nacional do Meio Ambiente, a Constituição Federal do Brasil de 1988,
em seu Art. 23 deixa claro que proteger o meio ambiente e combater a poluição são
atribuições da União, Estados e Municípios. No entanto, cada ente público deverá
estabelecer os seus próprios princípios normativos,
respeitando as respectivas
competências definidas em função das abrangências espaciais de seus domínios territoriais
(Quadro 29). Em Minas Gerais as atividades de impacto regional são de competência do
COPAM / FEAM (Órgãos Estaduais). Para as atividades de impactos ambientais locais ou
de baixo potencial de poluição a competência fica a cargo do poder municipal (Prefeitura e
COMDEMA). Portanto, a participação dos municípios no sistema de gestão ambiental passa
a ter muita relevância, exigindo que os governos locais se capacitem, como instâncias de
decisão e planejamento, para desenvolverem políticas econômicas e ambientais adequadas
à capacidade de suporte de seus domínios territoriais. No entanto, do ponto de vista
concreto, percebemos que mesmo os Órgãos Seccionais estaduais e, principalmente, os
municípios enfrentam dificuldades de operacionalizar as políticas ambientais. No nível
estadual falta mais aparelhamento técnico e pessoal qualificado para cumprir todas as
etapas dos processos de licenciamento, fiscalização de rotina e avaliações técnicas nos 853
municípios que formam a unidade territorial do Estado de Minas Gerais (IBGE, 2005). No
131
nível municipal, a situação é ainda mais crítica, já que, em Minas Gerais, são poucos os
que possuem Secretarias de Meio Ambiente, sendo que, em geral, quando existem,
ocorrem associadas a outras Secretarias. Dispõem de poucos profissionais capacitados e
deficiente aparelhamento, quando existe. No entanto, a criação dos COMDEMAs (Conselho
Municipal de Defesa do Meio Ambiente) já é uma realidade. Segundo a FEAM (2003), Minas
Gerais conta com cerca de 200 COMDEMAs em operação. Mas, como relatado
anteriormente, operam com dificuldades e com pouca articulação de informação com os
Órgãos Seccionais do
Estado. No nível municipal as pressões políticas e de grupos
econômicos são muito fortes e acabam influenciando as decisões dos COMDEMAs.
Os dois grandes acidentes que envolveram duas grandes indústrias de
Cataguases em 2003 e 2006 (Indústria Cataguases de Papel Ltda e a Mineradora Rio
Pomba, respectivamente ) demonstram as deficiências da política ambiental no Estado tanto
no que diz respeito ao papel dos órgãos
públicos fiscalizadores quanto às
responsabilidades das empresas em relação à qualidade ambiental. Em Cataguases, a
problemática ambiental sempre esteve ligada ao desenvolvimento industrial e mesmo após
a criação, em 1981, da Política Nacional do Meio Ambiente ainda eram registrados altos
índices de poluição que se refletiam diretamente nas águas do rio Pomba. O JORNAL DO
BRASIL (11/09/87, p. 5), em matéria com o título “Minas despeja soda cáustica em água que
fluminense bebe”, relatou parte dos impactos provocados pela poluição das indústrias de
Cataguases nos seguintes trechos:
Milhões de litros de produtos tóxicos – entre eles a soda cáustica –
despejados diariamente pela Indústria Matarazzo de Papéis e por outras
fábricas de Cataguases, no Sudeste de Minas Gerais, estão acabando com
a vida num dos principais afluentes do Paraíba do Sul.
A poluição causada pela fábrica de celulose e papel em Cataguases é um
dos problemas mais antigos enfrentados pelo COPAM, que instaurou o
primeiro processo em 1977, um ano antes de a fábrica ter sido adquirida
pelo grupo Matarazzo da antiga Companhia Mineira de Papéis.
O presidente da Comissão de Defesa do Meio Ambiente (CODEMA) de
Cataguases, Hugo Sodré Lanna, 69, contesta a acusação, atribuindo a
solução do caso Matarazzo a órgãos estaduais como a COPAM.
A Matarazzo não é a única empresa a poluir em Cataguases o rio Pomba .
Milhões de litros diários de poluentes, de menor toxicidade, são despejados
no rio pelas têxteis Companhia Industrial de Cataguases e Companhia
Manufatora de Tecidos, junto com outras empresas menores do ramo e com
a Indústria Química Cataguases, produtora de bauxita. As três grandes
indústrias, pressionadas pelo COPAM, estão construindo sistemas de
tratamento que deverão entrar em atividade no próximo ano. Apesar da
carga de poluentes que despejam no Pomba, onde as águas escuras ficam
132
barrentas quando a Indústria Química Cataguases lava o minério de
bauxita.
