slowfood

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slowfood
junho/julho
edição 29
2010
R$ 10
BRASIL
SUS T E N TÁV E L
Impresso
Especial
9912224192 3/8 - DR/RJ
CEBDS
CORREIOS
u m a p u b l i c a ç ã o d o c o n s e l h o e m p R e s a R i a l b R a s i l e i R o pa R a o d e s e n v o lv i m e n t o s u s t e n t á v e l
slow food
o movimento pela alimentação sustentável
queR ReduziR a velocidade do mundo
Pequenas
hidrelétricas:
sustentáveis,
mas nem tanto
+
euRopa queR
impoRtaR
energia solar
do saaRa
+
ignacy sachs:
é complicado
distRibuiR Renda
sem cResceR
Av. das Américas, 1.155 - grupo 208, 22631-000, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
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v inc u l a d o a o
WOR LD BUSINESS COUNCIL FOR SUSTA INA BLE DE V ELOPMEN T (W BC SD)
PRESIDENTE EXECUTIVA
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Marina Grossi
Marcos Bicudo
Erling Sven Lorentzen
C ONse L HO De a Dm i N ist r aç ãO
Carlos eduardo
Garrocho de almeida
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Alcoa
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Shell Brasil
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Abril
João Batista
Ferreira Dornellas
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marco simões
Coca-Cola
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Basf
Hélio ribeiro Duarte
HSBC
Di r e t Or i a
Vânia somavilla
Vale
altair assumpção
Grupo Santander Brasil
Jorge soto
Braskem
Wilson santarosa
Petrobras
C â m a r a s t e m át iC a s
ÁGUA
P RESIDENTE: Yazmin trejos
Amanco
VICE-PRESIDENTE:
maria Cláudia Grillo
Petrobras
VICE- PRESIDENTE:
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Coca-Cola
B IODIVERSIDADE
E B IOTECNOLOGIA
P RESIDENTE: Gloverson moro
Syngenta Seeds
E NERGIA E M UDANÇA
DO C LIMA
P RESIDENTE: Luís César stano
Petrobras
L EGISLAÇÃO A MBIENTAL
P RESIDENTE:
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Gerdau
C OMUNICAÇÃO E E DUCAÇÃO PAR A A
S USTENTABILIDADE
P RESIDENTE: eraldo Carneiro
Petrobras
VICE-PRESIDENTE:
David Canassa
Votorantim Participações
G ESTÃO S USTENTÁVEL
P RESIDENTE: ana Lúcia suzuki
Basf
C ONSTRUÇÕES S USTENTÁVEIS
P RESIDENTE: Carlos eduardo
Garrocho de almeida
Holcim
FINANÇAS S USTENTÁVEIS
P RESIDENTE: Wagner siqueira
Banco do Brasil
VICE-PRESIDENTE:
Luiz Fernando Nery
Petrobras
eQU i Pe Ce BD s
erica Fernandes
Fernanda Gimenes
Fernanda resende
Juliana Queiroz
Leandro Batista
Lia Lombardi
mara Braile
Pablo Vázquez
Phelipe Coutinho
silvana Nocito
soia shellard
sueli mendes
Verônica Oliveira
a s sO Ci a D O s Ce BD s
• 3m do Brasil Ltda.
• abralatas
• alcoa alumínio s.a.
• amanco Brasil s.a.
• amBev – Companhia
de Bebidas das américas
• arcelormittal Brasil
• Bahia mineração
• Banco do Brasil
• Basf s.a.
• Bayer s.a.
• Bradesco s.a.
• BP Brasil Ltda.
• Braskem s.a.
• Caixa econômica Federal
• Chemtech
• Cia. Brasileira
de Petróleo ipiranga
• Cia. energética de
minas Gerais – Cemig
• Coca-Cola
• Copel
• DNV
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termonuclear s.a.
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• Grupo santander
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• Holcim Brasil s.a.
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• Lorentzen
empreendimentos s.a.
• michelin
• monsanto do Brasil Ltda.
• Natura Cosméticos
• Nestlé Brasil Ltda.
• Organização Odebrecht
• Organizações Globo
• Petrobras – Petróleo
Brasileiro s.a.
• Philips
• shell Brasil Ltda.
• souza Cruz s. a.
• solvay do Brasil Ltda.
• suzano Papel e Celulose
• syngenta seeds Ltda.
• tim
• Usiminas – Usinas
siderúrgicas de mG s.a.
• Vale
• Votorantim Participações s.a.
• Walmart Brasil
nesta edição
bRasil sustentável 29
Jun/Jul 2010
foto de caPa: lysanne ooteman/sxc
iMageM
Vazamento de petróleo
ameaça praias do alabama
notas
cidade ecológica, Índice de estados
Falidos, negócios da china
Vida noVa
designer transForma objetos
rejeitados em objetos desejados
ferraMenta
certiFicação liFe promoVe
a gestão da biodiVersidade
PanoraMa
al gore, o barômetro da
biodiVersidade e a direção econômica
sustentáVel 2010
primeiro eVento da série discute
o Futuro das cidades, no rio
agenda
prepare-se para os eVentos
de agosto a setembro
Pequenas hidrelétricas
Várias usinas em peQuenos rios
causam grandes problemas
6
8
12
14
16
18
22
24
32
36
38
40
42
46
48
50
boa alimentação para mudar o mundo
congresso gife
empresas aumentam
inVestimentos sociais
lideranÇa
ignacy sachs, um dos pais da ideia
do desenVolVimento sustentáVel
deserto solar
energia solar do saara
abastecerá europa
ano da BiodiVersidade
conserVar e proteger serViços
ambientais também dá lucro
Vision 2050
Wbcsd discute os cenários
do Futuro com empresários
gri: noVa geraÇão
congresso de amsterdã discute a
direção
Álvaro Almeida (MTB: 45384)
Estevam Pereira (MTB: 21302)
conselho editorial
Ana Lúcia Suzuki (Basf)
Carlos Eduardo Garrocho
de Almeida (Holcim)
Enio Viterbo Junior (Gerdau)
Eraldo Carneiro (Petrobras)
Luís César Stano (Petrobras)
Luiz Fernando Nery (Petrobras)
Yazmin Trejos (Amanco)
Wagner Siqueira (Banco do Brasil)
CEBDS
Marina Grossi
Lia Lombardi
Fernanda Resende e Sueli Mendes
(Assessoria)
edição
Ricardo Arnt (redator-chefe)
Alessandra Pereira, Álvaro
Penachioni, Beto Gomes,
Daniela Vianna, Fernando Badô,
Raquel Sabrina e Rita Nardy (editores)
Conrado Loiola, Michele Silva,
Paula Andregheto, Paulo César
Pereira, Pedro Michepud e
Silvia Wargaftig (repórteres)
fotografia
Ricardo Corrêa
direção de arte
e
m uma única edição, a BRASIL SUSTENTÁVEL
aborda três temas de extrema relevância
para o nosso futuro, colocando em xeque
verdades com as quais a sociedade tem convivido
e apontando novas saídas.
Na reportagem de capa, a revista traz aos leitores
uma nova visão sobre a cultura global de produzir e
consumir alimentos. O Slow Food, movimento que
defende a preservação da biodiversidade alimentar,
pode contribuir em escala como instrumento de
combate à fome e ao inaceitável desperdício. Nos
Estados Unidos, por exemplo, jogam-se no lixo, todos
os dias, 22 toneladas de alimentos.
Considerado um dos principais pensadores do
desenvolvimento sustentável, o economista Ignacy
Sachs faz uma interessante análise das três mais
recentes etapas da humanidade. E vaticina: os países
das regiões tropicais e semitropicais ganham um papel
fundamental por deterem as maiores concentrações de
comunicação para a sustentabilidade
biomassa, invertendo o equilíbrio de poder global em
termos de energia, insumo crucial do futuro.
Também está em destaque nesta edição uma ampla
discussão sobre as chamadas pequenas centrais
hidrelétricas, à primeira vista sempre bem-vindas.
Produzem energia elétrica sem emitir gases de efeito
estufa e atendem, com menor investimento, a demandas
locais para gerar renda e emprego. Contudo, ouvindo
os mais diferentes segmentos envolvidos no setor, a
reportagem alerta que, sejam grandes ou pequenas,
as hidrelétricas devem passar por um cuidadoso crivo
socioambiental.
São três polêmicas com forte indução para refletirmos
sobre a melhor maneira de produzir energia, combater
a pobreza, preservar nossos ativos ambientais e, em
última instância, traçar um caminho mais seguro para
a construção do desenvolvimento sustentável.
Marina Grossi
controVérsia
o cheFe deVe ser
temido ou estimado?
diReto do conselho
EXPEDIENTE
coordenação
polêmicas opoRtunas
rePortageM de caPa
carlo petrini, do sloW Food, prega a
BRASIL
S U S T E N T ÁV E L
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Marcia Alvaredo (diretora)
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(executivos de atendimento)
Jefferson Eduardo (marketing)
inventário de gees
fórum carioca
empresas em Bonn
a divulgação dos inventários de
emissões de gases de efeito estufa
(gees) de 35 empresas, no im de
junho, marca o primeiro resultado do
programa brasileiro ghg protocol,
iniciativa lançada pelo cebds em
parceria com a Fundação getulio
Vargas. a metodologia e as metas de
sustentabilidade foram adaptadas ao
país. a partir do inventário, as empresas
estarão mais capacitadas para adotar
medidas de redução de emissões.
desenvolvido pelo World business
council for sustainable development
(Wbcsd) e pelo World resources
institute (Wri), o ghg protocol é
considerado a mais soisticada e precisa
ferramenta para medir emissões.
o cebds representará o setor
empresarial no Fórum carioca
de mudanças climáticas e
desenvolvimento sustentável,
criado recentemente pela
prefeitura do rio de janeiro.
o objetivo do fórum é
conscientizar e mobilizar a
sociedade para trabalhar junto
com a administração municipal,
abrindo espaço para a discussão
sobre problemas decorrentes
das mudanças do clima e sobre
desenvolvimento sustentável
em geral. o convite foi feito pela
prefeitura durante o 1º encontro
do sustentável-2010, realizado
em maio, no rio.
a representação empresarial
presente na reunião preparatória
para a cop-16 apresentou os estudos
preliminares de um amplo projeto,
o setor privado e a unFccc. a
apresentação do estudo foi feita
em um evento paralelo realizado no
dia 10 de junho durante o climate
change talks, da convenção-Quadro
das nações unidas sobre mudança
do clima, em bonn, alemanha. parte
do conteúdo foi extraído de cinco
workshops internacionais promovidos
pelo Wbcsd em cinco grandes
cidades: pequim (26 de março), hong
Kong (29 de março), são paulo (14 de
abril), Washington dc (27 de abril) e
bruxelas (6 de maio).
Denise Barreto (gerente inanceira)
impressão
Ediouro
tiragem
5 mil exemplares
A revista BRASIL SUSTENTÁVEL é uma
publicação do Conselho Empresarial
Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS). Os artigos não
reletem necessariamente a opinião
do CEBDS, sendo de responsabilidade
dos articulistas e entrevistados.
assinaturas e números avulsos • Telefone: 55 2 1 2483.2250 • e-mail: cebds@cebds.org • www.cebds.org
imaGem
talVeZ
fique ruiM
Para nadar
banhistas de dauphin island, alabama, tomam sol protegidos por
uma barreira de feno instalada pela Guarda civil. milhares de defesas
foram implantadas por voluntários, trabalhadores e militares para
impedir que o óleo vazado de uma plataforma da british petroleum,
no Golfo do méxico, em 20 de abril, atinja portos, praias, pesqueiros
e reservas ecológicas, no pior vazamento de petróleo da história dos
eua. o senado norte-americano quer aumentar de us$ 75 milhões
para us$ 10 bilhões a multa às três empresas envolvidas no acidente:
a bp, a halliburton e a transocean.
foto: Brian snyder/reuters
notas
Publicidade sem
greenwashing
« e d i ç ão b e t o G o m e s »
u r b a n i s m o • m a r K e t i n g • c a m pa n h a s
obras serão
concluídas
em 2015
O Conselho Nacional de Autorregulamentação
Publicitária (Conar) criou um grupo para debater
a abordagem de sustentabilidade em anúncios
publicitários. O objetivo é desenvolver propostas capazes
de aperfeiçoar as recomendações do Código Brasileiro de
Autorregulamentação Publicitária e reduzir a prática
do greenwashing. Para desenvolver normas, o grupo vai
aproveitar o fato de o Conar ser membro correspondente
da Ease, entidade que reúne os órgãos de regulamentação
europeus, para reunir ideias e informações. “Hoje, há
espaço para aprimorar e detalhar a regra ética”, diz o
presidente do Conar, Gilberto Leifert.
[Pedro Michepud]
23.200.000
é o número de famílias atendidas pelos programas federais de proteção social – bolsa Família, aposentadoria
Rural, benefício de prestação continuada – bpc-loas. com cerca de R$ 55 bilhões liberados em 2009 para
o pagamento dos benefícios, os três programas atenderam 22,5% da população do país no período. de acordo
com o instituto de pesquisa econômica aplicada, os atuais 32% de pobres e 12,6% de indigentes seriam 33%
e 13,9%, respectivamente, se não existissem os programas. [conrado loyola]
telhado Branco
new songdo à noite
8 [ bs ]
jun/jul 2010
cidade ecológica
Já imaginou morar num lugar totalmente sustentável? O
empresário norte-americano Stan Gale e sua empresa, a
Gale Internacional, estão trabalhando em uma das obras
mais ambiciosas do mundo: a construção de New Songdo,
na Coreia do Sul, uma cidade totalmente racional. Os
investimentos giram em torno de US$ 35 bilhões, e
a meta é concluir o empreendimento até 2015. Todos
os processos urbanos do local, construído para 65 mil
habitantes, serão racionalizados, desde a transmissão
de energia e o uso racional de água até a baixa emissão
de carbono. A cidade dos sonhos emitirá um terço
dos gases de efeito estufa das metrópoles do mesmo
tamanho. A água usada em lagos e parques virá
do mar e do reaproveitamento da chuva. Consultas
médicas e serviços municipais serão marcados em
monitores de tela plana instalados nos apartamentos.