A matéria publicada pelo Jornal do Brasil, em 1987, nos esclarece alguns pontos
fundamentais para o entendimento da problemática ambiental em Cataguases. Os ramos
mais poluidores são o têxtil, o papel/celulose e o químico, cujos impactos atingem
diretamente o rio Pomba e, posteriormente, o rio Paraíba do Sul no Estado do Rio de
Janeiro. Outro dado importante se refere à insuficiente atuação dos órgãos públicos
Estadual (COPAM) e Municipal (COMDEMA) diante dos interesses do capital industrial
instalado na cidade. O COPAM, criado em 1977, só conseguiu obrigar as empresas a
cumprirem as adequações técnicas de qualidade ambiental no final dos anos 1980. Mesmo
assim não garantiu, através da FEAM (Órgão licenciador e de assessoramento técnico),
uma rotina de monitoramento da qualidade das adequações técnicas efetuadas pelas
empresas. Por isso ocorreu o acidente em 2003 com o vazamento do reservatório de
rejeitos construído pela Matarazzo de Papéis no final dos anos 1980. A Polícia Ambiental
(antiga Guarda Florestal), a FEAM, o COMDEMA, a Prefeitura de Cataguases e os atuais
proprietários da empresa (Grupo IBERPAR) sabiam da existência dos reservatórios, mas
isso não impediu o acidente. Portanto, houve negligência de ambas as partes. Em matéria
publicada pelo jornal ESTADO DE MINAS (01/04/2003, p. 17) o Secretário Estadual de Meio
Ambiente do Estado de Minas Gerais admitiu que:
A FEAM não tem condições de atuar de forma efetiva em casos de
emergência como o de Cataguases. A Secretaria não está apta a fiscalizar
todas as áreas de risco ambiental no Estado já que sequer existe um
cadastro de identificação dos empreendimentos que geram produtos
tóxicos licenciados pelo COPAM.
Fica evidente que, em Minas Gerais, os Órgãos Seccionais
ambientais
cumprem mais o papel de órgãos licenciadores do que fiscalizadores sendo que, no nível
municipal, a situação é ainda mais precária.
Para estruturação de uma política municipal de meio ambiente é necessário que
cada município incorpore a Política Estadual de Meio Ambiente dentro das normas
municipais (Lei Orgânica, Código Tributário, Lei Orçamentária, Plano Diretor, Lei de Uso e
Ocupação do Solo, Lei de Parcelamento do Solo, Código de Obras e Código de Posturas).
Portanto, isso significa ajustar a estrutura administrativa, as normas tributárias, a estrutura
do poder local, o processo de desenvolvimento e suas relações institucionais e jurídicas
133
(FEAM, 2003). Logo, as Secretarias Municipais também precisarão adequar seus
planejamentos estratégicos ao
Código Ambiental Municipal para execução de seus
projetos. Obviamente o que se percebe é uma ampla distância entre a situação ideal e a
real. No caso de Cataguases, isso fica bastante evidente. Classificada como uma cidade
industrial e com um histórico de vários acidentes ambientais, era de se esperar um maior
cuidado com a questão ambiental. Percebe-se que esse cuidado ainda é bastante incipiente.
Não existe uma Secretaria de Meio Ambiente independente. O que existe é a Secretaria de
Agricultura e Meio Ambiente criada recentemente através do art. 1o Lei Municipal no
3.445/2005, cujas principais atribuições são:
I – supervisionar, coordenar e promover o desenvolvimento da área rural do
Município, visando o abastecimento de produtos hortifrutigranjeiros e
demais gêneros alimentícios;
II – defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado;
III – propor adoção de estratégias, mecanismos e instrumentos econômicos
e sociais para a melhoria da qualidade ambiental e do uso sustentável dos
recursos naturais no âmbito do Município;
IV – realização de prévio estudo de impacto ambiental para instalação de
obra ou atividade potencialmente danosa ao meio ambiente;
V – promover a educação ambiental e o engajamento da sociedade na
conservação, recuperação e melhoria do meio ambiente.
Percebe-se que é uma Secretaria que acumula duas funções. Uma nitidamente
ligada a promoção do desenvolvimento econômico na área de agropecuária e outra ligada
ao licenciamento e fiscalização ambiental. Dentro das competências da Secretaria de
Agricultura e Meio Ambiente não há nenhuma referência à necessidade de se fazer cumprir
a Lei Municipal no 2.812/1998
que instituiu o Código Ambiental Municipal de
Cataguases (ANEXO 1). Trata-se do primeiro Código Ambiental do Município cuja função
principal é a liberação de alvará de localização para que a Prefeitura possa licenciar e
fiscalizar todos os empreendimentos de impacto local, que já são legalmente de sua
competência. Portanto, segundo o Código Ambiental de Cataguases, será exigida a Licença
Ambiental, a ser expedida pelo Órgão Ambiental Municipal, a todos os empreendimentos
potencialmente poluidores ou que possam causar significativa degradação ambiental.
Mediante o preenchimento de um Memorial de Caracterização de Empreendimento, o Órgão
Ambiental Municipal verifica a competência. Se ficar constatado, através da análise do
Memorial, que a atividade é de baixo potencial poluidor e impacto local, compete à
Prefeitura expedir o alvará de localização exigindo também, do empreendedor, uma
Declaração de Responsabilidade Civil. O Código trás como aspecto importante, a
necessidade de se ouvir o COMDEMA antes de qualquer homologação por parte do
Executivo. No entanto, numa análise mais criteriosa, percebemos alguns problemas
134
relativos ao Código Ambiental de Cataguases , principalmente quanto à sua aplicação.
Primeiramene, o Código Ambiental de Cataguases atribui funções importantes ao Órgão
Ambiental Municipal como: fiscalização, controle, licenciamento e imposição de penas e
multas. Mas como foi relatado anteriormente, o Órgão Ambiental Municipal é a Secretaria
de Agricultura e Meio Ambiente. Não há um Órgão específico e independente para atuar na
área ambiental. Nem a atual Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente está devidamente
aparelhada tecnicamente e com pessoal competente para cumprir as funções acima
relatadas. Assim, a referida Secretaria não terá, por exemplo, como cumprir o artigo 43
sobre a fiscalização das fontes poluidoras. Um segundo aspecto trata do CAPÍTULO II –
SEÇÃO I
que se refere aos padrões de coleta, tratamento e disposição dos resíduos
sólidos. Esse capítulo regulamenta a coleta, o tratamento e o acondicionamento adequado
do lixo, mas, o Município não possui uma coleta seletiva do lixo e nem aterro sanitário.
Outro ponto importante, o terceiro, se refere à
Biodiversidade, em que o artigo 24 afirma
que a proteção da biodiversidade depende da atuação coordenada dos órgãos Federais,
Estaduais e Municipal. Essa ação coordenada ainda não existe. Os acidentes ambientais de
2003 e 2006, anteriormente comentados, demonstram essa ausência de coordenação.
Outro exemplo é a exigência do MCE (Memorial de Caracterização de Empreendimento)
exigido pelo poder público Municipal ao mesmo tempo em que a FEAM exige o FCE
(Formulário de Caracterização do Empreendimento), aumentando a burocracia.
Um quarto problema está ligado à própria estruturação da política municipal de
meio ambiente. Como afirmado anteriormente, é preciso que o Município
incorpore a
Política Estadual de Meio Ambiente dentro das normas municipais. Nesse ponto,
Cataguases apresenta uma deficiência séria, pois apesar de possuir 63.980 habiatantes
(IBGE, 2000), ainda não tem seu Plano Diretor. Segundo a Constituição Federal do Brasil de
1988, em seu Artigo 182 / parágrafo 1o “o plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal,
obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico de política
de desenvolvimento e de expansão urbana”. O plano diretor,
ao incorporar a política
ambiental, se constituirá num importante instrumento para orientar os agentes públicos e
privados na produção e gestão responsável da cidade.
Nosso trabalho constatou que as grandes indústrias, tanto do padrão disperso
quanto do padrão concentrado (DI) cumprem as exigências legais exigidas pelos órgãos
ambientais do Estado
(FEAM e IGAM) quanto a adequação às normas técnicas de
qualidade ambiental. Isso porque todas as grandes empresas são classificadas pela DN no
74 /COPAM como de grande potencial poluidor. Mesmo assim, ficou constatado que o
monitoramento dessas atividades pelos órgãos públicos é bastante precário. Em geral, as
ações são mais reativas (atuações pós-acidente ambiental) do que preventivas
(fiscalizadoras). Já as micro e pequenas empresas do município operam somente com
135
alvará expedito pela Prefeitura. Como a quase totalidade das indústrias cataguasense se
instalou antes da vigência
do Código Ambiental Municipal (1998), a Secretaria de
Agricultura e Meio Ambiente não possui um banco de dados com a caracterização técnica e
o potencial poluidor de cada empresa.