A cidade terá 25 quilômetros de ciclovias e os espaços
ao ar livre ocuparão 40% da área total. Mais de 75%
do material utilizado na construção de New Songdo
será reciclado. [Paula andregheto]
pintar o telhado de
branco de pelo menos
40% das casas no
mundo pode ser uma
alternativa para reduzir o
uso de ar-condicionado e
contribuir com a redução
da temperatura média do
planeta em 1°c. de acordo
com a ong green building
council (gbc), cada 100
m2 pintados de branco
compensam 10 toneladas
de emissão de co2 por
ano, pois as cores claras
não absorvem o calor e
refletem até 90% dos raios
solares. no interior da casa,
a temperatura pode baixar
até 6°c. a ideia faz parte
da campanha de combate
ao aquecimento global one
degree less, trazida para
o brasil pela gbc-brasil.
a versão brasileira da
campanha contou com a
participação voluntária de
famosos como cristiane
torloni, raí, Fernanda paes
leme e sergio marone. [cl]
Raí: tinta branca no telhado
notas
Falsa
g u er r a ciVi l • m er ca d o
F i n a n cei r o • g lo ba liz ação
stR new/Reuters
retranca
bandos armados
vivem em guerra
civil na somália
desde 1991. não há
governo central
abr/mai 2010
10 [ bs ]
A ONG Bank Track, rede internacional de monitoramento do setor
bancário, lançou o relatório Close the Gap, que avalia a qualidade das
políticas de crédito e investimentos desenvolvidas por 49 bancos, de 17
países. O levantamento indica que os bancos anunciam cada vez mais
compromissos com a sustentabilidade, mas, muitas vezes, não os colocam
em prática. De acordo com o estudo, existem lacunas que precisam ser
preenchidas: a falta de políticas de crédito e de investimento adequadas;
o fato de as questões socioambientais estarem resumidas aos direitos das
comunidades locais e à necessidade de preservar o meio ambiente; e a
falta de apoio de várias instituições aos Princípios do Equador. Banco do
Brasil, Itaú e Bradesco aparecem mais bem colocados na comparação com
os mercados emergentes (Índia, Rússia e China). Segundo o coordenador
do programa de Ecofinanças da ONG Amigos da Terra, Roland Widmer,
as empresas brasileiras carecem de políticas capazes de orientar a
atuação na área de sustentabilidade. [Pa]
o quintal do vizinho
Índice de países falidos
Tensões históricas e culturais,
ingovernabilidade e corrupção
generalizada são fatores que podem
levar as nações a entrar em processo
de falência, tornando-se incapazes
de garantir os serviços básicos para o
povo. Para mensurar tais condições,
o Fundo da Paz e a revista norteamericana Foreign Policy publicam,
anualmente, o Índice dos Estados
Bancos: pouca ação
Falidos, avaliando os países que mais
sofrem com a debilidade de governo.
Em 2010, cinco nações africanas
ficaram entre os dez primeiros
da lista: Somália, Chade, Sudão,
Zimbábue e República Democrática
do Congo. Na outra ponta da tabela,
a dos governos eficientes, estão
Noruega, Finlândia, Suécia, Suíça
e Irlanda. O Brasil ocupa a 119ª
posição. Para fazer a classificação,
os organizadores utilizam 12 tipos
de indicadores, atribuindo notas
de 0 a 10 para cada um (sendo 10
o pior). Na primeira lista,
publicada em 2004, apenas sete
países superavam os 100 pontos.
Hoje, a lista contém 15. O mundo
piorou. Veja a tabela completa no
link http://bit.ly/bm5pdr. [PM]
países com poucas terras para a agricultura estão de olho no
quintal do vizinho – que, em muitos casos, fica a milhares de
quilômetros de distância. com pouco espaço para cultivar e
abastecer o mercado interno, governos e corporações
estrangeiras estão comprando terras em outras paragens. a
arábia saudita e o catar fizeram acordos com países como
camboja, sudão, Vietnã e indonésia. o grupo sul-coreano
daewoo arrendou 1,3 milhão de hectares em madagáscar. no
brasil, a estatal chinesa chongqing grain group anunciou
investimentos de us$ 300 milhões na compra de 100 mil
hectares de terra, para produzir soja na bahia e exportar para
os dez piores em 2010
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
somália
zimbábue
sudão
chade
rep. democrática do congo
iraque
afganistão
rep. centro-africana
guiné
paquistão
6
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10
2
3
9
1
8
5
4
negócio da china:
estatais chinesas
compram terras na
bahia para plantar
soja e exportar
para pequim sem
intermediários
pequim, sem intermediários. além dessa, as principais
empreitadas no brasil, até o momento, são do grupo hyundai, da
coreia do sul, que quer adquirir 10 mil hectares, e de um grupo
japonês, que adquiriu 100 mil hectares de terras no maranhão, em
minas gerais e na bahia. para limitar as aquisições, a comissão de
constituição e justiça da câmara dos deputados aprovou um
projeto que limita a 1.140 hectares o tamanho das propriedades
rurais que podem ser compradas por estrangeiros na amazônia
legal. o projeto ainda será votado no senado. em angola, além
de adquirir terras, a china quer transferir 2 milhões de chineses
para trabalhar nelas. [PM]
vida nova
capa
RadaR
eneRGia
« e d i ç ão R i c a R d o a R n t»
i n i c i at i Va s p e s s o a i s t r a n s F o r m a d o r a s
BoM e
Bonito
por meio do design, nido campolongo
propõe uma noVa Forma de Ver os
resÍduos e de se relacionar com
diFerentes públicos
12 [ bs ]
jun/jul 2010
o que, paRa muitos, é liXo,
para Nido Campolongo, pode ser o componente estrutural de
uma mesa. O designer visita indústrias, favelas, lojas e cooperativas de reciclagem em busca de inspiração para novas
peças, que podem ser funcionais ou meramente ornamentais. “O que me guia são as belezas dos materiais, a possibilidade de unir pequenas peças idênticas e transformá-las em
outras coisas. São pedacinhos iguais e não são nada, como
um cone, que é só um cone, mas pode compor uma mesa”,
explica. A mesa em questão fica bem na entrada de seu escritório e é composta por 360 cones de linha. O componente,
ele explica, é chamado de tubete e utilizado em bobinas de
máquinas rotativas, para dar suporte a materiais como plástico, linha e papel em processos de produção.
Os tubetes, de diferentes tamanhos, são encontrados
em várias obras de Campolongo, como a cama acomodada em outra sala do escritório. Um grande lustre esférico,
feito de módulos de garrafas pet desenvolvidos por uma
cooperativa de reciclagem, compõe o ambiente. “Com
meu trabalho, acho que consigo mostrar para as pessoas
que aquele material que elas veem como resíduo pode ser
visto de outra forma. Ele tem uma virtude estética, dependendo da forma como é organizado”.
A trajetória recriadora do designer começou cedo. Quanto
tinha 1 ano de idade, sua família montou uma tipografia ao
lado de casa. “Cresci ajudando meu pai, e o barulho das máquinas era meu despertador”, lembra-se. O negócio era vol-
marcelo min
RepoRtaGem silvia WaRGaFtiG
campolongo à vontade no seu quarto de dormir singular:
a cama é feita de tubetes e a luminária de garrafas pet
tado para abastecer o comércio local, com cartões de visita e
panfletos. Aos 17 anos, ele decidiu pesquisar novos suportes
para desenvolver produtos diferenciados e prospectar mais
clientes. Assim começou o hábito de visitar fábricas, conhecer
os processos e, principalmente, observar os resíduos.
“Entrei na faculdade de engenharia civil no fim dos
anos 1970 e, na época, já tinha uma preocupação ambiental. Fazia parte de um grupo que brigava pela não implantação das usinas atômicas Angra 1 e Angra 2. Ao mesmo
tempo, eu vivia um conflito, porque trabalhava com papel
e achava os panfletos comerciais uma bobagem. Então, pensei
se poderia transformar as sobras de papel em algo interessante. Foi assim que minha veia artística me fez perceber que, por
meio do belo, é possível conscientizar e transformar. Desde então, venho fazendo isso”, conta.
Depois de três anos, Campolongo deixou a faculdade, mas
nunca parou de estudar. Consolidou-se como designer gráfico
até que, aos 35 anos, criou uma obra que marcou sua transição
do mundo bidimensional para o tridimensional: um manto feito com as sobras de papelão da tipografia, que guardara durante
anos. Os pedaços foram costurados um a um com fio parafinado.
A partir dessa obra, passou a ousar mais, com novos materiais,
como plástico, metal e vidro, concebendo objetos voltados para
casa. Mas a preocupação ambiental se manteve.
“Quando uso madeira, é de reflorestamento, que já tem uma característica sustentável”, destaca. E acrescenta: “A sustentabilidade não é só a questão do material. Abrange também o modelo de
produção, os licenciamentos, a remuneração dos funcionários. Porém não se fala muito de estética, e eu entro com isso, porque acho
que se trata de um instrumento transformador e, também, sedutor. Se você acha um objeto bonito, começa a refletir sobre ele”.
Foi durante as visitas às fábricas que Campolongo aprendeu
a observar todos esses aspectos. Certa vez, visitando uma indústria de papel, descobriu que a produção gera um resíduo semelhante a um lodo e decidiu procurar formas de aproveitá-lo também. Levou o material ao Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(IPT), na Universidade de São Paulo, e descobriu uma maneira
de produzir tijolos com 15% de lodo na composição, reduzindo o
uso do barro, e impermeabilizados com pet reciclado. Além dos
benefícios ambientais, o produto se encaixa em outro projeto, de
moradia de baixo custo. Resta, agora, captar recursos que financiem os testes de qualidade do tijolo e a produção em larga escala.
A pesquisa de novos materiais também levou Campolongo a
cooperativas de reciclagem e organizações não governamentais,
onde, atualmente, mantém projetos de inclusão social por meio do
design. Na favela do Jaguaré, em São Paulo, trabalha com uma cooperativa que produz casas de cachorro a partir de caixas de madeira. “Mostrei a eles que podem fazer outros objetos, como móveis e
até sua própria casa, e que esses produtos podem ser mais bem acabados. O objetivo é despertá-los para novas oportunidades de mercado, aumentando a geração de renda”. Isso, é claro, respeitando
a cultura dos moradores. “É preciso trabalhar no contexto deles,
preservando seus hábitos. Moradia é isso”, enfatiza. “A estética da
favela é interessante, porque se baseia em colagem de diferentes
materiais recolhidos nas ruas. Por sua condição social, essas pessoas são naturalmente recicladoras, e, se as construções fossem orga[bs]
nizadas, a favela seria muito bonita”.
nova madeira
de uso milenar, o bambu nunca foi tão moderno.
versátil, barato e mais resistente que o aço,
conquista cada vez mais
espaço na construção civil,
como as casas resistentes a
terremotos, construídas na
colômbia e no equador. na
informática, já foi transformado
em revestimento de notebook
pela asus, em 2007. no
brasil, o material ainda
é pouco explorado,
mas entra no mercado
por meio do design
sustentável. marcas
como etna e tok&stok
apostam na matéria-prima
para agregar valor aos
produtos por meio dos benefícios
em sustentabilidade. por crescer
rapidamente, a planta sequestra muito gás
carbônico da atmosfera e tem alta produtividade
por hectare. sua leveza é outro importante
atributo, que permite o transporte de grandes
quantidades com redução do consumo de
combustível. o bambu já está sendo
considerado a “madeira do século 21”.
licitações
sustentáveis
consumo consciente, agora, é assunto federal.
o ministério do planejamento, orçamento e
Gestão criou o programa contratações públicas
sustentáveis, que leva em conta critérios sociais e
ambientais nos processos de licitação. a iniciativa
contempla, principalmente, computadores e
equipamentos eletrônicos, materiais de escritório,
alimentos orgânicos e energia gerada de fontes
renováveis. ainda que os itens sejam mais
caros, a iniciativa visa melhorar a qualidade dos
gastos públicos e proporcionar
compensação inanceira em longo
prazo, redução de impactos no
meio ambiente e desenvolvimento
socioeconômico. o governo quer
inluenciar o padrão de consumo
do mercado, já que suas
compras representam
de 10 e 15% do
pib nacional.
FeRRamenta
capa
eneRGia
« R e p o R taG e m c o n R a d o l oYo l a »
indicadores, selos, normas, guias, certiFicados
e m é t o d o s d e F o m e n t o à i n oVaç ão n a s c o r p o r aç õ e s
ceRtiFicação liFe
gestão da
BiodiVersidade
14 [ bs ]
quais as vantagens?
A Convenção da ONU Sobre Diversidade Biológica realizada na Alemanha, em 2008, colocou o engajamento empresarial no centro da discussão sobre conservação da biodiversidade. Recentemente, o órgão internacional calculou
que a perda anual de florestas custa entre US$ 2 trilhões e
US$ 5 trilhões à economia mundial – ao passo que a última
crise financeira global provocou prejuízos estimados entre
US$ 1 trilhão e US$ 1,5 trilhão.
Em resposta a essa abordagem, que classifica a proteção aos
serviços ambientais como parte dos negócios, a Certificação
Life (Lasting Initiative For Earth, Iniciativa Duradoura Pela
Terra, em português), lançada em julho de 2009, visa medir,
qualificar e reconhecer as empresas que desenvolvem ações
voluntárias em prol da biodiversidade.
A iniciativa foi elaborada por um grupo multidisciplinar
de pesquisadores do Instituto Life, entidade criada a partir
dos recursos e dos conhecimentos da Fundação Avina, da
Fundação O Boticário de Proteção à Natureza, da Gráfica Posigraf e da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS). O Instituto Tecnológico do Paraná
(Tecpar) também apoia a elaboração da norma.
Segundo Clovis Borges, presidente do Conselho Diretor do Instituto Life, uma das vantagens da certificação é sua flexibilidade, uma vez que o instituto parte da premissa de que a perda de biodiversidade afeta
todos. Investindo na manutenção dos serviços ambientais, uma empresa de qualquer setor pode ser certificada, mesmo que não seja responsável direta por
impactos à natureza.
“A Certificação Life mede os impactos daquele negócio e gera índices. Então, ela possibilita a qualquer tipo
de empresa, da padaria à montadora de veículos, realizar investimentos de acordo com seu porte e os impactos de sua operação”, afirma Borges.
como funciona?
Entre as ações que asseguram a obtenção do certificado
estão investimentos em implantação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) e de Unidades de
Conservação públicas, apoio a políticas públicas relacionadas ao tema e ações de combate a espécies invasoras ou
de proteção de espécies ameaçadas.