O poder público municipal, mais preocupado com o desenvolvimento econômico,
tem deixado a questão ambiental em segundo plano
devido a ausência de um órgão
ambiental independente e tecnicamente preparado, inexistência de aterro sanitário e a falta
de um plano diretor de desenvolvimento urbano . Cataguases com um perfil de cidade
industrial demandaria mais atenção por parte do poder público local frente aos impactos
ambientais produzidos pelo desenvolvimento econômico. O histórico dos acidentes
ambientais provocados pelo desenvolvimento das indústrias no município ilustra também a
ineficiente atuação dos Órgãos Seccionais do Estado (IGAM, FEAM, IEF), cujas
competências também incidem sobre a base territorial dos Municípios. Mas esses Órgãos
Seccionais também enfrentam problemas estruturais sérios como falta de pessoal
qualificado para cumprir a fiscalização em todo o Estado; ausência de um planejamento
para licenciamento integrado; deficiente articulação com as políticas, órgãos, e secretarias
municipais de meio ambiente; deficiente aparelhamento técnico para análises e elaboração
de cadastros atualizados sobre as empresas e seus procedimentos. Em geral, os órgãos
tanto Municipais
quanto Estaduais têm atuado mais como licenciadores do que
fiscalizadores.
Apesar da ineficiente atuação dos órgãos ambientais, o poder público Municipal,
através da Secretaria de Indústria, Comércio e Segurança, tem procurado criar condições
estruturais para estimular um maior crescimento econômico, principalmente industrial. Por
isso, no próximo item estaremos examinando as reais possibilidades de expansão das
atividades industriais de Cataguases, considerando o perfil de sua base tecnológica, a
atual conjuntura econômica e a capacidade de suporte ambiental.
4.2- Os limites da expansão das atividades industriais em Cataguases
A indústria, desde a primeira década do século XX, passou a constituir a “marca
registrada” de Cataguases. Atualmente, mesmo sabendo que o PIB do setor de serviços
ultrapassa nominalmente os valores do PIB industrial, Cataguases ainda é uma cidade da
indústria (Quadro31).
136
Quadro 31 – Produto Interno Bruto (PIB) a Preços Correntes (Unidade R$ mil)
Ano
Agropecuário
Indústria
Serviços
TOTAL
1998
8.802
135.022
139.231
283.055
1999
9.244
123.366
141.773
274.383
2000
9.475
130.048
157.978
297.501
2001
8.653
141.603
176.089
326.345
2002
10.466
162.412
197.176
370.054
Fonte: IBGE (2002)
Grande parte do setor de serviços da cidade como o comércio, as oficinas, as
gráficas, as transportadoras de cargas (rodoviárias), o transporte ferroviário, as escolas
técnicas e as instituições bancárias se desenvolvem tendo como centro de gravidade as
indústrias. Portanto, o desempenho desses setores, bem como do conjunto da economia,
está necessariamente ligado à complexa dinâmica de evolução do setor industrial.
Desse modo, a discussão sobre as possibilidades e limites da expansão das
atividades industriais em Cataguases assume importância estratégica exigindo, no entanto,
uma abordagem multidimensional.
Se considerarmos os fatores “clássicos” (vantagens locacionais Weberianas)
que ainda influenciam nas decisões locacionais das empresas, veremos que Cataguases
reune um elenco de condições favoráveis à atração de novos empreendimentos industriais.
No que se refere à energia elétrica a Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina
(CFLCL), sediada em Cataguases, garante o suprimento de energia, pois a empresa tem
várias alternativas tecnológicas disponíveis. Há, atualmente, condições técnicas de dobrar o
fornecimento de energia operando com capacidade própria ou em cogeração com outras
empresas interligadas ao sistema. A CFLCL também já domina a tecnologia de construção
de usinas termoelétricas. Quanto aos acessos viários (rodovias), Cataguases encontra-se
conectada à rodovia BR 116 por acesso pavimentado com extensão de 21 Km (BR 120) . Já
o acesso à BR 040 se faz através da rodovia BR 267 com extensão de 120 Km. Tanto a BR
116 quanto a BR 0-40 são importantes eixos de conexão da cidade com aeroportos, portos
marítimos e regiões metropolitanas do Sudeste brasileiro. Além da malha rodoviária, a
cidade é cortada por um ramal ferroviário que permite a conexão direta com o Estado do Rio
de Janeiro e indireta com o Estado de São Paulo. Esses sistemas viários (rodovias /
ferrovia) acabam interferindo positivamente no desempenho da economia, pois disponibiliza
mercados mais amplos para os produtos produzidos pelas indústrias. Conforme ficou
demonstrado em nosso trabalho, os Estados que mais compram os produtos das indústrias
de Cataguases estão na região Sudeste.