O processo de obtenção é semelhante ao de outras
certificações: a empresa interessada é avaliada por
uma auditoria independente credenciada pelo Instituto Life. De acordo com Borges, a análise da auditoria
leva em conta o atendimento à legislação, mas verifica
também a gestão ambiental da companhia, o que resulta em “soluções” individuais, respeitando as especificidades de cada empresa.
“Se duas empresas do mesmo setor e do mesmo porte
possuírem processos de gestão ambiental diferentes,
a que possui o melhor processo não precisa necessariamente investir em biodiversidade o mesmo que a
outra, já que os impactos são menores”, exemplifica
Borges. Em seguida, a auditoria avalia se há algum
portfólio de ações de conservação da biodiversidade e,
finalmente, define que medidas a empresa deve adotar para ser certificada.
Atualmente, O Boticário, MPX Mineração e Energia,
Posigraf e a hidrelétrica de Itaipu estão em processo
de obtenção do selo. Segundo Borges, o objetivo do Instituto Life é ampliar o selo de mesmo nome com uma
referência internacional. “Estamos prospectando outras empresas, e nossa intenção a curto prazo é levar a
Certificação Life a elas, já na condição de protagonistas,
apresentado-as em Nagoya, no Japão, onde ocorrerá, em
outubro, a próxima Convenção da ONU Sobre Biodiversidade. As organizações que assumirem esse compromisso estarão na vanguarda.” Segundo Borges, já existem sondagens para levar a certificação a empresas do
Paraguai, considerando a legislação e os biomas locais.
Borges acredita que a popularização da ferramenta
contribuirá para dar mais foco aos investimentos das
empresas. “Grande parte dos esforços de conservação
da biodiversidade ainda é feita de forma aleatória. Embora o certificado tenha tido boa aceitação – respaldado pela ONU e pelo Ministério do Meio Ambiente –,
convencer o setor empresarial de que a queda de qualidade dos serviços ambientais acarreta impactos sobre
os negócios ainda é um desafio.
“A reação inicial, normalmente, é o famoso ‘o que
eu tenho a ver com isso?’”, afirma o presidente do Instituto Life. A gestão ambiental tem avançado, mas a
conservação da biodiversidade ainda está em estágio
inicial. É necessário que as empresas percebam que os
serviços ambientais têm custo e que não podem ser tra[bs]
tados como uma coisa descartável.
[ bs ] 15
o que é?
jun/jul 2010
jun/jul 2010
c e r t i F i c aç ão l i F e r eco n h ec e e r eco m p e n sa açõ e s
Vo lu n tá r i a s d e co n s e rVaç ão d e s e rV i ço s a m b i e n ta i s
a perda da
biodiversidade afeta
a sociedade toda
panoRama
retranca
Falsa
«edição daniela vianna»
quanto custa a degradação?
clima • biodiVersidade • mobilidade • comunicação
determinação coletiva
“se quiser ir rápido, vá sozinho; se quiser ir longe, vá
em grupo.” com esse provérbio africano, o ex-vicepresidente dos estados unidos e prêmio nobel da paz, al
gore, introduz seu novo livro, cuja versão em português
já está disponível no brasil. nossa escolha – um plano
para solucionar a crise climática estabelece uma
discussão sobre temas essenciais, como energia solar,
biocombustíveis, crescimento populacional, poluição
e, como não poderia deixar de ser, aquecimento global.
“já está mais do que claro que temos ao nosso alcance
todas as ferramentas necessárias para solucionar a
crise climática. o único ingrediente que ainda falta é a
determinação coletiva”, sentencia o autor.
16 [ bs ]
sustentabilidade
em tempo real
nossa escolha –
um Plano para
solucionar a crise
climática
[ r e l at o e m p r e s a r i a l ]
autor: al gore
editora: amarilys
páginas: 416
preço: r$ 79,00
[ pesQuisa ]
brasileiros estão mais antenados
sobre as questões ligadas à
biodiversidade na comparação
com consumidores de outros
países, como a França, onde a
biodiversidade é confundida com
produtos orgânicos; e os estados
unidos, onde é relacionada com
questões energéticas, como a dos
biocombustíveis. apenas 60%
dos norte-americanos e europeus
“ouviram falar” de biodiversidade,
contra 94% dos brasileiros.
Barômetro da Biodiversidade 2010
organizadora: uebt
site: www.ethicalbiotrade.org
direção
econômica
[ jogo ]
a Volkswagen lançou o game VW tem de tank?, um
jogo de corrida com elementos em três dimensões,
cujo principal objetivo não é chegar em primeiro
lugar, mas sim conduzir um VW polo de maneira
econômica, sem desperdiçar combustível.
Quem tiver o melhor desempenho ganha um VW polo
blue motion. para participar, basta se cadastrar no
site www.volkswagen.nl/temdetank. a navegação é
amigável e o prêmio é bom, mas as instruções
estão todas em holandês.
com o objetivo de ampliar a transparência, o
jornal britânico the guardian transformou o
seu tradicional relatório de responsabilidade
socioambiental em uma plataforma interativa na
web (www. guardian.co.uk). intitulado living our
Values, o relatório do the guardian foi o primeiro
de uma empresa de mídia publicado no mundo.
a mudança para o novo formato começou a
se conigurar há dois anos, quando jo conio,
responsável pelos relatórios do grupo, passou a
questionar o modelo até então utilizado. “como
é possível fazer um relatório anual e dizer que
existe interação, já que tudo muda o tempo todo?”,
questiona conio. o jornalista apresentou o novo
modelo durante a conferência global sobre
sustentabilidade e transparência promovida
pela global reporting initiative (gri), em maio,
na holanda. a plataforma procura reproduzir a
interação e a dinâmica do processo de construção
da sustentabilidade nas empresas. por meio dela,
o jornal criou um novo canal de comunicação com
os leitores. “o diálogo permite absorver diversos
pontos de vista e criar um luxo colaborativo
de informações para curar a cegueira que as
empresas têm em relação a si mesmas”, conclui.
[rita nardy]
[ bs ] 17
em 2010, o brasil foi incluído,
pela primeira vez, na pesquisa
barômetro da biodiversidade,
que mede a percepção dos
consumidores, da mídia e das
empresas sobre a biodiversidade
mundial. a pesquisa, elaborada
pela uebt (union for ethical
biotrade) – união para o
biocomércio ético –, foi
apresentada no país durante um
encontro realizado na sede da
empresa de cosméticos natura,
em cajamar (sp), em maio deste
ano. a pesquisa apontou, por
exemplo, que os consumidores
próximo, em nagoya. liderado pelo programa das
nações unidas para o meio ambiente, o estudo traça
paralelos entre os custos da perda de biodiversidade
– e a consequente piora dos serviços ambientais – e
os gastos necessários para a conservação e o uso
sustentável dos recursos naturais. o objetivo é mostrar
que a economia pode ser um poderoso instrumento de
conservação da biodiversidade, a partir da integração
dos saberes ecológicos e econômicos.
jun/jul 2010
jun/jul 2010
radar planetário
[ liVro ]
no ano internacional da biodiversidade, um grupo de
pesquisadores, coordenado pelo banqueiro sênior do
deutsche bank, pavan sukhdev, está na fase inal de
elaboração do estudo the economics of ecosystems
& biodiversity. o passo a passo do processo pode ser
acompanhado no site www.teebweb.org. o resultado
inal do trabalho, iniciado em 2007 e apoiado pelo G8,
será apresentado na 10ª conferência de estados para
a convenção da diversidade biológica, em outubro
[site]
r e p o r ta g e m
sustentável 2010
plinares e requerem a integração permanente de um
conjunto de ações em vários setores da economia, envolvendo a parceria e participação de todos os segmentos
sociais, da iniciativa privada e pública”. Ao mesmo tempo, o governo municipal propôs uma nova Lei de Mudanças Climáticas, que está em tramitação na Câmara
dos Vereadores, como parte do Planejamento Estratégico da Prefeitura.
Para Muniz, o licenciamento não é o maior desafio,
e sim a gestão do planejamento de cada investimento.
“É preciso que cada iniciativa esteja adequada à legislação, de modo que venha a causar o menor impacto ambiental possível.” Uma das metas da Política Municipal
de Mudanças Climáticas Rio Sustentável é reduzir as
emissões de gases de efeito estufa em 8%, até 2012. Para
2016, a meta é atingir 16% de redução, e, em 2020, 20%.
desaFio climático
cidades
RepoRtaGem mauRette bRandt
o Fechamento ao tRáFeGo encontro Sustentável 2010, realizado em maio pelo Conda Avenida Rio Branco e a revitalização do centro do
Rio de Janeiro, algumas das metas do Projeto Rio Verde para transformar a metrópole carioca em cidade
sustentável, foi um dos temas de destaque do primeiro
selho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS). Organizado em torno do tema Cidades e Mudanças Climáticas, o evento contou com a presença de lideranças empresariais, pesquisadores e auto-
ridades e discutiu os principais desafios urbanos, como
o lixo, a construção civil, a vulnerabilidade dos litorais
e a renovação da infraestrutura necessária para a Copa
do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016.
Adaptar as cidades aos desafios climáticos não é tarefa fácil. Para realizá-la, Carlos Alberto Vieira Muniz,
vice-prefeito do Rio, aposta no poder mobilizador do
Fórum Carioca de Mudanças Climáticas e Desenvolvimento Sustentável. Criado em 2009, o órgão se reúne
mensalmente para tratar das questões associadas ao
aquecimento global, que “são complexas, multidisci-
[ bs ] 19
18 [ bs ]
a parceria entre o goVerno e as empresas abre o caminho mais
curto para as cidades se adaptarem às mudanças climáticas
jun/jul 2010
jun/jul 2010
pRevisíveis
da esquerda para a direita, bjorn sitgson
(Wbcsd), branca americano (ministério
do meio ambiente), marina Grossi (cebds),
claudio muniz (vice-prefeito do Rio de
Janeiro) e sue Wolter (petrobras)
Em todas as cidades há urgente necessidade de adaptação do setor de transportes para reduzir impactos
ambientais e emissões de gases de efeito estufa. Suzana Kahn, professora da Coppe-UFRJ e ex-secretária de
Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente,
ressaltou que, apesar dos avanços da tecnologia e dos
combustíveis, o esforço de mitigação exige dos governos
a elaboração de uma legislação fortemente restritiva,
pois a quantidade de veículos em circulação só tende a
aumentar. “É necessário unir três aspectos: governança (comprometimento), cooperação (otimização, priorização e complementaridade nos programas) e liderança
(coordenação comum), de forma a compartilhar responsabilidades”, disse a pesquisadora.
Para tanto, torna-se essencial a existência de um
órgão que coordene as ações de mitigação e de adaptação, capaz de otimizar o desenvolvimento urbano e
planejar cidades mais previsíveis, salientou a arquiteta Andrea Young, pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial. “Com o aumento das chuvas, em consequência da elevação da temperatura no
nível do mar registrada entre 1960 e 1990, o risco das
cidades aumentou, pois o solo não consegue absorver
toda essa água em tempo hábil, o que favorece deslizamentos de terra como os que aconteceram no Rio”,
afirmou Young. Outros agravantes são o aumento
r e p o r ta g e m
sustentável 2010
O segundo painel do encontro, Primeira Jornada de Construção Sustentável, permitiu aprofundar os debates da parte da
manhã, discutindo a sustentabilidade da construção civil.
Carlos Eduardo Garrocho de Almeida, Diretor Comercial
e de Assuntos Corporativos da Holcim Brasil e presidente
da Câmara Temática de Construção Sustentável do CEBDS,
destacou a publicação, pela instituição, do Guia da Construção
Sustentável, destinado a promover uma mudança de cultu-
suzana Khan,
da coppe-uFRJ:
legislação deve ser
mais restritiva para
automóveis
Garrocho, da holcim:
é preciso capacitar
os profissionais da
construção civil
a pesquisa desafios urbanos e mudanças
climáticas, desenvolvida pela empresa market
analysis em parceria com o cebds, entre
26 de março e 15 de abril, e apresentada no
sustentável 2010, entrevistou 258 pessoas e
41 formadores de opinião, traçando um perfil
das expectativas sobre os problemas e as
necessidades do rio de janeiro. mais de 34%
dos entrevistados apontaram a segurança
como o maior problema da cidade daqui a
cinco anos, enquanto 28% dos formadores
de opinião identificaram os transportes. a
violência foi apontada por ambos os grupos de
entrevistados como o maior problema do rio
hoje e no futuro.
o governo se destaca como o agente de
maior competência e credibilidade para lidar
com o aquecimento global, na opinião de 33%
do público e de 17% dos formadores de opinião.
o trabalho das lideranças empresariais no
combate ao aquecimento global é considerado
bom por 53% do público, mas apenas 39% dos
formadores de opinião concordam.
dentre as soluções, 90% do público e 98%
dos formadores de opinião acreditam que a
primeira atitude a ser tomada, nas empresas,
é encontrar formas menos poluidoras
de gerar produtos e serviços. a segunda
alternativa é uma mudança de atitude
pessoal e social para diminuir a emissão de
gases poluidores, escolhida por 88% do
público e 90% dos formadores de opinião. a
força da lei é a terceira ação mais importante.
na opinião de 87% do público e de 96%
dos formadores de opinião, o governo deve
limitar severamente as emissões de gases
das empresas. mais de 61% dos entrevistados
acreditam que a preocupação com as
mudanças climáticas vai crescer.
[ bs ] 21
20 [ bs ]
constRução sustentável
goVerno
Protagonista
ra na construção civil. Já Marcelo Takaoka, presidente da
Câmara Brasileira da Indústria da Construção, mostrou os
esforços da entidade para conscientizar os sindicatos e as
construtoras para a transformação sustentável do setor.
Houve consenso entre os participantes do encontro
que os próximos eventos globais programados para o
Brasil e o Rio de Janeiro, a Copa do Mundo e a Olimpíada, abrem oportunidades de renovação. Maria Salete de
Carvalho Weber, coordenadora geral do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQPH), da Secretaria Nacional de Habitação do Ministério
das Cidades, informou que o governo investirá 7 bilhões
na infraestrutura das cidades-sede da Copa e da Olimpíada, além de 11 bilhões repassados a estados e municípios. “Para o ministério, os investimentos em transportes públicos devem ter caráter de perenidade. A questão
da sustentabilidade vem sendo incorporada a todas as
ações. Nossos parceiros privados têm a responsabilidade
de cumpri-la”, afirmou.