No que se refere a mão de obra, a cidade apresenta um cenário bastante
favorável. Existe uma unidade do SENAI
que oferece cursos de torneiro-mecânico,
137
manutenção de máquinas industriais e auto-cad para projetos industriais
qualificação
disponibilizada
pela
unidade
do
SENAI
atende
especiais. A
satisfaroriamente
as
necessidades das indústrias cataguasenses que, em sua maioria, ainda utilizam
maquinários tradicionais. Por outro lado, favorece também o surgimento de diversas micro
empresas e oficinas que prestam serviços às grandes indústrias da cidade e da região da
Zona da Mata mineira. A cidade conta também com uma unidade do SEBRAE que oferece
consultorias e qualificação para micro e pequenos empreendedores nas áreas comercial e
industrial.
Para as indústrias que fazem uso intensivo da água, o município possui uma
densa rede de drenagem de regime tropical tendo o rio Pomba como principal curso d’água.
Há ainda a possibilidade de se construir poços artesianos com bom rendimento.
O
município de Cataguases localiza-se no domínio dos “mares de morros”, apresentando um
relevo bastante movimentado com predomínio de elevações com encostas côncavoconvexas. Mas uma análise da carta topográfica nos permite identificar várias áreas de
alvéolos com terraços e planícies aluviais (relevo plano) intermontanas, geralmente
próximas de cursos d’água, que favorecem a instalação de parques industriais.
Obviamente, tratam-se de pequenas unidades topográficas não contínuas. Por outro lado, é
possível ocupar as baixas e médias encostas de muitos morros, desde que se efetue
movimentação de terra.
Em relação à política industrial do
Município, a Secretaria de Indústria,
Comércio e Segurança ( nova denominação dada à Secretaria de Desenvolvimento de
Projetos Especiais – Art 1 da Lei Municipal n 3.445/2005 assumiu a competência legal de:
I – estabelecer as políticas, diretrizes e programas de desenvolvimento da indústria;
II – incentivar a instalação de empresas de grande, médio ou pequeno porte no Município
.......................................................................................................
Essas são as atribuições legais relativas ao desenvolvimento industrial. As outras quatro
competências se referem às áreas de Comércio e Segurança que fazem parte da mesma
Secretaria.
Do ponto de vista prático, o desenvolvimento industrial sempre foi a prioridade
econômica do Município. Apesar de ter mais de 90% das indústrias dispersas pelo tecido
urbano, a tendência da política industrial é priorizar a lógica aglomerativa iniciada com a
construção do DI em 1971. Atualmente, com o quase esgotamento total da área do DI (a
ocupação atual é de cerca de 95%), o poder público municipal, através da Secretaria de
Indústria, Comércio e Segurança já desapropriou uma área de 360.000m2 para um novo DI.
Esse ficará localizado a uma distância de cerca de 2 Km a jusante do atual DI na margem
oposta (margem esquerda). Para estimular a instalação das indústrias o terreno será doado
138
às empresas interessadas, conforme regulamenta o Contrato de Direito Real de Uso
(ANEXO 2) em vigor no atual DI de Cataguases.
Sabemos que os fatores acima mencionados, mesmo sendo fundamentais, não
regem, sozinhos, as lógicas que orientam a dinâmica do setor industrial, principalmente na
atualidade. Nenhum arranjo produtivo local está fora dos condicionantes impostos pelas
profundas transformações da economia mundial que se acentuaram na década de 1990. As
revoluções tecnológicas, liberalização comercial e financeira, desregulamentações e abertura
dos mercados inseriram a economia brasileira num ambiente de competitividade internacional.
Segundo Mendes (2002), centenas de fábricas têxteis foram fechadas no Brasil durante a
década de 1990. A concorrência internacional afetou diretamente a indústria têxtil de
Cataguases produzindo efeitos negativos como fechamento de fábricas, demissões e férias
coletivas. As indústrias que resistiram tiveram que passar por mudanças operacionais e
modernização de equipamentos, que também produziram diminuição dos empregos como nos
casos da Companhia Industrial Cataguases e da Indústria Têxtil Goitacazes.