O Rio de Janeiro está no foco dos investimentos. No caso
do Projeto Rio Verde, apresentado por Altamirando Reis,
subsecretário de Meio Ambiente do Rio, as ações incluem
a reformulação do sistema de transportes metropolitano
e a preservação do centro, com o fechamento da Avenida
Rio Branco ao tráfego e a revitalização de áreas históricas,
como a Praça Tiradentes e a Praça XV. Também será fechado o lixão de Gramacho, em Duque de Caxias (condenado
há 20 anos), que ameaça ruir sobre a baía de Guanabara.
“O projeto é amplo e segue o exemplo de várias capitais
mundiais”, disse Reis. “A tendência é proteger as áreas
centrais, muitas com significativos conjuntos arquitetônicos históricos, o que implica otimizar os transportes e
implantar o bilhete único metropolitano.” A racionalização das linhas de ônibus é essencial para diminuir a concentração em regiões e servir melhor a todas as áreas da
cidade. Reis lembrou que 36% das emissões do Rio vêm de
dióxido de carbono e outros 36% são provenientes do lixo.
“Só a reformulação do sistema de transportes representará uma redução de 8% já em 2012”, comemora.
Na conclusão dos debates, Marina Grossi, presidenteexecutiva do CEBDS, reafirmou a postura da instituição de fomentar o diálogo sobre os desafios prementes
das cidades diante dos impactos previsíveis. “Indivíduos, governo e empresas devem melhorar sua atuação
no combate às mudanças climáticas; faremos tudo para
[bs]
dar suporte a esse processo”, afirmou.
jun/jul 2010
jun/jul 2010
da área impermeável, o esgotamento dos lixões e a expansão do desmatamento. “O prolongamento das áreas
periféricas, no Rio, já atinge os manguezais da Baía da
Guanabara, que deveriam ser preservados”, ressaltou a
pesquisadora. Em São Paulo a situação mais grave é a da
bacia do Rio Tietê, que envolve 39 municípios e está se
transformando numa ilha de calor em decorrência da
impermeabilização crescente.
Na visão das companhias de seguro, as áreas de maior
risco do planeta são as zonas costeiras. Cláudio Neves,
doutor em Engenharia Oceanográfica e Costeira pela
Universidade da Flórida, advertiu que as mudanças climáticas tendem a agravar o vazio urbano deixado pela
tendência de desativação dos portos. “No Brasil, as cidades portuárias detêm 14% das maiores rendas per capita”,
disse. Soluções de engenharia, não mitigações, são necessárias com urgência, pois a vulnerabilidade é enorme, apesar de a situação brasileira ser menos arriscada
do que a de muitos outros países.
O aquecimento global encurta o tempo do planejamento urbano. Sérgio Besserman Vianna, presidente da
Câmara Técnica de Desenvolvimento Sustentável e de
Governança Metropolitana da Prefeitura do Rio de Janeiro alertou que “do jeito que o mundo caminha, são
mínimas as chances de não ultrapassarmos o limite de
aquecimento global de 2ºC até o fim do século 21. Qualquer coisa além disso será um pesadelo”. O economista
aposta na produção de conhecimento – dados, estatísticas, análises de risco – e na participação da sociedade
para gerar uma análise mais realista da situação. É fundamental apoiar a projeção de mudanças climáticas em
territórios cada vez menores, através de políticas e planos municipais. “O Brasil tem imensas vantagens competitivas, por ser autossuficiente em energia, pela logística e pelo impacto dos biomas. Há muito a fazer ainda,
mas as possibilidades são boas”, concluiu.
retranca
Falsa
aGenda
«edição FeRnando badô | teXto pedRo michepud»
m ercad o • ág ua • ed u cação • n eg ó ci os
25 a 27
aGosto
realiZaÇão: associação dos analistas profissionais
de investimento do mercado de capitais (apimec)
local: ouro minas palace hotel - belo horizonte (mG)
Mais inforMaÇões: [tel] (31) 3213.0693
[site] www.21congressoapimec.com.br
[e-mail] 21congressoapimec@polobh.com.br
5 a 11 de setembro
31 de agosto
a 2 de setembro
31 de agosto
2º encontro sustentável 2010
realiZaÇão: conselho empresarial
brasileiro para o desenvolvimento
sustentável (cebds)
local: hotel sheraton – porto alegre (Rs)
Mais inforMaÇões:
[site] www.sustentavel.org.br
eco Business 2010 - feira e
congresso internacional de
econegócios e sustentabilidade
realiZaÇão: mes – eventos para o Futuro
local: centro de exposições imigrantes,
pavilhão de convenções – são paulo (sp)
Mais inforMaÇões: [tel] (11) 3060.2270
[site] www.ecobusiness.net.br
[e-mail] mes@meseventos.com.br
semana Mundial da água
realiZaÇão: stockholm international
Water institute (siwi)
local: stockholm international Fairs
estocolmo (suécia)
Mais inforMaÇões: [tel] +46 852 21 39 60
[site] www.worldwaterweek.org
[e-mail] worldwaterweek@congrex.com
21º congresso nacional apimec
Realizado a cada dois anos, o congresso nacional apimec reúne
profissionais e empresas relacionadas ao mercado de capitais para
debater o desenvolvimento do setor e a economia global. neste
ano, a programação tem como tema central o papel do mercado
de capitais em um mundo sustentável e discute desde a adoção
de mecanismos sustentáveis até a neutralização da emissão de
carbono do próprio evento. estão previstos painéis para debates
entre analistas de investimentos e profissionais das áreas de
relações com investidores. uma feira também será montada, para
que as empresas exponham seus produtos e serviços. as inscrições
podem ser feitas com preços especiais até o dia 25 de junho.
o 2º encontro sustentável – ciclo de encontros sustentável 2010 –
tem como tema comunicação e educação para a sustentabilidade e
irá debater, entre outros assuntos, a inserção do tema na grade das
universidades. a discussão também será aberta à participação de
lideranças locais, para que exemplos aplicados regionalmente possam
ser ampliados a outras comunidades. as inscrições, gratuitas, estão
abertas para acadêmicos, ongs, e representantes dos governos
estaduais e municipais e do setor privado. o terceiro e último encontro do
sustentável 2010 ocorre em novembro, em salvador (ba).
é possível gerar negócios e, ao mesmo tempo, disseminar conceitos
e práticas sustentáveis? para responder a essa pergunta, a eco
business 2010 promove, desde 2008, uma feira para integrar
empresas que desenvolvem projetos sustentáveis e ecoprodutos,
estimulando a troca de informações para gerar conhecimento
no tripé social, ambiental e econômico. além disso, é realizado o
congresso negócios e cidades sustentáveis, que discute projetos
adotados por governos, empresas, ongs e universidades para gerar
riqueza e lucratividade com menos impacto no meio ambiente.
o desafio da Qualidade da água é o tema da semana mundial da água, que
ocorre em estocolmo, na suécia. o evento proporciona um intercâmbio
entre os setores civis, empresariais, políticos e acadêmicos de todo o
mundo e procura soluções concretas com relação ao uso do recurso
escasso. o evento, que debateu o acesso à água para o bem comum
em 2009, debaterá o desafio urbano e a alimentação global, em 2011 e
2012, respectivamente. para acompanhar a programação, que conta
com workshops, seminários, cerimônias de premiação e plenários,
os internautas contarão com o watercube.tv, um podcast criado pela
organização para veicular os debates.
r e p o r ta g e m
inFRaestRutuRa
e
divulgação naturatins
nquanto os olhares de governantes e
ambientalistas se voltam para as grandes hidrelétricas da
Amazônia, o país vira um autêntico canteiro de obras para
outro aproveitamento hídrico. A construção de pequenas centrais
hidrelétricas (PCHs) – usinas com reservatórios de até 3 km2 e potência
de até 30 MW –, toma conta dos rios, de norte a sul. Desde 2004, quando
o governo lançou o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas
(Proinfa), garantindo a compra da energia gerada pelo prazo de 20 anos, a
preços de fazer o olho de qualquer investidor brilhar, as PCHs proliferam,
algumas vezes sem controle e, não raro, com várias no mesmo rio.
a bucólica pch
dianópolis, no rio
manuel alvinho,
em tocantins
Pch
S
:
sustentáVeis,
rePortageM Julio santos
Outro exemplo negativo acontece no Rio Palmeiras,
no município de Dianópolis, no Tocantins. Nessa região, um dos portões para o Parque Estadual do Jalapão, vizinha da Estação Ecológica da Serra Geral e do
Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba, já
existem oito PCHs, das quais seis em funcionamento.
Outras duas, as usinas Areia e Água Limpa, estão em
construção – todas as oito situadas num trecho de
apenas 150 quilômetros. A proliferação de construções no rio interferiu na topografia das cachoeiras
e corredeiras, eliminou cavernas e grutas e acabou
com a prática do rafting turístico no Rio Palmeiras.
O problema acontece porque em quase 95% dos empreendimentos é necessário fazer pequenas elevações
de nível para que haja altura suficiente para garantir
a geração de energia. Nas usinas com reservatórios
para acumulação de água, é construído um canal ou
uma adutora para que a água caia do ponto mais alto
com força para passar pela turbina e produzir energia. Nas PCHs a fio d’água, que não formam reservatórios, esse tipo de intervenção não acontece.
Uma das alternativas para moderar o impacto ambiental e impedir que a construção de pequenas usinas sobrecarregue os rios é a elaboração da Avaliação
Ambiental Integrada das bacias hidrográficas. O estudo avalia a situação socioambiental de toda a bacia
do rio, considerando os empreendimentos hidrelétricos em operação e os planejados, segundo a Empresa
de Pesquisa Energética (EPE), responsável pelo planejamento do setor de energia. Teoricamente, a ava-
[ bs ] 25
apesaR de seRem uma alteRnativa limpa e de menoR
impacto ambiental, as pequenas centRais hidRelétRicas
estão deiXando um RastRo neGativo pela Falta de uma
avaliação ambiental inteGRada de bacias hidRoGRáFicas
e de RiGoR no licenciamento ambiental
cascata de impactos
jun/jul 2010
Mas neM tanto
O subsídio governamental às PCHs – desconto de até
50% no pagamento da tarifa de transmissão e distribuição de energia, isenção de royalties nos municípios,
mais financiamento do BNDES e garantia de compra de
energia por 20 anos – ajudou a ampliar enormemente a
participação dessa fonte na matriz energética. Hoje há
368 usinas em operação, geradoras de 3.171 MW, quase
3% da capacidade do país. Para os próximos dez anos, o
Plano Decenal de Energia projeta para as PCHs um salto de participação na matriz para a faixa de 7 mil MW.
Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), há mais 64 usinas em construção e 149 em fase de
outorga. Além disso, a Aneel tem cerca de 800 estudos
de inventário e mais de mil projetos básicos de PCHs em
análise. Se todos esses projetos se concretizarem, serão
pelo menos 2.381 PCHs.
A corrida para a construção de usinas, em alguns
casos, tem passado dos limites exatamente em um dos
quesitos fundamentais do conceito das pequenas hidrelétricas: o menor impacto ambiental. A ausência
de Avaliação Ambiental Integrada (AAI) das bacias
hidrográficas e a falta de rigor dos órgãos ambientais
dos estados na hora de aprovar o licenciamento estão
criando situações surrealistas. Na Bacia do Alto Paraguai, no Mato Grosso do Sul, está prevista a instalação
de 116 PCHs. Desse total, 29 já estão em operação. A bióloga Débora Calheiros, da Embrapa Pantanal, é uma
das pesquisadoras que alertam para os riscos de construção em massa das pequenas usinas em rios de pequeno porte: impactos nas comunidades, na pesca, na
agricultura familiar, na criação de gado, no turismo
pesqueiro e no assoreamento dos rios.
ca
r
epa
o r ta g e m
Fotos: divulgação naturatins
biocombustíveis
inFRaestRutuRa
bacias inteiRas
Cabe à Agência Nacional de Águas (ANA) a tarefa de
regular o curso das águas dos rios para seus múltiplos usos, como geração de energia, produção de alimentos, abastecimento da população, irrigação e lazer. A agência responde pela emissão da Declaração
de Reserva de Disponibilidade Hídrica, que determina se a vazão estabelecida para a geração de energia
por uma determinada PCH vai limitar a quantidade
tolmasquim: a avaliação
ambiental integrada
refinará o licenciamento
ambiental
zar problemas em relação ao uso dos recursos hídricos. Cabe à AAI verificar quantas represas o rio pode
ter. “Não há dúvida nenhuma de que a análise integrada da bacia é a melhor solução. É melhor do que o
EIA/Rima (Estudo de Impacto Ambiental/Relatório
de Impacto no Meio Ambiente), embora não dispense
tais estudos”, comenta Viana, frisando que é o setor
de energia que propõe a divisão de quedas ou cascata
a ser explorada do ponto de vista energético.
Além da Avaliação Ambiental Integrada, o consultor Daniel Araujo Carneiro defende maior atenção
por parte dos órgãos ambientais na análise dos estudos de inventário e projetos básicos das pequenas
centrais. Autor do livro PCH: Aspectos Jurídicos, Técnicos
e Comerciais, o especialista também diz que é preciso
mais robustez nos estudos de EIA/Rima. Ele aponta
como fator determinante para evitar impactos ambientais a necessidade de obtenção das Licenças Pré-
bom neGócio
Na definição da Aneel, o inventário é a etapa de engenharia em que se avalia a capacidade de geração
hidrelétrica de uma bacia ou de um rio, buscandose compatibilizar o máximo de energia, ao menor
custo, com o mínimo de impactos sobre o meio ambiente, em conformidade com os cenários de utilização múltipla dos recursos hídricos. Após a aprovação, os estudos de inventário servem de base para
o desenvolvimento posterior de projetos mais detalhados, com vistas à efetiva instalação dos aproveitamentos hidrelétricos identificados.
“os eMPreendiMentos anteriores
à necessidade de aPresentaÇão
de licenÇa PréVia PodeM ter tido
uM desenVolViMento inadequado”
daniel caRneiRo
[ bs ] 27
26 [ bs ]
de água para outros usos. Posteriormente, cabe ao órgão ambiental verificar se aquela diminuição de vazão da cachoeira vai criar algum dano ambiental ou
vai alterar a biologia do ambiente.
Para Francisco Lopes Viana, superintendente de
Outorga e Fiscalização da ANA, a avaliação integrada
de bacia é a melhor solução para evitar ou minimi-
jun/jul 2010
jun/jul 2010
liação deve levar em conta “os efeitos cumulativos e
sinérgicos dos projetos sobre os recursos naturais,
as populações residentes e as atividades econômicas, assim como os usos atuais e potenciais dos recursos hídricos no horizonte atual e futuro de planejamento”.
No caso da Bacia do Alto Paraguai, no Mato Grosso
do Sul, segundo Mauricio Tolmasquim, presidente da
EPE, a licitação para contratar a empresa que fará os
estudos amplos está em fase de elaboração. “A Avaliação Ambiental Integrada será feita para atender precisamente a essa demanda”, garante Tolmasquim,
sem precisar quando a licitação acontecerá. De 2006
para cá, a entidade ligada ao Ministério de Minas e
Energia já desenvolveu estudos para sete bacias: dos
rios Teles Pires (MT/PA), Tibagi (PR), Parnaíba (PI/
MA/CE), Paraíba do Sul (SP/RJ), Doce (MG/ES), Tocantins (TO) e Uruguai (RS/SC).
pch areia, outra
usina em construção
no rio palmeiras
pch água limpa,
em construção, também
no rio palmeiras
divulgação epe
pch porto Franco, no
rio palmeiras (to),
já em funcionamento
vias, tanto para fazer os estudos de inventário quanto para iniciar a instalação do projeto.
“Acredito que os empreendimentos anteriores à necessidade de apresentação de licença prévia podem, de
certa forma, ter tido um desenvolvimento inadequado
em relação às regras ambientais”, ressalta Carneiro.
Sobre a construção de uma série de usinas num mesmo
rio, o que na linguagem do setor de energia é chamado de “cascata”, o consultor explica que no inventário
se busca, dentro da legislação ambiental, encontrar o
aproveitamento ótimo para geração de energia num
determinado rio.
Segundo Fábio Dias, diretor-executivo da APMPE,
associação que reúne os pequenos e médios produtores
de energia elétrica, a construção de uma sequência de
usinas num mesmo rio visa otimizar o seu potencial.
“Com a cascata de usinas, o objetivo é buscar os efeitos
sinérgicos para otimizar o potencial para geração de
energia, sem gerar impactos para o meio ambiente”,
comenta. Segundo Dias, o processo de aprovação de
um projeto está ficando mais longo, o que tem afetado
a atratividade das PCHs, em decorrência do aumento
de custos provocado pelos estudos necessários e pela
maior exigência ambiental.
r e p o r ta g e m
inFRaestRutuRa
28 [ bs ]
jun/jul 2010
Um fator novo no mercado das PCHs foi a aprovação,
em janeiro de 2009, da resolução 343 da Aneel, que, para
limitar a especulação com os projetos, impôs uma série
de exigências à solicitação de registro de um empreendimento. Antes dela, muitos empreendedores registravam
o projeto no Proinfa, mas não desenvolviam o licenciamento prévio, esperando vendê-lo a terceiros. O consultor conta que a nova resolução adotou o critério de vantagem competitiva para quem desenvolve os estudos de
inventário. “Com isso, a qualidade dos inventários está,
inclusive, ficando melhor”, avalia Daniel Carneiro. Após
a publicação da resolução, o número de inventários cresceu vertiginosamente.
O relatório de atividades de 2009 da Aneel, elaborado
pela Superintendência de Gestão e Estudos Hidroenergéticos, mostra uma significativa evolução. No caso dos estudos de inventário, que registravam uma média mensal
de pouco mais de 30 novas solicitações, o número foi elevado para 60 em novembro e dezembro. Segundo o relatório, em 2009 foram publicados 1.935 despachos relativos à
questão de registro e concedidos 1.156 registros ativos para
desenvolvimento de estudos e projetos. Em contraste, no
mesmo ano a Aneel analisou apenas 98 projetos básicos de
PCHs, dos quais 63 foram aprovados e homologados, perfazendo um total de 778 MW de potência.
A evolução regulatória apertou a marcação sobre
quem pretende investir em pequenas centrais hidrelétricas para especular. Hoje, o desenvolvimento do projeto é acompanhado trimestralmente, tanto pelos órgãos
ambientais como pela própria Aneel. Daniel Carneiro
ressalta que, se não forem apresentados o licenciamento
ambiental pertinente e o termo de referência na elaboração de impacto ambiental (EIA/Rima), por exemplo,
não se tem como dar andamento aos estudos de projetos
básicos. “A partir do momento em que o licenciamento
prévio passou a ser exigido como condição para se obter
a outorga, não tenho a menor dúvida de que os projetos
banco de dados – ana
eM 2009, foraM concedidos
1.156 registros Para PchS,
Mas aPenas 98 chegaraM a ser
ProJetadas, das quais 63 foraM
aProVadas e hoMologadas
no rio paraíba
do sul já foi feita
a avaliação
ambiental
integrada
da bacia
de PCHs ganharam um contorno ambiental sustentável”, aponta o consultor.
Com acesso garantido ao financiamento do BNDES,
uma PCH custa, em média, cerca de R$ 100 milhões, rende
cerca de R$ 5 milhões por mês e tem garantia de compra
de energia por 20 anos. Além do desconto na transmissão,
não pagam royalties aos municípios onde se instalam, embora paguem impostos estaduais e federais. Um bom negócio. Por isso, o aperto da regulação e da legislação ambiental chega mais do que na hora para um país que tem nas
fontes renováveis uma vantagem competitiva.
Muitos problemas ainda persistem no licenciamento ambiental, como a falta de pessoal qualificado para
avaliar a qualidade dos estudos ambientais e fiscalizar a
construção das usinas. Sem falar na falta de agilidade no
desenvolvimento das avaliações ambientais integradas.
Esses são fatores cruciais para que o país explore de maneira correta e racional o seu potencial hídrico, sem deixar um rastro de destruição ambiental rio abaixo. [bs]
entRevista
Valo riz ar a cu ltu ra e o pró pri o territó ri o
é o p o nto d e partida d o reQ u inte gastrô n o m i co
carlo petrini
entRevista maRia da paz tReFaut
alberto peroli
“para comer bem
não é necessário
muito esforço”
Brasil sustentáVel como
o senhor avalia a presença do Brasil
no movimento do slow food ?
carlo Petrini O Brasil, país com uma grande
biodiversidade agrícola, gastronômica, cultural e linguística, é um dos principais interlocutores do Slow
Food. Um dos primeiros projetos internacionais de
apoio aos pequenos produtores brasileiros foi realizado no país em 2002, quando nasceu a fortaleza do Guaraná Nativo dos Sateré-Mawé, da Amazônia. Ao longo
dos últimos anos, a mobilização da sociedade brasilei-
Bs qual a principal contribuição
que os brasileiros podem dar?
cP Conhecer e valorizar o próprio território é o ponto de partida. Os chefs de cozinha que atuam no Brasil
possuem um papel-chave na promoção dos produtos
regionais. Já a universidade, quando próxima ao mundo rural, pode contribuir para o reconhecimento e a
valorização de técnicas de produção e produtos autóctones. Os consumidores brasileiros possuem o poder de
motivar os pequenos produtores a prosseguirem com
suas atividades realizando compras de maneira responsável. Pequenas produções tradicionais somente
continuarão a existir enquanto existirem consumidores sensíveis e conscientes.
Bs algumas das técnicas culinárias mais
importantes nasceram nas classes mais
pobres. Mas a gastronomia sempre foi de
elite. será sempre assim?
cP Sempre existiram a cozinha popular e a aristocrática, das cortes. Depois, a Revolução Francesa mudou
as coisas, também nesse campo. Hoje, o que realmente conta é a tomada de consciência ecogastronômica.
Trata-se de entender que o futuro da terra depende
também e, sobretudo, do modo com que nos alimentamos todos os dias.
Bs o senhor costuma dizer que o
slow food é uma revolução doce e tranquila.
o que essa revolução tem de diferente?
cP É uma revolução lenta e pacífica, que parte de
[ bs ] 33
GastRonomia
símbolo do caracol se espalhou por 153 países, significando, mais do que uma antítese à velocidade da
globalização, uma adaptação para a alimentação do
conhecido slogan “Pense globalmente e atue localmente”. A ideia de repensar o que cada país tem de
único, junto com a percepção de que comer também
é um ato agrícola, deu origem ao que hoje se chama
de ecogastronomia.
Trata-se da tomada de consciência de que o alimento, do modo de produção ao consumo, incluindo
o desperdício e o dejeto, é um elemento da sensibilidade ambiental, sustenta o jornalista italiano Carlo
Petrini, 61 anos, fundador e presidente do movimento. Graças ao seu empenho, o Slow Food nasceu em
Bra, no Piemonte, terra de tradições culinárias que
influenciaram o mundo, também ameaçadas pela
globalização. Mais de 150 mil pessoas em cinco continentes trabalham para a educação do gosto e a preservação da biodiversidade alimentar, organizando
eventos e publicando livros e revistas.
Em abril, Brasília sediou a segunda edição do
Terra Madre – Encontro Nacional de Ecogastronomia, uma das manifestações do movimento,
que reuniu produtores, chefs de cozinha e pesquisadores brasileiros. Carlo Petrini esteve lá, experimentou culinárias regionais, viu de perto como
resistem as “fortalezas” – os núcleos Slow Food de
defesa de produtos ameaçados – e conversou com a
BRASIL SUSTENTÁVEL.
ra tem sido fundamental para o crescimento do movimento. Atualmente, a Associação Slow Food conta
com quase mil sócios no país, que promovem iniciativas locais, regionais e nacionais em prol da biodiversidade alimentar. O Slow Food conta ainda com o apoio
da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Secretaria
da Diversidade e Identidade Cultural do Ministério da
Cultura para realizar a segunda edição do Terra Madre, neste ano.
jun/jul 2010
eco
em pouco mais de 20 anos o
entRevista
b i o d iV ers i da d e • g lo ba liz ação
baixo, da nossa atitude alimentar cotidiana. Todos
nós comemos e podemos escolher algo melhor para
comer, sempre de acordo com a dimensão do nosso bolso. Para comer bem, produtos que satisfaçam
o paladar e que respeitem o ambiente e o trabalho
dos camponeses, não é necessário muito sacrifício.
Basta comprar produtos locais, da estação, e conhecer quem os cultiva e os vende. É preciso conhecer o
nosso alimento para lhe dar o justo valor. Se todos
fizéssemos nossa parte, o sistema mundial de alimentos – que está destruindo o equilíbrio ambiental do planeta, o trabalho de milhões de agricultores
e a saúde de tantos cidadãos – não seria tão invasivo
e perigoso para o futuro. É uma coisa que se pode e
se deve fazer, sobretudo porque é muito agradável e
demanda pouco sacrifício: basta um pouco de educação alimentar e empenho na hora de consumir.
34 [ bs ]
“compre
produtos locais,
da estação, e
conheça quem os
cultiva e vende”
nizar espaços de mercado nas cidades e estimular
a criação de cooperativas são experiências que valorizam o alimento dentro dos limites regionais.
Tratar todos os alimentos como commodities, pensar
em aplicar o modo de produção da indústria numa
atividade natural como a agricultura, que envolve
um sistema ecológico complexo, é uma loucura. Depois, existem alguns produtos, como café, vinho e
especiarias, que desde tempos imemoriais percorrem longas distâncias. Isso é normal, pois só podem se desenvolver em determinadas condições de
ambiente e clima.
Bs que alimentos estão em sua lista negra?
cP Tudo o que gera desperdício. Você sabe que na
Itália se joga fora, todos os dias, 4 mil toneladas
de comida boa para se comer? Nos Estados Unidos,
esse número chega a 22 mil toneladas. um é realmente um sinal inequívoco de um sistema que não
funciona mais. Enquanto falamos de 1 bilhão de
pessoas no mundo que passam fome, há uma quan-
Bs os ecologistas são pessimistas
quanto ao futuro da humanidade.
o senhor parece não ser. Por quê?
cP Porque, no fim das contas, acredito na humanidade. As previsões, de fato, são muito pessimistas, mas só se concretizarão se continuarmos na
mesma estrada que trilhamos até aqui. Mas podemos mudar e podemos fazê-lo buscando nosso
prazer, celebrando nossa cultura e nosso desejo de
ampliar a vida comunitária e conviver com nossos
irmãos. O fato inacreditável é que podemos fazer
essa mudança a partir do sabor do alimento. Acre[bs]
dito nela porque não é difícil.
fortaleZas Brasileiras
um dos principais projetos da Fundação
slow Food para a biodiversidade é difundir
e viabilizar comercialmente alimentos
artesanais ameaçados de extinção. para
isso, foram identificadas em todos países
“fortalezas do gosto”, que credenciam
produtores de sabores em risco, muitas
vezes esquecidos, ligados à identidade das
comunidades. Veja alguns dos produtos
brasileiros classificados como fortalezas.
castanha de Baru (castanha do
cerrado): coletada por 32 coletores das
comunidades de caxambu, santo antônio
e bom jesus, em pirenópolis, goiás.
guaraná sateré-Mawé: energético
em forma de bastão, ralado na língua do
pirarucu, produzido por 500 famílias
da etnia sateré-mawé, na terra
indígena andirá marau, no pará.
aratu: o crustáceo saboroso é pescado
por 50 famílias da comunidade de
cajazeiras, no município de santa luzia
do itanhy, em sergipe.
néctar de aBelhas natiVas:
Quarenta famílias participam da produção
desse mel menos doce, também na terra
indígena andirá marau, no pará.
arroZ VerMelho: plantado em
santana dos garrotes, Vale do piancó,
na paraíba, foi introduzido no brasil
pelos portugueses no início do século 16.
é produzido por 63 rizicultores.
PalMito JuÇara: cinquenta famílias
realizam o cultivo da palmeira em viveiro.
também há plantações nas reservas
silveira e boa Vista, dos índios guarani
do litoral norte de são paulo.