A incorporação da Indústria Irmãos Peixoto pela Companhia Industrial
Cataguases representou uma fusão dos parques produtivos e uma reestruturação induzidas
pelo
ambiente de competição globalizada. Existe, portanto, um cenário de acirrada
concorrência e competitividade colocado pela economia globalizada que afeta diretamente
ou indiretamente as perspectivas do desenvolvimento, ou expansão, da indústria local. As
grandes empresas mais intensivas em capital, conhecimento e que utilizam métodos de
gestão modernos e flexíveis, conseguem se reestruturar para adequação às novas regras
e se manterem no mercado. Em Cataguases só as grandes empresas reunem essas
condições como a CFLCL, a Indústrias Químicas Cataguases, a Manufatora de Tecidos de
Algodão, a Companhia Industrial Cataguases, a Zollern (metalúrgica), a Indústria
Cataguases de Papel e a Friatec (metarlúrgica). As demais indústrias (micro, pequenas e
médias) operam com métodos gerenciais superados, poucos recursos financeiros e
procedimentos tecnológicos pouco modernos.
De modo geral, as indústrias de Cataguases são tradicionais e envolvem,
principalmente, os ramos têxtil, papel, químico, metalurgia e alimentício. A cidade não possui um
núcleo endógeno de geração de novas tecnologias e nem está conectada a programas de
parcerias com centros universitários. Tal ausência não permite a geração de externalidades e
acúmulo de conhecimentos, indispensáveis para expandir setores de alta tecnologia,
potencialmente mais dinâmicos e afinados com as novas demandas da atualidade.
As perspectivas de expansão industrial continuam apontando para os setores
tradicionais. Segundo a Secretaria
de Indústria, Comércio e Segurança, esse perfil deve
continuar, pois as empresas que procuram a Secretaria com interesses de
se instalarem no
Município são, em sua grande maioria, de pequeno porte e ligadas aos ramos acima
139
mencionados. Mas dois grandes projetos, já em andamento, estão cumprindo processo de
licenciamento junto a FEAM por possuírem grande potencial poluidor. O primeiro se refere a
uma grande fábrica de papel que deverá se instalar no novo DI de Cataguases . Essa será a
segunda indústria de papel da cidade. Utilizará a celulose já pronta para fabricar tipos de papéis
para impressão. Apesar de não fabricar celulose fará uso intensivo de água. O outro projeto em
andamento no Município é a construção de uma grande fábrica de alumina pela
CBA/VOTORANTIN numa área que já é propriedade particular da empresa, localizada no
distrito de Turiaçú. Como se percebe, a indústria extrativa mineral e de transformação primária
de minério de alumínio são ramos que têm perspectivas de expansão no Município.
Os sítios mais favoráveis à expansão das indústrias no Município de Cataguases
estão cada vez mais distantes da mancha urbana. As novas áreas escolhidas tanto pelo
poder público quanto pela iniciativa privada para expansão industrial, acompanham o curso
do rio Pomba a jusante da cidade. A expansão das indústrias tradicionais nessa direção
ampliará a área de urbanização e aumentará os riscos de poluição.
Competirá à Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente (Órgão responsável pela
área ambiental) fiscalizar os cumprimentos à legislação ambiental por parte das empresas
para que a expansão das indústrias no Município garantam o desenvolvimento, mitigando,
ao máximo, os efeitos negativos sobre o ambiente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A decisão de analisar os impactos socioambientais provocados pela lógica de
organização espacial das indústrias de Cataguases criou a expectativa de poder contar com
vasto material bibliográfico, mapas, estatísticas e informações que pudessem subsidiar a
pesquisa. Descobrimos, logo no início, que esse apoio seria extremamente limitado. Ao
relacionar industrialização com a problemática ambiental, verificamos que não há nenhum
registro de trabalho publicado sobre Cataguases. Portanto, de posse das limitadas
informações disponíveis, tivemos que ampliar nossos esforços de investigação e gerar
dados, através de pesquisas de campo, elaboração de mapas e entrevistas. Essa escassez
de informação sobre o desenvolvimento industrial de Cataguases já produziu um equívoco
no encaminhamento de nossa pesquisa.
Na fase inicial de elaboração do projeto de
pesquisa, pensávamos que as indústrias de Cataguases obedeciam a um único padrão de
organização espacial e que a forte presença
do setor têxtil evidenciaria uma estrutura
industrial pouco diversificada. No entanto, a representação cartográfica, que elaboramos
para localizar as principais indústrias da cidade, revelou um quadro industrial diversificado e
a existência de dois padrões de organização espacial: o disperso e o concentrado.
Formatados por lógicas distintas e implantados em momentos diferentes, os dois
padrões coexistem e produzem um conjunto de mudanças socioespaciais e ecológicas que
o presente trabalho tratou de investigar. A fim de investigar os impactos ambientais na
escala municipal, a pesquisa se orientou em torno da questão central: qual a dimensão geral
e singular dos impactos ambientais provocados pelos padrões de organização espacial das
indústrias de Cataguases, considerando seus dois arranjos espaciais: o disperso e o
concentrado? Assim sendo, após análise e sistematização das informações, vale um esforço
de síntese das generalizações e diferenciações internas dos dois padrões frente a questão
ambiental.