[ bs ] 35
Bs o que é o melhor e o pior da
gastronomia sem fronteiras?
cP A comida não deve percorrer milhares de quilômetros sem que haja real necessidade. Muitas
milhas alimentares inúteis e danosas, que redundam em produção de gás carbônico, poderiam ser
evitadas privilegiando-se os alimentos frescos e
locais, fruto de uma economia de pequena escala
para o abastecimento. Dar aos produtores a possibilidade de vender diretamente, ajudá-los a orga-
Bs o sr. acredita que o fast food
está condenado, apesar do poder
econômico das marcas globais?
cP Cedo ou tarde, a insustentabilidade econômica, social e ecológica desse modelo de alimentação emergirá de maneira tão veemente que ele
não será mais reproduzido nem mesmo por quem
o pratica. Não sei quando isso acontecerá, mas espero que seja o mais rápido possível, porque o sistema não é sustentável. O poder econômico que as
multinacionais acumularam é imenso, e elas, de
fato, apropriaram-se da nossa soberania alimentar. Controlam as sementes, a terra, as transformações e até a distribuição da nossa comida. O
problema é que em breve os custos sociais e ambientais serão tão altos que precisarão modificar
sua estratégia. Esperemos apenas que isso não venha tarde demais.
jun/jul 2010
jun/jul 2010
Bs que consequências devemos
esperar dessa revolução?
cP Um renascimento da cozinha tradicional, mas
não numa ótica de museu ou passadista. As tradições vivas já contêm, em sua essência, uma adaptação às exigências modernas das pessoas. É preciso
entender que, com produtos locais e de estação, defende-se a biodiversidade, se respeita o ambiente,
se consegue gastar menos e se avança na direção do
reconhecimento do bom e do belo como um direito
democrático, ao alcance de todos. Isso tudo é parte
do conceito de soberania alimentar. Uma coisa que
devemos reconquistar neste planeta. Tanto aqueles que têm pouco para comer como os mais ricos,
que podem se permitir qualquer alimento, mas
que não sabem dizer de onde provém, o que contém e quem produziu o que estão comendo.
tidade de comida muito superior à demanda mundial desperdiçada. A fome não é uma questão de
escassez, mas de injustiça.
r e p o r ta g e m
Responsabilidade social
adeel halim / Reuters
mais
investimento
social pRivado
os inVestimentos sociais das empresas Voltaram
a crescer em 2010, Focando, sobretudo, projetos
de educação, cultura e capacitação
Fernando Rossetti:
investimento social
corporativo cresce
em 2010
rePortageM patricia moreira
a
té o fiM do ano, as empresas brasileiras empregarão R$ 2,012 bilhões em
investimento social privado (ISP), a maior parte em projetos de educação, cultura
e arte, formação para o trabalho, esportes e comunicação, o que representa um
crescimento de 6,23% sobre 2009. Os números foram revelados pelo secretário-geral do Gife
(Grupo de Institutos, Fundações e Empresas), Fernando Rossetti, durante o sexto congresso da
entidade, no Rio, e integram a quinta edição do Censo Gife, elaborado em parceria com o Ibope
Inteligência, o Instituto Paulo Montenegro e o Instituto Itaú Cultural.
do setor, uma vez que certas culturas não mudam de
uma hora para a outra, a exemplo das leis.
“O Gife só tem 15 anos de vida, e, neste período, já obteve conquistas importantes para a sociedade. Pensar em
mudanças estruturais requer esse tempo. Nossa meta é
estabelecer um setor de investimento social privado relevante e legítimo, que abranja diversos temas, regiões e
públicos, formado por um conjunto sustentável e diversificado de investidores”, afirma.
los das emissões do evento e irá neutralizá-las por meio
do Programa de Desmatamento Evitado, da Sociedade
de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental
(SPVS). Para isso, todos os participantes receberam uma
ficha para informar a cidade de origem e o meio de transporte utilizado. Outras medidas em prol da sustentabilidade foram obtidas através da economia na impressão de
papel e da redução dos descartáveis.
2020
Durante o 6º Congresso Gife foi apresentada a Visão
do Investimento Social Privado para 2020. O documento,
apesar de ainda estar em fase de elaboração, já aponta quais são os principais desafios, as linhas de ação
e os indicadores propostos para o aprimoramento e a
expansão do setor no Brasil.
Com a participação dos associados da rede Gife e de
organizações sociais convidadas, foram organizados
quatro encontros para a elaboração do material. A visão para o setor foi montada a partir de três grandes
eixos temáticos: relevância e legitimidade; abrangência (temática e geográfica); e diversidade de investidores. Segundo Rossetti, são necessários dez anos
para se tentar estabelecer um panorama completo
novidades
Além das plenárias e mesas de debate, o 6º Congresso Gife ofereceu aos participantes atividades paralelas
realizadas pelas organizações parceiras da entidade,
como Instituto Votorantim, Instituto Rogério Steinberg, Instituto C&A, Instituto Desiderata e Fundação
Vale. O objetivo das iniciativas foi proporcionar debates qualificados e atuais que pudessem enriquecer e
complementar as discussões promovidas pelo evento.
Outra novidade foi a realização de visitas guiadas a
projetos, permitindo que os participantes conhecessem
in loco algumas ações sociais no Rio de Janeiro. Foram
disponibilizadas visitas às seguintes organizações: Nós
do Morro, Espaço Criança Esperança do Cantagalo, Residência Cultural – Teatro Escola Sesc e Instituto Tear.
Com a finalidade de neutralizar os gases do efeito estufa emitidos pelo congresso, o Gife fez uma parceria
com O Boticário, que efetuará o levantamento e os cálcu-
O encerramento do evento contou com uma atividade
inusitada, o bem-humorado julgamento “Qual o impacto do ISP na realidade brasileira”. Simulando um
tribunal, o consultor Francisco Tancredi assumiu o papel de juiz. Fernando Rossetti foi o réu, representando o ISP, e os promotores foram encenados por Cenise
Monte Vicente, coordenadora institucional da Oficina
de Ideias e Marketing Cultural, e Wellington Moreira,
coordenador-geral do Doutores da Alegria. Os advogados de defesa foram o superintendente de Atividades
Culturais do Itaú Cultural, Eduardo Saron, e a socióloga e diretora do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Anna Peliano.
O julgamento terminou com a absolvição do ISP, que
apesar de ser considerado culpado de vários delitos “não
oferece riscos graves à sociedade”. Segundo o juiz, o réu
deve se apresentar no próximo congresso do Gife, em
[bs]
2012, para passar por uma nova avaliação.
[ bs ] 37
36 [ bs ]
setor é fazer com que o ISP não permaneça apenas nos locais e regiões em que são geradas as riquezas.”
jun/jul 2010
jun/jul 2010
JulGamento
Cerca de 800 lideranças nacionais e internacionais participaram do sexto congresso da instituição – cujo tema
foi Visões para 2020 –, confirmando o baixo impacto da
crise financeira mundial de 2008 sobre o ISP no país.
Em 2009, os investimentos tiveram uma redução de 6%
em relação ao ano anterior, mas em 2010 o ISP voltou a
crescer. Segundo Fernando Rossetti, o país está vivendo uma época de reorganização de ambientes que favorece o crescimento da sociedade civil: “O terceiro setor
triplicou de tamanho, e as empresas cada vez mais têm
alinhado seus interesses corporativos com as ações sociais”, disse o secretário do Gife.
A maior concentração do investimento social privado,
conforme demonstra o estudo, está nas regiões Sudeste e
Sul. A Região Norte foi a que apresentou o menor volume
de investimentos. Esse dado reforça, na opinião do secretário-geral, a importância de buscar estratégias para nacionalizar os investimentos. “Um dos desafios do terceiro
lideRança
capa
eneRGia
« R e p o R taG e m á lva R o a l m e i da »
e x em p los i n s pi r a d o r e s pa r a m u da r o m u n d o
iGnacY
sachs
a usar fontes de energia fóssil. Agora, devemos realizar uma saída ordenada da era do petróleo e construir uma biocivilização baseada na transformação
da biomassa.”
quem? economista polonês, refugiado no
brasil e naturalizado francês, autor de mais de 20
livros sobre desenvolvimento e meio ambiente.
civilização da biomassa
o quê? ajudou a formular o conceito
de ecodesenvolvimento na conferência de
meio ambiente e desenvolvimento da
onu de 1972, mais tarde transformado em
desenvolvimento sustentável.
poR quê? conhece a realidade dos
países emergentes, acumulou anos de trabalho
no brasil e na Índia e é um dos raros economistas
capazes de conjugar crescimento econômico com
desenvolvimento social e conservação ambiental.
38 [ bs ]
pRaGmatismo
Sachs tem uma visão pragmática sobre temas polêmicos que despertam reações apaixonadas dos ativistas
no Brasil. Ele considera, por exemplo, inevitável que o
país aproveite o potencial hídrico das bacias da região
amazônica para a geração de energia. “Acho difícil ignorar o potencial hidrelétrico da Amazônia”, afirma
com ironia. Acredita também que o Brasil deveria utilizar os recursos provenientes da exploração do Pré-sal para justamente financiar a saída da era do petróleo. “É muito difícil encobrir as riquezas que já foram
descobertas”, justifica.
Embora alerte para os possíveis efeitos nas finanças brasileiras da atual crise econômica europeia no
médio e longo prazos, Sachs é taxativo a respeito da
mudança no peso político dos países emergentes, em
especial do Brasil, no cenário internacional. “O país
tem uma grande oportunidade de assumir efetivamente uma posição de liderança”, afirma. Esse protagonismo não se dá apenas no atual âmbito do G20,
mas do “G200”. “Não acredito no futuro do G20, e sim
numa reconstrução séria do G200, ou seja, das Na[bs]
ções Unidas.”
[ bs ] 39
para a construção do pensamento sobre o desenvolvimento
sustentável. Participou da organização da Conferência
de Estocolmo, em 1972, reconhecida por conjugar,
pela primeira vez, uma visão de desenvolvimento
com preocupação econômica, social e ambiental. Foi
conselheiro especial da Rio-92, que deu continuidade
a essa evolução e lançou a Agenda 21. Agora, lança sua
atenção para a Rio+20, que acontecerá em 2012.
“Neste momento, em que o mito dos mercados que
se autorregulam está mal das pernas, esse encontro
pode redesenhar o futuro da discussão sobre desenvolvimento”, afirma. “O Brasil, como país-sede, deve
bombardear a conferência com propostas articuladas
com outros emergentes”, aconselha. Para o professorpensador, autor de mais de 20 livros, os brasileiros
estão atrasados. É necessário acelerar o debate nacional nos próximos dois anos e articular um bloco com
os países que têm as mesmas preocupações. “Aprendi
que fóruns paralelos são animados, mas não impactam no que é discutido nas conferências da ONU. Para
serem efetivos, devem acontecer antes, como eventos
preparatórios”, ressalta.
Que futuro o sábio de 83 anos vislumbra? “Estamos
no começo da terceira grande transição da coexistência da espécie humana com o planeta. A primeira foi
quando domesticamos os animais e nos estabelecemos em comunidades. A segunda, quando passamos
Nesse contexto, os países das regiões tropicais e semitropicais ganham um papel fundamental por deterem
as maiores concentrações de biomassa, invertendo o
equilíbrio de poder global em termos de energia, insumo crucial do futuro. “Inverte-se a tese de inferioridade dos trópicos”, afirma. Sachs aponta também
para uma “Revolução Azul”, com o uso sustentável dos
recursos do mar e dos sistemas semiaquáticos. “Hoje,
estamos caçando os peixes em vez de cultivá-los. Das
águas, podemos tirar a proteína necessária para nos
alimentar e avançar nas tecnologias, como a da utilização das algas como fonte de biocombustível.”
Sustentabilidade, para o professor franco-polonês-brasileiro, não significa apenas responder à crise
climática. “Criamos um mundo cheio de desigualdades sociais”, resume Sachs. “O relatório do IPCC deixa
uma mensagem central clara. Temos algumas décadas para modificar nossas estratégias de desenvolvimento, pois do contrário teremos de conviver com o
gigantesco impacto social das mudanças climáticas,
que afetará, sobretudo, os mais fracos.”
Ao longo de sua trajetória acadêmica e diplomática, Sachs construiu uma visão globalizada. Nascido em Varsóvia, na Polônia, veio para o Brasil com
a família, aos 14 anos, como refugiado da Segunda
Guerra Mundial. Formou-se em Economia no Rio de
Janeiro. Voltou à Polônia em 1954, trabalhou como diplomata na Índia e consolidou a carreira acadêmica
na França, na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais. Em Paris, criou o Centro de Pesquisas sobre o
Brasil Contemporâneo. Com essa bagagem incomum,
que inclui um sólido conhecimento sobre o mundo
emergente e suas desigualdades, contraria os pensadores que pregam o fim do crescimento como saída
para a atual crise da civilização. “Distribuir renda já
é uma tarefa difícil, em termos políticos. Sem crescimento econômico, é muito mais.”
Sua proposta é de um desenvolvimento includente,
sustentável e sustentado, que possibilite a distribuição de renda e a consequente redução das injustiças
sociais. O economista confia também na ampliação
de redes sociais universais que enfrentem os déficits
de saúde, educação e moradia entre as populações
desfavorecidas e na evolução de mecanismos de economia solidária que permitam a inclusão no mundo
do trabalho.
jun/jul 2010
jun/jul 2010
iGnacY sachs contribui há 40 anos
“distriBuir renda Já é uMa
tarefa difÍcil, eM terMos
PolÍticos. seM cresciMento
econôMico, é Muito Mais”
r e p o r ta g e m
eneRGia
eneRGia
dodeseRto
o projeto desertec
quer construir
uma vasta
estrutura de
produção e
captação de
energia solar
da áfrica e do
oriente médio
para a europa
megaprojeto de 400 bilhões de euros preVê a construção
de usinas solares no norte da áFrica para abastecer
paÍses da região e atender a 15% da demanda da europa
rePortageM beto gomes
40 [ bs ]
tenções em julho de 2009, em conjunto com 11 empresas de
diferentes setores. Os gastos, estimados em 400 bilhões de
euros, são tão superlativos quanto o tamanho do empreendimento: uma vez funcionando a pleno vapor, a expectativa é de que o Desertec tenha 100 GW de capacidade instalada – o suficiente para abastecer o Brasil inteiro durante seis
meses. Uma das principais metas do projeto é atender a 15%
da demanda da Europa no ano de 2050.
meGaestRutuRa
Para atingir esse objetivo, uma enorme estrutura precisa ser erguida nos dois lados do Mar Mediterrâneo: usinas
solares e uma complexa rede de transmissão, que prevê a
colocação de cabos sob o oceano que separa a África da Europa, instaladas em uma área de seis mil quilômetros quadrados. A primeira experiência deve acontecer no Marrocos.
A ideia é que o país receba as primeiras usinas, equipadas
com milhares de painéis solares e espelhos refletores, desenvolvidos especialmente para captar o calor do Sol e alimentar um sistema que o transforma em eletricidade.
O maior desafio, no entanto, não é logístico. Embora os
desertos do norte da África recebam uma quantidade generosa de radiação solar, eles não são tão fartos em superfícies planas – o que dificulta a construção das plantas e não
ajuda na captação de energia. Outras questões complicadas
são as do plano político. “Cada país tem suas próprias leis
e regulamentações, com diferentes formas de subsídios e
diferentes regulações para a exportação e importação de
energia elétrica”, acrescenta Gerhard Hofmann, vice-presidente sênior da Desertec Industries, a empresa responsável pela parte de desenvolvimento do programa. Paralelamente, a Desertec Foundation atua para divulgar o projeto
e encontrar parceiros e investidores.
Existem, ainda, outros obstáculos que podem esfriar os
ânimos dos cientistas. A realidade de mercados tão distintos na Eumena fatalmente trará retornos diferentes de investimentos, compondo um cenário de incertezas que não
agradam aos financiadores. Outra questão é a tecnologia.
O melhor mix de matrizes ainda não foi determinado, e todas as possibilidades são consideradas pelos especialistas.
solaR com eólicas
Alguns estudos já foram conduzidos, e o projeto mais cotado, até o momento, é a utilização de energia solar contínua (CSP, na sigla em inglês) apoiada por usinas eólicas
para conduzi-la ainda em terras africanas. Da costa norte
da África, cabos especiais cruzariam o Mediterrâneo e levariam a eletricidade para a Europa, atravessando o oceano em diferentes pontos. “Todas as tecnologias essenciais
para o Desertec já existem. Temos projetos na China e na
Índia que demonstraram a viabilidade da transmissão de
eletricidade em longas distâncias, com baixas perdas”, comenta Bernd Utz, porta-voz para o Desertec na Siemens,
uma das empresas que integram o programa.
Dessa forma, a meta é criar um ambiente político e regulatório favorável até 2012, enquanto os técnicos trabalham em paralelo com análises concretas de projetos de
referência. Acredita-se que as medidas necessárias para
levantar toda a estrutura e colocá-la em funcionamento levem, pelo menos, duas décadas. “Ainda estamos em fase de
desenvolvimento. Definimos os problemas que têm de ser
resolvidos e estamos em fase de captação de shareholders e
parceiros associados”, comenta Gerhard Hofmann.
Ele é cauteloso ao falar do futuro, mas está otimista com
a possibilidade de o projeto sair do papel. “Quanto mais
companhias aderirem ao programa e mais governos apoiá-lo, maiores serão as chances de sucesso”, avalia o executivo
da Desertec Industries. A chanceler alemã, Angela Merkel,
e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso,
já manifestaram seu apoio. Gigantes do setor elétrico na
Alemanha, como a RWE e a E.ON, além de seguradoras do
porte da Münchner Rück, também aderiram. Resta ultrapassar a maior fronteira que separa a África da Europa: o
abismo político e econômico que há séculos divide o mundo
[bs]
desenvolvido dos países mais pobres do planeta.
[ bs ] 41
do norte da África e do
Oriente Médio podem virar uma importante fonte de energia para os países dessas regiões e de toda a Europa. Até
2050, a eletricidade de milhões de casas africanas e europeias pode ser gerada pelos raios de sol que incidem sobre
as areias tórridas do Saara. Nessa faixa de nove milhões de
quilômetros quadrados, o astro brilha durante cinco mil
horas por ano. É uma quantidade formidável de calor, que
alimenta a imaginação de um seleto grupo de especialistas.
Eles são os mentores do Desertec, um ambicioso projeto,
idealizado em 2003, que pretende pôr em prática o que já
se sabe na teoria: a energia provida pelo Sol é dez mil vezes
maior do que a necessária para abastecer toda a humanidade. Usar o sol do deserto é o óbvio que ninguém percebera.
Aplicada à realidade local, a conta significa aproveitar
apenas 0,3% da superfície dos desertos africanos para fornecer energia elétrica para toda a Eumena (sigla em inglês
para a região que abrange a Europa, o Oriente Médio e o
norte da África). Munidos dessa informação, os técnicos do
Desertec imaginaram uma extensa rede para levar a energia solar das areias do Saara a três mil quilômetros de distância, no coração da Europa, já em forma de eletricidade.
A iniciativa atraiu gigantes corporativos do porte do
Deutsche Bank e milionários ilustrados como o príncipe da
Jordânia, Hassan bin Talal, que assinaram uma carta de in-
jun/jul 2010
jun/jul 2010
os deseRtos
série
ano da biodiveRsidade
haroldo palo Jr.
conseRvaR
Florestas conservadas protegem
a biodiversidade da fauna e da flora,
a polinização e a manutenção de
estoques genéticos
dá lucRo
um hectaRe de mata
atlântica conseRvada
vale de R$ 370 a R$ 930
poR ano. a pRimeiRa lei
estadual de paGamento
poR seRviços ambientais do
bRasil Já está Funcionando,
no espíRito santo
42 [ bs ]
a superar, mas temos de reconhecer as contribuições
importantes dessa iniciativa, como a mobilização dos
proprietários. Também temos buscado inspirar políticas públicas para a conservação dos recursos naturais”,
afirma a executiva.
Partindo do conceito de serviço ambiental e dos benefícios derivados, tais como garantia de água doce,
alimentos e matérias-primas diferenciadas, além de
proteção da diversidade biológica, regulação do clima e
controle de erosão, a fundação fez um cálculo e chegou a
uma conclusão de valoração. Segundo a sua metodologia,
um hectare de área florestal bem conservada na região
da Bacia Guarapiranga pode valer até R$ 370, por ano,
pela manutenção da qualidade da água, que garante a sobrevivência de inúmeras espécies e o abastecimento da
Grande São Paulo. O dado é considerado essencial como
referência de remuneração dos proprietários.
Atualmente, o projeto paulista beneficia 13 proprietários de terras, que compreenderam a importância
de manter protegidas as matas nativas, ameaçadas por
muita pressão urbana. A experiência está sendo replicada no Oásis Apucarana, no Paraná, pela organização
ambientalista Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem
e Educação Ambiental (SPVS). Pelo menos 63 proprietários de terras do município, localizado na região norte
do estado, começaram a ser remunerados, com valores
que variam de R$ 850 a R$ 7 mil por ano. A Prefeitura de
Apucarana é parceira da iniciativa.
[ bs ] 43
além de estocar carbono
e conservar espécies, as
florestas da mata atlântica
absorvem a água da chuva
que se infiltra no solo e
abastece lençóis freáticos e
nascentes
A falta de um marco legal e a carência de recursos financeiros são as principais barreiras à ampliação dos projetos
de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) no Brasil. Na
contramão das dificuldades, no entanto, algumas experiências bem-sucedidas demonstram a viabilidade desse
mecanismo inovador, que concilia geração de renda e mobilização pela conservação da biodiversidade e de outros
recursos naturais. No Dia Mundial do Meio Ambiente, 5
de junho, são positivas as mensagens de quem assumiu a
vanguarda dessas iniciativas neste Ano Internacional da
Biodiversidade da Organização das Nações Unidas (ONU).
A Fundação O Boticário de Proteção à Natureza foi pioneira no desenvolvimento de uma metodologia que tornou
possível a aplicação prática do mecanismo de PSA no Brasil. Tudo começou em 2004, quando foi criado o Projeto Oásis, ajustado e lançado em 2006 com o objetivo de premiar
proprietários que mantenham áreas florestais conservadas na região da Bacia Guarapiranga, na Região Metropolitana de São Paulo. A área apoiada é considerada estratégica para a proteção de remanescentes de biodiversidade da
Mata Atlântica e de importantes fontes de água, que abastecem cerca de 5 milhões de habitantes.
Segundo a gerente da fundação, Leide Takahashi, no
ano em que a organização faz 20 anos e se comemora
o Ano Internacional da Biodiversidade, o Projeto Oásis se firma como exemplo de iniciativa que tem tudo
para dar certo em países detentores de megadiversidade, como o Brasil. “Ainda existem muitos desafios
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RepoRtaGem elizabeth oliveiRa
série
ano da biodiveRsidade
a falta de uM
Marco legal e
de garantias
financeiras
traVaM o
PagaMento
Pelos serViÇos
aMBientais
sessenta e um proprietários de terra, em cinco municípios, estão
sendo pagos para conservar as matas e as águas cristalinas da
bacia do Rio benevente, no espírito santo
Na Grande São Paulo, o Projeto Oásis ajuda a proteger 657
hectares de áreas florestais bem conservadas, onde estão
localizadas 82 nascentes de rios e outros corpos d´água que
alimentam a Bacia Guarapiranga. “Estamos estudando a
possibilidade de ampliar essa área, e buscamos parcerias”,
adianta Takahashi. A Fundação O Boticario já investiu
US$ 450 mil nos últimos cinco anos nessa iniciativa.
O Projeto Oásis tem patrocínio da Mitsubishi Corporation Foundation e é apoiado pelo escritório Losso, Tomasetti e Leonardo de advocacia, que, voluntariamente, trata de toda as questões legais relacionadas às propriedades
particulares participantes. Outros apoiadores institucionais da iniciativa são a Secretaria Estadual do Meio Ambiente de São Paulo e a Secretaria Municipal do Verde e do
Meio Ambiente de São Paulo, além da Fundação Agência
da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê (Fabhat).
44 [ bs ]
Partindo do princípio de que a proteção das florestas é fundamental para assegurar a oferta de água, além da manutenção da biodiversidade e outros benefícios ecológicos, o
projeto Produtor de Água, que já beneficia produtores rurais
de Extrema (MG) e Rio Claro (RJ), foi estendido para Joanópolis e Nazaré Paulista (SP), como ação de remuneração
por serviços ambientais no âmbito das bacias hidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. As atividades
são lideradas pela organização ambientalista The Nature
Conservancy (TNC), com apoio de uma rede de parceiros.
A solução é viável do ponto de vista econômico, assegura Fernando Veiga, coordenador de Serviços Ambientais
da TNC. “Na medida em que o PSA internaliza os benefícios da proteção ambiental, ele certamente gera um incentivo econômico positivo que pode ser uma poderosa
ferramenta para frear a degradação ambiental.”
No Rio de Janeiro, os produtores que recebem os pagamentos são responsáveis pela restauração florestal de
aproximadamente 60 hectares e pela conservação florestal de 920 hectares. A remuneração anual varia de R$
20 a R$ 60 por hectare. Em São Paulo, nove produtores
assinaram contrato para a execução das atividades, que
estão sendo iniciadas. Eles receberão aproximadamente
R$ 28,9 mil, em valores que podem variar de R$ 75 a R$
125 por hectare, ao ano. Em caráter pioneiro, os recursos
[ bs ] 45
O Governo do Espírito Santo saiu na frente e criou a primeira lei estadual de pagamento por serviços ambientais no Brasil, em julho de 2008. Para tornar a legislação
aplicável na prática, foi criado o Fundo de Recursos Hídricos (Fundágua), destinado à captação de recursos financeiros, que estão assegurando as ações de remuneração de 61 proprietários, em cinco municípios capixabas,
participantes do projeto ProdutorES de Água. Eles ajudam
a preservar 763 hectares de matas. Outros 35 processos
estão em tramitação. Os investimentos nas ações de remuneração somam R$ 121,1 mil.
FloResta e áGua
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leGislação inovadoRa
Os primeiros pagamentos foram realizados em março de
2009, para proprietários do município de Alfredo Chaves,
na bacia do rio Benevente. Gradativamente, outras regiões
do estado estão sendo incorporadas ao projeto, que atua,
também, nas cidades de Brejetuba e Afonso Cláudio, na bacia do rio Guandu, além de Mantenópolis e Alto Rio Novo,
na bacia do rio São José. Os valores pagos podem chegar s
R$ 930, por hectare, e dependem de critérios técnicos, tais
como o estágio de conservação das florestas. Os contratos
são de três anos.
“Temos alcançado bons resultados com o ProdutorES de
Água porque conseguimos superar dois grandes gargalos
que impedem a ampliação do uso de PSA no Brasil: a falta
de um marco legal específico e a garantia de recursos financeiros para dar suporte às ações de remuneração dos
proprietários de áreas florestais”, explica Robson Monteiro, gerente de Recursos Hídricos do Instituto Estadual de
Meio Ambiente (Iema).
O gerente destaca que os recursos disponibilizados são
oriundos da parcela de 3% do total dos royalties do petróleo e gás natural contabilizado no estado e da compensação financeira do setor hidrelétrico, podendo ser complementados com o orçamento do governo. “Temos uma fonte
segura de recursos para manter o projeto.” Apesar disso,
Monteiro ainda considera como desafio o envolvimento da
iniciativa privada em ações desse tipo no Brasil.
Pela experiência no Espírito Santo, os gestores estaduais
foram convidados a colaborar para a criação de leis semelhantes em Pernambuco, Santa Catarina e no sul da Bahia.
Enquanto estados e municípios se articulam para criar
legislação específica, o gerente do IAB destaca que está
tramitando no Congresso, desde meados de 2009, um
projeto de lei que propõe a criação da Política Nacional
dos Serviços Ambientais, cujo relator é o deputado federal Jorge Khoury (DEM-BA).
para remuneração dos participantes do projeto Produtor
de Água vêm da cobrança pelo uso da água direcionados
pelo Comitê das Bacias Hidrográficas dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí. A iniciativa também tem apoio
da empresa Caterpillar.
A expectativa em São Paulo é de estimular técnicas de
conservação de solo em 390 hectares, além de recuperar
outros 208 hectares de Áreas de Preservação Permanente
e de conservar 540 hectares de floresta. As ações vão contribuir para proteger a biodiversidade de espécies da Mata
Atlântica na região, além de promover a melhoria da qualidade dos mananciais de recursos hídricos que contribuem para o Sistema Cantareira, responsável pelo suprimento de 50% da água da Grande São Paulo.
Em Minas Gerais, os projetos de restauração florestal estão sendo implementados integralmente em parceria com
o Instituto Estadual de Florestas e com as ONGs Amanhágua, AMA Juiz de Fora e Quatro Cantos do Mundo. Esses
parceiros estão se mobilizando para integrar o primeiro
edital do Programa Bolsa Verde, iniciativa de Pagamento por
Serviços Ambientais criada pelo governo do estado.