O padrão disperso abriga o maior número de indústrias e os maiores
estabelecimentos. São justamente as grandes indústrias desse padrão que produziram os
maiores acidentes ambientais registrados até o ano de 2006. A
maior incidência dos
problemas ambientais ocorreram desde o início do século XX até a década de 80, quando a
criação da Política Nacional do Meio Ambiente (31/03/1981) obrigou, gradativamente, as
indústrias a se adequarem às exigências técnicas de qualidade ambiental. Mesmo com suas
deficiências e lentidão, essa política ajudou a reduzir os impactos produzidos pela operação
das indústrias. Os setores que mais geraram poluição em Cataguases estavam relacionados
aos ramos, têxtil, papel e celulose, químico e fundição. As grandes empresas passaram por
adequações técnicas e foram obrigadas a tratarem os efluentes. No entanto, percebemos
que a ineficiente fiscalização dos Órgãos Seccionais do Estado (FEAM, IGAM e IEF) deixa
141
margem para que ocorram acidentes ambientais . A maior parte dos impactos registrados
foram provocados por lançamentos ou vazamentos de efluentes líquidos que atingiram as
bacias do ribeirão Meia Pataca e rio Pomba. No caso de grandes vazamentos, a poluição
alcança o rio Paraíba do Sul e transborda para o Estado do Rio de Janeiro. Isso tem gerado
conflitos políticos entre as Secretarias Estaduais de Meio Ambiente de Minas Gerais e do
Rio de Janeiro.
Em nossa abordagem de impactos ambientais, interessou também investigar o
conjunto de transformações socioespacias induzidos pelo desenvolvimento industrial no
município.
Nesse sentido, ficou claro que o desenvolvimento das indústrias do padrão
disperso contribuiu para o crescimento do tecido urbano, pois, à medida que as indústrias
dispersavam, o poder público municipal estendia a infra-estrutura viária e favorecia também
o processo de urbanização no entorno da unidade fabril. As grandes indústrias têxteis, como
a Indústria Irmãos Peixoto, a Companhia Industrial Cataguases e a Cia. Manufatora de
Tecidos de Algodão tiveram papel importante nesse processo, visto que, ao construírem
suas vilas operárias, induziram o surgimento de novos bairros.
O desenvolvimento industrial produziu também efeitos multiplicadores e estimulou
o surgimento de diversas atividades correlatas como as pequenas oficinas de tornearia,
serralherias, fundições, comércio, bancos, pequenos restaurantes e inclusive uma escola
técnica do SENAI. O padrão disperso concentra 90% das indústrias, sendo que a grande
maioria é de micro e pequenas empresas que se amalgamam com o tecido urbano
utilizando as garagens, fundos de quintais e galpões construídos em terrenos baldios de
bairros residenciais. A intensa dispersão dessas indústrias dificulta as fiscalizações por parte
dos órgãos ambientais Estadual e Municipal.
O padrão concentrado de organização espacial da indústria é representado pelo
Distrito Industrial. Desde sua criação, não foram registrados acidentes ambientais, pois as
indústrias instaladas são de baixo potencial poluidor. A única exceção fica por conta da
Zollern Metalúrgica que apresenta potencial poluidor de nível médio, segundo a DN no
74/2004. No entanto, a CIC (Companhia Industrial Cataguases – fiação), a Têxtil
Goitacazes, a Reiclibem, a Paloosa Confecções e a Cat-Leo (Companhia Força e Luz
Cataguases Leopoldina) solicitaram, em 2005,
modificações nos procedimentos
tecnológicos, o que aumentará seus respectivos potenciais poluidores. Essas empresas
aguardam respostas dos órgãos ambientais estaduais FEAM e IGAM, responsáveis pelo
licenciamento e outorga das solicitações.
A lógica da indústria aglomerada inaugurada pelo DI não tem produzido
economias de aglomerações significativas, pois a estrutura das indústrias instaladas é
bastante diversificada. Por isso, constatamos um baixo grau de complementaridade entre as
142
indústrias. O poder público Municipal não tem colocado restrições quanto ao tipo de
indústria que pretende se instalar no DI.
A insuficiente ação fiscalizadora dos órgãos ambientais estaduais também ocorre
em relação às indústrias do DI. Embora o padrão concentrado favoreça a fiscalização, os
empresários ou representantes técnicos das indústrias informaram que não recebem visitas
dos órgãos fiscalizadores ambientais do Estado ou do Município.