Para Fernando Veiga, o aumento da percepção da sociedade leva a crer que a conservação da biodiversidade
passará a ser vista não apenas como uma preocupação
de ambientalistas, mas como condição essencial à garantia da própria sobrevivência humana. “Assim, podemos
passar da oposição meio ambiente versus desenvolvimento para uma situação em que o meio ambiente saudável
seja condição para o desenvolvimento”, conclui. [bs]
r e p o r ta g e m
planeJamento
eM 2050, dois terÇos da
PoPulaÇão Mundial ViVerá eM
cidades, auMentando a deManda
Por infraestrutura, qualidade
de Vida e MoBilidade
björn stigson: brasil
deve começar a mudar
a sua base produtiva
como cabeR
no FutuRo
há grandes desaFios a eQuacionar até 2050 para criar um
mundo sustentáVel com os recursos disponÍVeis no planeta
rePortageM e foto pedro michepud
46 [ bs ]
O Vision 2050 é dividido em cinco capítulos: Perspectivas de Negócios para 2050, Visão, Caminhos para 2050,
Oportunidades e Conclusão. Neles, são sugeridos passos
para que a sociedade consiga se sustentar até 2050. De
acordo com o estudo, a população mundial vai se estabilizar nesse ano, em decorrência da expansão da educação, da urbanização e da equalização da participação
das mulheres no mercado de trabalho.
Dois terços da população viverão em cidades, o que
exigirá adaptações e avanços em infraestrutura, qualidade de vida e mobilidade. Só na China, 600 milhões
de pessoas vão se transferir do campo para a cidade nos
próximos 30 anos, aumentando a demanda de infraestrutura e de bens de consumo.
Apesar de a adaptação à urbanização ser imperativa
para a sobrevivência das empresas, haverá, também,
grandes oportunidades de crescimento. “A tempestade
que vemos pela frente trará muitas possibilidades. O caminho para o mundo sustentável contém oportunidades e riscos, e vai mudar radicalmente as formas pelas
quais as empresas fazem negócio. Muitas empresas vão
coRRida veRde
De acordo com Björn Stigson, os países que se tornarem
sustentáveis serão os líderes da nova ordem mundial. No
entanto, nenhum encontrou, ainda, o equilíbrio entre
sua pegada ecológica e o nível de desenvolvimento humano (IDH) necessário para um mundo sustentável em 2050.
“Se o Brasil quiser ser um líder global, deve se apressar”, afirma o presidente do WBCSD. A participação brasileira é tímida diante do seu potencial, muito atrás do empenho dos países da União Europeia, dos Estados Unidos e
da China, nação empenhada em tornar-se a maior exportadora de tecnologia verde. A Índia também está adiantada, preparando soluções locais para melhorar a vida de
sua população. “Se o Brasil quiser ser líder, precisa começar a mudar a base produtiva”, afirmou Stigson.
“Este documento representa o primeiro passo de
uma jornada de 40 anos”, afirma a conclusão do Vision
2050. “Trata-se de um chamado para o diálogo, um convite à ação. Colaboração, convicção e coragem serão necessárias para visualizar e implementar as mudanças
para a prosperidade a longo prazo. Os empresários irão
querer e terão necessidade de liderar a busca pela sustentabilidade. Convidamos os líderes políticos e a socie[bs]
dade civil a se juntar a nós nessa jornada.”
para ver o documento completo online, acesse
o link (em inglês) http://tinyurl.com/38rlpme
[ bs ] 47
dia e energia, sem danos à biodiversidade e ao ecossistema. É, também, uma ferramenta para auxiliar
as empresas a desenvolver estratégias para uma economia de baixo carbono.
“Precisamos de uma revolução verde”, resume
Björn Stigson, presidente do WBCSD. Segundo ele, “o
mundo está em transição para a sustentabilidade, a
economia e a sociedade estão evoluindo e os desafios
são enormes. Se não nos envolvermos, não será fácil
realizar a mudança”. Segundo Stigson, há uma corrida verde global pela liderança das iniciativas de refor-
pessoas e planeta
mudar e se adaptar, enquanto outras serão desafiadas a
fazer a transição”, diz o estudo.
A longo prazo, o mundo precisa duplicar a produção
agrícola sem expandir as áreas agriculturáveis, eliminar o desmatamento, aumentar o número de florestas
e reduzir em 50% o nível de emissão de carbono em relação aos níveis de 2005. É preciso incorporar a sustentabilidade em todos os produtos, serviços e estilos de vida
e, ao mesmo tempo, retirar 3 bilhões de pessoas da linha
da pobreza.
jun/jul 2010
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nove bilhões de pessoas
vivendo bem com os recursos disponíveis no planeta em
2050. Essa é a missão do estudo Vision 2050, publicado pelo
World Business Council For Sustainable Development
(WBCSD) e lançado, em fevereiro, na Índia, e em maio,
no Brasil, destinado a mobilizar as empresas para repensar seu papel em busca de uma sociedade sustentável.
O relatório apresenta um panorama sobre os programas necessários para garantir que, nos próximos
40 anos, todas as pessoas tenham acesso a serviços
básicos, como saúde, educação, alimentação, mora-
ma. A Comunidade Europeia está na vanguarda, mas
os EUA e a China estão avançando na transição para
uma economia de baixo carbono, diz o executivo.
Stigson não poupa elogios ao Brasil. “Vocês estão entre os países que mais investem em infraestrutura urbana. Além disso, têm uma ótima situação energética e
uma grande biocapacidade, ou seja, a capacidade territorial de satisfazer as necessidades de consumo e de assimilar os resíduos dos seus habitantes. Só isso já representa um potencial substancial de liderança”, explicou.
Para o executivo, o empresariado tem um papel fundamental na transição pela qual o planeta está passando, dado que os governos não conseguirão realizar
a tarefa sozinhos. “O mundo não será bem-sucedido se
o empresariado não oferecer soluções para o planeta,
e as empresas não serão bem-sucedidas em sociedades
fracassadas”, afirma.
r e p o r ta g e m
GRi
Rita nardy
tereza Fogelberg
anunciou uma
nova geração de
indicadores GRi
para promover a
sustentabilidade
novas ideias,
velhos dilemas
conFerência da global reporting initiatiVe propõe
integrar relatórios Financeiros e de sustentabilidade
para aumentar a transparência das empresas
seis tendências para o futuro dos relatórios,
nos próximos dez anos:
• traceabilidade – que representa a capacidade
de ampliar o alcance da informação ao longo
da cadeia de valor;
• integração de dados econômicos, sociais
e ambientais;
• liderança em iniciativas de governo (regulação);
• novas fronteiras ambientais;
• ratings e rankings (filtros para a sustentabilidade);
• economias obscuras (o enfrentamento
das práticas e dos setores ilegais).
os vencedores do the gri readers´
choice awards 2010
Prêmio engajamento (engage award)
banco do brasil
Prêmio sociedade civil (civil society award)
Vale
Prêmio cadeia de Valor (Value chain award)
natura cosméticos
Prêmio investidor (investor award)
banco do brasil
Prêmio relatório Mais eficaz
(Most effective report award)
bradesco
Vencedor geral (gri readers’ choice award)
banco do brasil
A presença do Brasil foi marcante, e não apenas na
plateia. Os vencedores do prêmio GRI Reader’s Choice
Awards 2010, que registra a opinião dos leitores sobre os
relatórios, foram todos brasileiros. Banco do Brasil, Vale,
Natura e Bradesco arremataram prêmios em seis categorias (veja box), refletindo o intenso engajamento das empresas e dos seus públicos internos na premiação. Para
se ter uma ideia, dos 5.277 participantes de 40 países entrevistados pela pesquisa The Readers Report Survey, 3.724
eram brasileiros (71%).
Mesmo assim, Nelmara Arbex, do GRI, considera que os
relatórios de sustentabilidade no Brasil estão avançando.
Segundo ela, não só aumentou o número de empresas que
relatam utilizando as diretrizes GRI, como os processos de
preparação estão mais estruturados. “Muita gente no Brasil se interessa pelos relatórios, e isso cria um ciclo de produção e participação útil para a sociedade e para o futuro
da sustentabilidade”, diz Nelmara.
Seguindo a mesma linha, Kumi Naidoo, diretor-executivo do Greenpeace, fez um apelo aos participantes para
que não desistam do trabalho em prol da construção de
uma agenda de sustentabilidade. Para Naidoo, é fundamental manter a confiança e encarar os desafios como o
início de uma longa batalha. O ambientalista sul-africano
disse que o Greenpeace continua firme em suas crenças,
e que acredita na necessidade de ampliar o diálogo com
as empresas para criar um modelo de desenvolvimento
baseado na sustentabilidade. É preciso apostar em parcerias e ideias novas para vencer os velhos desafios. [bs]
[ bs ] 49
48 [ bs ]
s
oB os ecos da recessão euroPeia, foi realizada, em
maio, em Amsterdã, a terceira Conferência Global sobre Sustentabilidade
e Transparência, promovida pela Global Reporting Initiative (GRI).
Lideranças empresariais, especialistas e diversas organizações da sociedade civil
discutiram os rumos da gestão e dos relatos da sustentabilidade.
Três dias de evento reuniram 200 palestrantes e 1.200 participantes de 73 países.
Vários prêmios foram conquistados por empresas brasileiras – Banco do Brasil,
Vale, Natura e Bradesco – pelo engajamento de stakeholders nos relatos.
econoMia Mais
transParente
os Melhores
Para os leitores
jun/jul 2010
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rePortageM rita nardy, de amsterdã
“Precisamos repensar nosso modelo de produção para
adequá-lo à biocapacidade do planeta. Como relatórios
de sustentabilidade vão nos ajudar a construir a nova
economia sustentável que desejamos?”, perguntou Ernst
Ligteringen, diretor-executivo do GRI, durante a abertura da conferência. Para responder à pergunta, a organização lançou a publicação A Economia Transparente, elaborada em parceria com a consultoria Volans, de John
Elkington. O estudo apresenta seis tendências para os
relatórios nos próximos dez anos (veja box) e integra um
novo programa, que estuda os cenários futuros no campo da sustentabilidade.
Ligteringen apresentou duas metas da organização
para a próxima década, que foram debatidas no evento.
Em primeiro lugar, converter em prática obrigatória o
relato público de desempenho em sustentabilidade para
todas as grandes e médias empresas de países desenvolvidos e emergentes, até 2015. As empresas que optarem
por não relatar seu desempenho deveriam explicar seus
motivos publicamente, sugere a proposta. Na França, a
obrigatoriedade existe desde 2001.
O GRI também propôs integrar relatórios financeiros
e de sustentabilidade em um único produto, testando o
modelo até 2020. A ideia, segundo Teresa Fogelberg, diretora-executiva de Relações Externas do GRI, será desenvolvida por um Comitê Internacional com a participação
de outras organizações relacionadas ao mercado financeiro e a práticas de responsabilidade social corporativa.
O GRI abriu ainda a discussão sobre a necessidade de iniciar o desenvolvimento de uma nova geração de indicadores (G4) para suprir as demandas atuais.
Falsa
contRovéRsia
retranca
« R e p o R taG e m s i lv i a Wa R G a F t i G »
opiniões diVergentes sobre temas polêmicos
o cheFe deve seR temido ou estimado?
jun/jul 2010
teMido
Por definição, a posição de chefia é dotada do poder inerente, instituído pela organização, de despedir ou de
promover um funcionário, o que, por si só, é suficiente como instrumento de pressão. Portanto, o chefe não
precisa ser “linha dura”. Precisa ser ele mesmo, apostar
no seu estilo pessoal e dar espaço para o subordinado
contribuir com a organização. Todo ser humano gosta
e precisa dar a sua contribuição, o que se consegue somente se houver liberdade para atuar, esforçar-se ao
máximo e sentir-se gratificado pelo resultado, como
pessoa e como trabalhador. A premissa vale para todos
os empregados, dos menos aos mais qualificados.
Dentro do conceito de sustentabilidade, o que se
discute é que os recursos humanos não devem ser
vistos como recursos abundantes, mas sim escassos,
para que cada indivíduo seja valorizado e se sinta
confortável para se manifestar e discutir questões referentes ao trabalho. Evidentemente, a própria organização se beneficia com isso.
A missão do chefe como líder é, sobretudo, importar-se com as pessoas e facilitar as condições para que seus
coordenados ajudem uns ao outros. Esse é o sentido de
construir uma equipe, que se caracteriza por um grupo
em que os membros cooperam mutuamente. Enquanto
a sociedade, em geral, estimula a competição e o individualismo, cabe ao líder motivar a cooperação, gerenciar
eventuais conflitos e emancipar seus funcionários,
ensinando-os a se responsabilizar por si mesmos. Para
tanto, é fundamental que utilize seu poder de referência, e não o de força.
Segundo pesquisas, em grande parte das organizações
a estratégia de gestão de pessoas não está alinhada à estratégia de resultados. Como consequência, as empresas
não promovem o aculturamento de seus funcionários
no tocante a missões, visões e valores, e o público interno, por sua vez, não adquire consciência da importância
de se ajustar aos processos e às necessidades de resultado do negócio. Disso resulta, frequentemente, uma postura descomprometida e individualista, o que induz as
empresas a valorizarem gestores e líderes com um perfil
comportamental “linha dura”, capaz de garantir a produtividade diária. Caso contrário, não se sustentam.
Na prática, o chefe linha dura é aquele que orienta
constantemente o trabalho de cada funcionário, de
acordo com o planejamento prévio e eventuais intervenções estratégicas. Deve ter a visão macro do negócio
e conhecer o papel de cada um para cobrar o desempenho, separando o emocional do profissional e deixando de lado aspectos sentimentais para exigir o cumprimento das metas. Isso significa ser direto e objetivo,
com foco nos resultados.
Em organizações que ainda não realizaram nenhuma iniciativa de aculturamento, o chefe linha dura
pode ser visto como alguém cruel, mais temido do que
respeitado. Já em empresas que iniciam esse trabalho, ele passa a ser visto como um estrategista que está
cumprindo sua função para assegurar que todos os demais também façam sua parte. Para tanto, é importante que a política de Recursos Humanos torne as estratégias da empresa transparente para todos.
50 [ bs ]
estiMado
e d ua r d o b a s t o s , consultor de recursos humanos e
professor de psicologia do trabalho e saúde do trabalhador na
universidade metodista de são paulo
e l i s a n g e l a l i m a F a V a r o, consultora
e coach de recursos humanos