A implantação do DI produziu efeitos positivos na urbanização. A infra-estrutura
viária de acesso ao DI e a Subestação Geradora de Energia Elétrica da CFLCL permitiram
a construção dos conjuntos habitacionais Taquara Preta, Santa Clara e São Cristóvão.
Esse conjunto formado por bairros residenciais e indústrias têm estendido, linearmente, a
urbanização de Cataguases para jusante da mancha urbana central, principalmente na
margem direita do rio Pomba. Por isso, já se projeta para esta área a construção de uma
estrada que conectará o DI à BR 120 para facilitar o acesso à BR 116 e o escoamento da
produção industrial.
Os impactos socioambientais de Cataguases se colocam como um problema,
sobretudo no que diz respeito à execução da política ambiental. A competência
para
licenciamento e fiscalização das atividades industriais dentro da unidade territorial de
Cataguases depende do porte e do potencial de poluição da empresa, segundo critérios
definidos pela DN no74/2004 do COPAM-MG. No entanto, conforme admitiu o Secretário
Estadual de Meio Ambiente do Estado de Minas Gerais, os órgãos seccionais não têm
condições de atuar
em casos de emergência e a Secretaria não possui um cadastro
atualizado de identificação dos empreendimentos que geram produtos tóxicos. Não há
também um esforço político para uma ação coordenada entre os órgãos municipais e
estaduais na área ambiental, tanto para o licenciamento integrado, quanto para as ações de
fiscalização. Em geral, a postura tem sido mais reativa do que preventiva.
Na parte de competência do Município a situação também é crítica. Apesar de
Cataguases possuir um Código Ambiental Municipal, aprovado em 1998, não existe um
órgão Municipal ambiental competente para cumprir suas deliberações
normativas. A
questão ambiental em Cataguases fica a cargo da Secretaria de Agricultura e Meio
Ambiente criada em 2005. Além de dividir as competências com o setor de agricultura, a
Secretaria não se encontra em condições
técnicas e de pessoal para cumprir com as
deliberações do Código Ambiental Municipal. A cidade ainda não possui uma coleta seletiva
do lixo urbano e o aterro sanitário ainda não saiu da fase de planejamento e estudo de
viabilidade. Esse é um ponto importante, pois a maioria das indústrias de micro e pequeno
porte da cidade utilizam a coleta oficial de lixo urbano para fazer os descartes de seus
resíduos.
143
Outro problema detectado se refere às rupturas de continuidade na política
pública. A cada mudança de administração, o poder executivo Municipal tem alterado a
estrutura e as competências das Secretarias. Um exemplo é a atual Secretaria de Indústria,
Comércio e Segurança que, na administração anterior, era nomeada
Secretaria de
Desenvolvimento de Projetos Especiais. Tal procedimento, somado ao acúmulo de
competências numa mesma Secretaria, dificulta a consolidação e o amadurecimento das
políticas públicas no Município.
Em síntese, a relação do poder público, nas suas mais diversas escalas de poder,
com a questão dos impactos ambientais provocados pelas indústrias de Cataguases não
apresenta atitudes e práticas de controle ambiental diferenciadas para os dois padrões
industriais. A ineficácia da fiscalização é uma situação comum, apesar da legislação ter
contribuído para a redução dos impactos produzidos pelas empresas. Outro aspecto geral
aos padrões industriais investigados se refere à importância da indústria na extensão do
tecido urbano. A falta de planejamento da prática industrial é outro destaque tanto no padrão
disperso quanto no Distrito Industrial. A singularidade se verifica no grau de poluição das
empresas, visto que o padrão disperso é o de maior potencial poluidor. Por fim, alguns
aspectos da organização espacial das empresas mostram diferenciações significativas no
que se refere à logística de transporte, tamanho das empresas, sítio e posição, conforme já
assinalados na pesquisa em tela.
Enfim, o presente trabalho não tem a pretensão de esgotar a temática diante de
sua complexidade e movimento permanente. Pretendemos uma reflexão crítica sobre um
dos setores econômicos que, sem dúvida, é o mais importante da cidade. Optamos por
pesquisar a organização espacial das indústrias e seus impactos socioambientais, mas
reconhecemos que há também muitas outras possibilidades de abordagens. A indústria em
Cataguases é um tema inesgotável e precisa ser intensamente discutido. Esperamos que o
nosso trabalho possa servir de instrumento para orientação da gestão ambiental frente aos
imperativos das corporações econômicas. Não queremos negar o desenvolvimento
econômico, porém, acreditamos que é possível promovê-lo, mitigando, ao máximo, seus
efeitos deletérios sobre o ambiente.
144
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